Aqui estou eu, trazendo o 3º cap. De Pólos Opostos. Antes de mais nada, queria dizer algo que ainda não havia dito: Digimon e seus personagens não me pertencem, eu apenas escrevo porque gosto.

Também gostaria de agradecer às pessoas que me enviaram reviews! Vocês me animam muito, assim tenho disposição para continuar ^-^ Aproveitem a leitura, e me desculpem se sou detalhista....

Capítulo três -

Piquenique digital

A manhã estava relativamente calma naquele dia. O vento ameno levava embora as folhas secas que caíam das árvores, enquanto a imensidão do céu combinava com os olhos azuis dos irmãos Ishida/Takaishi.

Matt e TK caminhavam lentamente pela calçada, sentindo o frescor do ar bater em seus cabelos. Conversavam sorridentes, riam e brincavam, totalmente distantes do mundo real. Tal a graça da irmandade! Os garotos tão parecidos e às vezes tão diferentes, mas com um só espírito. Após esse tempo que os separou, nem viam as horas se passarem, falando da vida e de coisas triviais, e rindo por outras sem graça, mas que para ele faziam sentido...Era só com o irmão que Yamato conseguia falar sem medo, e os seus sentimentos ocultos eram mostrados. Sempre quis proteger Takeru, e era como se o tempo não tivesse passado, mas bem dentro dele o sabia...

Como era mesmo na infância? Ah, sim. Não tinham muito o que lembrar, os pais se divorciaram e separaram os dois ainda pequenos. Mas jamais deixariam de se lembrar da casinha de blocos de madeira de Takeru, o som do chocalho, o cheiro delicioso de mingau de chocolate que comiam às tardes, as brincadeiras de atirar bolas de neve durante o inverno – o que deixava a sra. Ishida morrendo de preocupação! Para onde será que os lamentáveis anos teriam levado esses sonhos de criança? Para debaixo da cama, onde os pequenos tinham medo de encontrar monstros escondidos na noite? Para um lugar onde esqueceriam facilmente por umas duas semanas, era apenas deixar o tempo passar. Assim diziam os pais. Oh, claro, não houveram muitos traumas, pelo que pareceu.

E ali estavam os irmãos, cobrindo o enorme buraco fundo e escuro cavado em suas vidas.

Pararam em frente a uma espécie de mini-supermercado, situada à esquina de uma das ruas mais movimentadas de Odaiba. Um letreiro enorme e chamativo (e demasiado antigo) jazia em cima da porta envidraçada. Matt reconheceu quase que imediatamente; era a loja da família Inoue.

Lembro-me..., pensou ele, era daqui que vinham os bolinhos de arroz e de atum, os sucos de frutas, as geléias. Ah, as geléias!

Os piqueniques comemorativos de 1º de agosto, eles mesmos. Estavam fazendo um bocado de falta por aqueles anos. Era assim que se lembravam da pequena loja de conveniência; esperariam Yolei Inoue abrir a porta de vidro com a mão direita, segurando na outra umas duas, três sacolas de guloseimas, e...

- Bingo! Agora podemos ir, pessoal – gritava, abrindo um largo sorriso.

Iam satisfeitos para o piquenique e voltavam ainda mais satisfeitos. Sempre no memorável Mundo Digital. E fariam o mesmo em poucos minutos, era só esperar a mesma Yolei sair de dentro dali, um pouco mais velha, obviamente. Depois de quantos anos? Cinco, dez? Parecia que o 1º de agosto fora comemorado(ou esquecido?) no pensamento de cada um, na última década. No pensamento e na saudade, mergulhados em lágrimas e risos contidos.

Takeru abriu a porta vagarosamente, estirando o pescoço para dentro da loja.

Não parecia haver ninguém, nem mesmo o sr. Inoue.

- Não está fechada? Talvez.... – disse Yamato.

- Acha que Miyako deixaria a porta aberta para nós? – perguntou TK, com uma risada abafada, olhando para ele.

Fez um sinal com a mão para o irmão entrar junto dele.

Não era um departamento muito grande, mas aconchegante. As estantes de madeira eram espaçadas, recostadas de duas em duas, repletas de doces, sucos enlatados e empacotados, biscoitos, pacotes com os famosos bolinhos de atum, arroz e legumes. O balcão dava de frente para a rua, e por trás deles se via, tempos atrás, um homem alto e esguio relativamente calvo, que usava uns óculos escorregando para o nariz. No entanto, àquela hora a loja estava tão silenciosa que os únicos ruídos eram o leve toque dos sapatos no piso.

Takeru Takaishi examinava cuidadosamente uma lata vermelha de suco de pêssego – um dos seus favoritos – e se agachava ante a estante, como se estivesse verificando se havia uma bomba capaz de massacrar um bocado de gente.

- Talvez já tenha ido....não há mesmo ninguém aqui – disse Matt, aproximando-se da máquina registradora, tão antiga quanto a própria loja, onde o sr. Inoue devia guardar os trocos de 1 yen das crianças que compravam balas puxa-puxa.

- Não creio, Matt – discordou o irmão, recolocando a lata em seu lugar – Por que iria antes? Certamente ela está trazendo as benditas sacolas para o piquenique, é só não....

O barulho de passos descendo apressadamente a escada espiral calou Takeru abruptamente. O corrimão e os degraus de aço enferrujados rangiam graciosamente, parecendo que os parafusos de soltariam a qualquer momento. Miyako esbarrou-se de relance contra o balcão de madeira solta, deixando escapar uma queixa. Ergueu seu rosto fino para os dois rapazes, com um belo sorriso. Yamato e Takeru retribuíram o sorriso, com uma intensidade tão grande que seria capaz de iluminar a noite. O tempo realmente se passara, mas quase nada havia mudado naquele rostinho atrevido. Podiam sentir a essência daquela expressão como se fosse 11 anos atrás, os mesmos óculos gigantes, e talvez até a mesma bandana vermelha que adornava seus cabelos lilás.

