DDT.1: PÁGINAS PERDIDAS

Capítulo 10 (penúltimo capítulo)

AUTORAS: Lady K & Towanda BR

DISCLAIMER: Todos os personagens da série Sir Arthur Conan Doyle's The lost world não são nossos (infelizmente), então não venham nos encher o saco.

COMMENTS:

Aline: Você pagou suas dívidas e fez crediário novo? He! He! Massagens nos pés? De onde vc tirou essa idéia? Se dependesse de vc tadinho do Thomas.

Rosa: Obrigada pelo carinho e por ser sempre tão atenciosa. Quanto a Anne e Lady Roxton estamos trabalhando para que tudo seja esclarecido ao longo dessa 4ª temporada virtual.

Rafinha: Obrigada por nos acompanhar. Adoramos seus reviews.

Lorena: Opa, gente nova deixando review. Abigail e Thomas ainda tem muitos caminhos a percorrer. Quanto a Marg e Roxton, concordo com você que eles se amam, mas acho que dessa vez a paciência do caçador chegou ao limite.

Nirce: Parece que a coisa está feia para o lado de Marguerite e Roxton. Acho que nesse caso, depois da tempestade vem o dilúvio.

Jess: Você acha que o Roxton vai mudar de idéia? Depois que você ler esse capítulo vai pensar melhor a esse respeito

Di Roxton: Você voltou, Di. Que legal. Já que você pediu ai vai o capítulo 10. Espero que goste.

Nessa Reinehr: Nossa, ficamos envaidecidas com seu review. Realmente, você mostrou a luz no fim do túnel. Obrigada.

Laiza: Não imagina como nos fez feliz o seu review. É sempre gostoso perceber que mais pessoas estão lendo a fic.

Cris: Concordo plenamente com você. Paciência tem limites e Marguerite puxou a corda até arrebentar. Agora é esperar que tenha conserto. Um feliz aniversário para você e tudo, tudo de bom.


Capítulo 10 (penúltimo capítulo)

Abigail dissera a Thomas que Manaus não era uma cidade esquecida e atrasada como muitos pensavam. A princípio, ele acreditou que sua esposa estava sendo uma boa patriota, já que estavam falando de uma região tão próxima ao lendário platô. Entretanto, teve que tirar o chapéu assim que colocou os pés nessa terra maravilhosa.

Com o desenvolvimento econômico e social provocado pelo Ciclo da Borracha a cidade cresceu muito rápido. Havia o sistema de transporte, composto por uma locomotiva que puxava jardineiras; sistema de iluminação em arco voltaico; um dos primeiros ateliês fotográficos do Brasil; os dois primeiros cinemas do Continente; as primeiras linhas regulares de bonde e a primeira empresa tipográfica, com jornais em francês, alemão e inglês, entre outras línguas faladas normalmente pela população endinheirada da cidade. Podia-se dizer que Manaus "respirava" ares europeus.

A partir de 1869, a cidade havia começado a familiarizar-se com a ópera, opereta, drama, comédia e mágica. O palco para esses espetáculos era o magnífico teatro de Manaus

Mesmo não estando acostumado ao clima quente e úmido de Manaus, Thomas adorou todo o burburinho e a agitação.

Apesar de Abigail tranqüiliza-lo, esperava ser devorado por mosquitos e estranhou quando isso não aconteceu. Um dos cientistas explicou que a região próxima à cidade possui pouquíssimos mosquitos devido à dificuldade de reprodução pela acidez das águas do rio Negro, que banha a Capital.

Gostou de passear pelas feiras locais, tão coloridas, tão cheias de vida, com pessoas tão abertas. Parecia que riam e eram felizes o tempo todo! A maioria da população local não entendia seu idioma, mas através de gestos e do aprendizado de algumas palavras em português, conseguiu se comunicar razoavelmente bem.

Conheceu alguns brinquedos artesanais, com os quais ficou encantado, como se voltasse a ser uma criança: a peteca confeccionada em palha de milho, com enchimento de areia, e com penas de galinha; piões elaborados em forma graciosa, usando o fruto totuma; bonequinhas de palha e panelinhas de barro.

