O Poder de Um Sorriso

Capítulo II:

Devaneios Irrefreáveis

- Esperava quem? –Milo respondeu sarcástico, saindo das sombras, adorando aquela entrada levemente triunfal. Lembrou-se depois que entradas triunfais eram para heróis, categoria na qual decididamente ele achava não se enquadrar. Era certo que era heróico salvar o mundo de deuses paranóicos, mas ele não fazia o tipo, Mu ou Aiolia talvez tivessem todo o perfil. Bonitos, jovens, calmos, fiéis... Tantas qualidades, que ele simplesmente sabia não caber a ele. Não que ele se desvalorizasse, ou pensasse que não fosse tão bom quanto eles, porém um sentimento fazia-se presente e tinha raízes profundas em seu âmago, algo que estava lá desde quando estivera em sua primeira batalha. Desde quando se entendera por gente. Ele sabia que nascera especial, talvez soubesse que nascera a ser o quase feliz, o quase amante, o quase mais poderoso, o quase fiel, mas nunca sendo algo de fato. Como todo mundo era egocêntrico, pensando que as coisas só aconteciam consigo, ou que deixavam de acontecer somente com ele, como no caso do sentimento que tanto procurava. Por tanto tempo... Tanta espera... Sua voz ecoando no vazio de um templo ainda intacto, enquanto procurava a realização de seus mais ocultos anseios. A máscara de impertinência precisaria ser recolocada no lugar... Ninguém podia perceber! Ninguém precisava saber que o quase alegre Milo, era um quase filosofo de fim de semana e que resolvera achar lógica para quase todas as dúvidas da vida... Ergueu a cabeça, tentando se sentir superior a tudo e a todos, mantendo o tom zombeteiro ao qual se habituara. Se queria que todos vissem o que ele queria mostrar, teria de se reerguer e se tornar um bom ator. - Chapeuzinho vermelho? Ou quem sabe você esteja tão bêbado a ponto de já estar vendo a Madonna vestida apenas com uma cueca samba-canção...

-Oras, Milo! –Kamus falou mantendo sua expressão impassível, encoberta pelas sombras. Milo viu-se com sua curiosidade sendo fustigada pelo chicote cruel da incompreensão, que parecia golpeá-lo com violência psicológica jamais vista em si, mexendo com as bases de ausência de sentimentos além dos estritamente necessários. Sua expressão mudou quase que instantaneamente dando-lhe o ar infantil de criança que mal pode esperar o natal pra saber o que vai ganhar. No caso, Milo tentava desvendar o que o francês levava em consigo. Era algo comprido e estava envolto em algum pano, retalhos quem sabe... Podiam ser várias coisas, porém Milo devia admitir que suas imaginação não estava tão fecunda quanto costumava ser, não sabia o que poderia ter aquelas formas... – Você só apareceu para me incomodar a essa hora da madrugada com essas constatações absolutamente ridículas? Você sabe muito bem que não sou irresponsável a ponto de ficar em festas até e a essa hora.

-Isso foi alguma acusação indireta a mim? –Milo perguntou erguendo a sobrancelha direita, com a curiosidade incessante cedendo espaço em proporções justamente iguais, ao divertimento. Ele sabia o que se iniciaria ali. E sabia... Não! Tinha certeza de que queria que aquilo continuasse tomando o rumo que seguiria irremediavelmente. Ao menos um pouco daquilo teria o poder de entretê-lo, por mais entediado que estivesse. Talvez aquelas discussões absurdamente hilárias fossem o único motivo de ainda não ter sucumbido num poço sem fundo de melancolia e mágoas de si próprio. Um sorriso matreiro já ganhando vigor em seus lábios acetinados, mais vermelhos do que qualquer cereja madura que pudesse ser escolhida como presente a amada por qualquer agricultor caprichoso, tão natural quanto a cor que aponta a diligência com a qual a natureza anunciou a todos que um de seus frutos estavam prontos... Exatamente como Milo se sentia... Apto a provar o néctar do amor que lhe negavam. Aproximou-se mais de Kamus, algo não muito apropriado durante uma discussão, mas o gosto do perigo que gotejava seus pingos quentes sobre os lábios de Milo era mais tentandor do que qualquer coisa que o francês fizesse... Estabeleceu-se bem em frente a ele, querendo e podendo observar com atenção o que ele portava em seus braços.

- Nunca faço acusações indiretas, Milo. –Kamus respondeu simplesmente, com um tom de indiferença, os passos recomeçando novamente, enquanto ignorava Milo em sua frente. Ele parecia estar ignorando as provocações taciturnas do grego. Talvez apressado ou ansioso... Milo nunca conseguia desvendar o que se passava por trás da expressão velada do aquariano - Minhas acusações são sempre diretas! Não sou homem de meias palavras, como você!

Milo, apenas observou o que Kamus carregava. Estava disposto a redargüir de forma árdua, contudo, por um momento, suficientemente longo, a curiosidade pareceu ganhar do seu senso de humor um tanto deturpado. Deixou-se mirar deliberadamente o que Kamus carregava. Notou que a parte que estava descoberta pendendo sobre um dos braços do francês, eram pernas, provavelmente esguias e bem torneadas, ele não podia dizer exatamente, já que estava tudo tão escuro. Mas não escuro o suficiente para que ele não visse as silhuetas, os movimentos, ou até um olhar iluminado por qualquer sentimento mais pujante. Era acostumado com o escuro, com o frio, com o vazio... Ele segurava a pessoa com extremo cuidado, como se tivesse medo de quebrá-la. Era visível o pequeno brilho de apreensão em seus belos olhos azuis-escuros, quase um tom violeta, como das águas mais longínquas do alto mar, no coração azul do atlântico. Ele talvez estivesse bêbado mesmo, por mais que negasse isso. Kamus não era de se deixar ser pego com uma ponta de qualquer sentimento, por mais tolo que seja. Era decididamente um corpo humano feminino que o francês carregava. Estava encoberto por uma manta, mas bem que podia ser um daqueles vestidos novos que estavam na moda... Vai saber... Hoje em dia já tem roupas até de latinhas de cerveja... Com o artifício da roupa ou manta, seja como for, tudo que Milo podia ver eram os cabelos longuíssimos pendendo sobre o outro braço do francês. Deviam ser escuros, os fios... Entre castanho e negros, já que não havia qualquer tom mais claro que chamasse atenção em meio a escuridão. Não podia ver as feições do ser que ele carregava, contudo não se importou, sabia que o corpo com certeza era feminino...

