-- Capítulo 4 --
Casamento n'A Toca
Harry sentiu seu sangue ferver, enquanto levantava o corpo da reverência feita a Belatriz. Já havia se passado um ano desde a morte de Sirius, e finalmente chegara à hora de vingá-lo. Belatriz demorou em sua reverência e, quando se reergueu, olhou fria para Harry. Analisava-o sem tirar os olhos dele. Harry teve o pressentimento estranho de que ela usava Legilimência com ele agora, mas ele não podia impedir, não podia fazer nada pra reverter aquilo. Somente atacá-la.
- Atacar-me pode parecer uma idéia tentadora – disse Belatriz – Mas não vai me fazer parar de vasculhar sua mente.
- Sectumsempra – gritou Harry, brandindo a varinha. Belatriz desviou o feitiço levianamente com a varinha.
- Não funciona. Não funcionará – disse Belatriz, andando para mais perto de Harry.
De repente ela ergueu a varinha e lançou em Harry um feitiço que o fez bater na parede e cair, sem largar a varinha. Ele se levantou e tentou, não-verbalmente, lançar em Belatriz um Levicorpus, mas a idéia pareceu não funcionar. Ela riu ensandecida, jogando a cabeça pra trás, e Harry sentiu um arrependimento profundo em não ter treinado feitiços não-verbais com a freqüência que deveria. Belatriz lançou novamente um feitiço em Harry, mas ele conseguiu desviar a tempo. O feitiço provocara um grande buraco na parede da casa dos tios de Harry e, a contar pelo grito de Tia Petúnia na sala, Harry pensou que alguém tivesse sido atingido lá dentro.
- Então, os trouxas que o protegeram durante tanto tempo estão aqui? – perguntou Belatriz. Harry não respondeu – Que interessante.
Antes que Harry pudesse pensar no que fazer para acabar de uma vez com Belatriz, a porta se abriu num estrondo e por ela saiu tia Petúnia empunhando seu graveto-varinha e avançando para Harry, pisando forte.
- O que você fez? O que você fez? – berrou ela, raivosa, possuída por uma força que não lhe pertencia, apontando a varinha pra Harry – VOCÊ MACHUCOU O DUDA!
- A trouxa segurando um graveto acha que pode fazer magia – riu-se Belatriz.
- E você? Quem é? – perguntou tia Petúnia, as duas mãos no graveto, como se fosse ele quem tremia.
- E o que importa isso pra você? – perguntou Belatriz, erguendo a varinha ameaçadoramente para tia Petúnia.
- Estupefaça! – gritou uma voz atrás de Belatriz, e a mulher caiu de borco no chão, desmaiada.
- Sr. Weasley! – disse Harry, ao ver Arthur Weasley sair andando de onde o feitiço Estuporante que atingira Belatriz tinha vindo.
- Harry – disse o Sr. Weasley, olhando desconfiado para tia Petúnia que agora deixara o graveto cair no chão e se ajoelhara, chorando.
- Petúnia, Petúnia... – tio Valter vinha gritando da porta, da qual saía com uma cara preocupada – Petúnia, ele não quer acordar.
- O que está acontecendo? – perguntou Sr. Weasley, caminhando até tio Valter, que andou para trás ao ver a varinha na mão do Sr. Weasley.
- Não foi ele quem explodiu a parede – Harry se prontificou em responder.
- Foi aquela mulher – disse tia Petúnia, apontando chorosa para o corpo caído de Belatriz Lestrange.
- Não importa quem foi! Importa que foi gente da raça deles – berrou tio Valter, no momento em que as janelas dos vizinhos se acendiam.
- Você é mesmo uma lontra fétida e muito estúpida, não é? – urrou Harry, toda a raiva acumulada nesses dezesseis anos aflorando repentinamente – Será que você não vê que essa fofoqueira em grau maior – apontou para tia Petúnia no chão – também sabia fazer magia?
- O que você disse, Harry? – perguntou Sr. Weasley. Tio Valter estava tão surpreso pela audácia de Harry que pareceu incapaz de responder.
- Ela era uma bruxa! – respondeu Harry, apontando de novo para tia Petúnia que agora chorava cada vez mais alto. Os vizinhos agora saíam de casa, mas, aparentemente, estavam amedrontados demais para se aproximar – Mas por algum motivo que eu ainda não sei qual, ela não é mais!
- Não totalmente – murmurou tia Petúnia, chorando.
- Não totalmente? – perguntou o Sr. Weasley – Como isso?
- Eu não sei... foi depois da... depois da... – dizia tia Petúnia soluçando, enquanto tio Valter lhe fazia sinais para parar – depois da morte dos meus pais – completou ela finalmente, desabando num choro contínuo.
- Ahhhhhhh – berrou Duda na sala.