- Bem... – começou, com o mesmo sorriso, erguendo duas sacolas na mão esquerda – Prontos para começar o 1º de agosto novamente?

TK foi logo abrindo os braços para acolher a amiga de infância. Podia sentir todo o seu calor aconchegante enquanto acariciava seus sedosos cabelos. Yamato foi logo depois abraçá-la. Eu sinto...sinto um vínculo tão forte que nos une...sinto que os amigos voltarão a ser como eram.

- Oh, mas como estão vocês dois! – exclamou Yolei, segurando no braço de cada um, analisando-os, as sacolas penduradas – Não mudaram quase nada, nem desse chapéu você largou mais, meu querido TK.

Eles riram. Não sabiam bem ao certo porquê, mas os olhos brilhavam.

- Assim você parece a minha mãe....

Era verdade, Takeru nunca mais deixara de usar aquele chapéu branco de infância. De início pensara que esconderia um pouco aquela cabeleira despenteada, mas o costume não o deixou. Pousava o chapeuzinho de pescador na cabeceira de cama e o colocava na cabeça pelas manhãs, todos os dias.

- Vamos, Hawkmon, desça! – gritou para a escada, encostando uma das mãos na boca.

O digimon pássaro tentou voar para baixo, mas acabou caindo desajeitadamente pela escada espiral de ferro. Não demorou a ficar de pé, com a sua pose de costume.

- Olá, Hawkmon – cumprimentaram os irmãos.

- Oi, pessoal, faz tempo que eu não os vejo – sorriu a águia, corando um pouco, acenando com o braço direito.

- Oh, mas é mesmo, onde estão Patamon e Gabumon? – perguntou Miyako.

- Matt, eles não estavam atrás da gente?

O jovem Ishida se dirigiu à porta, com as mãos metidas nos bolsos dos jeans. Abriu-a e olhou para a direita da calçada, protegendo o rosto do sol.

Sorriu tenazmente, apertando os olhos.

- Não se preocupem, estão vindo.

Esperaram uns poucos segundos e Yamato deu passagem aos dois digimons, que entraram ofegantes dentro da pequena loja. Patamon repousava na cabeça de Gabumon (tomando cuidado com o chifre) e mexia as orelhas de morcego inquietamente.

- Foi Gabumon quem se distraiu com as borboletas.... – confessou o pequenino, olhando amigavelmente para o companheiro. TK deu uma gargalhada.

- Hawkmon! – sorriu Gabumon para o amigo, vermelho feito tomate. O outro retribuiu o sorriso aos dois.

- Bom...agora que estamos todos aqui, é melhor nos apressarmos, já estamos atrasados – disse Ishida.

- Sim, sim, vamos. Estou ansiosa para ver os outros! Ken já foi faz um bom tempo.

Miyako os guiou até uma espécie de despensa que ficava do lado esquerdo da loja. Era razoavelmente estreita, com várias estantes no alto da parede, ocupadas por estoques de alimentos. Mas ao lado da porta havia um computador em quase perfeito estado.

- A loja está a mesma coisa. Bem...quase – riu Takeru – E aonde está o seu pai?

- Oh, papai está acordando. Vai abri-la daqui a pouco... apenas deu para avisar que peguei emprestadas algumas coisinhas para um piquenique. Podemos voltar todos aqui depois, tomar um chá... não vivo mais com ele, já sabem – explicou, abaixando-se para ligar a máquina.

- Vocês estão bem, não estão? – perguntou Matt, fitando a amiga.

Yolei ergueu o rosto. Parecia ter mudado a expressão, mas sorriu radiante novamente.

- Claro. Eu e Ken estamos ótimos, papai também. Obrigada, Matt.

Após a memorável aventura de 2002 no Digimundo, em que os digiescolhidos haviam derrotado MaloMiyotismon, o portal nunca mais se fechara. O Mundo Digital se tornara um lugar para os humanos também, livre, e objeto de estudo. Uma nova lei mundial explicitara que era totalmente proibido maltratar os digimons ou apreendê-los ilegalmente, mas foram se criando espécies de grupos que eram contra a isso e tentavam violar a justiça e, vez ou outra, escutavam-se notícias de novos presos por atentado ao Digimundo. O CITD possuía um departamento especial de Proteção Digital e entravam em ação sigilosa e discretamente. Os digimons viraram símbolo mundial, e as crianças os adoravam. Programas de televisão, marcas de roupa e de alimentos os tinham como ferramenta para atrair pessoas, um verdadeiro fenômeno. Durante os meses após a aventura de 2002, uma febre praticamente incurável invadiu o mundo inteiro, e os digiescolhidos viraram heróis. Mas depois de tantos anos, talvez nem se lembrassem que um dia houveram pessoas que salvaram o Digimundo.

Porém, nem todos podiam possuir monstrinhos digitais, com exceção dos próprios digiescolhidos. Receavam que a situação pudesse se descontrolar, e ficara estabelecido que somente pessoas com autorização poderiam criar um digimon. Haviam agentes especiais que tomavam conta dessa parte da história, outros que estudavam sobre digitamas em uma espécie de laboratório e faziam testes, estudavam seu nascimento e fases de evolução. Poucos evoluíam fora de seu ambiente natural, o que era uma pena. Assim que era absolutamente normal haverem pessoas apontando e querendo saber sobre os monstrinhos na rua, por onde Tai e os outros passavam.