Também ficou maravilhado com as comidas que provou, tão diferentes da culinária britânica. "De sabor exótico e inesquecível." – definiu. Como comparar as maravilhosas frutas da região, o manjar de tapioca, o bolinho de mandioca e o arroz com castanha-do-pará com saladas pobremente temperadas, com bolos e doces sem imaginação ou sabor.

Abigail conhecia melhor o idioma e serviu de intérprete à expedição que se juntou a eles, proveniente de Londres. Precisariam ainda de algum tempo para concluir os preparativos que os levaria finalmente ao platô.


A expedição partiria em dois dias. Sentados à mesa do restaurante do hotel, o casal havia conversado bem pouco durante o jantar. Abigail percebeu que em nenhum momento o marido a olhara nos olhos.

"Thomas?"

"O que?" – ele ruborizou, mas continuou sem olhar para ela.

"Conheço esse olhar de garoto travesso. O que você andou fazendo?"

"Eu?"

"Você sim. Olhe para mim." – ela fingia seriedade e ele obedeceu. "Conte tudo."

"É que... comprei algumas coisinhas para nossa casa no platô."

"Umas coisinhas. E o que por acaso seriam essas coisinhas?"

"Ora... coisas."

"Conte logo."

"Uma cama, mas não se preocupe. Está desmontada e o estrado farei quando chegarmos."

"Você disse coisas. O que mais?"

"Um umumumum..." – resmungou entre dentes.

"Um o que?"

"Um colchão. Não podemos ter uma cama sem colchão." – apressou-se em explicar.

"Como vai levá-lo?"

"Tem mais."

"Hã!"

"Conte de uma vez."

"Um gramofone, discos, e uma banheira."

"Não acredito."

"São só alguns poucos luxos, Abi."

"Como vai levar tudo isso?"

"Nosso guia, Sinta, um rapaz muito jovem, mas muito experiente. Disse que é possível. Ele mesmo contratou alguns carregadores extras. Homens humildes que precisam de trabalho. E se houver qualquer problema, prometo que largo tudo no meio do caminho."

Abigail permaneceu em silêncio.

"Está zangada, não é?"

A moça riu do jeito amuado dele.

"Sabe muito bem que não consigo ficar zangada com você."

"Tem certeza?"

Ela inclinou-se, beijando-lhe os lábios.

"Tenho. E detesto dar o braço a torcer, mas foram compras muito úteis."


O quarto de Marguerite ainda estava na penumbra, graças às cortinas que o fechavam. Mas seu corpo, já acostumado a levantar-se habitualmente no mesmo horário, dava indícios que mais um dia começava. Mesmo sem sono, cobriu a cabeça com a colcha, na tentativa inútil de dormir mais um pouco. Logo sentiu fome e lembrou-se que não havia jantado na noite anterior.

Parou para ouvir os sons que vinham da cozinha. "Ummm" espreguiçou-se, "Roxton já deve ter preparado o café."

Fez sua higiene pessoal, trocou de roupa e foi de encontro ao caçador. Viu-o comendo o único pedaço de torrada.

"Não deixou nenhuma para mim?" perguntou irritada.

"Se quer torradas, você que prepare!" respondeu sem ao menos olhá-la.

"Certo, certo." – Ela pegou 2 fatias de pão, passou manteiga e colocou-as na torradeira. Pegou uma xícara e foi servir-se do bule prateado que repousava sobre a mesa.

"Mas o que é isso, Roxton? Chá! Onde está o meu café?"

Ele já entrava no elevador.

"Se eu queria chá, por que deveria preparar café?"

"Volte aqui, Roxton! Você não vai sair assim e me deixar falando sozinha!" Marguerite apenas ouviu o barulho do elevador que descia.

"Arrogante... Prepotente... Que ódio!" - bruscamente atirou para longe, a xícara de porcelana em que há pouco ele tomava seu chá - "Droga! Verônica vai me matar!"


Há muito Manaus ficara para trás. Tendo Sinta como guia, a expedição Layton continuava seu caminho mata adentro. A copa das árvores fechava completamente, e ao mesmo tempo que formava um teto, onde não era possível penetrarem os raios de sol, deixava o ar abafado e quente e os exploradores pareciam derreter, carregados de coisas, pois, como dissera previamente Thomas, todos deveriam ajudar a levar o que fosse necessário. Os mais fortes revezavam-se à frente da expedição, junto a Sinta, abrindo caminho por entre as plantas. Fechando o grupo iam os melhores atiradores, atentos a proteção dos companheiros que iam no centro.

