Desígnios do Destino
Capítulo Três
A noite já ia alta, todo o local estava deserto e o único som que se ouvia era do vento balançando as árvores. A única fonte de luz que havia era o brilho cálido da lua crescente, passando para o capitão uma calma inexplicável. Sabia que deveria dormir, descansar, mas não conseguia.
Suplicava internamente que tudo desse certo, não conseguiria suportar perder mais ninguém; sua família já fora destruída pela guerra, não queria perder as únicas pessoas em quem sabia que podia confiar para tudo.
Andava sem rumo pelo vilarejo, não era grande, não teria como se perder. Passando por trás da igreja, algo lhe chamou a atenção: um brilho que, prestando mais atenção, pôde identificar como sendo de uma lamparina. Sabia que não deveria bisbilhotar, mas foi ver o que era.
Ao entrar pelo portão, viu que o local era um cemitério. Quem estaria lá uma hora dessas? Era perigoso andar sozinho durante a noite. Seu espanto aumentou quando conseguiu discernir um vestido à luz da lamparina.
Aproximando-se, conseguiu perceber que a mulher tinha curtos cabelos caramelo, mas ela estava de costas e a lamparina pousada em uma pedra próxima. Colocou a mão no ombro, assustando-a, mas assustou-se ainda mais ao ver que era Sakura quem estava ali.
"Não me assuste dessa forma!" – pediu ela, falando baixo. – "Deveria estar dormindo...".
"Pode-se dizer o mesmo de você..." – replicou. – "É perigoso ficar andando sozinha durante a noite...".
"Tenho maior consciência dos perigos que rondam esse vilarejo do que você..." – suspirou. – "Eu só... Não conseguia dormir e senti que precisava fazer uma visita à minha família..." – afastou-se um passo para o lado, mostrando os escritos nos túmulos de seus pais.
"Eu... Desculpe-me, não devia tê-la interrompido..." – desculpou-se rapidamente, sendo silenciado pela jovem.
"Não se preocupe com isso... Está tudo bem..." – suspirou, observando a lua por alguns instantes, antes de prosseguir. – "Acho que eu deveria ser mais prudente... Não era para verem-me assim,... Ninguém..." – sorriu, constrangida.
"Bem, acho que a única coisa que posso fazer a respeito é manter em segredo esse nosso 'encontro'..." – sorriu também, um pouco mais relaxado.
Ficaram se encarando por algum tempo, somente analisando as feições do outro, quando Sakura quebrou o contato visual, olhando repentinamente para o lado.
"O que foi?..." – perguntou, vendo que ela tinha um olhar preocupado e atento.
"Acho que ouvi alguma coisa..." – deu um passo na direção do chinês.
"Acalme-se, não há nada por aqui... Provavelmente é só sua imaginação..." – tentou acalmar a mulher que começava a tremer. – "Venha. Eu a acompanharei até a entrada da igreja e não sairá mais durante a noite. Prometa-me...".
"Está bem..." – ela pegou a lamparina e foi acompanhada até a segurança da casa de Deus. – "Obrigada..." – agradeceu humildemente, com uma reverência.
"Não precisa agradecer... Fiz o que qualquer outro faria e, afinal de contas, estou aqui para manter a segurança desse local, não concorda?...".
"Tem razão..." – suspirou, olhando rapidamente para a lua. – "Boa noite e até amanhã..." – disse com um sorriso, entrando logo em seguida.
Shaoran permaneceu parado em frente à porta por algum tempo. Sorriu de lado, balançando a cabeça ao lembrar-se do jeito assustado da freira ao pensar ter ouvido um ruído. Sentia-se, de certa forma, intrigado com ela. Em um momento estava calma e tranqüila, tão segura de si, em outro corria como se sua vida dependesse disso e depois era como uma criança assustada. Parecia ter várias personalidades, ou talvez, não agisse como ela mesma em alguns momentos.
'Eriol e Tomoyo estavam comentando algo a respeito do comportamento de Sakura estar diferente…' – pensou, lembrando-se da conversa que tiveram durante o jantar.
§§§
Sakura encontrava-se em seu dormitório terminando de vestir o hábito. Ajeitava o capuz sobre os cabelos curtos e suspirou saudosa da época em que suas madeixas lembravam as de sua mãe. O sino da capela bradou repicou avisando que a missa de graças pelo novo dia estava começando. Calçou os sapatos e saiu do quarto, acompanhando outras garotas que caminhavam silenciosamente para a igreja.
Apesar de sentir uma grande paz naquele momento de reflexão, algo começava a lhe perturbar. Parecia haver uma voz em seu coração dizendo que algo estava errado. Tratou de deixar isso de lado, colocaria o problema nas mãos de Deus e sabia que tudo se resolveria em seu devido tempo.
Em suas preces, agradeceu pela cidade ter acordado a salvo, pela saúde de todos seus amigos e pediu que Tomoyo criasse juízo e aceitasse sair dali para ficar em segurança. Pediu perdão por suas falhas e dúvidas e também agradeceu por ter conhecido Shaoran, uma pessoa de bom coração, exatamente como a prima o descrevia em suas cartas. Permitiu que um sorriso se formasse em seus lábios ao lembrar do acontecido naquela madrugada e da reação do jovem capitão.