Tio Valter apressou-se em levantar tia Petúnia, que parecia ter perdido a força no corpo, e levou-a para dentro para ver o filho. O Sr. Weasley lançou uma espécie de quadrúpede indefinido e prateado até a casa da Sra. Figgs, e correu para dentro da casa também.
Harry ficou lá fora, sozinho com o corpo inerte de Belatriz. Sentou-se sobre um dos malões. Então o mesmo tipo de coisa havia ocorrido com Mérope Gaunt e tia Petúnia, pensou Harry, ambas foram expostas a traumas profundos relacionados a perdas de pessoas queridas. Mérope tinha perdido seu amado Tom Riddle, enquanto tia Petúnia havia perdido os pais. Provavelmente, Petúnia se achava mais fraca que Lílian, que aparentemente não sofrera o mesmo tipo de reação que ela, fato este que poderia ter gerado em Petúnia a inveja assombrosa que sentia da irmã. Tal inveja se transformara em ódio. Harry quase chegou a sentir pena de tia Petúnia enquanto pensava sobre o que ela sofrera pela morte do pai, pela decepção de perder quase que totalmente seus poderes e de ver a irmã triunfar como a única bruxa da família.
De repente, antes que Harry pudesse perceber quanto tempo ficou lá fora pensando sobre o triste destino de tia Petúnia, ele ouviu um estalido alto e ressonante e viu dois vultos vestindo capas pretas andando até ele. Harry se levantou imediatamente. Aqueles eram mais dois comensais. Três em uma noite! E Harry não conseguira acabar nem ao menos com um deles.
- Parece que ela veio mesmo procurar o garoto, Narcisa – disse uma voz que Harry reconheceria em qualquer lugar do mundo. Foi aquela voz que gritara "Avada Kedavra" semanas antes e fizera Alvo Dumbledore perder sua vida sem a mínima chance de se defender.
- Precisamos levá-la de volta, Severo – disse Narcisa Malfoy, o rosto oculto na sombra do capuz.
- Você não vai fugir de novo! – berrou Harry, correndo atrás de Snape com o mais profundo ódio que possuía dentro de si. O garoto ainda não tivera tempo para pensar quem odiava mais: se Snape ou Voldemort.
- Pode ter certeza de que irei, Potter – disse Snape, retirando o capuz e revelando seu rosto odioso, emoldurado pela cortina de cabelos oleosos e pretos que lhe descia pelo rosto.
- Acabemos logo com isso, Severo – disse Narcisa – o Lord não quer que façamos nada de mau ao menino. Ele não gostará nada quando souber que Bela o desobedeceu.
Snape brandiu a varinha com um ar de profundo tédio e fez Harry paralisar. As pernas do garoto ficaram presas ao chão e, por mais que ele as tentasse mover, não conseguia. Seus braços também se paralisaram. Se ele ao menos conseguisse mexer os dedos e apontar a varinha para Snape...
- Adeus, Potter – disse Snape, enquanto pegava o pulso de Belatriz para, provavelmente, levá-la de carona em uma aparatação – Até mais um entediante encontro.
- Você vai me pagar, Snape! Juro que vou destruir você – disse Harry, toda a raiva transparecendo em seu olhar fulminante para Snape.
- Tenho certeza que vai – disse Snape com desdém – assim, é claro, que descobrir a existência de coisas complexas demais, como feitiços não-verbais, Oclumência e mais uma série de encantamentos que você, "O Escolhido", acha inúteis.
- Vamos, Severo. Antes que o Lord descubra sobre Bela – disse Narcisa, apreensiva.
Snape sorriu desdenhoso para Harry e desapareceu junto de Narcisa e Belatriz. O feitiço que prendia Harry ao chão e congelava suas mãos perdeu efeito ele caiu no chão.
- O que houve, Harry? – perguntou o Sr. Weasley, correndo para o jardim. Provavelmente ouvira os gritos de Harry.
- Snape. Estava aqui. Levou Belatriz. Não pude fazer nada – disse Harry. Sentia uma raiva imensa de si mesmo naquele momento.
- Snape? – perguntou o Sr. Weasley, olhando para onde estivera o corpo inerte de Belatriz – E ninguém da Ordem havia chegado? Eu mandei um recado para a Sr. Figgs através do Patrono.
- Que estranho – disse Harry – Mas o que houve com Duda afinal?
- Obrigada, muito obrigada, Seu Bruxo... – disse tia Petúnia saindo de casa, ainda chorosa, e se agarrando às pernas do Sr. Weasley.
- Sim, sim – disse o Sr. Weasley tentando desprender as pernas dos braços da mulher – Mas eu e Harry precisamos mesmo ir, Sra. Dursley.