Thomas agora se convencia de que o platô era praticamente inacessível. Há dias eram torturados pelas condições climáticas, mas seguiam sempre em frente e, mesmo assim, pareciam nunca chegar.

Entretanto, nem a distância nem o clima nunca foram empecilhos para a existência de povos que sobrevivem graças à floresta. E foi assim que a expedição acabou entrando nas terras dos Mundurucus.

Sinta avisara que estavam sendo observados, mas que não fizessem movimentos que pudessem ser interpretados como hostis e apenas caminhassem naturalmente. Se quisessem os nativos teriam matado facilmente a todos.

Após avistarem a aldeia, Thomas sugeriu que dessem a volta e evitassem passar por lá, mas o jovem guia da expedição explicou que os Mundurucus considerariam uma afronta dos estrangeiros.

"São um povo fechado, que prefere evitar o contato com os outros povos da região, pois um dia foram muito explorados pelos colonizadores. Mas quando alguém passa por seus domínios, acreditam que não oferecer-lhes abrigo pode provocar a ira dos deuses. Acampamos na tribo. Aceitem o que lhes for oferecido e amanhã partimos. De qualquer modo, não tarda a escurecer."

Os estudiosos que ainda não haviam tido contato com nenhum grupo indígena, ficaram um pouco chocados ao verem homens e mulheres andando nus. Alguns deles usavam apenas um tapa sexo feito com fibra natural, outros estavam completamente desnudos, adornados apenas com pinturas no rosto e, na pele, alguns adereços.

Abigail, percebendo o clima no ar, intercedeu em inglês. "Sejam discretos com os olhares. Para essas pessoas não há nada de pecaminoso ou indecente em exibir o corpo. Respeitem-nos."

Mas mesmo que ela não os tivesse alertado, logo se acostumariam. A graça e a naturalidade com que se moviam indicava que, realmente, não se via pecado algum naquilo. Talvez até achassem estranho que os visitantes usassem tantas roupas.

As crianças tocavam os exploradores com grande curiosidade; riam e se afastavam rapidamente quando algum se movimentava em sua direção.

Então, um homem que se vestia de maneira diferente, com uma quantidade maior de adornos de plumas de pássaros silvestres aproximou-se.

"Meu nome é Aitapu, chefe dos Mundurucus. Não temos muito a oferecer além de comida, abrigo e nossa hospitalidade enquanto assim o desejarem."

Abigail e Sinta eram a únicos que conheciam um pouco do dialeto.

"Nós agradecemos e aceitamos a hospitalidade. Não queremos incomodar seu povo. Ficaremos felizes se puder nos abrigar até amanhã cedo."

O chefe assentiu com a cabeça e mostrou-lhes uma grande barraca, sem paredes. Era construída com vários caibros de madeira e coberta com folhas de coqueiros. Várias redes se prendiam, servindo de cama. Sinta explicou que ali não havia uma casa como propriedade, tal como na civilização moderna. Essas eram ocas coletivas, onde todos dormiam juntos e, aquela em especial, era deixada de reserva para algum visitante. O único a possuir uma oca individual era o pajé, que havia sido morto recentemente por uma onça.

Enquanto se acomodavam, Abigail e Thomas notaram alguns doentes sendo cuidados por outros da tribo.

Chamaram um dos médicos que acompanhava a expedição e perguntaram ao chefe se poderiam ajudar.

"Não estão doentes e sim possuídos pelos espíritos maus da floresta. Assim como as estações do ano, sua doença ocorre cada dois dias. É uma prova de que se trata de algo que fizeram que não agradou aos espíritos. Mas se conhecerem mágica ou medicina que funcione, podem tentar."

