- Capítulo seis -

Um convidado inesperado

Por Manu

"Velho amigo, o que procura?

De volta, após tantos anos distante,

Com imagens que teceu

Sob céus estrangeiros,

Muito além da sua terra natal. "

-- George Seferis

Sentou-se no chão, sobressaltado. De olhos arregalados pelo susto, tateou pelos cobertores à procura de algo.

- Ahhh...Daisuke....o que houve? - murmurou Yamato com a voz cansada, depois de ter acordado com o barulho. Levantou a cabeça do travesseiro, esforçando-se para enxergar com mais clareza.

Taichi e Cody dormiam nos dois sofás da sala, enquanto Davis e Matt, no chão. Sora, Mimi e Kari estavam no quarto de hóspedes, próximo à cozinha. No andar de cima estavam dormindo Yolei e Ken; Izzy, TK e Joe na sala de televisão.

- Não ouviu nenhum barulho, Matt?

- Só se for os seus roncos... - disse o rapaz, sentando-se e esfregando os olhos - O que você está procurando, afinal?

- A lanterna que eu havia deixado aqui....estava aqui!

Tai se remexeu no sofá e virou-se para os amigos, com a cara mais preguiçosa que podia fazer.

- Ei, caras, devem ser quatro da madruga.... será que poderiam me deixar dormir?

- Espere até eu achar a maldita lanterna... - sussurrou o chef, vendo que Matt apontava para Iori, que devia estar em seu décimo sono.

Taichi bocejou e sentou-se lentamente no sofá, enquanto Daisuke se levantava e olhava por todos os lados do chão.

- Pensei que você estivesse no banheiro, recebendo um sinal.

- Não é hora para piadinhas, Tai. - retrucou ele, abaixando-se e pegando a lanterna, que provavelmente caíra da mesa.

- Pra quê a lanterna? - perguntou Yamato Ishida.

- Questão de precaução... - respondeu, observando para ver se não havia causado algum dano - E eu ouvi um barulho. Sei que ouvi.

Os melhores amigos se entreolharam, não entendendo muita coisa. A casa continuava silenciosa...sombriamente silenciosa.

A porta da cozinha foi aberta com um ruído incômodo e Sora Takenouchi apareceu, segurando um copo com água.

- Vocês estão acordados?

- Oh, Sora, não sabíamos que estava aí... - disse Tai, depois virando-se para Motomiya - Não está vendo, Davis? Era apenas Sora... agora vê se sossega.

- Você está bem? - perguntou Matt à moça, com notável preocupação.

Ela sorriu, caminhando lentamente até a mesa de onde a lanterna caíra.

- Sim, apenas perdi o sono e vim tomar um copo de água...mas... vocês não ouviram alguma coisa, ouviram? - perguntou, hesitante, olhando curiosa para a janela que dava ao jardim.

- Ahááa! - exclamou Daisuke, apontando para cima - Viram? Não estou louco. Ouvi mesmo um barulho esquisito....

- Quer falar mais baixo? Vai acabar acordando o pobre Cody com as suas infâmias - repreendeu-o Tai.

- Eu o quê?

Todos olharam surpresos para o jovem digiescolhido, que continuava em "seu" sofá, com os braços atrás da cabeça, olhando tontamente para os quatro presentes.

- Ah, quer dizer que você estava acordado, han? - disse Davis.

- Ouvi vocês falando... o que estão fazendo?

- Eu também gostaria de saber.... - riu Sora, entretida com aquela cena.

- Davis nos acordou... sem querer, é claro. Ouviu um barulho e pôs-se a procurar essa lanterna bendita - explicou Yamato, ficando de pé.

- Eu acho que o ruído veio lá de fora, amigos - avisou Sora, um pouco assustada.

Eles fizeram silêncio, cada qual prestando atenção à todos os sons que pudessem ouvir. O vento se chocando com as folhas do jardim davam um certo ar amedrontador. De repente, um chiado. Vindo de lá, do jardim. Todos ficaram estáticos ao mesmo tempo, esperando acontecer mais alguma coisa.

Nada...

