Notas iniciais da autora: Milagre, aleluia! Olha só... eu cheguei mais cedo do que imaginavam, né? Trago aqui mais um capítulo de Pólos Opostos, espero que desfrutem. Virei coruja para poder escrevê-lo... u.uU
Ah, este capítulo é especial para Motoko-chan, que gosta muito da Yolei.
Ainne, aqui estão os nomes juntos dos sobrenomes dos personagens que você pediu (não acredito que ainda possa se confundir!): Taichi Kamiya(Tai), Sora Takenouchi(Sora), Yamato Ishida(Matt), Koushiro Izumi(Izzy), Jyou Kido(Joe), Mimi Tachikawa(Mimi), Takeru Takaishi(TK), Hikari Kamiya(Kari), Daisuke Motomiya(Davis), Iori Hida(Cody), Miyako Inoue-Ichijouji, agora(Yolei), Ken Ichijouji(Ken).
- Capítulo onze -
Envie-me um anjo
Por Manu(1)
"Basta ser sincero e desejar profundo, você será capaz de sacudir o mundo"
-- Raul Seixas
"Aqui eu estou. Você me enviará um anjo?"
-- Send me an angel/ Scorpions
- Cody! Acorde!
- Espere... acho que ele está reagindo...
Daisuke prestava a maior atenção nas expressões do garoto, que estava com a cabeça no colo de Miyako. Os três amigos de infância se encontravam dentro de uma gruta, situada no centro de toda aquela neve, que os protegia um pouco do frio. Haviam achado Iori (graças ao D3 - talvez) praticamente coberto pelo gelo e o trouxeram até o abrigo, aflitos. Motomiya conseguira preparar uma fogueira, que estava trazendo um conforto tremendo.
Iori Hida abria os olhos, de uma lentidão que era capaz de irritá-los, parecendo tonto. Demorou um pouco até conseguir enfocar a vista em algum lugar, e a primeira coisa que viu foi o rosto de Davis, bem à sua frente.
- Da.... Davis?
- Há. Sabia que acordaria, rapaz - sorriu o velho amigo.
- Oh, Cody, querido, que bom que você está bem! Espere... você está bem, não está?! - disparou Yolei, nervosa.
- Hufs... - o garoto erguia a cabeça e tentava sentar-se - Sim, estou...acho. O que aconteceu? Onde estamos?
- Bem... provavelmente na Zona de Inverno.
- Quê? Que diabos de zona está falando, Davis? - perguntou Cody, confuso.
Motomiya e Miyako se olharam por um instante, não compreendendo a fala do companheiro.
- Está com algum tipo de amnésia?
- Não se lembra das Zonas de que Genai nos disse, Cody? - perguntou a melhor amiga.
- Ah.... as zonas? As zonas... ah, tá, me lembro... - respondeu tontamente.
Yolei e Davis suspiraram, mais aliviados. A remota idéia de Iori estar com alguma perda de memória os deixava aterrorizados.
- Daisuke... estamos aqui desde quando?
- Daisuke? Quem é Daisuke? - perguntava o jovem, com cara de sonso. Yolei arregalou os olhos; talvez não por espanto, mas sim por indignação.
- Certo... brincadeirinha! - riu meio amarelo, levantando as mãos.
- Deve fazer uma hora, mais ou menos. - começou Yolei Ichijouji - Acho estranho que meu relógio tenha parado... encontramos você por causa do D3, que apitou. Oh, Iori.... que susto nos deu! Estava desacordado debaixo da neve. Davis e eu o trouxemos para dentro dessa gruta e fizemos uma fogueira. Ainda bem que não aconteceu nada de mais grave...
- Eu? Desacordado na neve? - disse o garoto de olhos verdes, olhando preocupado de um amigo para outro.
- Sim. Não se lembra de nada, né?... Eu também, a última coisa nítida de que me lembro é a reunião na casa dos Ichijoujis. Quando acordei, estava aqui.
Miyako tomou o rosto de Iori entre as mãos e o fitou, carinhosa como uma irmã mais velha:
- Por certo, querido... está sentindo-se melhor?
