Capítulo II – A Convocação

Assim como Saori pediu, Mú foi à Vila de Atena convocar um homem cada família. Não teve problema algum, como previu a Deusa, apenas teve um pequeno aborrecimento em uma casa, que se tornou mais pena mesmo do que aborrecimento. Um senhor, já com idade avançada brigava com a filha dizendo que tinha que honrar a família e cumprir o juramento de seus ancestrais. A menina, por outro lado, dizia que o pai já tinha feito a sua parte e sendo tão doente não resistiria nem aos treinamentos. O pai continuava brigando com a filha dizendo que estava bem, apesar de isso não ser bem verdade, enquanto a filha argumentava dizendo que era melhor que ele justificasse sua falta dizendo ser doente e que não havia mais nenhum homem na família para substituí-lo, já que ela era filha única. Foi aí que Mú chegou:

- Boa tarde, essa é a casa da Família Lexus?

- É sim. – respondeu o pai, Gumercindo, andando em direção a Mú apoiado em sua bengala.

A cavaleiro viu que o senhor não parecia em condições de ir para a guerra, e havia ouvida parte da discussão que o pai tivera com a filha. A menina tinha os olhos cor de mel tristes, e os cabelos ondulados, da mesma cor dos olhos caíam como cascatas em suas costas. Era muito bonita, isso não se podia negar, tinha uma carinha doce, isso era graças principalmente aos olhos brilhantes e boquinha rosada. Mas, pelo que o cavaleiro podia perceber, ela era muito teimosa também. No entanto, apenas quem podia fazer a justificativa seria o homem e aquilo parecia ferir o seu orgulho profundamente. Assim, o ariano resolveu usar seu poder de persuasão para ver se o homem desistia da idéia de servir no Exército de Atena:

- Senhor, o senhor sabe que se não estiver em condições de lutar e não tiver filhos, o senhor pode, sem problema algum, justificar a falta, não sabe?

- Claro que sim, Cavaleiro. Mas eu vou lutar por Atena, e não jogarei o nome e a honra de minha família na lama. Quando não mais puder lutar fazendo jus a promessa de meus ancestrais, é melhor que eu esteja morto. – disse Gumercindo.

- Mas papai, o senhor não vai agüentar nem os treinamentos, sua perna não está boa, e tem tido problemas nos pulmões ultimamen... – insistia a filha, quando foi bruscamente interrompida pelo pai.

- Cale-se, Natasha! Já disse que vou e não importa o que disser!

O Cavaleiro de Áries viu que se tratava de um homem retrógrado e que era um poço de orgulho, sem dúvida, por isso, não adiantava argumentar com ele.

- Está bem, senhor. Apresente-se amanhã ao pôr-do-sol em frente ao alojamento.

Mú já tinha se virado para ir embora, quando a garota o chamou:

- Não, por favor, cavaleiro! Não pode deixar o meu pai fazer uma coisa dessas! Ele vai morrer nos treinamentos, não vai nem chegar a ir à guerra! Por favor... – pediu Natasha suplicante.

- Eu não posso fazer nada, menina. Desculpe-me, mas seu pai é quem deve se justificar, a não ser que achem um outro homem da família que tome o lugar de seu pai.

- Então, não há esperança. – disse a garota triste.

Mú estava com o coração partido por não poder fazer nada, apenas pôde dizer para garota:

- Não se preocupe, tudo vai ficar bem. Há um plano para todos nós nas estrelas, e se for a hora de seu pai ir ou não, os deuses vão cuidar disso. – disse o cavaleiro indo.

Natasha entrou em casa desolada. Era um azar tremendo não ter irmãos, e nem tinha como, a mãe morreu logo após o seu nascimento, e o pai cuidara dela desde sempre. Ele queria que ela se tornasse sacerdotisa ou casasse com um homem de sua preferência. Como Natasha achara os homens que o pai escolheu horríveis, preferiu seguir o caminho da religião. E lá estava ela, meio perdida, com seus dezesseis anos, estava sendo educada no templo e era noviça por enquanto. Ela queria buscar o seu verdadeiro eu, nunca dera para a religião e achava que os deuses haviam reservado algo grandioso para ela, pois se sentia tão inútil e perdida no mundo que essa era única explicação possível.

Andava triste pela casa, não queria perder o pai, ele era a única coisa que a garota tinha. Foi aí que teve uma idéia, não muito boa, mas uma idéia: ela iria no lugar do pai. Tudo bem, que o treinamento era apenas para homens, mas, avaliando as chances, ela tinha um pouco de chance a mais de sobreviver ao treinamento do que o pai, apesar de saber que esse pouco era realmente pouco. Contudo, se ela morresse no treinamento, que sabia ser árduo, morreria pelo pai feliz, mantendo a honra da família. Assim, cortou os longos cabelos na altura do ombro, fazendo um rabo de cavalo e deixando a parte da frente meio solta para cobrir parcialmente os olhos e o rosto rosado, deixando à mostra com mais clareza apenas a boca rosada. Para disfarçar os seios não muito pequenos e a cintura fina, costurou em sua vestimenta masculina, que pegara emprestada do pai, algumas almofadas, que lhe deixavam gorda, mas disfarçavam o volume dos seios, da bunda e a cintura fina, transformando seu corpo de ampulheta em um barril. Olhou-se no espelho e se achou horrorosa, mas, pelo menos, era um homem até convincente. Também tinha sorte de ainda não ter tido suas regras pela primeira vez, ou seja, ainda não era uma mulher fértil, apesar de achar que isso ocorreria em breve, mas, por enquanto, ainda não precisava se preocupar com isso. Assim, ela pegou o papel com o selo de Atena, a espada do pai e montou no cavalo. Olhou a casa uma última vez, sabendo que o pai ficaria desesperado quando visse o que ela havia feito, deixando apenas um bilhete para ele escrito: "Eu te amo". Ela sabia que ele não poderia ir até o Santuário e acabar com seu disfarce, ou ela seria morta de qualquer maneira, apedrejada em praça pública pela ofensa feita à Atena. Assim, foi-se.