Também era necessário uma espécie de documentação para adquirir um digivice. A moda eram os estilos variados do aparelho, e novas formas de uso. Como um aparelho celular. Digiescolhidos dispensavam essas bobagens. Somente com o digivice se poderia entrar no Digimundo. Foram-se criados tipos de estabelecimentos onde se reuniam dezenas de computadores à disposição de "visitantes" que poderiam fazer um passeio – ou seja lá o que fosse – pela exótica paisagem digital. Ou poderiam ir pelo seu próprio computador. Veja, meu bem, lá está um computador, vamos ao Digimundo?

Porém, nem todos enxergavam os digimons realmente como amigos.

- Trouxeram seus digivices, rapazes?

- Oh, sim, claro – respondeu Yamato, rapidamente procurando o seu na mochila pendurada nas costas.

Era o velho modelo da primeira aventura – garanto que não é um novo tipo de celular – , bastante distinto do de Takeru e Miyako. Cabia perfeitamente na palma da mão.

- Vamos por esse computador? – perguntou o menor Takaishi.

- O que acha, cabeça-de-melão?

- Tudo bem, tudo bem... era mesmo pra ver o que você diria, Matt.

Os três riram por um instante.

- Até parece, TK.

- Bem...Yolei...você está levando um bocadinho de guloseimas, han? Meu irmão aqui chegou de viajem e só teve tempo de fazer seus biscoitos especiais.

- Há, há, há! Que tipo de biscoitos são esses, Yamato?

- Hum....são...biscoitos assados. Com chocolate.

- Ótimo! Engordaremos bastante.

Mais gargalhadas. Os três digimons olhavam fixamente para seus companheiros, mas de uma forma tão terna que ninguém notariam que estavam aturdidos. Yamato Ishida virou-se para seu amigo, notando-o.

- Eu sei que você gosta dessas coisas. Eu já preparei vários quando chegávamos exaustos em casa, com a geladeira vazia.

Gabumon sorriu, assentindo com a cabeça.

- Vocês devem estar ansiosos para retornarem à sua terra natal conosco, não? – perguntou Yolei.

- Pode apostar! – exclamou Hawkmon, que parecia algo quieto.

Um toque pesado na porta da loja os interromperam. Patamon saltou de susto, batendo as asinhas rapidamente até o chapéu de Takeru, onde se ajeitou.

- Ora, é algum freguês? – disse o jovem, esticando a cabeça para alcançar o desconhecido.

- Não creio, meu pai não costuma receber fregueses a essa hora.

- Oh, não, é apenas Kari! – avisou TK, saindo da despensa em direção à porta envidraçada.

A menina Kamiya estava encostada à porta do lado de fora, sorrindo amistosamente e acenando com a mão. Trazia uma mochila vermelha pendurada no ombro esquerdo, onde levava sua parte do piquenique. Eram doces folheados de morango e creme, especialidade de sua mãe, que os preparara com muito prazer. A sra. Kamiya fizera um breve curso de culinária a pedido da família; Davis e Mimi fazendo questão de ajudar.

Hikari amadurecera a aparência de forma surpreendente. Seu rostinho angelical se misturara ao de uma mulher adulta e atraente, apesar de seus vinte e três anos. Os cabelos canela tocavam exatamente os ombros e estavam quase sempre presos por fivelas. Seu romance com Takeru Takaishi começara quando estavam iniciando a faculdade (no mesmo local, por sinal); ela recebia certos bilhetes de amor colocados em sua mochila por um garoto míope chamado Kenji, um colega de TK que também seria professor – assim como Kari – , fazendo favor ao rapaz. Não demorara muito em descobrir o admirador secreto.

Takaishi abriu a porta e beijou a moça brevemente.

- Meu amor, pensei que já estivesse no Digimundo.

- Mamãe acabou se atrasando com os doces (queira que tudo estivesse perfeito) e então resolvi passar aqui, para saber se ainda não haviam ido. Pelo jeito acertei!

- Tem razão.... estávamos prontos para a viagem. Olá, Tailmon, como vai?

- Tudo bem, TK! O dia está lindo hoje, não? – disse a digimon, caminhando a dois pés para dentro da loja junto a Kari. Acenou para dentro da despensa, onde os amigos retribuíam o cumprimento efusivamente.

- Pessoal, que bom vê-los! Estava morrendo de saudades! – exclamou Hikari, emocionada.

Abraçou Yolei com força, sorrindo e deixando as covinhas aparecerem. Aliás, Takeru adorava vê-la sorrir, especialmente por causa das covinhas, que ele achava lindo. Depois abraçou Matt, que já o havia visto no dia anterior, na casa de TK.

- Oh, céus, vamos logo ou irei ficar louca! – disse Miyako Inoue – Faz tempo que não vejo alguns dos amigos...oh, Cody, meu querido...

Todos sorriram, procurando seus digivices. Yamato e a amiga Inoue o seguravam, apontando em direção ao monitor. O rapaz suspirou, cerrando os olhos por um fugaz momento.

- Todos prontos? Digiportal, abra! Digiescolhidos, aqui vamos nós! – gritou Inoue, como sempre fazia.

Uma claridade imensa vinda da tela do computador iluminou por um instante a apertada despensa, e alguns segundos depois ninguém mais estava ali dentro.

* * *

A brisa vinda do mar acariciava os longos cabelos de Mimi Tachikawa. Estava descansando ao lado de uma antiga e enorme árvore, apoiando o braço em ângulo reto, observando o oceano.

Todos os digiescolhidos – com exceção dos que estavam na loja – reuniam-se embaixo dessa mesma árvore, que fornecia uma sombra confortavelmente grande. Era uma espécie de penhasco com vista para o horizonte, coberto de grama verde e exuberante, o cheiro fresco do campo. Às vezes alguns digimons voadores apareciam cruzando o firmamento limpo.

- Venha, Mimi, me ajude com a toalha – chamou a melhor amiga Sora, que estava ajoelhada e estendia uma gigantesca toalha xadrez de vermelho e branco sobre o capim.

