Capítulo 03: Anjo

Caía uma chuva forte naquela madrugada, e Draco a observava, da janela do seu dormitório. Ouvia os roncos insuportáveis de Crabbe e Goyle, seus dois guarda-costas, que nem dormindo deixavam de incomodá-lo, e estragavam o som da chuva em seus ouvidos. As duas semanas de aula que haviam se passado, ocorreram como nos anos anteriores: alguns insultos a Potter e seus amiguinhos insuportáveis, os treinos de quadribol, algumas horas naquela biblioteca, e badalações com os sonserinos do sexto e sétimo ano em lugares escondidos, as festinhas que sempre ocorriam e não era de conhecimento de nenhum professor.

A madrugada passava lentamente, seus olhos ardiam, os olhos gélidos pareciam mais gélidos ainda, ao observar aquela chuva, uma única vela acessa em seu quarto. Em sua vida nada tinha sentido, tudo era designado pelo seu pai. Sempre fora um garotinho mimado, com todas as vontades e regalias atendidas, mas nada disso era suficiente para Draco. Não tinha motivação naquela vida, não tinha nada que o fizesse gostar de viver, estava ali por uma eventualidade, não tinha um significado próprio, não para ele. O fato de querer derrotar Potter não era necessariamente um motivo, era só uma diversão que, ás vezes, o atormentava de maneira sádica.

Sentia-se vazio. As mãos estavam muito geladas, e a cor muito branca delas proporcionava a visão das veias, podia ver nitidamente a veia que passava pelo seu pulso. Uma veia vertical e outra inclinada se encontrava com a vertical, talvez fosse a mesma, não sabia dizer. Draco Malfoy era só ódio, ódio de todos e ate dele mesmo. Sentia uma vontade imensa de ver o vermelho do seu sangue, mas agora não era o momento. O vermelho lembrava a maldita Weasley. Sua mão segurava o pequeno punhal de prata, deslizou a ponta afiada do punhal lentamente, e com suavidade, em sua mão, tão leve, não fez nada, sem marcas dessa vez, as marcas podiam esperar. Voltou a cortar as folhas de lótus para colocar na sua poção.

Dizem que plantas choram. Aquele liquidozinho que sai quando arrancamos ou quebramos a parte do caule simbolizava as lágrimas. Draco adorava vê-las chorando.


O domingo amanhecia, nublado. Gina se espreguiçou lentamente na cama. Thamy e Julia não estavam mais no quarto. Eve penteava os longos cabelos negros, sentada na cama ao lado da de Gina.

- Bom dia Gin!

- Bom dia! – Levantou com preguiça, e lançou um olhar à
mochila, que se encontrava largada e entreaberta, ao pé da sua
cama, deixando a mostra alguns livros e pergaminhos.

Tomou seu banho, tudo igual a todo dia. Quando já estava pronta, pegou a mochila e colocou um livro grosso de herbologia, e um de poções.

- Gin, hoje é domingo, não tem aula. – Eve agora estava deitada na cama, lendo uma revista.

- Eu sei, eu vou a biblioteca.

- Sem nem ao menos tomar café da manhã?

- Não tenho muita fome assim que acordo, não sei por que. – Suspirou resignada, pegando um pote de tinta para escrever. – Tenho muito o que estudar, você sabe que eu quero muito ser monitora.

- Eu sou boa em poções, se quiser ajuda...

- Valeu Eve, qualquer coisa, eu venho te perturbar com alguma dúvida.

- Estou disponível, não se preocupe. – a japonesinha sorriu, com gracejo.

Gina saiu do quarto, a sala comunal estava cheia, o dia nublado não parecia agradável para se andar nos jardins do castelo. Na biblioteca não havia muitas pessoas, era começo de ano, e ainda por cima era domingo. Depositou a mochila na mesa mais isolada e foi até uma das prateleiras, onde havia livros de poções. Pegou o livro do quarto ano, para relembrar de algumas coisas, e voltou para a mesa. Abriu o livro de herbologia e, ao lado, o de poções.