- Esperem um pouco.. - disse Cody Hida, levantando-se apressadamente e indo em direção à janela.

Abriu-a e espiou para fora, tentando enxergar algo fora do comum, observando as árvores, enquanto os outros o assistiam.

- Iori...

O jovenzinho franziu a testa curiosamente e seu olhar se fixou em algum ponto da grama do jardim. Fazia alguns gestos para os amigos...

- Ei, vejam... ali - apontou discretamente - O que é aquilo?

Os demais se aglomeraram em volta da janela rapidamente, arranjando espaço para poder ver afora.

Exatamente no chão, próximo à árvore, algo brilhava majestosamente, como uma estrela caída do céu. No momento não estava emitindo som algum, e os seus pequeno raios brancos se movimentavam em círculo.

- Oh, céus, fomos invadidos por extraterrestres!

- Não seja ridículo, Taichi - disse Matt, olhando fixamente para a coisa do jardim.

- Quero ver você não acreditar em mim quando for ao espaço...

- Quietos, rapazes - pediu Sora, calmamente - Será que foi aquilo que fez o barulho?

Davis Motomiya ergueu sua lanterna acima de todas aquelas cabeças e a ligou em direção ao raios brancos. A coisa parecia ter se mexido por um momento e emitiu um chiado rouco.

- Desligue isso, vamos! - disse Cody, quase arrancando a lanterna das mãos do rapaz.

Daisuke desligou, e todos se calaram. Os raios se intensificaram, fazendo parecer que a coisa aumentava de tamanho.

- Ah, um sinal!

- Um sinal, Davis?

- Sim, o que Ken disse ontem à noite! Esperamos um aviso....ah, eu sabia que deveria ter dormido no jardim....

- Eu acho melhor você ir acordar os outros - disse Sora, observando que o estranho ser ganhava mais cores em seus raios.

Davis assentiu e saiu em disparada para a escada que dava para o segundo andar, ainda com a lanterna na mão. Os fortes ruídos da escada (parecia que a casa estava caindo) já seriam suficientes para acordar todos...

Ao entrar na sala de TV, Izzy, Takeru e Jyou dormiam no chão, brigando pelo único colchonete sobrevivente. Entretanto, estabanado como era, Daisuke acabou tropeçando no laptop de Koushiro e caindo em cima dos três.

- Aaahhh, mas o que é isso?! - gritou o gênio, com o coração na boca pelo susto.

- Acordem, pessoal, vocês precisam ver o que tem lá no jardim! - explicou, ligando a lanterna e iluminando os rostos recém-acordados dos amigos.

- Davis, caso você não saiba, existe uma coisa chamada energia elétrica - ironizou Joe Kido, tapando os olhos com a mão ao mesmo tempo em que procurava seus óculos.

Daisuke desligou a lanterna nervosamente, enquanto TK se levantava com esforço e acendia a luz. A porta do quarto à frente foi aberta e Miyako Ichijouji saiu, parecendo preocupada.

- O que foi isso? Uma manada de elefantes na minha casa?

- Não, era eu subindo as escadas....

- Perdoe o pobrezinho, Yolei querida, mas ele caiu em cima da gente também... - disse Joe, empurrando os óculos para o nariz.

- O que está havendo, afinal?! - perguntou a moça, totalmente confusa.

Daisuke levantou-se e aproximou-se dela, com seus olhos castanhos a todo brilho.

- Temos um sinal no seu jardim, Miyako... uma coisa realmente esquisita.

Yolei o fitou, aturdida, imaginando que o rapaz perdera um parafuso. Os outros três se dedicaram a observar a cena... ele só podia estar sonâmbulo, ou algo do tipo...

- O que estão fazendo aqui? - perguntou Ken, acanhado atrás da porta, os olhos fechando de sono.

- Ken, meu amigo, vamos descer lá embaixo e verá do que estou falando - disse Davis, dando um tapinha nas costas dele e começando a descer as escadas.

- Mas o que...

Os demais deram de ombros e o seguiram, não restando outra alternativa.