- Sim, estou indo.

- Hum...não deveríamos estar vendo gente passeando por aqui? – perguntou Cody.

- O Digimundo é um lugar grande demais para as pessoas estarem muito juntas. Além disso, há portais por todo o lugar. – explicou Ken, sentado e com os braços apoiados nos joelhos.

- Ei, é mesmo! Os outros não vão se perder? – lembrou Jyou Kido, interrompendo sua tarefa de arrumar o macarrão que Daisuke trouxera sobre a toalha.

Ninguém respondeu até que Koushiro esclarecesse, sem desviar os olhos de seu laptop amarelo. Não demorara muito desde sua chegada para ele ligá-lo, o que era um fato tão comum que quase ninguém percebeu. Oh, a não ser Mimi, que reclamava que ele não lhe dava atenção como um namorado.

- Ah, mas esse Izzy! Está me traindo com esse computador! – queixara-se, indo se acalmar olhando para o mar.

Era o típico romance de os opostos de atraem. Todos apostavam que daria certo, mesmo com todas as diferenças, pois seu amor havia sido escondido durante muito tempo. Mimi tinha as suas crises de ciúmes por causa do laptop, mas no fim sempre terminava de bem com Izzy.

Izumi desviou os olhos para os outros e disse:

- Não se preocupem, eles não vão se perder. Ali embaixo é aonde ficam as cabines telefônicas, lembram-se? Só espero que o portal não os mande para um lugar mais longe....

- Ei, Izzy, largue um pouco esse maldito computador pelo menos uma vez na vida! – gritou Daisuke, divertido, enquanto jogava futebol com Veemon. O monstrinho não se dava muito bem com bolas de couro – como aquela – e ficava indignado a cada drible de seu companheiro.

Koushiro sorriu, suspirando, voltando a olhar para a tela do seu querido tesouro.

- Me desculpe, você tem razão. Desculpe – disse, desligando a máquina e fechando-a – Vamos aproveitar o dia. Afinal, é graças a você que estamos aqui, amigo.

- Bah, que nada. Algum de vocês, mas cedo ou mais tarde iria querer fazer um encontro desses. Apenas fui um pouquinho mais rápido. – respondeu, dando uma cabeçada na bola, fazendo Veemon correr atrás.

- Aliás, Izzy... você ainda não disse porquê o sr. Tento não veio com você.

- Ah, Ken... não sei o que ele tem. Tentomon me disse que estava muito indisposto. Mas não entendi, antes parecia tão ansioso por causa desse piquenique. Não entendo, de verdade!

- Que estranho....Agumon também não veio por causa disso. Mas já estava esquisito desde ontem - comentou Taichi, que até então permanecera quieto, debaixo da árvore.

- O que será que deu neles? Ainda mais Agumon, guloso do jeito que é - disse Sora, aproximando-se do melhor amigo - Não estavam abatidos?

- Tentomon parecia...frio. - respondeu Koushiro, levantando-se do chão. Olhava para Tai, esperando a mesma resposta.

- Agumon também. - disse, depois olhando para o chão.

O resto do grupo permaneceu calado, internados em suas próprias suposições. Ora, não devia ser grande coisa. Não precisavam dar tanta importância.

- Bem....mandamos lembranças para os dois - disse, por fim, Armadillomon, sorrindo amavelmente.

E encerrou o assunto.

Koushiro Izumi caminhou até a beira do penhasco, com o laptop debaixo do braço. Olhou cauteloso para baixo, sentindo um calafrio percorrer sua espinha. Sentou-se cuidadosamente, as pernas cruzadas, e olhou momentaneamente para o mar. Milhares de lembranças tomaram sua mente no ato. Lembranças que o enchiam de conforto e que estavam se transformando no presente. Seus olhos se encheram de lágrimas, enquanto ele continuava sorrindo sem perceber. Não era muito sentimental, mas quando se encontrava sozinho não sentia receio de nada.

Desviou o olhar para a tela negra do computador e bufou. Era enormemente agradável estar novamente com os amigos de infância, mas a ansiedade e curiosidade em saber mais sobre a estranha medalha eram mais fortes. Procuraria o máximo de informações para poder tranqüilizar-se um pouco, aproveitar aquele raro dia e deixar de se preocupar um pouco com o seu amigo digital.

Taichi Kamiya queria se afastar um pouco dali. Por um momento, e só. Eram tantos pensamentos que invadiam sua mente que pareciam querer deixá-lo louco; muitos acontecimentos em pouco tempo. Respirava profundamente e fechava os olhos, procurando ficar tranqüilo.

Levantou-se de debaixo da árvore e se encaminhou lentamente para a beira do penhasco. Avistou Koushiro do outro lado, teclando sem parar em seu computador portátil. Parecia tão intrigado...Tai se deitou na grama fresca e cruzou os braços por trás da cabeça. O céu nunca esteve tão limpo, ao menos em suas recordações. As nuvens pareciam dançar em câmera lenta em meio a imensidão daquele brilho.

Sora Takenouchi aproximou-se do melhor amigo. Taichi girou os olhos até ela e sorriu com ternura. Passasse o tempo que fosse, a moça jamais deixaria de ter aquele olhar.

Deitou-se ali ao lado dele e suspirou, olhando para o céu.

- Em que está pensando, Tai?

- Eu...bem...estava pensando em você - respondeu, virando o rosto para fitá-la. Seu jeito brincalhão de falar não a intimidaria, e era isso que encantava todos à sua volta. Taichi Kamiya podia ter crescido, mas seria sempre desse jeito... como sua amiga de infância não mudaria. E era assim que devia ser.

