Capítulo 5: O Que É Música?

Foi numa noite quente bem no final de agosto. Eu havia passado quase três semanas em um pequeno povoado bruxo, perto de Edinburgo, na Escócia. Dumbledore tinha me pedido para investigar possíveis conexões entre os bruxos negros locais e os servidores de Voldemort. Não tinha sido trabalho fácil, mas foi compensador. Quando finalmente cheguei em casa, era muito tarde, e as duas únicas pessoas acordadas eram Sirius e Harry. Encontrei-os na cozinha quando fui fazer um chá. Sirius dava muitos conselhos a Harry, e parecia um pouco arrasado. Ele havia simplesmente amado todos aqueles dias com seu afilhado; era quase como ter Pontas de volta. No dia seguinte começariam as aulas em Hogwarts; e a velha casa voltaria a ficar silenciosa. Ou, pelo menos, era o que eu pensava.

Me preparava para entrar em meu quarto quando ouvi música vindo do sótão. Quer dizer, não apenas "música", mas jazz. Intrigado, fui investigar... e encontrei quem eu menos esperava. Os olhos fechados, os cabelos rosa arrepiados, a cabeça balançando ao som da música. Tonks ouvindo aquela antiga banda de jazz bruxo em vez de As Esquisitonas? Eu devia estar vendo coisas. Tudo isso iluminado pela luz alaranjada de velas espalhadas pelo lugar. Sorri sem perceber quando a vi. Só então admiti para mim mesmo que havia sentido falta dela naquelas semanas. Além disso, não tinha conseguido parar de pensar naquela conversa que havíamos tido algum tempo atrás. E se fosse diferente? E se dois adultos que se dessem muito bem teriam que terminar, invariavelmente... apaixonados? Às vezes queria que ela jamais tivesse tocado nesse assunto; aí, eu não perderia horas pensando nele, em alguma realidade alternativa. Sacudi a cabeça mais uma vez. A conclusão a que eu chegava, depois de horas remoendo as possibilidades, era sempre a mesma. Isso jamais aconteceria comigo. Avancei pelo sótão em silêncio.

Ela só me notou quando eu já havia sentado ao lado dela. Com o susto, Tonks arregalou os olhos e chutou meu tornozelo, pedindo mil desculpas enquanto me dava um abraço de boas-vindas.

"Está tudo bem...' acalmei-a, apalpando o tornozelo para calcular o estrago "Fui eu quem assustou você, pra começar... Hm. E esse gramofone enfeitiçado?" perguntei, apontando com a cabeça e disfarçando a dor.

"Oh! Então. Achei por aí, acredita? Eu podia jurar que não se ouvia música nessa casa... e os discos nem são assim tão ruins."

"Nem são assim tão ruins? Isso é que é música, não aquele... lamento de espíritos agourentos que ouvi uma vez vindo do seu quarto."

Ela ergueu uma sobrancelha e então jogou a cabeça para trás e riu.

"Remus... você não sabe o que é música."

"Você não sabe o que é música. Não sabe o que está perdendo."

"Ah, é?" ela perguntou, a sobrancelha erguida, me desafiando. "Me diz então o que estou perdendo."

"Bem... só para começo de conversa, duvido que alguém consiga dançar... aquilo."

"Dançar! Ah. Pára tudo! Você dança?"

"Eu... costumava dançar há alguns anos..." tentei afastar algumas memórias um pouco dolorosas da mente. A última vez que eu havia dançado tinha sido com Lily, em seu casamento. Depois disso, não tive muitos motivos para repetir a experiência.

"Ah. Nunca consegui aprender... hm... minhas pernas não acompanham a música, meus braços não acompanham as pernas e por aí vai...' ela sorriu, com um ar meio derrotado.

"Ora. Não é tão difícil assim, qualquer um consegue aprender pelo menos o básico."

"Tem certeza?"

"Absoluta."

Tive certeza absoluta, também, de que estava enrascado quando ela arregalou os olhos, como sempre fazia quando tinha uma idéia.

"Já sei! Você vai me ensinar."

Tentei me esquivar.

"Estou meio enferrujado. Além disso, temos que acordar cedo amanhã."

"Ah não, sem desculpas! Disse que ia me ensinar a gostar. E é só um pouquinho, vai. Pra ver se eu levo jeito. Vem!"

Ela tinha um argumento válido. Deixei que me puxasse pela mão; e nos posicionamos bem no meio do sótão, entre caixas, baús, candelabros e pilhas de velhos livros e pergaminhos. A música que tocava agora era lenta; disse para mim mesmo que era perfeito, já que ela era apenas uma principiante. Ficamos ali parados, um de frente para o outro.

"Tá. E o que eu faço agora?"

Segurei as mãos dela nas minhas. Não sei por que por um segundo fiquei tão nervoso; eu já havia feito aquele gesto milhares de vezes. Segurei, então, as mãos dela; e comecei a ensinar-lhe alguns dos passos mais simples; enquanto aproveitava para relembrá-los. E então, o inevitável aconteceu: ela tropeçou e caiu em cima de mim. Ouvi o som da minha própria risada ecoando pelo sótão, junto com a dela.

"Preciso de um tempo", ela pediu; e eu concordei. Ficamos ali abraçados, apenas nos movendo suavemente junto com a música. Tonks suspirou contra meu pescoço.

"Ainda não acredito que fiquei de fora dessa vez. Queria tanto ter ido pra Escócia com você..."

Em algum momento, sem que eu notasse, os braços dela haviam se apoiado em meu peito; e agora minhas mãos estavam em sua cintura. Trouxe-as para cima, onde era seguro.

"Você tinha o trabalho de Auror, Tonks."

"É."

Ela ergueu a cabeça. Me olhava nos olhos. De repente me senti hipnotizado. Tudo o que eu via eram seus olhos negros. Brilhantes. Me refletindo. Mal conseguia notar as maçãs do rosto levemente salientes, a pele clara agora iluminada pelo tom quente das velas, os lábios entreabertos... que ela mordeu; e então me contou, num jato de palavras:

"Senti sua falta."

Abracei-a, escondendo o rosto. Não queria que ela visse o que estava escrito nele. Meu coração batia rápido. Eu não sabia o que fazer, o que dizer, e ouvi a mim mesmo respondendo contra seu ouvido:

"Senti sua falta também", e senti os lábios dela formando um sorriso contra o meu pescoço. "Mas agora... temos que ir", concluí, voltando a mim.

E me senti, confesso, ao mesmo tempo aliviado e frustrado quando ela concordou.