"Clove: planta com um leve aroma de cravo, usada em poções anti depressivas. Não é bem vista aos olhos de especialistas em poções, por apresentar características variadas de acordo com a pessoa que ingere a poção. Ás vezes, pode causar o efeito contrário, sendo considerada uma poção volátil."

Deixou o livro de herbologia um pouco de lado e pegou o de poções.

"Poção anti depresissa a base de Clove: uma poção simples, com um aroma peculiar de cravo e ervas. Não apresenta muito efeito em pacientes, considerando que a depressão é algo psicológico e não uma doença causada por um fator fisico."

Abaixo, seguiam-se as intrusões de como preparar a poção e de como deveria ser escolhida a Clove. Até que aquilo não era tão difícil, com uma pouco de paciência e dedicação conseguiria se sair bem aquele ano.


Draco entrou na biblioteca, com o seu ar de arrogância e superioridade a todos os seres da Terra. Avistou os cabelos vermelhos e, com irritação, foi até Madame Pince, pedindo um livro de Defesa Contra Artes das Trevas. Madame Pince entregou o livro que ele pediu, resmungando algumas palavras do tipo "Tenha cuidado com um dos meus preciosos livros".

Ele saiu da biblioteca, não estudaria ali, naquela sala com poeira e cheia de alunos intragáveis. Iria estudar do lado de fora do castelo. O dia estava nublado ele queria muito sentir a brisa fria batendo em seu rosto.


Há duas horas que tentava absorver aquelas informações sobre poções e herbologia. Colin apareceu na porta de entrada e correu até Gina com um olhar fuzilador de Madame Pince.

- Gina, Harry pediu para você ir ao campo de quadribol, decidiram treinar de última hora.

Ela sorriu, seria maravilhoso voar, e se livrar daqueles estudos por algumas horas.

- Só vou deixar minhas coisas no meu quarto. – Ajeitou tudo com pressa e saiu da biblioteca, indo para a sala comunal de sua casa.

Gostava mesmo de jogar quadribol, sentir o vento esvoaçando suas madeixas ruivas. Em menos de dez minutos, já estava no vestiário. Harry passou algumas instruções ao time, o desejo dele de ganhar a taça no seu último ano, era enorme. Dado ao fato de que não ganhou a taça no quinto ano, por conta dos eventuais acontecimentos e, no sexto ano, Sonserina ganhou a taça por um descuido dele e uma sorte daquele apanhador loiro e arrogante.

Harry descobriu que os treinos da sonserina começaram logo na primeira semana de aula. Ele não podia ficar para trás. O treino não foi tão agradável quanto Gina esperava. Harry exigiu bastante de todos, Rony estava em um mau humor insuportável, e Gina não gostava de receber ordens de como agir no jogo, dadas por Harry.

Acabou o treino exausta e suada, o ar nem parecia tão frio quanto deveria estar. Os cabelos grudavam no pescoço e na testa. Foi a última a tomar banho no vestiário, e se demorou mais do que pretendia. Saiu do vestiário e começava a cair uma finíssima garoa. Julia podia ter esperado-a, entrou um ano depois de Gina no time da Grifinória, e não falava com ela nos treinos. Eve dizia que era inveja por Gina ter conseguido entrar no time antes dela.

Saiu andando pelo campo, devagar, indo até o castelo. Então viu, sentado e recostado à uma árvore que ficava um pouco antes do campo de quadribol, alguém que parecia concentrado em um livro. Draco Malfoy. Andou mais apressada, para não ter de ouvir insulto ou alguma esquisitice da parte do rapaz.

- Ei Weasley! – Parou, contrariada.

- Malfoy antes de tudo, dane-se. Não estou a fim de aturar seus insultos.