A sala estava vazia, a não ser pelas "camas" desarrumadas. O grupo saiu pela porta principal (que estava aberta) e deram com Tai, Matt, Cody, Sora, Mimi e Hikari em silêncio, observando o ser pousado no jardim. Parecia maior do que antes e tinha as cores do arco-íris... estavam encantados ante aquela beleza.

- Isso me lembra a aurora boreal... e o primeiro dia em que fomos ao Digimundo.. - murmurou Mimi, nostálgica.

- O que fizeram?! - perguntou Ken, levando um susto ao ver aquela coisa.

- Aí está o nosso sinal... - disse Motomiya, sentindo-se ótimo, tendo certeza absoluta do que dizia.

- Credo, o que é isso? - perguntou Takeru Takaishi.

Ninguém soube responder. Ficaram calados, continuando a observar as luzes, enquanto Koushiro ajeitava o seu inseparável laptop embaixo do braço.

- Vamos ver.... - murmurou Tai, tomando a iniciativa e aproximando-se do ser.

- Tenha cuidado... - disse a irmã, hesitante.

Taichi agachou-se ao lado daquela luz e a analisou por mais ângulos, não achando nada de mais perigoso. Não parecia possuir receio algum, e a tocou levemente.

O rapaz caiu para trás, e todos os presentes engoliram o grito. As luzes se intensificaram de um modo incrível que quase os cegou, quando o ser começou a mudar de forma e a aumentar de tamanho.

Finalmente a luz colorida se foi por completo e todos puderam enxergar com mais clareza. Sorrisos nervosos se abriram em alguns rostos, enquanto outros digiescolhidos olhavam perplexos para o que acabara de aparecer.

- Sr. Gennai?! - exclamou Taichi, incrédulo.

As luzes haviam desaparecido para dar lugar a um senhor calvo de olhos apertados, estatura baixa e a um carisma que todos conhecem. Depois de tantos anos os escolhidos voltavam a ver o velhinho que por tantas vezes os ajudou.

- É mesmo o senhor... - sussurrou Sora, estática e frente a ele.

- Esperem aí... tanto drama e era só o sr. Gennai?! - indignou-se Daisuke, cruzando os braços.

- Dai, cala essa boca - disse Yolei entre os dentes, pisando discretamente em seu pé.

- Ai, ai, ai... está bem... mas eu pensei que o senhor fosse mais jovem...

O homenzinho aproximou-se de Davis e apontou o dedo, fazendo uma cara carrancuda:

- Eu vou te ensinar a tratar melhor os mais velhos... eu venho em missão de ajuda e é isso o que eu recebo, seu ingrato!

- Não ligue para ele, sr. Gennai - tentou acalmá-lo Yamato - Mas estamos muito contentes em vê-lo, depois desses anos... o senhor sempre nos socorreu quando precisamos.

O velhinho voltou com a sua expressão serena e pigarreou, fazendo um gesto para todos sentarem-se. Depois de obedecerem, ele começou:

- Sim, digiescolhidos... eu voltei para ajudá-los mais ma vez. E querem saber? Estou mesmo tão contente em vê-los que daria um abraço em cada um.

Os demais se entreolharam, sorrindo melancolicamente. Que esquisito tudo isso parecia... era um sentimento estranho que invadia o coração daqueles amigos. Talvez fosse a saudade súbita da infância que nem os tempos nem a maturidade conseguiriam arrancar. E lá estava o senhor Gennai, o velho, igualzinho como da última vez... e era assim que começavam a se sentir: igualzinho da última vez, como uma criança.

- Vejam só... - sorriu, olhando nos olhos de cada um - Como cresceram... todos adultos...até estão bem maiores que eu!

Os doze riram...não conseguiam mais dizer uma palavra.

- Mas o espírito... é o de uma criança. Os brasões ainda estão vivos em seus corações, digiescolhidos.

Taichi tocou o peito, olhando para baixo, enquanto seus olhos enchiam-se de lágrimas. Coragem... Agumon. Era nessas horas que percebia como o tempo não passara... não era a idade, nem as transformações físicas que faziam de uma pessoa um adulto. E um filme começava a rodar na sua cabeça. Sim, tudo estava voltando no presente...