- Meias palavras, meios termos... –Milo pensou por um momento, estava prestes a cair em mais uma reflexão profunda, mas não podia dar esse gostinho ao Kamus! Afastou tais pensamentos e abriu um sorriso triunfante, devolveria a Kamus na mesma moeda, mas com muito mais graça, e com um sorriso que deixaria o francês desconcertado. Um sorriso era uma forma de ataque tão eficaz quanto as palavras, pois ele tinha ar implícito que muitas palavras não possuiam. - Não são nada além de coisas que a gente fala da boca pra fora, não Kamus? Então que diferença faz se as frases são completas ou não? Se o que digo é errado, não há nada que ninguém possa fazer, porque talvez seja nisso que eu acredite. Tudo se trata de uma questão de opinião.

- Não tenho tempo a perder com seus questionamentos absolutamente grotescos! –Kamus devolveu, desviando-se do amigo pela segunda vez. Dando-lhe as costas. Milo estava quase decepcionado. O francês não parecia disposto a discutir. A ajudá-lo a esquecer a dor momentaneamente...

- Está com pressa, Kamus? –Milo perguntou com escárnio, acompanhado de um sorriso bastante maldoso, um tanto característico dele. Sua máscara favorita em meio a hipocrisia sentimental que encenava aos companheiros. Sequer voltou-se para fitar o amigo, pareceria mais frio, mais cruel... Uma provocação pessoal ao francês mal-humorado e observador - Parece que a noite vai ser bem animada, não?

- O que você quer dizer com isso? –Kamus perguntou parando novamente, voltando-se para fitar o grego. Acompanhou o olhar do escorpiano até a jovem que ele carregava. Depois de um instante em meio a grande confusão que se fazia em seu ser, sentiu os fios de compreensão penetrando rapidamente dentro de sua mente. Não pôde deixar de corar instantaneamente. Algo pouco usual, pouco esperado, completamente inimaginável... Milo associou-o rapidamente a uma manga rosa, com seus tons coloridos e alegres ferindo a mesmice do verde das folhas longas em forma de pena, exatamente como os tons rosados feriam a face pálida do aquariano- Não é nada disso...

- Nunca pensei que veria o Senhor Cubo de Gelo desesperado por causa de uma mulher. –Milo comentou tentando conter o riso de divertimento. Era um tanto engraçado ver Kamus em uma saia justa, simplesmente porque depois de tanto tempo convivendo com o amigo, jamais conseguira perturbá-lo ao ponto de deixá-lo enrubescido. O embaraço de Kamus era quase palpável ao grego, que se internamente se divertia a valer com o emudecimento súbito dele. Já que brincava em terreno perigoso, por que não dobrar a aposta? Até que ponto Kamus pode chegar antes de tentar matá-lo? - Você não deve estar tão desesperado a ponto de não me apresentar à moça.

- Eu preciso ir, Milo. –Kamus respondeu em um tom sério e urgente, um tanto mal-humorado, ignorando os comentários que o amigo emitiu. Ou ao menos tentando. Ele se recompôs a tempo! Filho da mãe! Como podia ser tão esperto a ponto de se desvencilhar facilmente da arapuca que armara? Seria engraçado vê-lo submetido a ter de lhe apresentar a garota, talvez mais envergonhado que jamais ele vira antes. Era mais um desafio implícito que lançava a Kamus, uma forma de tentar derrubar o orgulho fátuo e ridiculamente inquebrável do francês - Como lhe disse, não tenho tempo a desperdiçar com você e suas brincadeiras completamente tolas.

- Larga de ser um pingüim estúpido e me apresenta logo a moça! -Milo pediu com o sorriso maroto quase infantil, tentando disfarçar o desafio implícito que carregava os ares frescos com a tensão iminente que corria por todo o lugar - Eu juro que não roubo ela de você... -completou piscando o olho direito levemente, com uma malícia muito mal contida. Devia melhorar na capacidade de ator...

- Adeus, Milo! –Kamus ignorou deliberadamente o grego, já sem paciência. Milo sabia que não era algo que fosse abundante nele, a paciência. Era uma virtude que Kamus jamais teria, Milo tinha certeza. Não sabia esperar, gostava de todas as coisas bem límpidas diante de seus olhos, odiando qualquer assunto obscuro ou que pudesse deixar um ar dúbio em meios as palavras que proferia. Ele não era alguém que parecia disposto a cair em seus desafios infantis...

- Nossa, Kamus! Quanta intolerância! –Milo disse no mesmo sorriso simplório de divertimento. Se Kamus não tinha paciência, azar o dele. Porque Milo era um ser um tanto persistente, nunca parava de tentar enquanto ainda tivesse seu leque de opções válidas em mãos e sua sanidade mental, embora dessa segunda ele já duvidasse da existência dentro de si, caso contrário, já teria desistido e ido contemplar a chuva que cairia. Assistir os olhos castanhos da tempestade castigar os desmerecedores seres terrestres de sua piedade- Você vai tê-la pelo resto da noite só pra você, o que custa deixar a dama conhecer seu grande amigo aqui?

- Ela não pode. –O aquariano deu um suspiro resignado, um ar triste o açoitando. Era comum se ver Kamus quieto, em meio a sua reclusão habitual, mas nunca havia visto aquele olhar triste e de profunda dor naquele homem absolutamente frio, quase reconhecia aquele olhar. Parecia o mesmo que andava em seus olhos nos últimos dias, o mesmo olhar que indicava que eles estavam afundando em um mesmo abismo, que declarava a dificuldade de superar cada um dos obstáculos imaginários que colocavam entre si e seus ideais. Neste momento ele parecia tão ofuscado pela própria sorte a qual a vida o submetera, sorte exatamente igual a sua. O diferencial nele, talvez fosse o fato de Kamus não buscar a felicidade. Parecia já estar resignado destino, se é que se pode chamar uma vida de servidão de destino, ao que fora fadado. Contudo, nenhum dos pensamentos de Milo o preparou para ouvir o que se seguia - Ela está morta.