-Potter e uma grifinóriazinha passaram por aqui bastante empolgados. – Veneno e curiosidade misturados.

- E o que eu tenho a ver com isso, Malfoy? – O olhou, com todo o desprezo que conseguiu reunir.

- Nada não, né Weasley, já que não namora mais o Potter.

Ela revirou os olhos para cima, que coisa mais idiota de se dizer. Voltou a olhar para Malfoy, que já não tinha os olhos entretidos nela, e sim, no livro da biblioteca. Virginia observou os cabelos caídos sobre os olhos, depois baixou o olhar até o livro. Uma das mãos dele segurava o livro de lado, e a outra, caia de lado no chão com a palma estendida para cima. Esboçava pequenos corte acima de pulso e na palma da mão.

- Vai ficar me admirando, aí parada Weasley? – Falou sem retirar os olhos do livro.

Virginia virou, e saiu andando em direção ao castelo. Draco tirou os olhos do livro, aborrecido. Aquela Weasley estava fixa em sua mente, não sabia por que. Era sufocante ter aquela garota ocupando seus pensamentos, ofuscando suas sensações frias. Queria acabar com ela, estraçalhar de maneira emocional, essa era a forma que tinha de acabar com qualquer índice de sentimento, fosse de obsessão ou qualquer outro. Talvez, se acabasse com a Weasley, se a machucasse como machucava as outras, se a ferisse emocionalmente... ele sabia que esse tipo de ferimento era pior que o físico. Tinha que dar um jeito de envolvê-la em um dos seus joguinhos e despedaçar tudo. Daria um jeito nisso o mais rápido possível.


Um mês de aula, e Draco não andava evoluindo no seu quadro de jogos e fixação. A Weasley não era vista com freqüência por ele, não freqüentavam os mesmo lugares, na mesma hora. Tentava achar alguma solução, mas o barulho na sua sala comunal atrapalhava suas idéias.

- Draco! – Pansy se sentou ao seu lado. – Você deixou o Blás ser capitão do time?

- Escolheram ele. – Voltou a atenção para o seu pergaminho.

- Pensei que você quisesse o posto de capitão. Potter é o capitão da Girfinoria.

- Pansy, eu me atrasei para a reunião, e acabaram decidindo que seria ele, já que eu não estava lá para dizer que queria
ser capitão.

- Você anda tão disperso esses últimos dias, Draco.

- Quando você vem assim é porque quer dizer alguma coisa. Fala logo o que é Pansy. – Guardou o pergaminho em um livro e olhou
irritado para ela.

Pansy se aproximou mais dele e sussurrou em seu ouvido.

- É sobre Você-sabe-quem. – Draco olhou-a, instigando para que ela continuasse. – Eu quero me tornar uma comensal. – Draco
desviou os olhos entediado.

- Pansy, você e todos os sonserinos, querem se tornar comensais.

- Mas eu quero ser uma comensal de destaque.

- Eu não tô a fim de ouvir sobre as suas metas para o futuro. Arranje uma daquelas suas amiguinhas para ficar contando sobre
'o que deseja ser quando crescer'.

- Não se trata disso Draco. Vou ser direta: eu quero que você me ajude, sei que você tem status com Voldemort.

- Até parece que eu vou sair ajudando alguém.

- Draco, eu sou sua amiga.

- Corta esse papo de amizade, isso não existe entre nós. Quem já viu um Malfoy ajudando alguém?

- Ok Draco, vou fazer do jeito que você quer. – Ela respirou, resignada com aquela situação, ao mesmo tempo em que os olhos
brilhavam, imaginando coisas que ela realmente queria fazer com aquele sonsenrino loiro, de sorriso torto, à sua frente. –
O que você quer em troca?

- Pansy, se está achando que eu vou te ajudar em troca de meras noites com você, está muito enganada. – O brilho nos
olhos dela sumiram. – Já tive o suficiente. – Acrescentou, com malicia.