- Vocês sabem porquê são os digiescolhidos, não sabem? - perguntou, fazendo uma pausa - Dizem que não são especiais por causa disso, mas... sabem que são. Seus corações estão cheios de sentimentos puros que o tempo não apaga... sentimentos que os pequeninos possuem.

Parou por um instante, analisando os doze amigos. Estavam com os olhares mais doces e tristes que já vira na vida.

- Adultos têm muitas coisas com o que se preocupar... trabalho, dinheiro, sua vida agitada. Enquanto eles lutam para pegar no sono, uma criança vai dormir despreocupadamente em sua cama, pois não precisa pensar em nada disso, só nos amigos que vai encontrar no dia seguinte, do que vão brincar... e eu estou falando com adultos que ainda são crianças... oh, até mesmo Iori, esse garoto...nunca vi um igual.

O rapazinho assentiu educadamente com a cabeça, sorrindo com modéstia.

- E estão todos reunidos novamente aqui, comigo. Os brasões...que não se apagaram... mas infelizmente, sem os digimons.

Suspiros de lamentação por parte deles.

- É isso o que não entendemos... por quê? O que é isso que está acontecendo? - disse Hikari, tristemente.

- Sabemos de algumas coisas, sr. Gennai, como essa medalha... agora temos mais certeza do que nunca que é um trabalho para nós fazermos, no entanto não sabemos como - disse Izzy Izumi.

- Tenham calma, eu sei que vocês devem estar confusos. Mas é por isso que estou aqui, para tentar ajudá-los.

- Estamos prontos - disse Matt, com firmeza.

- Há muito, muito tempo atrás, no início da formação do Mundo Digital, existia uma medalha muito bem guardada... Era composta de duas metades: a metade de ouro, o bem, e a metade de bronze, as trevas.

- Quer dizer que existe mesmo uma outra metade?! A que ainda não encontraram? - perguntou Ken, sem poder se conter.

- Sim, sim, mas deixe-me continuar primeiro...

- Me desculpe, sr.Gennai.

"Essa medalha era de fundamental importância para manter o equilíbrio do Digimundo. Sua profecia nunca fora levantada....até agora. As pedras de cristal representam os 12 digimons, os seus digimons. Oito de vocês foram os primeiros digiescolhidos, e outros quatro os herdeiros dos brasões, um fato que já estava previsto desde aqueles tempos... Ninguém seria capaz de querer causar algum dano usando essa medalha, mas as coisas mudaram um pouquinho. Alguém... desafiou as leis... e agora despertou essa profecia que até então, bem, não se imaginaria que fosse acontecer."

Um silêncio reinava entre os escolhidos. Agora que as coisas estavam sendo reveladas, as perguntas respondidas... algo mais além do que imaginavam.

- Mas o que esse... alguém fez? - perguntou Sora.

Gennai sorriu sombriamente.

"A metade de bronze está sob poder de alguém, ou algum ser...algum ser que sabe da existência dessa profecia. Dessa forma, a metade de ouro foi afastada do Digimundo, vindo parar na Terra... e depois de ser encontrada, os desaparecimentos começaram. Enquanto que a metade dourada possui 12 pedras, a de bronze não tem nada... até que os digimons sejam dominados."

- O interior deles parecia se tornar obscuro, sr. Gennai.... e então desapareciam - agregou Matt, lembrando-se de Gabumon.

- Sim... e quando um desaparecia, uma pedra sumia. Mas o que ninguém sabe é que essa pedra que sumia aparecia na metade de bronze, a metade das trevas...

- Mas que droga... - o rapaz fechou os olhos, apoiando os braços nos joelhos.

- É claro... as pedras vão completando os espaços vazios da outra metade... - raciocinava Koushiro - E aonde está essa medalha?

- Essa medalha continua sob poder desse alguém... mas agora que seus espaços estão completos, a medalha de ouro desapareceu. - disse o ancião.

- E pra onde foi ela, afinal de contas? - perguntou Joe, ainda sereno.