Acompanhado por outros membros da expedição, o Dr. Hollow verificou os sintomas: todos os pacientes apresentavam o 'acesso malárico', caracterizado por intenso calafrio, seguido de elevação rápida da temperatura corpórea, acompanhada de náuseas, dor de cabeça, dores musculares e abdominais. À medida que a temperatura começa a baixar, o doente apresenta intensa sudorese. Esse acesso, que pode durar vários minutos ou horas, se repete em dias alternados, de 48 em 48 horas. Pelo tamanho do intervalo, o doutor explicou que se tratava da malária causada pelo P. vivax ou P. ovale.

Alguns, mais afetados, apresentavam anemia, falta de apetite, aumento do tamanho do fígado e do baço, fraqueza e distúrbios gastrointestinais. Apesar desse quadro preocupante, entendido pelos indígenas como uma luta entre o espírito malfeitor e o espírito da pessoa afetada, esse tipo de malária nem sempre leva à morte.

"Conheço um remédio que pode curar a doença, mas preciso saber se existe aqui na selva. Trata-se de uma planta." O médico explicou a Thomas, a Abigail e ao chefe, que o compreendia através da tradução do guia e da moça.

A planta, conhecida como 'chinchona', era uma árvore de casca grossa, que deveria ser extraída e então passar por um processo de retirada de seu princípio ativo (o quinino). Felizmente, Abigail, que tanto havia aprendido sobre plantas no platô e, depois, em Londres, sabia exatamente o aspecto do vegetal.

A expedição acabou por não partir na manhã seguinte, pois não havia como abandonar os enfermos sem terem a certeza de que não corriam mais perigo.

Então, aproveitando os dias em que permaneceram ali, Abigail ensinou a um discípulo do pajé morto o uso de várias ervas para eventuais emergências: dor, inflamação, feridas, náuseas etc. Os cientistas também orientaram sobre algumas regras básicas de higiene que os ajudaria a evitarem algumas doenças.

Quanto à malária, explicaram que, para evitar a doença poderiam confeccionar algum tipo de tela para cobrirem as redes ou as paredes das ocas e também evitar estar ao ar livre nos horários em que o mosquito normalmente ataca, como o amanhecer e o anoitecer. Os pesquisadores aprenderam com os nativos a usar as sementes de andiroba como repelente.

Alguns dias depois, todos se recuperaram ou estavam a caminho da total recuperação. Abigail sentia-se realizada, afinal, a expedição cumpriu a primeira ação de muitas que fariam: melhorar a vida das pessoas que vivem no platô. Ainda não haviam chegado, obviamente, mas ela interpretou isso como um sinal de boa sorte.

Quando o momento de partir chegou, Thomas foi surpreendido por dois cientistas.

"Sabemos que nos comprometemos a acompanhar a expedição até o fim, e é por isso que estamos vindo até você. Para pedir que nos libere dessa promessa. Caso sejamos aceitos gostaríamos imensamente de permanecer junto aos Mundurucus aprendendo seus hábitos e ajudando-os no que for possível."

Thomas apertou a mão dos dois homens.

"Se é o desejo de vocês e for o deles, eu os libero. Com tristeza por estar perdendo bons companheiros, mas com alegria por saber que farão um bom trabalho. Sejam felizes, meus amigos."

E com mais suprimentos oferecidos em agradecimento pela tribo, a expedição prosseguiu rumo ao platô, abrindo caminho por entre a mata selvagem e cruzando grandes rios e maravilhosos igarapés.


As horas passaram-se tediosas para Marguerite. Se havia uma coisa que a deixasse inquieta era ficar sozinha. Andou pela casa toda à procura de algo interessante, mas nada lhe prendia a atenção: tentou ler; recontou pela milésima vez suas jóias e pedras preciosas; xeretou o laboratório; folheou os diários de Malone e até se deu ao luxo de mexer no porta-jóias de Verônica. E nada adiantava...

"Roxton, por que você tem que ser tão turrão? Não desiste nunca, que inferno!" resmungava sentada no sofá, com os braços cruzados. "Mas se pensa que vou ficar aqui sofrendo por você, está muito enganado!"

Tomou um banho bem demorado na banheira, usando seus melhores sais, que há muito começara a racionar para que ficassem apenas para ocasiões especiais.

Depois, colocou seu hobby de seda, penteou os cabelos e os deixou soltos para que secassem naturalmente. "Vai ser do jeito que quiser, lord Roxton! O que o faz pensar que se tornou essencial para mim? Só por um simples café!"