- Draco, você é a pessoa mais insuportável que eu já conheci.

- E a pessoa que te faz delirar como louca. Com saudades, Pansy? – Ele riu. – Eu quero outra coisa em troca.

- Que?

- Depois eu falo. – Deu um beijo no pescoço dela. – Tenho uma outra sonserina para ver agora.

Se afastou, saindo da sala comunal. O encontro com outra sonserina era mentira, trouxera consigo o livro, onde colocara um pergaminho dentro, tinha que enviar uma carta ao seu pai, para se informar sobre o que andava acontecendo no lado deles.

Quando colocava a carta na perna de Duchy, uma outra coruja pousou ao seu lado, e estendeu a pata com uma carta. Draco tirou, surpreso, o envelope da coruja do seu pai. Coincidência. Abriu o envelope lacrado com uma espécie de carimbo vermelho.

"Draco, tenho boas noticias. Você será marcado no final do ano letivo. Você sabe do que eu estou falando, não sabe? As coisas andam muito boas para o nosso lado, não posso dar detalhes, é arriscado. Fique atento ao Profeta Diário, lá existem sutis informações, e poderá tirar suas próprias conclusões. Quanto aos seus estudos, quero que você consiga uma boa nota nos NIEMs, supere todos, inclusive aquela sangue ruim grifinória. Não se preocupe, Draco, eles pagarão caro por ousarem desafiar sangues puros como nós. Sua mãe manda lembranças."

Lucius Malfoy

A única coisa que importava para ele, era a primeira linha. Seria marcado com o símbolo de Voldemort quando terminasse Hogwarts, seu pai o comunicou, nem perguntava se ele queria ter aquela marca negra em seu corpo. Essa decisão já estava tomada desde que Draco nascera, e quase foi impedido de realizar o sonho do seu pai, quando todos pensaram que Potter havia derrotado Voldemort, com somente um ano de vida. Agora esse sonho era devolvido e seria realizado, assim queria Lucius, ver Draco como um dos melhores comensais da morte. O respeito à seu nome permaneceria, a linhagem nobre, pura e de bruxos das trevas permaneceria, no sangue de Draco.

Ainda teria muito o que fazer, para conseguir o mesmo prestígio que seu pai, em meio aos outros comensais, mas sabia, desde cedo, que era um dos futuros comensais mais bem vistos por Voldemort. O bruxo via nele a nova geração de seguidores das trevas. Draco representava esse papel muito bem. Era frio, sem vestígios de sentimentos bons, refinado, um gosto peculiar por magia negra. Até seu físico se encaixava: a aparência elegante, o jeito obscuro, o olhar dissimulado, sem expressão concreta, tudo isso contribuía para que Draco Malfoy fosse o exemplo da nova geração de comensais.

Saiu do corujal, sem vontade de enviar a carta ao seu pai. Não precisava, tinha obtido as notícias que queria. Decidiu ir a biblioteca estudar Defesa Contra Artes das Trevas e Feitiços. Lupin podia ser um lobisomem, mas era extremamente útil e satisfatório como professor. Enquanto fazia seu percurso, viu Potter, Granger e Weasley conversando, sérios. Olhou para eles e sorriu, maldoso, estavam de lados opostos, sabiam disso, e não faziam questão de esconder entre si. Potter já tinha mandado seu pai para a prisão uma vez, e, apesar de Lucius não passar mais que um mês lá, o rapaz sentia raiva de Potter, assim como sentia de tudo que o Cicatriz fazia. Era ter o orgulho ferido, um Malfoy em uma prisão imunda, e ele ainda lembrava da aparência acabada do seu pai quando saiu de Azkaban.

Entrou na biblioteca com ar arrogante. Pôde ouvir um suspiro de uma quintanista da corvinal, na mesa da frente. Soltou um sorriso nos lábios, típico de quem tem noção do que provoca no sexo oposto. Se dirigiu até um canto da biblioteca e, para sua surpresa, na mesa em que costumava sentar, estava Weasley. Nunca a tinha visto ali, seus horários não coincidiam.