- Sim, Yolei, muito obrigado. Se não fosse por vocês... - dizia, reconfortado e até um pouco tímido.
- Nem nos diga nada, Cody! - exclamou Daisuke, levantando-se repentinamente do chão - Mal chegamos a esse lugar e nada de ruim poderia nos acontecer. Estou até achando tudo isso meio perigoso...
Miyako o fitou curiosa. Ia pergunta alguma coisa, mas acabou desistindo, voltando a olhar para Iori. Perigoso? Ora, mas por que aquela zona haveria de ser perigosa? Bobagens de Daisuke, mal pisaram na neve... só podia ser.
Hida quis dizer alguma coisa. Abriu a boca uma vez e trancou a respiração, tornando a abri-la segundos depois, mas também desistiu. Preferiu guardar seus pensamentos e suposições para si mesmo. Sentia-se ligeiramente tonto, enjoado e congelado, principalmente. Esquentou as mãos perto do calor da fogueira improvisada e as assoprou. Cody tornou-se quieto, porém diferente de como já o era... O silêncio reinou por aqueles instantes até que Yolei Ichijouji perguntou:
- Vamos preparar alguma coisa? Está com fome, Cody?
- Não, tudo bem... não quero comer, só acordei atordoado. - respondeu, olhando fixamente para o fogo.
- Parece pensativo... o que há?
O jovem estudante de advocacia ergueu a vista para Motomiya, um olhar que lhe pareceu sombrio de relance, e voltou a encarar o chão.
- Me bateu uma pontada de preocupação agora... estranho. Ou, talvez, normal. Com os digimons... - suspirou, passando a mão pelo rosto - Não seria melhor procurarmos logo esse enigma?
- Claro que sim! Esta é a nossa missão - disse Miyako, animada - mas está tão frio lá fora...
Davis pousou o dedo indicador no queixo e deus dois passos lerdos em volta da fogueira, fazendo cara exagerada de pensativo.
- Hum... e se o enigma estiver... aqui?
- Como? Dentro da gruta?
- Exatamente, Yolei! Seja lá quem ou o quê tenha posto... não sei a palavra certa... esse enigma na nossa Zona... não iria nos deixar perambular por essa neve toda até congelarmos os nossos narizes, iria?
Os dois amigos o encararam, não parecendo muito conformados com a sua teoria.
- Me nariz já está congelado. - disse Miyako.
- Han... OK... mas vejam só: encontramos Cody caído na neve, coincidentemente (será?) encontramos esta gruta para nos aquecer. O frio está intenso lá fora... não foi forjado? Forjado para encontrarmos o enigma justamente aqui?
-Hum, não. - afirmou Iori, seguro - Me encontraram na neve simplesmente porque eu estava desacordado, Davis, e porque estamos no mesmo lugar. Para que planejariam tudo isso? Será que querem que a gente decifre logo essa.... essa mensagem? Bah... tenho quase certeza que não. Precisamos congelar mais os nossos narizes, se queremos acabar com essa história.
Um sorriso fino formou-se nos lábios do cozinheiro. Hesitou por um momento e logo aproximou-se intrigado da parede gelada da gruta.
- Elementar, meu caro Watson... porém, não custa nada verificar.
Davis começou a tatear pela parede, encostando o ouvido, parecendo determinado em encontrar algo relevante ali. Yolei e Cody trocaram olhares ansiosos, mas ficaram indecisos se ajudariam o amigo com a "tarefa" ou se continuariam assistindo.
- Se é... uma mensagem... então....pode estar.....cravada.... ou algo assim. - disse o rapaz de cabelos arrepiados, lentamente.
- Não deixa de ter razão, cara, mas...
Davis interrompeu Iori, levando o dedo aos lábios abruptamente.
- Vai precisar de uma lanterna, só a luz do fogo não vai ajudá-lo a encontrar nada. - avisou Yolei, não dando caso ao pedido de silêncio do amigo.
A moça fez menção de abrir sua mochila e pegar uma lanterna, mas ficou quieta olhando para ele, assim como Cody.
- Que foi? - perguntou o garoto.