Foi a até dispensa e começou a revirar tudo, até encontrar o que desejava: as poucas bebidas que ainda havia na casa. Colocou tudo sobre a mesa e começou a provar alternadamente cada uma delas.

Depois já haver bebido mais do que seu limite, começou a ficar tonta e abaixou a cabeça sobre a mesa e desatou a chorar, soluçando. "Challenger, Verônica, Ned, Finn... onde estão vocês? Voltem! Você não precisa voltar, Roxton! Veio com essa sua conversinha mansa, esse seu jeito cafajeste... burra, Marguerite, burra!" e continuou a dizer frases desconexas até cochilar sentada à mesa.


Os dias foram passando lentamente, sem que nada da rotina diária da expedição Layton fosse alterada; era sempre o mesmo: levantar-se quando ainda estava escuro, tomar um café da manhã reforçado; depois, caminhar até o final da manhã, quando almoçavam e, uma hora depois, a marcha recomeçava, parando somente quando o último raio de sol deixasse de iluminar o caminho. Então armavam acampamento, faziam a última refeição do dia e caíam exaustos de sono. E no dia seguinte tudo recomeçava...

Juntamente com o médico da expedição, Abigail estava sempre atenta para que todos estivessem bem hidratados, lembrando-os de beberem bastante água, que era abundante por todo o caminho. Além disso, quando encontrava frutas comestíveis, incitava-os a comê-las também.

Entretanto, nos últimos dias os homens davam sinal de cansaço e impaciência. Thomas detestava admitir, mas ele mesmo começava a duvidar que pudessem chegar a algum lugar. Talvez ela tivesse se confundido e errado a direção. Contudo, em nenhum momento deixou transparecer suas dúvidas. Mas temia que os componentes da expedição se rebelassem em algum momento e mais do que nunca Thomas procurava permanecer ao lado da esposa. Após tanto tempo longe de casa, ela tinha dúvidas do quão perto estavam. Mas sabia estar na direção certa.

Em uma tarde especialmente quente, os ânimos estavam à flor da pele. Um dos homens confrontou o líder da expedição na frente dos companheiros.

"Não daremos mais nenhum passo sem ter uma resposta concreta. Para onde estamos indo? Quando chegaremos?" – reclamou o topógrafo Patrick Rouanet em nome dos homens.

"Que me lembre, vocês concordaram em me seguir sem saberem onde."

"Seja realista, Thomas. Estamos rodando em círculos. Indo do nada para lugar nenhum."

"Você não sabe o que está dizendo."

"E parece que você também não." – ironizou.

Thomas percebeu que deveria tomar as rédeas da situação antes que fosse tarde demais.

"Prestem atenção. Não vou pedir um voto de confiança porque acredito que só o fato de terem me seguido cegamente é o suficiente. Ninguém disse que seria uma viagem fácil. Não lhes prometi nada que não tenha cumprido até agora." – fez uma pausa olhando a todos firmemente – "Acamparemos aqui esta noite. Acalmem-se e pensem a respeito de tudo isso. Aqueles que não quiserem continuar têm toda a liberdade para retornar."

Houve um murmurinho geral. Por um lado, estavam sim em dúvidas quanto à liderança de Thomas. Porém, haviam se comprometido a segui-lo.

"Retornar para onde, Thomas? Para o nada? Ou seguimos em frente, com você, que está perdido, ou voltamos e nos perdemos, sozinhos" - atreveu-se Patrick.

"Como disse, a decisão está em suas mãos, amigo. Não vou implorar a ninguém para me seguir. Se for de sua vontade retornar fornecerei guia e os carregadores que precisar."

"Admita, Thomas, estamos sendo guiados por uma mulher" - apontou com desprezo para Abigail - "O que uma mulher sabe?"

Sem hesitar Thomas, foi certeiro ao desferir um murro no rosto do jovem, que caiu no chão. Tocou o lábio, que agora sangrava - "O que houve? Não gostou de ouvir a verdade? Ou é mentira que você é um brinquedo nas mãos da sua mulher?"

Thomas teve todo seu corpo tomado por profunda cólera e partiu para cima do homem. Foi seguro por outros membros da expedição.