- Em mim? - Sora riu por um momento e parou, voltando a contemplar as nuvens - Me desculpe, Tai. Já faz tanto tempo que não nos reuníamos....está parecendo tão normal pra mim. Ora, mas por que não estaria?

- Talvez porque estejamos adultos.

- Sim, acho que tem razão - disse Sora - Mas é como se voltássemos a ser crianças. A magia não se esfumou... e é disso que precisamos - ergueu-se subitamente, se sentando com as mãos apoiadas no solo.

- Sim....é disso que precisamos.

Kamiya se sentou também, cabeça pendida para trás, ainda olhando para cima. Os dois permaneceram em silêncio por uns instantes.

- Eu pensava em você, Sora. Estava com saudades.

Ela o encarou com um sorriso tímido. O rapaz a olhava inquietamente nos olhos; os dele trêmulos, brilhantes.

Você ainda a ama, não é?

Não sei se continua do mesmo jeito...

- Eu também senti muitas saudades - disse a amiga, o abraçando. Fazia falta um abraço de amigo, oh, sim, como fazia. Sabia que Tai tinha sentia algo mais por ela, mas suas dúvidas persistiam. Não queria de maneira alguma magoar o rapaz, ainda mais por terem sido criados praticamente juntos. Claro que não queria!

Se separaram depois de um tempo. Sora estava sorrindo com doçura, enquanto Taichi passava a língua nos lábios e mostrava aquele riso travesso.

- Bem... é só não sumir tanto.

- Ora, Tai! Todos nós sumimos!

- OK, OK... - virou-se para trás, girando o corpo no chão - Mas será que as aventuras poderiam nos unir novamente? Acho que Matt disse algo.... fazem uns bons anos que não acontece nada.

Sora sentiu um baque no peito. Não acontecia nada...era estranho, mas realmente não acontecia nada. Eles estavam no Digimundo apenas para fazer um reencontro, não para....para o quê mesmo? Combater o mal.

Deu uma olhada para a direção onde Taichi estava virado. Piyomon e Palmon pareciam conversar animadamente, andando de um lado para o outro. Era um piquenique, não uma aventura.

- Ainda bem que não acontece nada... - murmurou Takenouchi.

- Ah...! Veja, Sora, eles chegaram - sorriu o jovem, apontando para os quatro que vinham caminhando.

Takeru, Miyako, Yamato e Hikari chegavam do mundo real - atrasados - , carregando sua parte do piquenique comemorativo. Já não era tempo. Sora sentia seu coração bater tão rápido... e sorriu calorosamente.

- Vamos, Tai - chamou, levantando-se e ajudando-o a ficar de pé, puxando sua mão.

- Vamos.

Kamiya seguiu caminhando lentamente atrás dela. Esboçou um lamentável sorriso em sua boca, observando a amiga. Sora estava confusa em sua mente e era terrivelmente difícil conseguir decifrar os próprios sentimentos. Mas Tai sabia de uma verdade que talvez ela mesma desconhecia.

***

Os raios fortes de sol apareciam entre uma folha e outra daquela gigantesca árvore que abrigava os doze amigos na sombra.

Os "petiscos" estavam espalhados sobre a toalha estendida na grama, e todos lanchavam e conversavam com muita energia. As novidades acumuladas durante o tempo eram contadas fervorosamente, passando por aquele círculo em volta da toalha.

- Veja só, Yolei... - começou Yamato Ishida, passando geléia de ameixa na torrada - Dizendo que eu não mudei nada, han? Até parece que não nos vemos há mais de dez anos.

- Ho, ho, ho, ho, eu sou mesmo assim, né? Não importa, é tempo demais do mesmo jeito, e você bem que poderia aparecer careca e de bigode.

Risadas no círculo.

- Bem, pessoal... - disse Davis, enxugando as lágrimas com o dorso da mão - Como eu sou, digamos, o responsável por isso aqui, eu...bem, eu gostaria de lembrar algumas coisas, sacam? Sei lá... as nossas aventuras...eu e Veemon aqui! - e deu um cascudo carinhoso na cabeça do digimon.

Os rostos em volta começavam a parecer melancólicos. As recordações formavam uma esfera ali, no centro do piquenique, prontas para gritarem a qualquer momento.

- Não sei se quero recordar... - disse Ken Ichijouji, abaixando a cabeça.

- Mas por que não, Ken? Não é sobre....sobre aqueles tempos. - agregou Joe.

- Não se trata só disso... não quero lembrar também as coisas boas que vivemos juntos...aqui. As saudades são muitas. E garanto que poderia virar uma choradeira.

- Há, há, há, há, tem razão! Mimi ia inundar isso aqui!

- Taichi! - a moça olhou furiosamente para ele, fazendo-se de indignada - Não tem graça...eu sou sensível...

- Muito sensível - murmurou Daisuke entre os dentes, mas o suficiente para Mimi ouvir e atirar um copo plástico em sua cabeça.

Todos gargalharam. Davis acariciava a testa ( que já tinha uma mancha vermelha ) e franzia a testa, mas estava se divertindo.

- Bom... e se nós dermos uma volta por aí? - sugeriu Cody.

Um breve silêncio reinou.

- Por mim, tudo bem. A gente pode passear pelo lugar que mais gosta... não sei. Vocês não sentem aquela magia da infância? Não parecemos crianças de novo? - perguntou Sora.

Eles assentiram; alguns sorriam, outros pareciam estranhamente sérios. Jyou Kido empurrava os óculos para o nariz.

- Há tanto tempo eu não me sentia assim.... - começou Matt - Quando nos tornamos adultos, temos muitas coisas com o que se preocupar. E aqui é como se estivéssemos....livres, talvez seja a palavra certa. Nos sentimos sem responsabilidades. O peso de... heróis... parece ter sumido.