- Estranho... parece um estremecimento... - murmurou Davis, franzindo a testa, de onde se formava uma prega. - Bom, sei lá, talvez tenha sido só impressão minha. Ah! Já sei. Será que o enigma pode estar enterrado? Devemos procurar debaixo da neve?
Miyako o olhou, intrigada, e erguendo uma sobrancelha. A idéia parecia ser absurda. Iori apenas ouvia pacientemente.
- Sua cabeça deve estar trabalhando muito, Dai... como assim, enterrado?! Não vamos ficar cavando neve por aí, como se fosse um tesouro.
- Yolei, pense só! Para isso mesmo serve a neve. Para tornar a busca mais difícil. - disse, animado, fazendo gestos com as mãos - Porque, eu creio, que deva ser difícil encontrar essa mensagem... já é um enigma encontrar o enigma!
- Sei que não deixa de fazer sentido, mas... acho que não é bem assim...
Yolei fez uma careta de não-estou-convencida. Iori ainda não dissera nada; esticou a perna dormente para a frente e soprou a mão mais uma vez, antes de começar a falar com um tom de voz sério e até misterioso:
- Será que vocês não pensaram em uma coisa? Talvez não seja preciso achar enigma nenhum. Talvez não seja esse enigma de que todos pensam... não devemos procurar algum pergaminho com uma mensagem absurda e sem sentido gravada, ou uma espécie de mapa.
Daisuke sentiu uma ponta de desapontamento.
- Puxa... era assim que eu estava pensando.
- Pois então... o sr. Genai não disse coisa parecida, disse? - fez uma pausa, mirando o fogo ardente - ... muito menos uma mensagem gravada na parede ou enterrada...
- Oras, mas então aonde devemos procurar esse enigma? - perguntou Davis, nervoso.
- Não dentro desta gruta, provavelmente.
Os três continuaram parados, esperando alguma manifestação para saírem dali logo, já que parecia não haver outro jeito. Cody Hida apertou os olho claros que olhavam fixamente para o fogo e murmurou, como se pensasse em voz alta:
- Tenho quase certeza de que seja algo mágico... algo que tenhamos que encontrar por nós mesmos... mágico como o Mundo Digital e nossos brasões...
Yolei e Davis o encararam com expressão curiosa. Realmente, não duvidaram das palavras de Iori - aparentemente, mas antes que pudessem ao menos refletir, uma boa sacudidela na gruta os assustou.
- Que... que foi isso? - perguntou Miyako, apenas mexendo os olhos.
- Eu senti também, enquanto verificava a parede - disse Daisuke, desconfiado.
Novamente, ouviram um som que lembrava um terremoto gentil. Alguns fragmentos de rocha se soltaram do teto e caíram, enquanto sentiam tudo à sua volta tremer.
- Diabos... o que está acon...
- Acho que isso aqui vai desmoronar - afirmou o herdeiro da Confiança e do Conhecimento, relativamente calmo - Vamos sair, andem. Talvez se ficássemos ainda sentados, ninguém tomaria a frente de se aventurar na neve.
Iori começou a levantar-se, no entanto sentiu uma estranha tonteira e cambaleou, apoiando-se na parede. Motomiya apressou-se a segurá-lo e dar firmeza.
- Tudo bem? O que houve?
- Ah... está como quando acordei.. - resmungou, acariciando a cabeça.
Yolei desvencilhou-se de algumas pedras que caíam e apanhou a sua mochila e a do melhor amigo, preocupada e assustada ao mesmo tempo. Tentava abrir o zíper emperrado para pegar a lanterna.
- Então vamos rapazes, para fora daqui. Encontraremos o bendito enigma, ou seja lá o que queiram dizer...
Ela ligou a enorme lanterna; Davis, com Iori apoiado em seu ombro, apagou a pequena fogueira com boas pisadas e acomodou sua mochila no outro extremo, dando uma olhada pelo chão para ter certeza de que não esquecera nada. Aproximou-se da entrada da gruta e deu-se conta de que fora razoavelmente coberta por neve.
- Tudo bem, deixe-me ir na frente - disse Miyako, vendo que o rapaz tinha menos condições do que ela de retirar o gelo.