"Escutem todos!" - disse Abigail tentando demonstrar calma – "Ninguém disse que seria fácil chegar ao platô. Sabiam o que os esperava e, mesmo assim, optaram por vir. Posso ser apenas uma mulher para vocês, mas este é o meu lar. É onde eu cresci e sei perfeitamente para onde estou indo e esta é a confiança que meu marido depositou em mim. Se não podem fazer o mesmo, será melhor que retornem. Mas se continuarem conosco, não serão mais toleradas cenas como essa."

E saiu para preparar o acampamento, com toda a calma e elegância, como se todos aqueles homens, agora pasmos diante da fibra da mulher, nem estivessem ali. Thomas fez o mesmo, mas não sem antes falar com Patrick:

"Estarei de olho em você."

Novamente o topógrafo passou a mão no lábio ferido, a escorrer sangue, e lançou um olhar carregado de ódio para o engenheiro. Mal sabiam os Layton que acabavam de fazer um grande inimigo.


Após mais alguns dias de caminhada, Abigail orientou o marido que a partir daquele momento ela deveria seguir vários metros a frente da expedição e em nenhum momento, nem ele, nem ninguém, deveria dela se aproximar.

"Sinto que estamos muito perto. Quando encontrarmos os avatares, qualquer um que esteja perto de mim pode ser confundido com um agressor."

Thomas se preocupou.

"É perigoso, Abi. E se antes que eles possam se juntar a nós você for atacada por algum animal?"

"Se isso acontecer, vou fechar meus olhos e acreditar com todo meu coração que você não errará o tiro."


Andaram por mais de meio dia. Carregando um afiado facão era Abigail quem ia vinte metros a frente abrindo caminho pela mata. Quando fizeram uma parada para descanso e almoço, a moça permaneceu isolada do grupo. De longe ela e Thomas trocavam olhares. Ele mal tocou a comida, preocupado em vigiá-la.

Quando Abigail foi rapidamente cercada por 10 homens robustos ,empunhando o que pareciam cimitarras de combate, o engenheiro levantou-se num rompante apontando a arma para eles. Os membros da expedição fizeram o mesmo.

"Abaixem as armas." – ordenou a moça. Como nenhum deles a obedecesse, disse com firmeza – "Agora!"

Mesmo hesitando, Thomas foi o primeiro a obedecer. Sem tirar os olhos da esposa colocou o rifle no chão. Os outros acompanharam seu gesto. Só então um dos avatares virou-se para Abigail. Postando-se a sua frente, ajoelhou e fez reverência.

"Levante-se." – Ela disse. O homem obedeceu – "Estes são os meus amigos e nenhum deles me fará mal. Vocês nos levarão em segurança até o platô. Juntem-se a nós, partilhem de nossa comida e descansem. Sairemos amanhã bem cedo."

Ele inclinou a cabeça assentindo disse duas ou três palavras a seus comandados que viraram-se para a mulher e a reverenciaram antes de se recolherem.

Thomas reuniu os carregadores e guias.

"A jornada de vocês termina aqui. Vocês estão dispensados de suas obrigações. Ao amanhecer seguiremos caminhos diferentes. Agradeço a dedicação de todos vocês."

Minutos depois Sinta foi até o engenheiro.

"Senhor. Trabalho apenas para o meu sustento. Não tenho família nem ninguém. Nada me prende a Manaus. Meu instinto me diz que descobrir coisas novas e estar com pessoas que desejem construir alguma coisa é o meu destino. Se permitir gostaria de permanecer com a expedição."

Na manhã seguinte, os carregadores e guias, sem Sinta, seguiram de volta a cidade.


A descida com a ajuda de cordas pela abertura inclinada da caverna estreita parecia anunciar uma jornada árdua. Metros abaixo se abria uma galeria espaçosa e relativamente fácil de caminhar. Mas a quantidade de caminhos dentro do local era imensa. Para qualquer incauto seria impossível entrar ali e encontrar o caminho de volta.

Quando finalmente adentraram ao platô os homens ficaram boquiabertos. Acostumados com a selva fechada e escura da Amazônia, o platô se abria, cheio de luz, vegetação deslumbrante e uma brisa fresca.