- E desta vez nenhuma aventura nos uniu. O que vai acontecer? Aparecer uma de repente e nos fazer recomeçar nossa odisséia? - disse TK.

Koushiro suspirou nervosamente, pressionando os dedos contra o computador pousado ao seu lado. Olhou discretamente para Ken, depois para Tai. A medalha. Aquela maldita medalha acabaria deixando-o louco! Por que o intrigava tanto? Por que tinha tanto interesse nessa história estúpida? Não, deveria parar de pensar nisso e relaxar. Mas não conseguia! Não sabia porquê, mas era incapaz. Afinal, ele nada tinha a ver com isso. Porém, o CITD queria...

- Eu sei, Izzy. Você pensou na medalha, não foi? Até quanto você sabe sobre isso? - perguntou Ken, reparando a inquietude do amigo.

- Medalha? Do que estão falando? - quis saber Davis Motomiya, curiosíssimo, esquecendo o dia em que ouviram a notícia no restaurante.

Se calaram por um instante. Os demais olhavam de Ken para Izzy e de Izzy para Ken. Koushiro apertou os olhos e bufou, parecendo voltar ao normal.

- O que há, Izumi?

- É apenas uma medalha, Daisuke. Uma medalha que foi descoberta na Grécia, feita de ouro e com doze pedras de cristal. - respondeu firmemente.

- Na Grécia? Mas... esse tipo de relíquia não existe por lá, existe? - perguntou Yamato, duvidoso.

- Ééé... eu vi algo assim no jornal vespertino de ontem. - comentou Mimi. Hikari estremeceu.

- Sim, exatamente. Esse objeto não veio da Grécia, tenho quase certeza. Mas foi encontrado lá...estranho. Mas o mais entranho é que...até agora só conhecem a metade dessa medalha. A outra não foi achada. - disse Izzy, tocando o dedo no queixo.

Os outros de calaram, olhando fixamente para ele, mas sem muita surpresa. Kari também o fitava, mas parecia pensar em algo completamente diferente daquilo.

- É mesmo esquisito.... - murmurou Takeru Takaishi, erguendo as sobrancelhas.

- E o CITD está bastante interessado nessa medalha - completou Tai.

- Ahhh.... por isso você está assim.

- É... é p-por isso que estou assim. Mas não... não se preocupem - terminou Koushiro.

Ficaram quietos por uns instantes, querendo dizer alguma coisa, analisando os rostos de cada um, girando os olhos para o céu. Yamato interrompeu o silêncio, levantando-se.

- Her, bem, eu...vou dar uma volta - e se dirigiu a Sora e Taichi - Vocês vêm comigo?

Se entreolharam rapidamente, antes de Sora dizer:

- Claro.

- Vamos, caras.

- Vamos ficar aqui e decidir aonde vamos. Também quero passear. - disse Miyako, enquanto Matt ajudava Sora a se levantar.

- Nós três vamos andar. Nos encontramos mais tarde, pessoal. - finalizou Taichi, sem se afastar dali antes de enfiar dois bolinhos no bolso da calça.

Os outros 9 permaneceram em seus lugares, em um estranho silêncio. Hikari Kamiya estava quieta, observando ao redor como se fosse a primeira vez que tivesse visto.

- Bem...ninguém se manifesta? - perguntou Yolei - Vamos fazer alguma coisa também! Cody, quer andar comigo?

- Claro, Yolei. Vamos. - respondeu o mais novo de todos, levantando-se educadamente.

- Bingo! Estamos indo, então... vocês aí, divirtam-se. Kenzinho, não quer vir também?

- Não, querida, vá na frente....depois eu alcanço.

Ficaram todos calados novamente após os dois se afastarem, até Davis quebrar o silêncio:

- Ei, me esperem, também quero ir! - gritou, ficando-se de pé desajeitadamente para alcançar os amigos que já desciam pelo penhasco, enquanto Veemon corria na frente.

- Venha, Kari, vamos andar também. - virou-se TK, segurando a mão de sua namorada delicadamente.

- Posso ir com vocês?

- Claro, Joe. - respondeu a moça, oferecendo um amistoso sorriso, mas ainda perturbada por algum motivo.

Restaram Koushiro, Mimi e Ken sentados em frente à toalha, e seus digimons - menos Tentomon - olhando para a comida que sobrara do piquenique.

- O que vamos fazer? - perguntou Wormmon.

- Venha, Wormmon... acho que é melhor deixá-los sozinhos um pouco - sussurrou Palmon para o digimon, e os dois caminharam discretamente para o lado.

Mimi Tachikawa acariciava os cabelos de um Koushiro aflito, mas que queria a qualquer custo manter a serenidade. Ken o fitava de modo penetrante, querendo descobrir o que se passava em sua mente.

- Vamos, meu bem, o que há? Está sério....

- Perdoe-me, Mimi... - murmurou, virando seu rosto até ela - Não há nada de mais. Não se preocupe, está bem?

Beijou os lábios da moça fugazmente. Não perdera sua timidez, e beijá-la na frente do amigo o fazia ficar vermelho.

- Sua preocupação tem algo a ver conosco?

Ichijouji o olhava com seriedade.

- Diga, Izzy, o que tem essa maldita medalha? Eu não entendi direito! É algo tão complexo assim? - se queixou a namorada.

- Sim, Izumi...não há razão para ficar desse jeito.

- Isso tudo pra mim é muito estranho... - começou o jovem gênio - Onde está a outra metade da medalha? Por que o CITD está tão interessado? Percebe, Ken? Nem mesmo nós sabemos...

- Talvez não seja da nossa conta, e você está ultrapassando os limites. Lembre-se que o pai de Sora e o irmão de Joe não são os responsáveis por isso. Eles não comandam o CITD.

Mimi ouvia a conversa, confusa.