Olhou irritado. Ela nem estava estudando, estava era dormindo com a cabeça virada de lado, em cima do livro. Weasley inútil, nem estudar, estudava. Os cabelos dela caiam por todo o rosto e pela mesa. Aqueles malditos cabelos vermelhos caiam graciosamente por todos os lados. Draco jogou o grosso livro de Defesa Contra Artes das Trevas sobre a mesa, fazendo um barulho ecoar por toda a biblioteca, fazendo os alunos presentes e Madame Pince olharem-no com indignação, e a Weasley levantar a cabeça sobressaltada e confusa.

- Teve bons sonhos, Weasley? – Falou baixo, com seu habitual sarcasmo. – Aposto que esse livro deve ser mais confortável do que o travesseiro que você tem naquilo que chama de casa.

Draco observou-a passar uma das mãos por trás da orelha, fazendo uma mecha de cabelo ir para trás e deixando a mostra o rosto vermelho que devia ter sido marcado quando ela dormia com aquele lado pressionado no livro.

- Weasley, eu costumo usar essa mesa, por ficar mais afastada da escória.

- Tá querendo que eu saia? – Perguntou aborrecida. – Não vou sair, procure outro lugar.

- Escute aqui Weasley, você nem tava estudando, e biblioteca não é lugar para se dormir.

- Eu não estava dormindo, estava apenas descansando a minha cabeça e os meus olhos.

- Esse é boa Weasley. – Revirou os olhos e se sentando à mesa, de frente para ela, abriu o livro e começou a ler.

Ginny piscou os olhos três vezes sem acreditar naquilo. Um Malfoy sentado à mesma mesa que uma Weasley. Isso era demais para ela... Pegou seu livro e levantou da mesa, deixando Draco concentrado em sua leitura.

Weasley chata, só o perturbava. Fixava o livro, mas só lembrava da imagem da Weasley dormindo na mesa. O certo seria ele sair daquela mesa, e não ter sentado com ela. Mas havia sentido vontade de ficar ali, com ela à sua frente, era confortável saber que ela estava ali, e experimentar a sensação de calor que tinha ao vê-la. Era bom e ruim ao mesmo tempo, e os cabelos vermelhos ainda pareciam estar espalhados por aquela mesa, ainda sentia o perfume que vinha do cabelo dela. Ela era um anjo ruivo, um anjo que lhe trazia sensações estranhas, sensações que ele não podia sentir, não queria sentir, seu conceito não permitia, tinha que tirá-la da cabeça. Draco fechou o livro com força e saiu da biblioteca, ouvindo Madame Pince resmungar.

Talvez, se experimentasse mais alguns beijos da Weasley, pudesse se livrar daquelas sensações. Só não sabia como faria isso, não conseguia ficar perto dela sem ofendê-la, já era um hábito, e ela o detestava, não ficava perto dele durante muito tempo. Ele via ódio, horror, afrontamento nos olhos dela quando estes cruzavam com os seus. Saiu andando por aqueles corredores, até ouvir um barulho estranho vindo da sala de feitiços, que a essa hora deveria se encontrar vazia. Tomado de curiosidade, andou até lá e nem precisou abrir a porta, pois já estava meio entreaberta. Viu a Weasley sentada no chão, próxima a porta, parecia esta chorando. Draco permaneceu parado ali, durante algum tempo, sem saber o que fazer, até que decidiu se abaixar e ver o que ela tinha. Podia ser frio, mas uma mulher chorando, de certa maneira, o instigava.

- O que você tem? – Ele tentou ver o rosto dela. Virginia tinha a cabeça abaixada, os cabelos tampando o seu rosto, só
se percebia que ela estava chorando por causa do fungado baixo e dos ombros, que, ás vezes, levantavam discretamente.