- Obrigada, obrigada – chorava tia Petúnia. O Sr. Weasley, parecendo meio impaciente, tirou a perna dos braços da mulher num solavanco só e, afastando-se apressado da mulher, despediu-se.
- Pegue seus malões e a gaiola de Edwiges, Harry – pediu o Sr. Weasley.
Harry fez o que o Sr. Weasley pediu e foi ao seu encontro. O Sr. Weasley pousou a mão sobre o ombro de Harry com força e então o garoto sentiu aquela estranha sensação que experimentava quando aparatava "de carona".
Harry se viu em frente à Toca, a casa do seu melhor amigo Rony, onde se realizaria em alguns dias (Harry não sabia quantos) o casamento de Gui, um dos irmãos de Rony, e Fleur Delacour, uma francesa que há dois anos atrás participara, junto com Harry, do Torneio Tribruxo. Harry viu o Sr. Weasley levando seus malões em direção à Toca e o seguiu.
- Sr. Weasley, o que de fato houve com Duda? – perguntou Harry.
- Bom, parece que a tal explosão de Belatriz atingiu Duda também. Nada de mais. Ele só voou pela sala, bateu a cabeça na parede e desmaiou – disse o Sr. Weasley, agora batendo na porta de sua casa. Pelo visto as medidas de segurança ainda faziam parte da rotina do local – Sabe, um bom Enervate foi suficientemente bom para acordá-lo e fazer aquela mulher parar de gritar e chorar ensandecida, embora eu não tenha certeza quanto à parte de chorar.
- Quem é? – perguntou a voz da Sra. Weasley, por detrás da porta.
- Sou eu, querida. Vim com o Harry.
- Uhm... qual a senha? – perguntou a Sr. Weasley.
- Doce de ameixas secas cristalizadas com recheio de passas ao rum e cobertura de creme mágico daqueles que vêm nos pacotinhos do "Faça você mesmo – com Madame Bublin" – disse o Sr. Weasley rapidamente. Harry olhou assustado para ele impressionado com o tamanho da senha.
A porta se abriu rangendo e Harry entrou atrás do Sr. Weasley. Lá estava a Toca como sempre fora. Na mesa estavam, vestidos de pijama, Rony, Mione, Fred, Jorge, Carlinhos e Gina. A Sra. Weasley abriu um largo sorriso ao ver Harry e abraçou-o forte, assim como sempre fazia com os próprios filhos.
- Bem-vindo de volta, Harry – disse a Sra. Weasley.
- Senta aí, Harry – disse Rony, apontando para o amigo a cadeira à sua frente.
Harry se sentou, depois de ver que as mãos de Rony e Hermione estavam dadas por cima da mesa. Gina sorriu quando Harry se sentou entre Fred e Carlinhos.
- Estávamos esperando você para jantar, querido – disse a Sra. Weasley carregando travessas, pratos, talheres, copos e uma jarra cheia de suco de abóbora para a mesa.
- Mas não está um pouco... tarde? – hesitou Harry. Não queria parecer mal-agradecido.
- Queríamos jantar com você no dia do seu aniversário, Harry. Não pudemos comprar presentes decentes para você – disse a Sra. Weasley meio encabulada. Harry envergonhou-se de imediato – Os remédios do Gui são realmente caros. Até Fred e Jorge nos ajudam comprando alguns no Beco Diagonal.
- Pois é. São poções raras essas – disse Jorge.
- E você sabe, não é, Harry? Quanto mais rara a poção maior é o tamanho da mão que metem nos nossos bolsos – completou Fred. Harry forçou-se a rir, embora ainda se sentindo envergonhado.
- Ele foi até dormir mais cedo com Fleur – disse Gina – Os remédios dão sono.
- Coma, Harry – disse a Sra. Weasley - Rosbife, seu preferido.
Harry agora tinha certeza: aquela era sua família. Sua família de coração. A família que ele adquirira. A família que ele sempre imaginou e quis que a sua tivesse se tornado caso não tivesse sido extinguida por Voldemort. Rony era mais do que um amigo, era um irmão. Alguém com quem ele sabia que poderia contar pra tudo. Assim como Hermione era mais do que uma amiga (embora Harry tenha sido invadido por uma estranha idéia de seus dois irmãos de coração estarem namorando. Ele riu com a fértil imaginação de um incesto). Gina não fazia parte do clã fraternal que Harry formara, pois, embora Gina tenha sido um pouco ausente com ele em relação a Rony e Hermione, ela era mais. Um ínfimo mais.