- Eu sei... - suspirou Koushiro - E esse encontro, o passado voltou...

- Está maluco? Como assim o passado voltou? Estamos apenas nos reencontrando, Izzy!

- E se não for para sempre? Só nos víamos quando surgia algo importante sobre o Digimundo, Mimi...e isso faz tanto tempo. Parece que fomos...chamados até aqui.

- Ai, ai, ai, eu não estou gostando disso - disse Ken, levantando-se desgostoso.

Koushiro continuava olhando para o chão, respirando devagar. Ken caminhava até a árvore atrás deles, pensativo.

- Deixe de bobagem, Izzy - finalizou Mimi Tachikawa, segurando o braço do rapaz - Vamos, vamos subir na árvore.

- Subir na árvore?!

- É, isso mesmo. Comer frutas, olhar a paisagem. Anda! - e saiu arrastando Izzy. O rapaz esqueceu quase que imediatamente as suas suposições.

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Daisuke, Iori e Miyako estavam na beira de um riacho que corria em direção à uma floresta, de uma mata de cor verde intensa. Yolei e Cody fingiam estar lutando kendo, e o outro amigo parecia fazer uma brincadeira com os digimons.

- Iááá, cuidado, Cody! - gritou a moça, com o verdadeiro espírito de criança, dando um golpe no ar.

- Não se preocupe, sou bom nisso.

Os dois pararam com a agitação e tentaram respirar devagar. Yolei Ichijouji enxugava o suor da testa com a mão, enquanto sentava em uma pedra.

- Irmãozinho, eu estava com saudades...

- Irmãozinho? - perguntou o mais novo, surpreso - Faz tempo que ninguém me chama assim.

- Não quer nenhuma ajuda com o seu computador?

Se olharam por um momento e caíram na risada. Por um segundo Yolei não cai da pedra.

- Eu prefiro que você vá lá em casa tomar chá.

- Ai, ai....sim, eu sei, meu querido. Ken me disse que vocês se encontraram.

- É verdade, me deu uma carona.

- Tenha certeza de que vamos aparecer lá! Quero conversar com o senhor avô Hida. - disse Miyako.

- Senhor avô Hida? - perguntou Davis, deitado no chão com os digimon pulando em cima dele- Que ridículo, Yolei.

A moça fez cara de furiosa e fingiu partir em cima dele, com um golpe de kendo em uma vara invisível.

- Há, há, há, há....brincadeira! - gritou Motomiya, tentando esconder o rosto, porém Veemon e Armadillomon pulavam ainda mais.

- Ahh, bem, Davis...e a sua irmã? Está bem? - perguntou, voltando a se sentar na pedra.

- Sim, ela está bem. Estou livre dela, afinal, agora é cineasta e não mora em casa.

- Pare de brincar, eu sei que vocês não brigam mais. Aliás, já era hora.

- E você, Yolei, por que não trabalha? - quis saber Iori, olhando para o céu.

- Tranquei a faculdade de engenharia, assim me casei com Ken.

- Boba, não devia ter feito isso! - disse Daisuke - Vocês se casaram muito jovens, poderiam esperar só um pouco mais, oras.

Miyako virou o olhar contraído até ele e fingiu disparar uma arma com os dedos polegar e indicador, enquanto Davis "morria".

- Estão parecendo crianças...

- Mas é isso o que somos, Cody! Crianças, e sempre seremos. E é por isso que estamos aqui...

- Eu vou correr até o riacho! - gritou Yolei, indo disparada até a água para dar um salto.

- Céus, ela nunca vai mudar - riu o menor de todos, entretido, observando a amiga totalmente encharcada e pensando na reação dos demais ao vê-la naquele estado.

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Takeru repousava sua cabeça confortavelmente nas pernas de Kari. Os dois estavam descansando debaixo de uma árvore que os cobria de sombras. Jyou Kido não parava de falar de sua vida profissional; o rapaz estava fascinado pela medicina e havia encontrado seu lugar provisório no principal hospital da cidade.

Hikari acariciava calmamente os cabelos loiros de TK. O rapaz sorria com os olhos cerrados, naquele ambiente maravilhoso. Nem a voz de Joe conseguia tirá-lo daquela paz. E era sempre assim que ele se sentia quando estava ao lado dela, iluminado pelo seu amor.

- ... Mas acho que vou conseguir, afinal, eu nunca me imaginaria sendo médico, acho que seria capaz de desmaiar só de ver sangue e essas coisas de cirurgia.

- Imagine, Joe, nós sempre apostamos que seria médico. E cuidaria dos digimons - disse Hikari Kamiya.

- Tem razão... creio que precisaria praticar mais. Ora essa, nunca pensei ter saudades de hospitais!

- Ótimo, cara, então quebre logo a minha perna pra você engessar depois - brincou Takeru, abrindo um dos olhos.

Risadinhas abafadas por parte dos três. Estavam sentados em frente à Cidade do Princípio, onde vários digitamas aguardavam serem chocados. Havia de todas as cores. TK se sentia atraído por aquele lugar, sempre gostara de digimons bebês. Patamon voava de berço em berço para observar os ovos; Tailmon lustrava seu anel mágico, e Gomamon comia um fruto de uma árvore, andando pela cidade. Fora um tanto ruim separá-los de seu habitat e depois voltar após um longo tempo.

Os três amigos mantiveram silêncio. Jyou se remoía por dentro, querendo desviar seus pensamentos, apertando o lábio inferior. Queria fazer muitas perguntas, mas não achava que fosse o momento mais adequado.

- Hum...Kari...me desculpe, não queria falar sobre isso, mas...eu ainda não entendi a sua reação no restaurante de Daisuke, sobre aquele medalhão....o mesmo de que Izzy falou hoje. É confusão demais pra minha cabeça.