Milo fechou os olhos, tentando assimilar a última notícia que recebera. Kamus estava carregando uma mulher morta em seus braços... Mas por quê? Quer dizer, não é uma coisa que todo mundo faça, sair carregando um cadáver pelas casas zodiacais. A pressa e a impaciência dele era compreensível, afinal era um cadáver que ele tinha em mãos, contudo o que raio Kamus estava pretendendo fazer com aquele corpo? Será que ele a iria... Mesmo depois de morta? Kamus seria tão amoral assim? O aquariano era um mistério para todos no santuário, nunca revelava suas emoções a ninguém e nem ao menos tentava ser levemente cordial, um homem alegre ou quem sabe, quase feliz, como ele forjava. Talvez por isso Kamus se sentisse bem, porque ele procurava motivos para ocupar sua mente sempre tão abastada de afazeres, sempre privando-se a si próprio de algo. Se fosse isso que se passa dentro da mente hermética de Kamus, talvez ele fosse capaz de... Meu Deus! Kamus seria...?

- Kamus! –Milo repreendeu-o horrorizado, com sua mente assaltada pelos pensamentos indignos que começaram a partir dos pensamentos anteriores. Tinha de comprovar aquilo- Não sabia que era necrófilo! Você não tem vergonha na cara! Ela já está morta!

- O quê? –Kamus voltou-se totalmente revoltado para o grego, sem poder rejeitar a injúria que o escorpiano lhe fizera. Era uma acusação muito grave a que ele o estava sujeitando. Como ele podia duvidar de sua índole e educação? Kamus era incapaz de fazer mal a uma mulher, ainda mais morta! Nunca ouvira maior disparate em sua vida! Sempre soubera da imaginação úbere do grego, mas ele parecia dar passos maiores do que suas pernas podiam galgar, exatamente como uma criança que dá seus primeiros passos, tão oscilantes e tão incertos, contudo, sempre na perspectiva de resultados enriquecedores e que lhe acrescente algo mais na luta que se iniciou em seu nascimento num mundo hostil em que foi destinado, talvez até prognosticado, a viver. Impertinentemente malicioso! Podia uma só pessoa portar tantos pensamentos maliciosos? Era sempre o cavaleiro mais indiscreto, parecia não ter limitações que pudesse impedi-lo de transpor valores morais de suma importância para pessoas comuns, mas que parecia desvanecer rapidamente aos olhos do grego– Você não pode estar falando sério! Pirou de vez? É claro que não sou necrófilo! Como você pode ser tão malicioso, mesmo quando digo que tenho uma mulher morta em meus braços? Será que você, ao menos uma vez, não pode abster-se de qualquer comentário de caráter malicioso ou alusivo à vida sexual de uma pessoa?

- Calma, Geladinho! –Milo tentou apaziguar, pelo tom de voz aborrecido do francês, ela parecia quase capaz de enviá-lo ao mundo de onde não se volta facilmente, onde coisas frágeis são julgadas com o vigor da fúria dos trovões que caíam sempre reluzentes, lindamente mortais. Dessa vez tinha de admitir que fizera uma constatação ridiculamente infeliz. No entanto, não se culpava por ter pensado coisas assim. Como bom representante da raça humana, era egocêntrico o suficiente para dizer a si mesmo que não errara com o amigo ou remotamente demonstrara não ter sentimentos. Ele os tinha, porém Kamus parecia não ser merecedor de sua preocupação. Sabia de que artifício deveria valer-se pra livrar-se da repressão psicológica que sua consciência o debelaria mais tarde. Sem dúvida, podia dizer que a culpa era toda de Kamus por nunca falar nada sobre sua vida. Era sempre mais fácil sair jogando a própria culpa nos outros do que atentar-se a real razão ou necessidade do próximo. Algo bonito, mas que na aplicação prática, perdia em dez a zero pro seu orgulho. Não pode conter o riso, contudo, que lhe fugiu rouco pela garganta. Era difícil resistir à expressão de completa indignação que o francês emoldurara em sua face. Parecia que ele houvera ultrajado a mãe do aquariano, ou até mesmo dito absurdos sobre qualquer coisa que ele pudesse ter dito. Aquilo estava bem melhor do que uma noite reflexiva, não podia deixar de se abençoar por ter ido implicar um pouco com Kamus. Talvez até conseguisse dormir mais tarde... – Não precisa ficar assim, só porque eu lhe disse óbvio! O que você acha que um homem pensaria ao ver você, que nunca aparece com acompanhante alguma, passando por Escorpião exatamente às... –Milo fitou o relógio, que tinha os ponteiros que brilhavam levemente no escuro- duas e três da manhã, com corpo desfalecido de uma mulher? Nada de bom, eu suponho!

- Não lhe devo satisfações! Não preciso reportar a você o que faço fora do meu leito a essa hora! –Kamus continuou seu caminho e, pela expressão de poucos amigos, não se voltaria para falar com ele novamente, por mais que Milo falasse seus absurdos ou morresse de perguntar por que Kamus levava aquele corpo nos braços. Irritara-o tanto que perdera sua oportunidade, e isso porque nem o irritara com todo o seu potencial. Kamus estava mais irritadiço que de costume, ou era apenas uma impressão sua? Quer dizer, ele sempre faziam brincadeiras um tanto insinuativas ao francês, tentado desvendar um pouco da existência secreta que aquele homem abstruso quanto resto do mundo, isso se ele soubesse que há um mundo além do próprio nariz, que mantinha-se cada dia mais firme em sua obstinação incompreensível de abster-se de amizade, de coleguismo, amor... Talvez ele até tivesse amor, mas somente se esse tratasse-se de seu amor próprio. Porque o ego, ele parecia ter muito mais que inflado, quem sabe até mesmo transbordante.

- Tchau pra você também, Kamus! –Milo devolveu sarcástico ao amigo. Como diziam por aí: "Mal-humor se devolve com gentileza, quem sabe assim, a pessoa não se dá conta de sua grosseria." Pelo menos Kamus ficaria embaraçado. Não! Conhecendo-o, ele diria algum impropério dirigido a ele.