A moça agachou-se e realizou uma espécie de escavação, retirando a neve suficiente para que pudessem passar para o outro lado.
Por certo... o primeiro ar gelado que os recepcionou foi o bastante para desapontá-los. Estava muito mais frio do que imaginavam. Podiam ver a substância branca cobrir praticamente toda a paisagem, do chão até as incríveis montanhas que rodeavam a própria em que se encontravam. O céu possuía uma tonalidade arroxeada, e a significativa luz que os permitia visualizar melhor vinha da lanterna que Yolei Ichijouji segurava.
- O frio... pode queimar até mais que o próprio fogo... - murmurou Cody, estranhamente.
- Está sentindo-se melhor, Iori-chan? - perguntou Yolei - Você parece misterioso.
- Não me mime demais, Miya... - disse, sorrindo carinhosamente - Para falar a verdade, ainda continuo tonto. Minha vista está um pouco turva... não sei se consigo andar sozinho.
- Opa, opa! Não se preocupe, eu te ajudo o quanto for preciso.
- Muito obrigado, Davis. - respondeu, sincero - Só não entendo... não é possível. Será que bati a cabeça quando cheguei a este lugar? Ela dói um pouco também... mas nada de mais.
- É provável... estava caído quando o encontramos, não? Se bem que nós dois também estávamos - disse o cozinheiro, olhando para Miyako - , como se adormecêssemos até chegar à Zona. E você, bem... demorou um bocadinho até acordar.
Cody assentiu com a cabeça e olhou para o céu, não parecendo se importar muito com a cabeça depois da resposta de Davis, enquanto seus cabelos eram despenteados pelo vento.
- Hum... certo. - murmurou.
O jovem Hida assoprou as mãos mais uma vez, sem deixar de se apoiar no amigo. Os três olhavam para as grandes montanhas que, ao passo que os encantava, também os assombrava. O ar gélido que se chocava em seus corpos causava arrepios e tremores.
Yolei abaixou-se e apalpou a neve, pegando um pouco na mão. Aproveitou que Daisuke estava distraído com a paisagem e atirou uma bola em sua cabeça.
- Ei! - exclamou, limpando o rosto com a mão livre - Eii... que idéia foi essa?
- Vamos fazer um boneco de neve? - sorriu a moça, preparando mais "munição" - Ou que tal enterrá-lo aqui? Seria divertido.
- Deixe disso, Miya... - disse Iori, com a voz cansada - Nada de brincadeiras. Vamos logo atrás do enigma, anda.
- Ora essa, estamos mais perdidos do que cego em tiroteio. Nem sabemos pra que lado andar!
- Hum... não importa. Desde que andemos... só espero que minhas pernas não congelem - murmurou Motomiya, avançando à direita com Cody - Deixe que eu ilumino à frente, Yolei.
A moça suspirou e entregou-lhe a lanterna, enquanto levantava-se.
- Precisamos de pistas... algo que nos ajude a achar a saída daqui. E resgatar os digimons, é claro. Cadê o nosso grito de guerra?
Os outros dois sorriram. Miyako vinha atrás. Não havia nada à frente deles a não ser neve, mais neve e vento congelante... era até desesperador para quem percebesse.
- Me desculpem... não queria ser um estorvo - gaguejou Hida, pendendo a cabeça, enquanto era praticamente carregado pelo rapaz de óculos de aviador.
- Cody!
- Ou, cara! Que bobagem é essa que está dizendo? - repreendeu-o Davis - Estorvo... não diga isso, ouviu? Estamos juntos, um ajudando o outro. Sempre. Ou achamos essa coisa juntos, ou não achamos.
- Hum... até parece que sou seu filho - disse o rapazinho, e um sorriso bobo brincou em seus lábios.
- Você nunca deixará de ser o menor dos digiescolhidos, Iori-chan - disse Yolei - O nosso bebê!
A jovem Ichijouji não conseguiu perceber, mas Cody pareceu ficar um pouco mais contente.