O coral do convento anunciou o fim das orações e cada uma das irmãs, postulantes e noviças seguiu seu caminho, cumprindo seus deveres.
Sakura dirigia-se para o portão do convento quando ouviu alguém chamá-la, voltou-se para trás e sorriu.
"O que deseja, reverenda Madre?" – perguntou após beijar a mão da bondosa senhora, pedindo-lhe benção.
"Apenas quero aproveitar que também vou até a escola para conversar um pouco…" – disse tranqüilamente com um sorriso. Caminharam até o portão em silêncio e o atravessaram alcançando a rua.
"A respeito de quê gostaria de conversar, Madre?" – Sakura perguntou curiosamente, fazendo a mulher rir.
Não importava quanto tempo se passasse, aquela menina sempre teria a mesma curiosidade, a mesma alegria, a mesma bondade. Seria sempre a mesma Sakura e, apesar dessa ser a razão pela qual amava tanto aquela criança, era também a razão que a preocupava. Não era tão fácil desistir de sonhos tão belos quanto os que a garota possuía quando chegou a ela. Naquela época, fazia pouco tempo que perdera os pais, mas não se mostrava tão abalada como outras crianças em sua situação. Pois não perdera o amor pela vida e pelas pessoas que a cercavam.
"Percebi que você está um pouco distraída desde a chegada de sua prima…" – tinha a voz tranqüila. – "Algo a preocupa, não é, criança?" – comentou, vendo a jovem freira abaixar a cabeça.
"Sim, Madre. Algo me incomoda desde ontem…" – admitiu com a voz baixa. – "Tomoyo recusa-se a sair do vilarejo sem mim e com essa batalha prestes a acontecer eu…" – fez uma pausa. – "Eu temo pela segurança dela…" – disse parando de caminhar. – "No entanto, não é apenas isso que me perturba…" – sua voz saiu baixa, quase inaudível.
"E o que mais a deixa ansiosa?" – questionou, parando em frente à garota, erguendo-lhe o rosto.
"E-eu não sei…" – disse apenas. Seus olhos estavam agitados, olhavam para longe, tentando encontrar uma resposta.
"Quando descobrir a resposta me procure para conversarmos…" – disse a Madre com um sorriso compreensivo, voltando a caminhar, deixando Sakura para trás. – "Apresse-se, Irmã Sakura, ou vai se atrasar para sua aula hoje!" – riu fazendo a jovem despertar de seus pensamentos e correr para alcançá-la.
§§§
"Estão dispensados!" – Shaoran disse para o regimento à sua frente. Passaram o dia fazendo reconhecimento do território em volta de Kanoya, montaram postos de vigilância em locais estratégicos na floresta h a alguns quilômetros do vilarejo. Tinham acabado de definir os turnos de vigilância. Não estavam ali para brincar.
Começou a fazer o caminho de volta para a pousada onde estava, tudo o que queria agora era um banho relaxante e, apesar de ainda ser cedo, cair na cama e descansar, recuperando as horas que ficara em claro na noite anterior. Suspirou lentamente observando a revoada de andorinhas cruzando o céu rumo ao norte. O inverno estaria chegando em menos de um mês, a melhor data para o ataque do grupo de invasão. O chinês não entendia o porquê do interesse de um grupo militar de seu país natal invadir o território Japonês. Não que invadir outros territórios fosse correto, mas havia muitas outras áreas de maior interesse que um vilarejo como Kanoya.
Teve seus pensamentos interrompidos pelo som de risadas infantis e procurando sua fonte viu um grupo de crianças na faixa de sete anos correndo pela praça onde foram recepcionados no dia anterior. Estavam sob a supervisão de uma freira que parecia estar se divertindo mais que as próprias crianças. Shaoran não pôde deixar de sorrir ao reconhecer a risada de Sakura. Ficou parado no lugar onde estava observando-a correr, fugindo no pega-pega. Sentiu-se simplesmente fora de órbita, todas as suas preocupações desapareceram. Uma calma inexplicável tomava conta de seu corpo e acalmava seu coração.
"Ela é linda, não é?" – Eriol comentou, aproximando-se de Shaoran, que se mostrava constrangido por ter sido flagrado admirando a freira. Sorriu, desviando o olhar do amigo.
"Não há como negar que seja bela…" – disse sabendo que não adiantaria mentir para o amigo. Eriol sorriu, encarando a prima da esposa e virou-se para continuar seu caminho. Repousou a mão sobre o ombro do chinês ao passar por ele.
"Tome cuidado para não se deixar apaixonar por ela, Shaoran…" – advertiu, antes de se afastar.
Por mais ridícula que fosse a idéia de se interessar por uma freira, a reação do capitão não foi a incredulidade esperada. Ele ficou apenas observando o comandante se afastar com o olhar assustado e distante, perdendo noção do que acontecia ao seu redor.
Continuará...
§§§
N/A:
Olá! Como vão todos?
Bem, hoje, por problemas técnicos, não faremos as notas separadamente, então sejamos breves e vamos diretamente aos agradecimentos.
Saulo Dourado, M. Sheldon, Tamires Stuart, Irmãs Potter, Agatha, Andréia, Pety, MeRRy aNNe, danyglatz e lilaclynx.
Poxa, quanta gente... O.O
Well, é só... Até daqui a 15 dias, com o próximo capítulo de Desígnios do Destino!
Yoru no Hoshi.