Ao longe, Milo apenas ouviu um grunhido. No mínimo, fora Kamus praguejando contra ele, exatamente como prenunciara. Milo riu com gosto do amigo, imaginando o quanto ele era previsível. Previsivelmente chato! Sempre achara graça em implicar com Kamus, mas dessa vez fora mais divertido do que seria habitualmente. Ele engolira o orgulho habitual, orgulho esse que fazia mal... Não a Kamus, obviamente, e sim as pessoas que cercam esse ser tão egocêntrico. Milo se perguntava de onde o aquariano tirara aquela tendência tão enfadonhamente exasperada e precipitada. Kamus distribuía cortes e lições de moral a quem quer que fosse, mesmo que o ser acusado não tenha feito absolutamente coisa alguma além de respirar um pouco mais ruidosamente. Ninguém parecia capaz de se aproximar dele, pois no segundo seguinte ele repelia quem quer que fosse, mesmo se tratando da Deusa.

Kamus esperaria um pedido de desculpas registrado em cartório para poder voltar a falar com ele.

Milo deu de ombros já resignado. Estava acostumado a Kamus se recusar a falar com ele por causa de alguma brincadeira sua desmedida. Qualquer hora ele precisaria voltar a falar com ele, seja por obrigações no Santuário, seja por causa do treinamento... Ele apenas seria paciente. Na verdade, tolerante. Como sempre fora com Kamus. Não sabia exatamente porquê ainda persistia em falar com Kamus, de tratá-lo bem, ou ao menos o que ele considerava bom o suficiente para o francês, já que ele era sempre tão eficiente em se enclausurar dentro de sua própria ideologia peculiarmente desatinada. Era fato que mesmo com suas "brigas" constantes, sim, pois ele não considerava aquilo exatamente uma briga, ou uma demonstração de diáfano ódio, eles não eram inimigos. Ainda que com essas brigas, era sem nesgas de dúvida, o cavaleiro mais próximo do aquariano. Ele nunca lhe confessara detalhes de sua vida, ou aceitara tomar um chá amigável depois que voltaram dos domínios de Hades.

Pensava, no entanto, mais em sua curiosidade insaciável, que agora ficara ainda mais fustigada em busca do saber. Não que fosse algum mistério da vida o que ele queria compreender. Certamente se um Deus viesse hoje e lhe oferecesse o conhecimento profundo sobre coisas incompreensíveis ao qual era negado o acesso aos simplórios mortais que se faziam habitar e acreditar na terra que os deuses lhe ofereciam, ou no que lhes eram ensinado, manipulados de qualquer modo, seguramente eles escolheria os segredos da vida ao invés da mente ininteligível de Kamus. Estranhamente incomodava-lhe o fato de não conseguir raciocinar sobre o ensejo que teria feito-o agir de forma tão impaciente, principalmente ao que Milo mencionara sobre o corpo que carregava, parecia resvalar-se das insinuações de Milo como quem foge de um carcereiro... O que ele pretendia com a jovem perecida? Ensinar seus discípulos a congelar indigentes? Provavelmente nem ele desrespeitaria assim a memória de uma pessoa. Por mais que fosse uma indigente, nem Kamus seria capaz de fazer a tênue linha de memória que vivera naquele corpo um dia, definhar sob meros treinamentos. Havia coisas que deviam ser respeitada, uma dessas coisas era o corpo de quem um dia caminhara junto deles em direção a vida atroz ao qual o simbólico Destino submetia sem indulgência os filhos que pusera. Apenas sabia que certamente não se tratava de nenhuma manifestação de necrofilia da parte dele, caso contrário não teria ficado tão ofendido. O que seria então? Continuava a se questionar. Sua mente parecia ignorar-lhe o chamado para por em andamento toda a sua capacidade imaginativa e até perceptiva. Fingia não ouvir-lhe o apelo de sua curiosidade latente em meio aos pensamentos transtornados.

Sacudiu a cabeça com veemência, afastando essas dúvidas. Era a vida de Kamus e ele não tinha nada com isso, mesmo porquê não queria confusão com o francês. É verdade que Milo o deixara irritado, no entanto, não era nada fora do comum. Como se já não bastasse suas dúvidas existenciais insólitas, ainda tinha de arranjar confusão com o outro lá... Por quê simplesmente estava pensando sobre a vida de Kamus? Isso era algo que só tinha relação com ele próprio, não com Milo!

Caminhou até seu quarto, quando teve ganas a bocejar, exatamente como não fazia há muito tempo. Ao invés de abafar tais anseios, fez exatamente de forma contrária, bocejando de forma maravilhosa, tanto que mal pode conter duas pequenas lágrimas solitárias que rolaram de seu rosto.

Limpou-as rapidamente e se jogou com gosto em sua cama, afofando o travesseiro no momento seguinte, sem poder esperar para recuperar as noites de sono mal dormidas. Noites quase tão deprimentes quanto essa. Noites em que os herméticos monstros cobertos de pesadelos mais hostis que qualquer coisa encarada por um homem, vinha assolara todas as faltosas almas que se afundavam cada dia mais em seus mais derradeiros e aviltos medos.

Tinha de confessar que ao menos algo de bom teve naquela noite: A pequena discussão com Kamus trouxe de volta o seu bom-humor, ao menos naquela noite não teria mais crises existenciais, o que pra Milo já era uma grande vitória! E se era... Ninguém sabia disso melhor do que seu travesseiro, que fora massacrado várias vezes nas noites anteriores pelo mal-humor de Milo, depois de não conseguir mais cair no sono.

XXX

Milo abriu os olhos vagarosamente. A primeira coisa que sentiu um enorme calor sobre seus olhos, seguindo por sua visão sendo turvada por milhares de pontos multicoloridos em meio ao negror.

Piscou os olhos repetidas vezes, até que finalmente pudesse ver o cômodo completamente iluminado pela luz dourada da manhã, que vinha mansa brincar no quarto.

Contemplou a luz solar com um enorme sorriso de tranqüilidade, bem diferente do que vinha fazendo. Normalmente acordava irritado, isso é, quando dormia, e saia chutando suas coisas até o caminho para o banheiro, em meio a impropérios dirigidos aos céus... Hoje, contudo, não parecia muito disposto a sair xingando todas as criaturas viventes ao longo da face da Terra, e sim sair cantando aos quatro ventos, esperando que Zéfiro enviasse sua voz rouca e ressonantemente sexy, emoldurada pela euforia que sentia a todas as pobres almas que se sentiam exatamente como ele anteriormente.