- Saia daqui. – Ela sabia de quem era aquela voz, ele só devia estar ali para humilhá-la.

Draco tocou o queixo dela com as mãos frias, e levantou o rosto da ruiva. Tentou falar, com a voz um pouco menos fria, mas talvez isso nunca mudasse nele.

- Me diga o que você tem, talvez eu possa te ajudar. – Se estranhou por estar falando aquilo, afinal, o que ele poderia
fazer para ajudá-la? Não sabia ajudar a si próprio, sem contar que não era do feitio dele ser solidário, mesmo em se tratando
de uma mulher chorando.

Qualquer pessoa serviria para ela, naquele momento. Não se importava de ser um Malfoy, não ligava, só queria dizer para alguém o que havia acontecido. Estava cansada de guardar seus problemas para si mesma, iria dizer para ele o que estava se passando, mesmo não sendo bom começar a contar o que ocorria com ela logo com um Malfoy, não levava isso em conta naquela hora.

- Meu irmão Carlinhos está desaparecido. – Chorou ainda mais.

- Um dos gêmeos? – Perguntou com a testa franzida. Ela balançou a cabeça, negativamente. – Aquele que foi monitor?

- Não, ele já tinha se formado quando você entrou em Hogwarts.

Draco balançou um pouco a cabeça, compreendendo. Ela não o encarava, mantinha os olhos baixos.

- Rony, Harry e Mione, não iam me contar, não queriam que eu soubesse – Ela passou as costas da mão tentando enxugar as
lagrimas. – Eu ouvi sem querer, quando sai da biblioteca. Eles não podem esconder isso de mim. – Voltou a chorar. – Carlinhos
era o único que brincava comigo quando eu era pequena.

- Você tem tantos irmãos. – Disse com a intenção de consolá-la. O efeito foi o contrário, Virginia chorou ainda mais.

- Não é a mesma coisa, cada um é um. – Ela se levantou, Draco a segurou pelo braço, para que ela não saísse da sala.

- Me desculpe, não foi bem isso que eu quis dizer. – Draco franziu a testa contrariado. Tinha pedido desculpas a uma Weasley.

- Me solte. – Os olhos dela estavam marejados, como um ser tão pequeno podia soltar tanta água pelos olhos? Via o rastro das
lágrimas pelo rosto dela, algumas iam de encontro aos lábios vermelhos.

Uma aflição se apoderou de Draco, lembrou-se do beijo doce. O gosto dos lábios dela agora devia estar salgados por conta das lágrimas. Já tinha visto tantas garotas chorarem por ele, chegava a ser prazeroso, no entanto, com ela era diferente, não era nada agradável vê-la chorando, não que não fosse uma visão bonita, era algo lindo até demais, vê-la com os cabelos caindo pelo rosto, os olhos cheios d´água, dando um ar melancólico e de anjo perdido, os lábios extremamente vermelhos. Céus! Aquela garota mexia com ele.

Não soube dizer o que levou a fazer aquilo, só sabia que tinha que fazer. Puxou-a para mais perto e abraçou-a com força. Não se lembrava da ultima vez que abraçara alguém, sequer se lembrava se tinha abraçado alguém. Ah sim, abraçava a sua mãe, algumas vezes. Era totalmente diferente abraçar aquela ruivinha. Quando ele a abraçou, notou que ela parou de chorar por alguns segundo, para depois chorar ainda mais e abraçá-lo também.

Ela era quente, muito quente, sentia um calor emanar do corpo dela, fazendo-o sentir um choque bom. Agora ele afagava os cabelos ruivos, que ondulavam nas pontas, aquilo já estava indo longe demais. Ficaram assim sabe-se lá por quanto tempo, ela foi parando de chorar aos poucos. Draco não queria soltá-la, aquilo o acalmava, era bom. Tinha um frágil anjo em seus braços. Quando ela se afastou, ele sentiu um vazio, o vazio que sempre estava com ele.