Abigail beijou o marido.

"Bem-vindo ao platô."


Assim que os primeiros raios de sol adentravam pelas frestas da choupana, Verônica se levantava, indo juntar-se aos amigos Kadiwéus.

Toda a tribo já havia regressado do festejos e o trabalho pôde ser feito ainda mais rapidamente.

Orientou às mulheres que, com capricho, usavam vime para refazer o fundo danificado do cesto do balão. Posteriormente, os nativos reforçaram a peça com madeira. Acompanhada pelos novos amigos, saía para procurar enxofre ou extrair a seiva das seringueiras, que usava para fazer a borracha. Partilhava da comida deles, aprendia a respeito de seu idioma e costumes. Mesmo assim, sentia saudades de casa e dos amigos. À noite, após o dia de trabalho árduo, dedicava-se à leitura de algumas páginas do diário antes de finalmente ser vencida pelo cansaço.


Acamparam alguns quilômetros adiante e foram instruídos a aguardar. Alguns novos avatares chegaram e Abigail passou correndo por eles sem dar atenção a nada. Feliz abraçou com força a mulher que vinha logo atrás deles.

"Mamãe!"

"Abi, eu sabia que você estava voltando." – beijou longamente o rosto da filha – "Senti tantas saudades."

"Eu também. Como você está? E vovó?"

"Estou muito bem. Sua avó continua reclamando que está velha, mas está melhor do que nunca."

"Mãe, quero que conheça alguém." – pegou a mulher pela mão e conduziu até o engenheiro que caminhava em direção as duas – "Este é meu marido, Thomas Layton. Thomas, esta é Adelaide, minha mãe."

Adelaide estendeu a mão e o rapaz a beijou educadamente.

"É um prazer, senhora. Agora sei de onde vem a beleza de sua filha."

"É muito gentil, Thomas." – O engenheiro ficou satisfeito ao ser chamado pelo primeiro nome. Em seu mundo seria chamado de senhor Layton.

Adelaide foi apresentada a cada um dos membros da expedição. Curiosa conversou um pouco com todos. Depois chamou a filha para uma conversa reservada.

"Deixem os homens acampados aqui, serão muito bem tratados e poderão descansar por um ou dois dias antes de prosseguirem. Sua avó está em Avalon aguardando você e seu esposo."

"Acha que ela gostará dele?"

"Mesmo que não gostasse, é a você que ele tem que fazer feliz." – riu Adelaide.

"Obrigada."

"Só mais uma coisa. Você tem um objeto que não pode entrar em Avalon."

"Não que me lembre."

"Pense, filha. É importante."

Bastaram alguns segundos para que a moça lembrasse. Pegou o lenço onde estava embrulhada a pequena peça de metal.

"Anne Mayfair pediu que eu trouxesse isso comigo."

Adelaide estava fascinada.

"Quando em Avalon, o oroborus tentaria sugar a energia do trion e não sabemos quão perigoso seria. Deixe o objeto aqui comigo. Vá encontrar sua avó. Tem minha palavra de que eu o protegerei pessoalmente."


Escoltados por avatares, Thomas e Abigail saíram ao entardecer. Não foi uma caminhada longa e nem difícil, mas, assim como a entrada do platô, apenas aqueles que realmente conhecessem o caminho poderiam chegar a Avalon. Provavelmente muitas pessoas por lá já haviam entrado sem mesmo saber. Não havia um portal, praticamente nenhuma mudança entre o platô e o refúgio. A única diferença eram as construções de pedra praticamente escondidas dentro da mata.

Aderes os recebeu em uma dessas casas. Nem maior nem menor do que as outras.

Abigail a abraçou longa e carinhosamente.

"Senti saudades, vovó."

"Eu também, querida. Fez boa viagem?"

"Sim. Maravilhosa. Obrigada... Quero lhe apresentar alguém muito especial."

"Thomas Layton a seu dispor senhora." – ele repetiu o gesto que fizera ao conhecer a mãe da esposa. Mas a protetora não pareceu impressionar-se. Andou em volta do rapaz examinando-o de cima a baixo.

"Você não me parece muito forte."

"Vovó!" – reclamou a moça ao perceber o constrangimento do marido.