Espreguiçou-se como um gato manhoso que acaba de ser despertado pelo maravilhoso cheiro de comida. Levantou-se vagarosamente, sem querer apressar aquele momento prazeroso, onde se levantava como se estivesse passado os melhores momentos de sua vida na noite anterior. Não que pudesse julgar assim a noite anterior, contudo, ele dormira! E isso era mais que motivo para acordar bem. Ao menos era o que ele pensava...

É bem verdade que todos os dias milhares de pessoas acordam no mundo, sem nunca se dar conta de quanto são afortunadas por terem tido uma boa noite de sono. Exatamente como Shaka lhe dissera uma vez: "As pessoas não sabem o quanto são afortunadas pelas pequenas coisas que a vida lhe oferece, até que elas as percam e desvaneçam bem diante de seus olhos, sem que elas possam fazer algo!" Sempre achara as frases de Shaka ilógicas, incoerentes e falsas até, porém nos últimos dias vinha percebendo que para ter o total entendimento de cada uma delas, era preciso muito mais espírito do que poder de assimilação lógica. Todas tinham como plano de fundo, um conhecimento arraigado em todos as ações e pensamentos humanos. Sabia agora que era algo além da compreensão de pessoas que tinha espíritos fracos e volúveis, como o fora o dele anteriormente. Tinha de admitir que crescera, espiritualmente falando. Mais do que vinte anos puderam lhe proporcionar tal ensinamento. Sua fase levemente depressiva, não fora de todo ruim.

Foi até o banheiro tomar um bom banho frio, para ver se conseguia o deixar ainda mais desperto, algo que talvez Milo não fizesse nem morto nos dias anteriores. Ele era totalmente contra banhos frios desde que Saori permitira alguns deleites básicos aos Cavaleiros, incluindo uma ducha bem quentinha ao amanhecer. Porém hoje parecia um dia em que se merecia todo o seu vigor físico. Toda a exultação de seu corpo.

O sol tão vigoroso lá fora, devia ser a comprovação a Milo de que o dia prometia. Principalmente depois de um temporal igual ao da madrugada anterior. O ar devia estar maravilhoso além das paredes de mármore branco de sua residência, revigorante pela chuva que veio refrescar o calor infernal grego, e ao mesmo tempo prazeroso pelo sol que viria incidir sobre suas cabeças durante o treinamento, tão manso e tão tímido, como não era visto há tempos naquela primavera, uma das mais quentes dos últimos anos. No entanto, o colorido do Santuário era notável, e muito admirado pelas jovens aspirantes amazonas e até mesmo por Afrodite, que ultimamente não tem feito outra coisa a não ser cultivar sua rosas, embora as gérberas aparecessem em meio à vegetação de forma mais marcante.

Por falar em Afordite... Hoje seria com ele seu treinamento. Como vinha fazendo desde o começo da semana. Foi estabelecida uma espécie de rotatividade, onde todos os cavaleiros treinavam entre si alternando os pares todas as semanas, assim seriam capazes de encarar vários estilos de luta diferentes e estariam mais preparados para um possível ataque surpresa. Bobagem, na opinião de Milo, já que ninguém mais era tolo o suficiente de se meter com Athena e seus cavaleiros.

Consultou o relógio quase com descaso, porém arregalou os seus olhos ao se dar conta do horário: dez e vinte e quatro. Marcara as oito com Afrodite! E olha que o pisciano ainda lhe dera uma colher de chá, ao lhe deixar chegar as oito, já que os outros já estavam prontos pra começar às seis da manhã. No fundo, sabia que fora somente para defender os interesses próprios que Afrodite lhe dera esse tempo, já que devia estar dando a regada matinal em suas rosas, contudo era cômodo para ele também, então não reclamara. Agradeceu aos deuses por não ser com Kamus que ele estivesse treinando! Imaginava que se fosse com ele, era capaz do aquariano já ter vindo tirá-lo da cama com neve caindo em seu rosto.

Riu-se ao imaginar a cena, desligando o chuveiro e pegando o roupão acomodado num suporte próximo ao boxe. Milo repreendeu-se no seguinte segundo. Ria agora porque isso não aconteceu, caso contrário teria insultado Kamus até suas gerações seguintes. E talvez até um pouco mais. Conhecendo-se, teria matado o francês ali mesmo!

Vestiu-se com pressa. Estava atrasado e não queria deixar Afrodite ainda mais ofendido pelo seu atraso. Talvez não tivesse percebido que sua blusa azul velha e surrada estivesse pelo avesso, algo que não passaria despercebido ao pisciano observador e crítico.

Saiu apressado da casa de Escorpião com dois muffins em uma mão, um waffle entre os dentes e um pedaço de mamão com açúcar em outra. Seria uma cena bizarra, digna de muitas brincadeiras por parte dos outros cavaleiros, caso o vissem naquela situação. Porém ao passar pelas casas, tudo o que via eram alguns servos cuidando das casas de seus mestres. Sinceramente, melhor pra ele, pelo menos não ia ter de agüentar as possíveis piadas com sua situação, embora já estivesse se preparando para as hipóteses absurdas que os amigos levantariam sobre sue atraso.

Lamentou-se por não ter tempo para admirar o dia, que parecia se abrir em um dos mais lindos do ano. Eram poucos que percebiam, mesmo com sinais tão evidentes. O ar fresco e leve vindo tão manso até cada ser que pudesse ser contemplado com esse presente e entendê-lo. As gotas de orvalho, mesmo às dez da manhã, ainda alojadas nos limbos das folhas de cada forma primitivamente linda das plantas que vieram a florir todas vigorosamente neste dia. O colorido atingindo às vistas dos transeuntes até onde seus olhos não mais podiam alcançar, como em um lindo tapete que se desgrudara dos jardins dos deuses, num ápice de loucura. O mar, ao fundo do Santuário, parecia ganhar um brilho dourado totalmente peculiar, recebendo a luz do sol dançando por suas oscilações límpidas, como em um ritual oculto que poucos mortais tinham o privilégio raro de apreciar, algo que ficaria ainda melhor se o privilegiado estivesse acompanhado com a pessoa certa. O céu parecia que nunca estivera tão turquesa quanto estava neste dia, tão limpo quanto estava agora. As nuvens brancas e fofas parecia ter desaparecido completamente, como se alguém as tivesse arrancado dali, para que não maculassem o lugar perfeito. Um dia propenso ao capricho dos deuses para com os mortais. Lindamente perigoso. Dia onde tudo o que se acreditava ser humanamente impossível, pode se tornar real.