Continuaram a andar, então, fazendo silêncio. Metros já andados pareciam ter sido quilômetros. Às vezes Miyako olhava para trás - avistando somente neve e as montanhas deixadas para trás- e vigiava as pegadas... Suas passadas se tornavam mais lentas, cada vez que o vento não favorável os empurrava, enquanto debatia-se em espaços de cinco minutos para se sentir aquecida. Era impossível também evitar pensar nos companheiros que estavam longe deles. Visualizava Ken em sua mente, principalmente, e desejava que estivesse em um lugar melhor do que aquele. De fato, ele realmente estava... mas ainda não sabia. Tentar usar algum walk-talk seria perda de tempo. E cordas... só se fossem subir montanhas, mas não estavam loucos.
Iori assoprava as mãos pela milésima vez. Daisuke havia se cansado um pouco desde o início da caminhada, em parte por sustentar o garoto. Logicamente que não iria se queixar; óbvio! Isso não era nada. Aliás, era prazeroso ajudar.
Miyako assustou-se ao sentir suas pernas afundarem na neve. Parou de supetão e olhou para baixo, percebendo que apenas os joelhos acima estavam visíveis. Forçou o caminhar, mas não adiantou muito... só se retirasse um bom punhado de neve.
- Ah, não. Desisto! - exclamou, lançando um olhar derrotado e nervoso aos amigos, que andavam alguns metros mais à frente.
Cody se empenhava para não fechar os olhos, ainda pendurado no ombro de Daisuke, que por sua vez não prestou muita atenção na queixa da moça. Seu olhar refletiu incredulidade e surpresa ao falar:
- Não... mas não-é-possível! Vejam só que droga. Simplesmente chegamos no final da montanha! - fez uma pausa, praticamente arrancando os próprios cabelos - É, pois caso ainda não perceberam, parecemos estar perambulando em uma montanha, como todas essas outras... droga... estamos encurralados. Há um penhasco ali na frente.
De fato, Daisuke tinha razão. Estavam andando na direção que os levava à extremidade da montanha; o jovem acenava para a ponta, decepcionado. Iori não se deu o trabalho de resmungar, apenas bufou. Entretanto Yolei arregalou os olhos, ainda encalhada na neve, começando a ficar exaltada.
- Quê?! Davis, eu vou te matar! - gritou a moça. Ele tentou protestar, mas foi contido pelos berros - Estivemos andando pelo caminho errado o tempo todo! Gastamos umas belas horas, sabia?!
- Não vai pôr a culpa em mim, vai? Claro, poderíamos ter escolhido outras direções, e errado do mesmo jeito. Poderíamos ter ido pela esquerda, pela frente e até escalado essa montanha, se fosse preciso; encontrar uma caverna, um buraco, um... sei lá! Até encontrar a outra extremidade!
Motomiya, apesar de não gritar, tinha um indício de nervosismo e exasperação em seu tom de voz.
- Ai... céus, céus, céus... - choramingou Miyako Ichijouji, arrancando uma perna e depois a outra da neve e deixando-se cair.
Cody finalmente desvencilhou-se de Davis. Parecia estar com o pensamento em outro mundo, totalmente distante, a observar como se fosse uma criança as pegadas recém-projetadas. Realmente agia de modo estranho. Ergueu a cabeça, balançando os cabelos cobertos de neve, e olhou para as outras montanhas distantes.
- Que falta de sorte... - disse, parecendo bastante tranqüilo, como se tudo não passasse de um pequeno desvio nos planos.
- Está tão frio... - murmurou Yolei, aquecendo-se com os braços em volta do colo, ainda zangada.
- E agora... o que fazer? Voltar e recomeçar? - perguntou Davis, desanimado.
- Não é por nada, mas as minhas pernas estão geladas. E o meu nariz também...
- Eu sei, Miya, estamos todos com frio... mas vamos ter que agüentar. - o herdeiro da Coragem e Amizade tentou reconfortar, olhando para o céu como se tentasse achar a resposta para o problema - Se queremos que alguma coisa aconteça, temos que nos esforçar.
- E nos esforçamos! Só que para o lado errado.