"Estamos esquentando... bem... Os digimons foram capturados pelo poder das trevas, inevitavelmente. Agora estão também sob poder, assim como a metade de bronze. É preciso que prestem atenção: uma vez separadas, as metades opostas se repelem... mas vocês, vocês precisam juntá-las novamente, para assim resgatarem os digimons. Nesse ato, diz a profecia, quatro zonas se formam para o desafio final."

- Quatro zonas? Como assim?! - perguntou Mimi, aflita. Izzy segurava sua mão delicadamente, tentando acalmá-la.

"Vocês serão transportados para quatro zonas interligadas, as Zonas das Quatro Estações, que são aparte do Digimundo. Em cada uma vocês decifrarão um enigma, e a passagem se abrirá à outra zona, onde deverão encontrar seus companheiros. Quando todos os enigmas estiverem decifrados, o digiportal se abrirá novamente, atraindo a medalha dourada à de bronze, e os digimons libertados..."

Outra vez o silêncio...os amigos pensavam solitariamente, tentando associar as informações.

- É coisa demais pra nossa cabeça... - murmurou TK.

- Então é uma profecia... - começou Izzy - que espécie de enigmas são esses, sr. Gennai?

- Isso eu não sei dizer, digiescolhidos... Mas ouçam...é algo que vocês nunca viveram antes. Tudo o que sei eu disse à vocês, mas... temo que possa ser algo mais complexo.

- Quatro zonas, zonas... como vamos ser transportados? Quando? - perguntou Jyou, voltando-se aflito.

O velho suspirou tristemente.

- Também não sei...mas acredito que não vá demorar muito. Faz parte da profecia... ninguém comanda os seus passos a não ser o seu poder. É a primeira vez que esse fenômeno irá acontecer... e tenho medo de suas conseqüências.

Ficaram calados, fitando Gennai atenciosamente. Ele, com medo... Mimi estava com as mãos suando frio, agarradas nas de Koushiro:

- Eu também tenho medo...

- Entendo como devem se sentir...uma enorme responsabilidade. Mas eu confio em vocês, digiescolhidos, e sei que são capazes. Façam isso pelos digimons, não deixem que as trevas os dominem...

A voz do sr. Gennai estava cada vez mais distante. Seus dados digitais iam se tornando transparentes, precipitando um adeus provisório.

- Não me diga que vai embora! - exclamou Miyako, levantando-se repentinamente.

- Volte, sr, Gennai, temos mais perguntas a fazer! - completou Kari.

- Eu fiz a minha parte, digiescolhidos... agora é a sua vez - e desapareceu por completo, deixando para trás os doze amigos.

Com exceção de Yolei Ichijouji, os demais permaneceram em seus lugares, com o olhar perdido no infinito, totalmente perdido... As aparições de Gennai eram tão misteriosas quanto fugazes.

- Hum... jeito moderno de aparecer aqui, han? - disse Daisuke inconscientemente, enquanto Takeru apoiava seu braço amistosamente no ombro do rapaz.

Tai finalmente levantou-se e parou em frente ao grupo, dizendo:

- Tirando as loucuras que Davis diz, pelo menos em uma coisa ele tinha razão: Gennai era o nosso sinal. Agora sabemos qual é a nossa missão...graças a ele. Eu sinto, pessoal, uma coisa estranha dentro de mim... sinto falta das nossas aventuras! Faz tanto tempo que eu não tinha a sensação de toda essa energia me invadir.

Os amigos sorriam efusivamente para ele, assim que Motomiya ficou de pé ao seu lado:

- É isso mesmo, agora é a nossa vez... pensei que fosse um simples encontro de velhos amigos, mas... precisamos resgatar os nossos companheiros, fazer voltar a nossa ideologia dos digiescolhidos.

- Mas, esperem... - interrompeu Sora com seriedade, mas com expressão doce - Temos que ter cuidado. Isso pode ser perigoso.

Os amigos assentiram, balançando a cabeça firmemente, conscientes de que aquilo não era nenhuma brincadeira.

- Então o que estamos esperando aqui fora?

- Como assim, Ken? - perguntou TK.

- Já que precisamos nos preparar para isso que enfrentaremos, vamos ter de levar mantimentos, medicamentos, bússolas, coisas úteis.