Parou na frente ao campo de treinamento, escondendo-se atrás de um pequeno arvoredo, o atalho que tomara, resolvendo que antes de seguir e aturar as piadas, iria acabar de comer o pedaço de mamão e o único muffin que restara, não querendo ser motivo maior para as brincadeiras desmedidas.

Lambeu um pouco do mamão que lhe sujava as mãos, apressado demais para ir até o pequeno riacho que passava ali por perto para lavá-las e no segundo seguinte, se recompôs, impaciente, tentando parecer o mais digno possível, o que realmente era difícil quando ele usava aquele irritante sorriso zombeteiro, para se proteger. Como dizem: "A melhor forma de se proteger é atacar!" Talvez fosse aquela a idealização de Kamus, já que vivia atacando todo mundo com seu maldito mal-humor. Deveria falar com Kamus para mudar de estratégia... Quem sabe no dia em que chover prata...

Ao chegar no meio da campina verdejante, notou que muitos cavaleiros lutavam já concentrados e bem suados, pelo longo e contínuo esforço físico. Sentiu-se levemente culpado por não estar em meio a eles aprimorando suas técnicas, como eles faziam e se dedicavam com tanto furor. Mas apenas levemente... Não o suficiente para se lamentar por ter dormido tudo o que podia.

Máscara da Morte lutava com Aldebaran em um canto um pouco mais afastado das vistas de Milo, o primeiro parecia tentar quebrar a resistência do segundo de qualquer forma. Shaka e Kanon estavam um pouco à frente do primeiro par, o virginiano sempre confiante em suas técnicas, enquanto Kanon parecia lutar mais impulsivamene. Saga e Shura estavam próximos à extremidade oposta do arvoredo de onde Milo saíra, deve-se dizer que muitas toras já estavam entregues ao chão. Shion e Dohko lutavam entre si, numa disputa acirradíssima bem no meio do campo, pareciam uma luta extrema, diferente de um treinamento supostamente amistoso. Ambos continuavam disputando entre si quem era o mais poderoso, desde que Athena os trouxeram de volta a vida. Kamus treinava violentamente com Mu, parecendo realmente mais exigente, nesse dia em particular, estavam perto de Shion e Dohko. Aiolia e Aiolos estavam praticando alguns golpes novos, perto de Saga e Shura., com certa camaradagem característica de irmãos que querem bem um ao outro.

No entanto, ele não avistava Afrodite.

- Ei, Milo! –Gritou alguém a sua esquerda. A voz era suave macia, exatamente como a das rosas que ele cultivava. Milo não precisou voltar-se para saber que se tratava de Afrodite. Este acenou vigorosamente, quando percebeu que a vista do escorpiano repousava em si e sorriu graciosamente. Não parecia estar tão chateado quanto ele pensara- Aqui!

Milo caminhou vagarosamente até o amigo, com um sorriso, acenando de volta. Os outros prestavam atenção aos seus movimentos, mas sem pararem de lutar entre si, como se fingissem ignorar. Afrodite levantou-se da pedra em que estivera sentado, com suas vestes cor-de-água, pomposamente arrumadas. O cabelo azul piscina preso em um rabo de cavalo, por ma fita vermelha, sempre dando um tom alegre as velas madeixas do pisciano.

- Desculpe, Dite! –Ele pediu com seu sorriso simpático habitual. Sabia que quando pede-se algo sorrindo, na maioria das vezes tem seus desejos atendidos de bom-grado. Milo admitia que não gostava de coisas anteriormente manipuladas pelo senso comum dos humanos, como por exemplo, os ditos populares. Contudo, nos últimos dias ele vinha se encontrando em cada um deles. Por mais que seja minúsculo o cunho de veracidade, não deixava de ser um retrato um tanto deturpado da realidade que vivia - Creio que tenha dormido demais.

- Ah, não se preocupe, querido! –Afrodite disse guardando a lixa de unhas que estivera utilizando, mirando em seguida, suas unhas pintadas de acordo com a cor de suas vestes, pra depois encará-lo com um sorriso condescendente- Ao menos minhas rosas estão muito bem regadas e minhas unhas impecáveis. Além de que a vista está maravilhosa.

Milo ao ouvir aquilo, procurou a direção na qual o olhar do sueco incidia. Um ponto atrás de suas costas, era certo! Acompanhou-o fitando ao redor e reparou que a maioria dos cavaleiros estava sem suas blusas, com exceção de Shaka e Kamus, é claro. Todos exibindo os bíceps bem definidos, enquanto o suor traçava um caminho lento e suave pela pele de cada um deles. Milo riu do comentário maldoso do amigo.

- Ah, claro! Essa não seria uma oportunidade que você perderia, não Dite? –Milo disse ainda com resquícios de riso em sua voz, o divertimento passeando pelos seus olhos azuis profundos- Que bom que não se chateou com o meu grande atraso.

- Que nada! O que seria da vida monótona se não tivessem suas surpresas diárias para que homens como eu pudessem desfrutar desses pequenos deleites? –Afrodite respondeu, com um aceno vago das mãos, ainda com seus olhos grudados aos cavaleiros. Por fim, pareceu finalmente dispensar-lhe um pouco de sua atenção, observando-o por um momento. Depois de uns segundos ergueu seu rosto e assumiu um tom um pouco mais sério- Sabia que sua camisa está ao avesso?

Milo olhou para si e reparou que a linha azul marinha estava em evidência e etiqueta do lado direito sobre as costelas foram a sua comprovação. Desleixado! Era a única conclusão que tirava daquilo. Como pudera, num átimo de distração, aparecer co a aparência pouco digna de um cavaleiro de ouro? O que os aprendizes diriam se o vissem daquela forma? Ainda mais ele, que segundo consta, deveria ser um exemplo, modelo superior, a tudo e a todos?

Nossa! Desde quando era tão emotivo e se preocupava com o que os outros iam pensar de si? Nunca se importou com isso... Sempre teve seus estilo próprio. Será que era assim que se comportava nos últimos tempo? Preocupando-se apenas com o que os outros pensariam sobre suas atitudes, ao invés de manter sua peculiaridade? Seria aquele o motivo de estar naquele abismo hermético e sem saída? Se fosse, não deixaria que a convenção humana o tragasse novamente! Ele era Milo, o cavaleiro de Escorpião, e isso era algo que nenhum padrão previamente estabelecido conseguiria lhe arrancar por mais convencional que fosse.