Iori Hida voltou até eles e também sentou-se, abraçando os joelhos, aparentemente melhor. Davis seguia em pé, segurando a lanterna, não sabendo mais aonde iluminar.
- Eu disse... que não é exatamente esse tipo de enigma que temos que decifrar... - murmurou o garoto de olhos claros, tremendo ligeiramente.
- É... só que mesmo assim não sabemos como - falou a sra. Ichijouji, tentando permanecer calma. Percebera que de nada adiantava partir para a histeria e, sem querer, seu olhar tornava-se melancólico.
Daisuke suspirou profundamente. Queria levantar o ânimo - seu e dos companheiros, talvez fazê-los voltar e tentar do outro lado, ou então ficar ali e pensar um pouco. Por enquanto, decidira-se pela terceira opção.
- Aham... hum, bom... vamos nos organizar e decidir o que fazer realmente. O que será melhor. E o mais rápido para sairmos daqui e salvar os digimons.
- Oh! - gemeu Yolei - Fico imaginando o que aconteceria se ficássemos presos aqui. Porque acho que, se fracassarmos, estaremos pondo em risco os nossos amigos que estão nas outras Zonas. Afinal, o último enigma será revelado quando todos os doze estivermos juntos, não?
- Sim, você tem razão... o sr. Genai nos disse. - concordou Hida.
- Eh, e o pior... precisamos muito achar este enigma, nos encontrarmos com os demais... e assim poderemos resgatar nossos amigos. - completou Daisuke.
- Estou preocupada com eles... nenhum de nós deve ficar preso em nenhuma das Zonas. Esqueceram que os digimons estão sendo controlados... ou sei lá o quê... dominados pela metade das trevas da medalha?
- Não - disse Iori, balançando a cabeça.
- Pois é... bingo - disse sem interesse, fazendo uma bola de neve com a mão esquerda - enquanto a outra segurava o ombro. Mas não atirou no rapaz de googles. - Para cada pedra de cristal que sumia na metade de ouro, uma aparecia na metade de bronze. Certo, todas as de cristal desapareceram... todos os nossos digimons desapareceram... e nem ao menos sabemos onde estão! Só sabemos que estão sendo controlados pelas trevas! Percebem, heim? Se demorarmos o suficiente eles podem ser totalmente cobertos pela escuridão... e então, pode ser tarde demais. Maldita profecia...
Daisuke e Cody a fitaram, apreensivos e preocupados. Em vez da fala de Miyako os incitarem a correr logo atrás da saída, curiosamente os desestimulava. Sentiam-se inseguros da vitória e aflitos. Quanto mais depressa, mais chances então... mas era justamente o enigma que os atrasava. E se Cody estivesse realmente certo de sua teoria?
- E eu não agüento ficar aqui parada! - exclamou Miyako, levantando-se subitamente. Andou vários metros, parando para esquentar as mãos e dar uma olhada pelo firmamento escurecido. Todo aquele jeito histérico da velha Yolei se refletiu na frase, mas com um tom de nostalgia.
- Tudo bem, fique calma... é claro que vamos dar um jeito nisso. Podemos pensar um pouco antes de continuarmos. - disse Davis, querendo ser otimista, mas sério.
- É... assim vejo se consigo andar melhor... ai - queixou-se Iori, colocando a mão sobre a cabeça. O cozinheiro levantou o polegar para ele, perguntando se estava tudo bem. O rapaz assentiu.
Yolei continuou parada, de costas, mas olhou-o de relance sem se virar. Sim... seria bom refletir. Cody poderia descansar a cabeça e verificar se realmente não levara nenhuma pancada. E gostaria de se esquentar... uma lareira fazia falta. E como! Chegou a suspirar ao pensar naquele calor reconfortante.
Hawkmon... meu amigo... você sabe que estou morrendo de preocupação. Sabe... não é?
A moça ajoelhou-se e esfregou os braços para diminuir o frio.
Sei que você pode me ouvir, de alguma maneira. Eu sinto... eu preciso... eu desejo. Sim, pois se posso desejar, ao menos penso que é verdade. Aprendi, principalmente com TK, em ter fé nas coisas. E Hawkmon... onde você está? Preciso vê-lo! Oh, só espero que esteja bem... e todos os outros. Peço que agüentem, por favor, até nós conseguirmos sair daqui e encontrar os demais.