"Abigail. Eu gostaria de falar a sós com ele."

A moça hesitou. Thomas a tranqüilizou.

"Está tudo bem, Abi."

Após a saída da moça, Aderes sentou-se a frente do rapaz.

"Você sabe quem eu sou, não é?"

"A avó de minha esposa. Também sei que é a atual protetora do platô"

"Sabe o que isso significa?"

"Sei que tem uma missão importante, assim como sua filha e sua neta terão um dia."

"Ela já lhe disse o significado disso na vida de vocês?"

"Sim."

"Então sabe muito a nosso respeito. Mas eu não sei nada sobre você."

Thomas pensou um pouco e aproximou-se da mulher.

"Sou americano, filho de irlandês, engenheiro." – fez uma pausa – "Desculpe. Não é nada disso... na verdade o que tem importância é que sou um homem que tem muito mais do que quase todos e pouco menos do que poucos. Nunca tive grandes dramas, exceto aqueles que são comuns a qualquer um. Sei exatamente o que quero e o que meu pai e meus irmãos esperam de mim. Que eu seja feliz e que honre minha família"

Aderes apenas meneou a cabeça numa leve reverência.


Ao ouvir o elevador lentamente, começou a acordar, embora ainda sentisse os efeitos da bebida.

O caçador aproximou-se e viu a bagunça que ela havia feito sobre a mesa. Havia algumas garrafas espalhadas e o cheiro de bebida era claro.

"Andou bebendo tudo que encontrou na dispensa?"

Ela levantou-se cambaleante e apontou o dedo para ele - "Eu sei muito bem me cuidar, lord Roxton!"

"Estou vendo."

"Ah, é mesmo? Vou te mostrar como sou uma mulher que faz o que quer!" - enroscou-se no pescoço dele - "E agora, eu quero beijar você!" – colou os lábios aos dele que não retribuiu. Roxton a segurou pelos braços afastando-a de si.

"Não é tudo o que você sempre quis desde que nos conhecemos? Vá em frente agora!"

"Às vezes eu não sei se você é dissimulada ou apenas finge não entender o que eu digo, Marguerite! Acha que quero apenas o seu corpo, me divertir com você?"

Ele andou em direção ao quarto, mas virou-se antes de entrar.

"Já lhe disse que não quero mais migalhas."


Parado perto da janela, Thomas estava nervoso. Ao sair de seu encontro com a protetora, foi lhe oferecido um delicioso banho quente e uma massagem com óleos aromáticos e, após vestirem-no apenas com um lindo roupão, uma saborosa refeição foi servida. Depois o haviam trancado no quarto confortável com uma grande cama e lençóis limpos.

Mas por mais confortável que estivesse não conseguia dormir. Preferia estar na selva, dormindo em esteiras ao relento, contanto que Abigail estivesse em seus braços.

Virou-se ao ouvir o barulho da porta e viu a moça entrar, trancando a porta atrás de si. Suspirou profundamente. Ela estava linda. Os cabelos estavam amarrados em um rabo de cavalo e ela vestia uma túnica longa presa aos ombros, cujo tecido deixava entrever sua silhueta.

Abigail deu alguns passosparando no centro do cômodo. Sem desviar os olhos dele soltou os cabelos. Em seguida desatou os laços que prendiam sua veste aos ombros deixando-a escorregar para o chão.

Thomas continuou parado, apenas contemplando o corpo nu da mulher que tanto amava. Começou a andar em sua direção, mas parou a alguns metros dela. Soltou o laço que amarrava o roupão e como ela, também o deixou escorregar para o chão. Foi a vez de ela olhá-lo por inteiro.

Aproximaram-se e Thomas correu os dedos suavemente pela face da esposa, descendo até o contorno dos ombros.

"Minha doce, Abi." – sussurrou.

"Estamos em casa, Thomas."

Foi apenas em Avalon que Abigail e Thomas se tornaram verdadeiramente marido e mulher.

CONTINUA!

ATENÇÃO: Capítulo 11 – capítulo final!

Os significados dos nomes: (pq fic é cultura!)

Adelaide: Significa de linhagem nobre e indica pessoa de grande sabedoria

Aderes: Protetora