- Nada que eu não possa resolver, para que comece logo o nosso treinamento. –Milo disse tirando a camisa, deixando o olhar de Afrodite perdido no abdômen maravilhoso do grego. O sueco deixou escapar um assovio. Milo o fitou arriscando um sorriso, devia admitir que adorava receber elogios, mesmo implícitos. Desvirou a camisa e a colocou no lugar.

- Nossa, Milo! Não iria me importar se você treinasse sem esse pano cruel me privando as vistas. –Afrodite fitou-o depois de algum tempo, abrindo seu leque cor-de-água com fios dourados e abanando-se num sorriso malicioso- Agora eu entendo porque ela o deixou tanto tempo em escorpião.

- Ela? –Milo perguntou levemente confuso, fitando o pisciano com uma expressão de surpresa, franzindo a testa de uma forma extremamente doce. Algo que se via pouco que Milo o fizesse. Ele era um daqueles que sempre entendia a piada logo de uma vez. Nunca pedia para repetir qualquer coisa por não ter entendido ou não estivesse confiado em sua audição suficientemente para dar credibilidade a si, por ser algo absurdo, o que ouvira. Ele achava um sinal de fraqueza, homens seguros como cavaleiros de ouro, pedirem para se repetir a notícia simplesmente por não crer em seus ouvidos. Era o mesmo que dizer que seu cosmo não era nada além de uma pequena chama de uma vela perdida em meio a escuridão. Se todos ali era cavaleiros, era simplesmente porque tinham seus sentidos apurados, inclusive o sétimo. Então porquê raios todos duvidavam dos ouvidos?

- Ora, Milo! –Afrodite disse num tom malicioso com um sorriso de quem sabia das coisas, bastante cúmplice- Eu sei que somente alguém especial teria te prendido em escorpião até essa hora, a coisa deve ter sido realmente boa, pela sua expressão animada. Eu não te via assim há dias!

- Ah, é! –Milo sorriu concordando. E daí que fosse mentira? Ele não dissera uma palavra, Afrodite que concluíra por conta própria. Não se importava com o fato de que seria assediado por todos os outros dourados, que iriam querer saber quem era a jovem. Pelo menos aquilo inflamava seu ego, principalmente com os outros cavaleiros o parabenizando por sua recente conquista, com fariam no intervalo para o almoço. Mandava danar-se o fato de que aquilo não era uma verdade exatamente... O que era a verdade senão o que cada um acredita? Afinal, se a pessoa põe em sua mente que Papai Noel existe, pra ela, essa será uma verdade. Sua felicidade, no entanto, era que ninguém ousaria parar agora devido ao treinamento que já devia estar acontecendo há muito tempo, não queriam perder o pique e ter de recomeçar todo o aquecimento novamente- Foi uma noite bem divertida, por assim dizer!

Afrodite riu. Milo não mentira. Ele nunca mentira, apenas omitia... Talvez aquela fosse a verdade de Afrodite e não cabia a ele desacreditar o homem. Não gostava de ser "o cara que estilhaçava sonhos, ou "verdades", no caso. Ele sabia que Kamus e Shaka eram capazes, mas não ele. Se tinha algo que construía a índole de um homem, era o poder de sua crença. E ele não servia para acabar com isso nas pessoas, talvez fosse um pouco sensível em relação aos sonhos, que inclusive ele possuía em suas crenças. A noite fora divertida, era fato, mas ele só não dissera como e com quem... E nem diria, e se dissesse, acrescentaria alguns detalhes mais... tórridos! Afinal, ele era capaz de tudo para não destruir os sonhos e verdades do outros... ;)

- Eu ainda tenho de me aquecer, você parece já estar pronto! –Afrodite disse observando o rubor leve nas face morena do belo grego, assim começando a correr pelo campo, com Milo bem ao seu lado- Se você quiser lavar suas mãos, enquanto me aqueço...

Milo fitou as próprias mãos, ainda sujas de comida. É, elas realmente precisavam ser lavadas, parecia que seu banho de gato não funcionara tão bem quanto esperava. Deu de ombros, pouco se importando. Contudo aceitando o que Afrodite lhe propunha, gentilmente.

- Eu não demoro! –Milo disse sem sequer se sentir encabulado pela observação do sueco. E daí que estivesse com as mãos sujas? Era hora de parar de se importar, como ele dissera a si exatamente há alguns minutos atrás. Claro que as lavaria, já que sabia aceitar um bom conselho, mas não porque lhe importasse o que as pessoas pensariam... Só queria se sentir bem! Limpo! Passou na frente de Afrodite e tomou o rumo da trilha de margaridas até o riacho.

Chegando lá, abaixou-se até as águas transparentes, colocando suas mãos debaixo da correnteza forte e opressiva. Estranhamente parecia forte demais para um riacho simples. Como se seu vigor tivesse redobrado naquele dia maravilhoso e as águas corressem com mais satisfação. O sol tocava bem de leve os seixos escondidos pela água no fundo do riacho, refletindo sem querer nos olhos do grego. Este colocou a mão na frente do rosto querendo impedir o brilho lhe cegasse momentaneamente, como não visse solução apertou as pálpebras e sentou-se no chão de terra batida, levemente molhada pela água que por ali passava, dando o cheirinho familiar do campo em seu meio rural. Desviando o olhar do rio, sem querer deixara as pernas cederem e acabara propenso a uma pequena queda, onde seus glúteos atingiram o chão gramado com leveza.

Ao abrir os olhos e pela segunda vez se deparar com um monte de bolinhas multicoloridas em meio a escuridão se sentiu irritado. Piscou intensamente diversas vezes, impaciente.

Um som extremamente bonito lhe atingiu os ouvidos, era um som cristalino e regular, que entrecortava o ar com doçura. Ao abrir os olhos e finalmente perceber-se capaz de olhar para algo, procurou com os olhos pelo som que ouvira e notou uma figura pequena na margem oposta ao riacho. O som que ouvira era o de uma risada... A risada de uma criança.