Miyako olhou para trás. Iori também jazia ajoelhado, com os olhos fechados. Parecia meditar, se acalmar... ou fazer uma oração. Davis incrivelmente estava deitado na neve, sem se importar com o gelo; suas mãos apoiavam a cabeça, e seus olhos carregados de nervosismo se enfocavam em algum ponto do céu. A lanterna estava ao seu lado, acesa.
A jovem Ichijouji voltou em seus pensamentos e decidiu cerrar os olhos também. Enxugou as lentes dos óculos com as vestes e voltou a acomodá-los no nariz.
Bem... e se Iori-chan estiver certo de verdade em suas palavras? E... se for assim... como poderemos achar esse enigma "mágico"? Aliás, não sei de onde ele tirou esse pensamento. Está agindo meio esquisito... mais misterioso do que o normal. Disse... que poderia ser mágico como o Digimundo e nossos brasões. Hawkmon! Eu poderia estar chamando pelo digiovo agora...
De repente, ela abriu os olhos. Franziu a testa. Não sabia se estava tendo alguma idéia, mas algo que poderia tentar e fazia certo sentido. Afinal, não estavam perdendo nada, mesmo.
Meus digiovos... meus brasões... Amor e Sinceridade - sorriu, sozinha - É o que guardo em meu coração. Sim, preciso desejar! Desejar que tudo acabe bem... que possamos ver nossos digimons! Afinal... lembro-me do que o jovem Genai havia nos dito há onze anos atrás: o Digimundo é composto de dados digitais e desejos humanos. Sei que não estamos lá, mas... se eu desejar sinceramente do fundo do meu coração... se eu tiver fé....
Yolei juntara as mãos e então se levantou, clamando pelo firmamento:
- Hawkmon! Onde você está?
Cody abriu os olhos; Davis sentou-se. Olhavam agora para ela, achando que realmente não receberia resposta, mas com uma pequena esfera de esperança brotando em seu ser. Não disseram nada para impedi-la, porém sussurravam para si mesmos...
- Veemon...
- Armadillomon...
Miyako olhava em todas as direções possíveis. Acreditava firmemente que algo poderia acontecer, mas nada mudara. Não podia ser agora, justamente quando sentia explodir algo em seu peito.
- Anda! Me reponde! Manda um sinal! - gritou. Sentiu um pouco de desânimo - Droga...
Eu sei, é mesmo algo mágico! Será... será que não posso ouvi-lo? Nem ao menos dentro de mim? Vamos, estou desejando! Não quero que aconteça algo ruim a você... tampouco aos outros. Quero sentir a parte viva que ainda resta do meu Hawkmon...
Um brilho esverdeado começou a emanar de Miyako. Era verdadeiramente belo, e emitia uma luz frágil de seu coração... A moça sentia-se estranhamente bem, até contente, mas com uma sensação se paz.
Começou a caminhar para a direita, em direção à extremidade da montanha, parecendo hipnotizada. Davis Motomiya notou e fazia menção de levantar-se... Pensou que a amiga fosse apenas andar e parar novamente, para tornar a refletir ou chamar o companheiro digital novamente. No entanto, Yolei parecia não ter intenções de retroceder. O simples fato de chegar perto do penhasco fazia os pêlos da nuca de Davis ficarem em pé.
- Miya... o que vai fazer?
Ela não respondeu; continuou andando calmamente. Iori o olhou com seriedade e levantou a mão com lentidão, como se quisesse silenciá-lo. Se Yolei andasse mais alguns metros poderia cair!
- Cody... ah, YOLEI! NÃO! - berrou Davis, levantando-se desajeitado e desesperadamente, querendo correr e alcançar a amiga antes do pior.
Antes que pudesse aproximar-se, uma luz em tons de laranja e azul escuro brilhou em seu peito com tal intensidade que ele teve de espremer os olhos. Terminou caindo sentado outra vez, notoriamente confuso e surpreso.