- Aliás, não sabemos ao certo para onde vamos, nem quanto tempo permaneceremos nessas zonas. - agregou Yamato.

- Sim... vamos, pessoal, todos para a sala. Está começando a esfriar...

Todos foram se levantando calmamente e encaminhando-se para dentro da casa, com um novo astral dentro de cada um.

Depois de uma aflita espera em busca de uma solução para os problemas iniciais, o "anjo" Gennai aparecera novamente, transmitindo a sua mensagem de que os velhos tempos haviam voltado.

Ken Ichijouji já estava fechando a porta quando virou-se para os outros e disse:

- Amigos... sei que precisamos nos esforçar, mas... estou muito feliz que vamos juntos nessa.

E eles retribuíram com um belo sorriso, entretidos com a nova cor que tomava conta das bochechas do portador da Bondade. É... ele não era muito acostumado com "discursos" do tipo.

--

Reunidos novamente naquela mesma sala, havia esparadrapos, ataduras, lanternas e utensílios que poderiam ser úteis, espalhados pela mesa. Ah, sim, e bolinhos de legumes.

- Hum... - analisava Matt, com a ponta do lápis na boca - Os primeiro-socorros não serão suficientes para todos...

- Ainda bem que eu trouxe a minha maleta, posso colaborar com algo mais - disse Joe, enfiando a mão dentro da mesma.

- Joe carregaria a parte de medicamentos mais importante, afinal... ele é médico.

Todos concordaram, sem mais problemas.

- Então fica repartido um número igual para todos... vamos enrolar essas ataduras e guardar esses potes de...aspirina?! - exclamou Taichi, arregalando os olhos para o remédio.

- Han... - murmurou Davis, levantando a cabeça para todos - Alguém poderia ficar doente, não.... poderia?

- Uffs... tudo bem, vá...

- Todos com suas mochilas do piquenique, ok? - disse Yolei, entregando para cada um a sua correspondente, para que pudessem carregar outras coisas que acharem necessário.

Repartiram os medicamentos de primeiro-socorros entre si e os guardaram nas bolsas. Joe, além da sua, carregava a maleta de médico.

- Tome a sua aspirina, Davis.. - disse o amigo da Coragem, entregando-lhe o pote.

- Achei umas cordas lá no porão - avisou Ken, entrando na sala com três cordas em um estado não muito bom. - Quem vai ficar com elas?

- Se não se importar, eu gostaria - disse Cody Hida - Sei mexer bem com elas, já ajudei muito o meu avô com as tarefas.

- Jogue uma aqui, Ken - pediu Takeru; Ken entregou uma a ele e a Iori.

Taichi olhava fixamente para a corda restante. Não se lembrava de ter usado nenhuma quando partia para as suas "loucuras" quando avançava no perigo, mas...

- Coloque na sua mochila, grande Tai - disse Ken, jogando a corda no colo do jovem, fazendo-o voltar a si.

Grande Tai... , pensou, observando o objeto, vendo que o melhor amigo Matt sorria, animando-o.

- Sobrou alguma coisa do piquenique?

- Sim, Joe, está ótimo... - respondeu Mimi, cuidando da parte dos mantimentos.

- Comer a sobra do piquenique é ótimo... levem a sobra do jantar também.

- Você está me saindo um ótimo piadista, Dai... - riu Yolei.

Koushiro Izumi, como sempre fazia, teclava em seu laptop incessantemente. Analisou algo em seu monitor, assentiu para si mesmo e retirou de sua mochila quatro walk-talks.

- Pessoal, vamos dividir isso aqui... - disse, mostrando os objetos - Os que tem o D3 e o analisador digital não vão precisar...

- Maneiro, Izzy! - encantou-se Tai, tomando um logo para si, enquanto guardava o seu binóculo.

- Dois de nós, os veteranos, vão ficar sem... bom, eu não faço questão de um pra mim.

- Hum...acho que eu também não - finalizou Mimi, entregando os outros walk-tolks para Sora, Joe e Yamato.

- Agora uma coisa importante... achei dados interessantes sobre a profecia da qual o sr. Gennai nos falou - informou, voltando ao computador.