- Obrigada. – Ela enxugou as lagrimas que manchavam seu rosto. Draco se aproximou, e enxugou as lágrimas dela com as pontas dos dedos.

Gina estremeceu ao entrar em contato com aqueles dedos gelados, mas, mesmo assim, seu rosto ardia, sabia que estava corando.

- Não chore. – Draco estava muito próximo dela.

- Gina, eu procurei você pelo... – Thamy entrou na sala e parou de falar, ao notar a presença de Malfoy.

- Thamy, eu preciso falar com você. – A ruiva fez uma cara chorosa, e saiu sem dizer mais nada a Draco.

Ele a viu sumir do seu campo de visão. Se sentia mais frio ainda. Encostou as costas na parede e deslizou até o chão, mantendo os joelhos próximos ao peito e encostando a cabeça neles. Nunca tinha sentido aquilo. Não tinha mais controle das suas ações quando ela estava perto. O que aquilo significava, ele ainda não sabia dizer. Talvez até soubesse, só não queria admitir. Sentia o cheiro dela, sentia a pele do rosto macio e os cabelos sedosos, não esquecia aqueles olhos triste e melancólicos. Ela era um anjo. E ele sabia que não merecia aquele anjo.

Era mau, cruel, frio, não era digno de um anjo tão puro e tão bom. Sentia-se horrível por não ser digno daquele anjo, por não merecer tocá-la, se a tocasse seria como se tirasse a pureza daquele belo anjo ruivo. As mãos dele deviam feri-la como duas lâminas de gelo, e foi assim que achou ao tocá-la no rosto, quando ela estremeceu. Sua voz ia ser sempre fria e arrogante, e não doce e suave como ela merecia ouvir. Aquela garota podia ser sua ruína ou sua salvação.


Thamy perguntava a Gina o que ela fazia, sozinha numa sala com Malfoy. Gina explicava sobre Carlinhos e Thamy tentou consolá-la se esquecendo de Malfoy. A ruiva não pode deixar de comparar o consolo de Malfoy e de Thamy. Sua amiga dizia palavras que se devia ouvir naquele hora, palavras de conforto. Já Malfoy, sequer conseguiu dizer algo que a consolasse, mas o abraço dele a fez se sentir bem melhor, e ela se sentia confusa. Ele passou segurança, proteção. Draco Malfoy não era tão frio assim, afinal, se compadeceu dela e a havia tratado muito humanamente.

Aqueles olhos cinzas, postos nela, faziam-na sentir um frio na barriga, um friozinho bom. O olhar dele demonstrava preocupação e aflição pelo sofrimento dela, e o toque das mãos dele era suave.

Gina viu Harry, Rony e Hermione entrarem pelo retrato da mulher gorda. O trio se aproximou dela e de Thamy.

- Oi Gina. – Hermione foi a primeira a falar. Rony apertava as mãos nervosamente e Harry não a encarava.

- Rony, por que você não me contou que Carlinhos está desaparecido?

- O que Gina? – Rony ficou vermelho. – Carlinhos não está desaparecido.

- Não minta para mim. – Ela gritou, fazendo com que alguns alunos na sala comunal olhassem em sua direção. – Estou cansada de vocês tentando me proteger 'Oh, a frágil Gina, não agüentaria saber isso.' Estou farta, não quero que me escondam
as coisas, eu agüento sim. – Não sabia se chorava de raiva ou tristeza.

- Calma Gina. – Harry se aproximou dela.

- Afaste se de mim Harry. Você é outro que tem mania de proteção, de achar que eu não sou capaz de resistir a essas coisas.

- Gina, nós só pensamos no seu bem. – Hermione correu em socorro aos amigos.

Gina foi em direção ao dormitório feminino sem querer ouvir o que ela tinha a dizer.

- Deviam ter contado a ela. – Thamy falou preocupada. – Gina não é mais uma garotinha, sabe.