- O que houve com você, Kari? - perguntou TK no mesmo instante, levantando a cabeça - O que aconteceu no restaurante?

A moça fechou os olhos e deu um longo suspiro.

- Eu pedi para o Davis aumentar o volume da TV, e estava passando a notícia sobre a medalha de que Koushiro falou, TK. Foi isso - respondeu, assustada, olhando para o chão.

- Mas Hikari... você falou alguma coisa depois, não me lembro. Parecia hipnotizada! Além do mais, como sabia que ia passar a notícia? - perguntou o míope.

- Não sei, não sei! Só senti... - tornou a fechar os olhos; odiava ter que falar dessas coisas - Perdoem-me, mas vamos mudar de assunto?

Takeru a fitou docemente, acariciando seu rosto.

- Faz muito tempo que você não fica envolta por esse encanto, não é, minha Kari?

Ela sorriu um pouco triste, assentindo.

- Oh, céus, odeio segurar vela - disse Jyou Kido, brincando.

Os amigos riram, dando tempo para TK acertar um fruto na cabeça do rapaz.

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Taichi, Sora e Yamato pararam em um enorme estádio de futebol antigo que jazia no Mundo Digital. Lembravam-se da primeira vez que foram para lá, quando Greymon fez a digievolução maldita e Kido encontrou o seu brasão da Confiança. Mas desta vez não haveria nenhum SkullGreymon para tornar a cena drástica.

- Que maravilha, vamos jogar futebol! - encantou-se Piyomon, correndo em direção ao campo.

- Já vamos, Piyomon! Ah, e onde está Gabumon? - perguntou Sora.

- Ele me disse que ia atrás de Patamon. Precisa falar com ele - respondeu Yamato, erguendo uma sobrancelha - Não sei o que é.

Desceram a arquibancada quase em ruínas até o último degrau. Tai virou o rosto até a tela gigante em cima do gol e a imagem de Agumon correu por sua mente. Um arrepio.

Matt sentou-se com os braços segurando as pernas e ficou observando a digimon chutar desajeitadamente uma bola de couro barrenta. Seria a mesma de 14 anos atrás? Não sabia. Mas tinha quase certeza de que estavam 14 anos atrás.

- Acho que vou matar as saudades um pouquinho - riu Taichi, com um sorriso malandro, indo em direção à Piyomon.

Sora sentou-se ao lado de Ishida e acenou para os dois jogadores. O melhor amigo a olhou por um instante e sorriu, depois abaixando a cabeça. Começou a fazer embaixadinhas.

- Vamos ver no que isso vai dar - murmurou para Matt.

Ele assentiu. Olhou pra Sora de lado, e logo voltou a observar o campo. Não...ele não podia estar há 14 anos. Ela não o deixava assim há muito tempo. Sim, a amava. Descobrira naquele instante que seus sentimentos não mudaram... Esperava voltar transformado, pensando que o tempo, o terrível tempo pudesse ter apagado as lembranças e o amor. Porém se enganara; tudo apenas servira para descobrir que seu coração ardia de vontade de vê-la.

Mas, e Sora? Como o tempo agiu sobre ela? Não queria pensar, não queria relembrar... não sabia o que ela realmente queria. Sora parecia se deixar levar, sem tocar no passado, apenas querendo pensar que ninguém a amava. Tai a amava?

(Não sei se continua do mesmo jeito)

Era difícil responder. Ao menos sabia que ainda a amava como uma irmã. Mas todos estando de volta a se reencontrar, talvez pensasse que Sora provocou a mesma coisa em Tai. Como provocou nele.

- Eu não sabia que tinha o sonho de voar, Matt.

O rapaz virou o rosto para ela, um pouco atordoado, acordado subitamente de um sonho.

- O que disse, Sora?

- Você quer voar - riu a moça - Para o espaço...

- Ah, sim - sorriu o dono da Amizade, abaixando a cabeça - Bem, eu... também não pensava em ser astronauta. Acho que foi um pouco culpa do destino...mas voar por enquanto é um sonho distante...

- Mas eu sei que chegará aonde quer - disse, olhando para o céu - Mas tome cuidado.

- Eu sei, é perigoso viajar para além da Terra, Sora... pode acontecer alguma coisa, de repente - fitou-a, fazendo uma pausa - A não ser que tenha alguém aqui que torça por nós...

Takenouchi o olhou com um brilho nos olhos. Depois de um instante sorriu calorosamente, de uma maneira tão peculiar que deixava o amigo tranqüilo; ele retribuiu o sorriso.

Taichi Kamiya vinha ofegante até eles, com a bola segura nas mãos.

- Pegue, Yamato! - gritou, atirando-a para ele. Por pouco não acontece um acidente...

- Ei, isto aqui está sujo, não? - disse o amigo, apalpando a bola coberta de terra e lama.

- Um pouco.... acho que Piyomon daria uma ótima goleira - replicou Tai, indicando a digimon com o polegar. Ela vinha atrás dele quase se desfalecendo por causa da correria.

Eles riram por um momento, sem perceberem que Patamon vinha voando apressadamente até eles. Sora se deu conta de sua preocupação e decidiu perguntar:

- O que houve, Patamon? Aconteceu alguma coisa?

Ele pairou no ar diante dos quatro e respirou agitadamente antes de recuperar o fôlego.

- Matt, é o Gabumon! Passou por nós na Cidade do Princípio e...sumiu! Estava muito estranho!

- O quê?!

Continua...

N.A.: Aproveitando a dica da GreenAngel....Bem, e então? Ficou um pouco grande, né? Mas foi necessário...Ia ficar maior, mas então resolvi "cortar". As coisas estão ficando evidentes... não percam o próximo cap., acho que vai demorar um pouco pra chegar, mas não desistam de ler, por favor. E deixem reviews!!

Manu