- É sério? Que ótimo! - aprovou Kari, sentindo-se mais aliviada.

- Não sabemos como nem quando seremos transportados, certo? Pois aqui há uma frase referente, mas que não sei ao certo o que significa...: "Quando a pouca luz invade a escuridão, o céu se torna vermelho quando a água os torna transparente"... Algum comentário a respeito?

- Não sei o que é, mas Izzy, você é um gênio! - elogiou Tai Kamiya.

- É meio esquisito... - murmurou Matt, sem muita preocupação, caminhando em direção à enorme janela com a mochila pendurada no ombro.

Faltava pouco para amanhecer. Agora cabia a eles esperar por algo que os levarias às Zonas das Quatro Estações, e haviam conseguido se preparar. Será?

Zonas das Quatro Estações... quatro estações.. isso já sugere algo relevante, pensava Matt Ishida, olhando para o céu, onde as estrelas brilhavam intensamente.

Sora e Taichi também aproximaram-se para junto dele, na janela. Ficaram em silêncio aqueles três amigos, tão especiais uns para os outros, a contemplar aquela maravilhosa noite.

- Queria que tudo desse certo... - murmurou o jovem da Amizade, sem desviar os olhos do firmamento.

- Eu também... - disse Sora, no mesmo tom - Quero salvar os digimons desse... monstro que fez isso com eles. Desejo que todos se saiam bem... que ninguém fraqueje...

- Mas nós nunca desistimos de nada, não é? Somos os digiescolhidos... - afirmou Tai, confiante.

Yamato abaixou a cabeça, depois encarando os dois amigos.

- Gennai não nos disse o que poderia acontecer se não conseguíssemos decifrar os enigmas..

- Tem razão, mas... iremos fazer o possível, não vamos? Pelos nossos companheiros - animou Kamiya, fazendo-os sorrir.

Um breve silêncio...Sora segurou nas mãos dos dois rapazes, olhando para baixo, sorrindo com ternura.

- Me prometem uma coisa? - perguntou, olhando para eles - Prometem que não vão fazer besteira? Que vão... voltar pra casa, depois?

Tai e Matt sorriram junto à dona do Amor. Ela os abraçou com força, querendo sentir aquela energia única do momento....esquecendo que era tão querida por eles, mas pensando o quanto eles eram especiais a ela.

Ken chamou todos para se sentarem. Os três se separaram com um novo sentimento de confiança e coragem dentro deles; Matt ainda pôde sentir uma ardência em suas bochechas quando olhou para Sora mais uma vez.

- Pessoal, já está amanhecendo... - começou Ichijouji - Vamos ficar juntos agora, a última vez antes de partirmos... queria desejar boa sorte à todos.

- Sim... - sorriu Koushiro - e vai ser daqui a pouco a nossa hora.

- Como sabe?

- Está amanhecendo, TK... "Quando a pouca luz invade a escuridão, o céu se torna vermelho...".

- E... quanto à tal "água transparente"? - perguntou Davis, intrigado.

- Bom, isso eu não sei... apenas a primeira parte.

Um adorável e reconfortante silêncio invadiu a sala, e os amigos da alma se olhavam, com um riso simpático em seus lábios.

- É isso... - disse Ken, colocando sua mão sobre a mesa - digiescolhidos.

Os demais entenderam a mensagem e foram, um por um, colocando sua mão sobre a dele, formando um círculo de amizade que se estenderia por mais um longo, longo tempo...

E fugazmente amanheceu. O céu ficara vermelho, e os primeiros raios de luz invadiram a escuridão do fim da noite...

*Continua....

N.A: Agora sim!! Finalmente a ação(de verdade) vai começar! Daqui pra frente vocês irão acompanhar os passos dos escolhidos para tentar juntar as duas metades e, é claro, resgatar os digimons. Tenho que dizer que o próximo cap. foi um tanto complicado para organizar e escrever, mas que fiz o possível... tenham paciência. Ah, e aquele trecho do início desse cap. era um trecho do início de um livro que eu li, um dos melhores que já li, de Stephen King. É isso...

Bom, até mais!