- Cody, o que é isso...? Ah...Yolei... - Daisuke também teve uma sensação boa com aquele brilho, e a imagem de Veemon chamando alegremente pelo seu nome passou por sua mente em uma fração de segundo.
Felizmente, Miyako parara com o seu caminhar. Sorria, contente por alguma coisa, enquanto Hida levantava-se tontamente e espiava o céu.
- Ah! Eu sabia! - alegrou-se a moça.
- O que está havendo? - perguntava Motomiya, agora conseguindo enxergar melhor.
Visualizaram uma espécie de pássaro voando em sua direção. Estava ainda longe, mas puderam distinguir as longas asas planando no ar.
- Quê? Hawk... Hakwmon?! É mesmo ele? - perguntou Daisuke, arregalando os olhos.
- Não... é um falcão. - respondeu Cody, seguro do que falava, observando serenamente o animal se aproximar. Uma luz bem fraca, mas perceptível, começava a rodear o garoto.
Daisuke continuava aturdido, o fitando com a testa demasiada franzida.
Era um majestoso falcão, de olhos cor de âmbar, coberto de penas brancas. Chegou até Yolei em alta velocidade, pousando gentilmente em seu braço. A moça não parecia nem um pouco assustada, ao contrário, sorria satisfeita para a ave.
- Eu sabia... ainda há esperança...
- Quê?! - exclamou o cozinheiro, ficando de pé com a ajuda de Iori.
O falcão branco levantou vôo outra vez, fazendo os cabelos de Miyako esvoaçarem, e partiu para o alto da montanha. Pairava em torno do pico e voltava em outras direções.
- Será esse o nosso enigma? - disse Cody, olhando tranqüilamente para o pássaro. Era como se ele soubesse de tudo o que ia acontecer, o que deixava Davis ainda mais intrigado - Você desejou profundo, Miya.
A jovem o fitou, sentindo o mesmo que Daisuke. A luz fraca em torno de Cody se intensificou, tomando uma cor lilás. Ela, então, assentiu.
- Hai! Você tinha razão, Iori-chan! Nem posso acreditar... me enviaram um anjo, me enviaram um anjo! Vejam... os nossos brasões.
- Hem... - Davis olhou para baixo, do lado esquerdo de seu peito. A luz ainda brilhava ali.
Yolei correu até eles e puxou Davis pela blusa de lã - que ela havia lhe emprestado quando chegaram na Zona -, com aquele seu jeito de menina.
- Os digimons... os digimons ainda estão bem, Dai. Mas estão nos chamando... precisam de nós. Agora tenho certeza de que Hawkmon pôde me ouvir. E o seu Conhecimento, Cody... ultrapassou os limites.
Daisuke Motomiya foi abrindo um sorriso, parecendo entender aos poucos.
- Sim, claro. Vamos lutar por eles.
- Hum... acho que conseguimos. - murmurou Hida.
A moça olhou à sua volta, admirada. Tudo ao redor parecia desaparecer gradativamente, como se estivessem entrando em outra dimensão. A neve, as montanhas, o céu... e até mesmo o falcão que ainda sobrevoavam iam tornando-se transparentes, dando lugar à brancura total.
**Continua...
Notas finais: Que tal ficou pra vocês? O que acharam? Creio que esta é a Zona mais "esclarecida" até agora ^^"... não? Bom, cada Zona já foi apresentada mas, como eu havia dito no capítulo anterior, a Zona onde estão Sora, Mimi, Ken, Koushiro e agora Yamato e Taichi, é a mais importante. Será que Cody tinha mesmo razão em sua "teoria"? Os digiescolhidos descobrirão o verdadeiro significado dos enigmas? O que acontecerá na Zona da Primavera (esses nomes de estações me deixam enjoada)? Bem... as perguntas para estas e outras perguntas vocês irão saber... não sei quando, espero logo -^.^-" O próximo capítulo (O espelho), para variar, vai demorar a chegar um... pouquinho, tá? Vou tirar umas férias! Então desejo logo um FELIZ NATAL e FELIZ 2004 a todos!
Até mais,
Manu(1)