- Quem você pensa que é, para me dizer o que fazer com a minha irmã?

- Rony. – Hermione o repreendeu. – Ela só está querendo ajudar. – Voltou-se para Thamy e disso com gentileza. – Acho
melhor você ir vê-la e tentar fazer com que ela fique mais calma. - Thamy fez o que Hermione disse.

Após Thamy consolá-la, Gina disse que ia dormir. Cobriu-se e fingiu que dormia. Até agora, achava estranho o que tinha acontecido. Estava preocupada, mas não podia deixar de pensar na reação inusitada de Malfoy. Se arrependeu de ter contado a ele, várias vezes Rony comentava que Draco seria um comensal, como o pai. Não tinha que ter contado a ele, afinal, Draco era filho do homem que fez seu primeiro ano em Hogwarts o pior de sua vida, pensar em Tom ainda lhe causava calafrios, medo. Acabou adormecendo e não pode evitar o pesadelo com Tom Riddle.


- Draco, você está prestando atenção? – Pansy perguntou na aula de Flitwick.

- Estou.

- Não está, não. – Ela disse, com entusiasmo. – Até parece que você tá em transe.

- O que é dessa vez, Pansy?

- Você já pensou no que eu devo fazer, no nosso trato?

- Que trato? – Perguntou, indiferente.

- De você me ajudar a ser uma comensal renomada. O que você quer em troca? – Ela tentou parecer não muito entusiasmada.

- Eu quero uma pessoa em troca. – Respondeu, com sarcasmo.

- Quem? – Os olhos dela brilhavam de contentamento.

- A Weasley.

- Que? Você esta brincando, né Draco? – O brilho vacilou.

- Quero humilhar aquela Weasley e você me ajudará nisso.

- Ah sim, estou começando a entender melhor. Por um momento eu pensei que você... Wow, claro que não, impossível isso, que
pensamento imbecil. Só não entendo por que você quer tanto humilhá-la, já não a humilha o suficiente?

- Não Pansy, eu quero mais, não me contento com pouco. – Ela sorriu para o loiro.

- Vou pensar em algo.

- Seja rápida.

- Pode deixar Draco. – Não era exatamente isso que Pansy queria dar a Draco, mas pelo menos assim iria conseguir o seu
precioso status entre os seguidores de Voldemort.

Era essa a decisão de Draco, conseguir a Weasley o mais rápido possível e esquecê-la mais rápido ainda. Tinha certeza que se, apenas a usasse, se livraria daquelas sensações boas. Faltando dez minutos para o fim da aula, Pansy o chamou mais uma vez.

- Já sei Draco. – Ele olhou interessado para a garota. – Você pode pedir ajuda a ela em alguma coisa. Grifinorias são boazinhas demais, ajudam qualquer pessoa.

- Pansy, não acho que essa seja uma boa idéia.

- Confia em mim, Draco.

- Até parece que eu vou confiar em alguém. Trate de ter uma idéia melhor.

- Draco, você pode se fazer de coitadinho para ela, peça ajuda em alguma matéria.

- Eu vou pedir ajuda em que? Não tenho dificuldade em nenhuma matéria.

- Então peça ajuda para fazer alguma coisa.

- Não, Pansy. Mas talvez me fazer de coitadinho não seja uma má idéia, já sei até como.

O sinal, anunciando o fim da aula, tocou. Draco saiu na frente sem se importar com Pansy. E para sorte dele, a Weasley estava naquele corredor, essa era a oportunidade perfeita.

Se aproximou dela, cautelosamente, e a viu se separar das amigas e andar em direção aos jardins do castelo. Quando se encontrava a sós com ela, se aproximou mais e esbarrou na ruiva. Gina olhou confusa para Malfoy, não pôde deixar de dar um pequeno sorriso, ia agradecer mais uma vez a ela quando o loiro falou com urgência.

- Me ajuda.