Era uma menina, que tinha os cabelos tão negros e compridos quanto uma noite de temporal onde embora fosse completamente bagunçada, ainda podia-se saber da maciez de suas nuvens pesadas, e cujos os olhos verdes-esmeraldas brilhavam a distância da margem oposta do rio com seu divertimentos. A pequena de pele alva, não parecia intimidada pela presença dele, um cavaleiro de ouro. Talvez nem soubesse quem ele era... Como era doce o poder do desconhecimento! Às vezes queria ser ele ater essas maravilhosa sensação. Sem precisar se importar com anda, exatamente como a criança.

Depois de alguns segundos ela parou, ainda a fitá-lo.

- Oi, Milo! –Ela disse acenando com um belo sorriso em seus dentes brancos e pequenos, deveriam ainda ser de leite. Não devia passar dos oito anos.

- Eu te conheço? –Milo perguntou simpático, se levantando e fitando-a com um belo sorriso encorajador.

- Não sei, mas eu te conheço! –Subitamente a pequena sumiu de onde estava e sua voz soou exatamente ao seu lado, sentada sobre uma grande pedra.

- De onde me conhece? –ele quis saber tornando-se um pouco mais sério, se ajoelhando ao lado da menina, que usava um vestido comprido e estampado. NA cor branca e brilhante, como um pequeno presente dos deuses para tornar seu dia um pouco menos... entediante? Usual? Bem, ele não sabia, mas gostava de saber que talvez o dia não fosse assim tão... tão... Bem, ele não sabia com dizer, apenas como sentir a euforia prometida.

A menina tocou-lhe o rosto de leve. E depois os olhos verdes dela o encararam levemente alegres. Soltou-lhe o rosto, quebrando o contato da mão quente da pequena com seu rosto. Ao romper tal carícia, foi como se a pequena lhe tivesse arrancado algo. Ele olhou-a com certo estranhamento.

- Podia não te conhecer a dois segundos atrás, mas agora eu te conheço! –A menina sorriu misteriosamente- Sabia que é feio dizer aos amigos coisas que não aconteceram... Pobre Afrodite, vai fofocar pra todo mundo que você está namorando!

- Como... Como você sabe? –Milo perguntou gaguejando levemente ao fazer a pergunta. Essa menina lhe soava muito estranha, aparecera do nada e já sabia sobre suas pequenas nuances, como aquela de omitir a verdade. Como podia? O que ela estava fazendo ali? Como soubera sobre Afrodite e sua pequena omissão? Quem era ela? E o que ela queria consigo?

XXX CONTINUA XXX

N/A: Eu não ia acabar o capítulo aqui, mas resolvi deixar todo mundo no suspense sobre a pequena... Será ela uma deusa disfarçada? E se for, o que ela está fazendo ali? Se você leu "A Intenção É O Que Conta" ( a fic que autoro em parceria), você vai reparar uma certa semelhança entre essa garotinha com a que deu um aviso a Shaka, confesso que essa foi minha intenção... Só que as duas não tem nada a ver uma com a outra, a não ser o dom especial... No próximo capítulo saberão porquê... Eu pretendia contar nesse, mas temi que ficasse grande e enjoado de se ler. Meus capítulos de Harry Potter normalmente excedem 20 folhas e não quis fazer isso aqui porque muita gente reclama disso, então farei capítulos menores e mais numerosos, espero que gostem...

Gente o Kamus viu o Milo de samba-canção! Se fosse eu tinha pirado! Perdido a pouca sanidade que me resta... Se fosse eu tinha agarrado aquele gostoso!

Os diálogos ficaram assim, meio + ou -... Só gostei da discussão do Milo com Kamus. O com o Dite está meio pobrinho porque já é domingo da semana de testes e eu sequer abri meu caderno para estudar e agora a minha consciência parece ter voltado do fundo daquele cofre que atirei no mar, todo cheio de correntes... Consciência maldita! Era pra ter morrido afogada lá!

Sobre o dia perfeito... Ficou perfeito! Eu quase chorei ao ler aquilo de novo e juro que me imaginei no colo do Milo dando uvinhas na boca dele! Mas não espalhem pra todo mundo que sou assim, meio emotiva, tenho uma pose de durona a zelar, certo?

Agora, o Milo acusando Kamus de necrofilia foi ótimo! Eu acho que nunca mais vou fazer algo tão absurdo... Bom, para quem não entendeu o que é necrófilo muito bem, eu direi... Necrófilo é o cara que "come" o cadáver... Sim, esse comer é no pior sentido da palavra... Ah, e sorry pelos erros de português, mas não sei o que está acontecendo com que a formatação tá saindo um c... mfmfifmifm... Tamparam a minha boca! Desculpem. Eu corrijo o texto por pelo menos duas vezes antes de mandar, mas parece que a coisa não fica como eu produzo, por mais que eu tente... Se alguém souber como dar um jeito nisso, me conte por favor! Eu estou desesperada, só sei como por travessão e olhe lá...

Bem, vou fazer o pedido básico que estão cansados de ouvir! Reviews, please! PELOAMORDEDEUS! Credo, que desespero! Mas é isso aí! Eu peço reviews... Ah, e já abusando de vocês, será que alguém poderia me mandar algumas figuras de Milo e Kamus? Eu preciso dos meus musos (essa palavra nem existe! Acho que já estou variando!) inspiradores! O e-mail é: que não era um vibrador... He,he! Imagina o Kamus com aquilo na mão? O Milo ia ficar louquinho de tesão... Vixi, até rimou! Quem sabe eu não apronte uma dessas? De mim esperem por qualquer coisa...

Aopovo que comentou esse mesmo capítulo na outra url, meu agradecimento especial!

Shakinha: Puxa, não esperava um review! Mas fiquei super feliz! Fiquei mesmo! 'Brigada viu! Eu não esperava por isto ser uma reedição do que já escrevi e nem todo mundo deixa algo pra animar-me a continuar a escrever. Não é todo mundo que consegue aturar minhas fics chatíssimas. O povo deviar agradecer aos céus por eu ter sumido por uns tempos... Puxa! Assim eu continuarei a escrever mesmo! Prepare-se para o capítulos que virão. Estão divertidos! Pelo menos o Capítulo V que publicarei em breve!

Viu o que o Kamus estava segurando? Agora o bicho vai pegar é no três... Teremos mais acusações libidinosas...

E por último às pessoas que lêem, mas não comentam. A elas mando um GRANDE APERTÃO NO TRASEIRO! E comentem se não mando mais!

Para todos os pais, eu desejo: FELIZ DIA DOS PAIS!