Harry passou três longos dias n'A Toca enquanto o casamento de Gui e Fleur não chegava. Mas o grande dia enfim chegara. Harry descobrira na noite anterior, por intermédio de Fred e Jorge, que era uma tradição bruxa os homens da família ajudarem com o buquê da noiva (que deveria ser entregue por ele a ela quando ambos se encontrassem no altar), assim como as mulheres também ajudariam a noiva a se vestir. Harry e Hermione ficaram felizes ao saber que poderiam fazer parte dessa cerimônia, apesar de Hermione não gostar de ouvir Fred e Jorge lhe chamando toda hora de "cunhadinha". Harry não viu onde e como a decoração estava sendo feita. Soubera por Rony que as famílias bruxas contratavam sempre uma equipe para construção de cenários de casamento e que, também por tradição, ninguém de ambas as famílias poderia ver o cenário antes do momento certo. Gui, que ultimamente tentava a todo custo esconder as cicatrizes que Fenrir Lobo Greyback deixara em sua face durante a luta em Hogwarts semanas antes, agora parecia mais alegre e feliz sob a perspectiva de se casar naquela bela manhã de sábado.
Harry acordou no sábado e foi pego de surpresa por Rony e Carlinhos para uma saleta que levava ao local onde o buquê seria montado, por meios mágicos, pela ala masculina da família. Foi divertido ver o Sr. Weasley montando arranjos cada vez mais espalhafatosos, enquanto o pai de Fleur preferira deixar o buquê simples, porém perfeitamente bem-acabado. Rony e Harry ficaram com a parte mais chata: o corte das rendas que embrulhariam o buquê. Ambos decidiram fazer uma total revolução nas rendas, deixando-as todas picotadas (o que remeteu Harry às vestes a rigor que Rony usara no baile de inverno). O resultado final do buquê foi algo bastante confuso: o arranjo bem feito do Sr. Delacour entrava em total contraste com a renda picotada e mal amarrada de Harry e Rony e com as cores berrantes escolhidas por Fred e Jorge para as flores (pareceu a Harry que eles queriam tirar um pouco do brilho de Fleur durante a cerimônia).
Ainda muito contrariado com a família Weasley e seu mais novo representante de coração, Harry, o Sr. Delacour seguiu na frente para o jardim da Toca, onde se realizaria a cerimônia, batendo os pés e usando expressões francesas, que pareciam a Harry xingamentos bem ofensivos, mas nenhum dos Weasley se importou. Eles pegaram Gui, que estava sentado na sala, para leva-lo até o altar, esperar Fleur. Ele usava um terno simples preto, assim como a maioria dos Weasley (Harry usava a mesma roupa que usara no baile de inverno, depois que a Sra. Weasley usou um Feitiço de Aumento Temporário nele).
Harry se surpreendeu ao ver Percy numa das fileiras de cadeiras que esperavam a chegada dos noivos, mas achou melhor não perguntar nada a Rony. Pelo menos não naquela hora. Rufo Scrimgeour também estava sentado na mesma fileira ao lado de Percy, que olhava um pouco tímido para os próprios joelhos. Em metade das cadeiras ocupadas no jardim, estavam sentadas pessoas de reverberantes cabelos ruivos que entravam em contraste com a massa loira ou castanho-claro que cobria a outra metade das cadeiras (Harry sentiu extremamente diferente ao se dar conta de que era o único de cabelos pretos no local).
Finalmente, antes que Harry pudesse se acomodar na cadeira ou Gui se posicionar decentemente no altar, Fleur apareceu saindo da Toca. Estava deslumbrantemente linda. Usava um vestido azul claro que destacava suas formas, um véu de cetim e uma tiara de lírios branquíssimos na cabeça. A comitiva de primeiro grau das Weasley e Delacour vinha atrás, feliz da vida pelo grande dia. Fleur caminhou lentamente até o altar, dando tempo de sobra para todas as mulheres ainda de pé em seu encalço se sentarem. Seus cabelos refugiavam à luz do sol e o cetim de seu véu dava a Fleur um aspecto decididamente perfeito, próprio de uma veela.
- Bonjour, Gui – disse ela, baixinho, ao chegar até o noivo e receber dele o buquê, cuja cor tinha se adaptado ao vestido de Fleur magicamente (Harry pôde jurar ter visto a Sra. Weasley guardando a varinha nessa hora).
O resto do casamento ocorreu sem muitas diferenças em relação a um casamento trouxa. Ao fim, antes do juiz (um velho atarracado de barbas brancas e crespas) dizer as palavras finais, praticamente todas as mulheres estavam chorando. Hermione, Gina e a Sra. Weasley choravam de soluçar na primeira fila. Mas Harry teve que admitir, ao ver a cena, que o casamento tinha sido realmente emocionante. Ainda mais por ter sido o primeiro visto por Harry em toda a sua vida.
- Pode beijar a noiva, Sr. Weasley – disse o juiz. Então todos se levantaram (Harry por último, não esperando tal reação) para ver Gui tirar suavemente o véu de Fleur e dar-lhe um beijo. O beijo que selava a eterna união entre os Weasley e os Delacour.
