"Lamentável." - a voz de Hiei invadiu os pensamentos de Lyn que, de costas para a entrada da tenda, desamarrava as faixas do punho. Instintivamente, ela levou as mãos aos pulsos tentando esconder cicatrizes de um passado muito distante, mas ao ouvir a voz de Hiei, relaxou.

Lyn estava fazendo um esforço incrível para se manter de pé, a ferida na barriga latejava e agora, com ele ali, não poderia simplesmente se render à dor. Gastara energias importantes e sabia que, depois disso tudo, morreria muito mais cedo. Mas não se importava, procuraria sua vingança até o final.

"Vá embora!" – ela ordenou sem se virar.

"Você sabe que eu não irei. O que aconteceu?"

"Eu venci. Você deveria estar acostumado a isso."

"Foi um duelo medíocre, você sabe disso." – ele replicou seco.

"Não me venha com sermões, Hiei! Acho que já passamos da idade disso...""

As faixas dos pulsos caíram no chão. A blusa estava chamuscada, as calças rasgadas nos joelhos, os braços e o rosto sangravam e estavam sujos de poeira e Hiei percebeu que suas pernas tremiam.

"Eu não vou perder meu tempo aqui, Lyn. Há algo errado e você vai me dizer o que é."

Ela fechou os olhos procurando calma e forças e depois olhou o youkai novamente.

"Muito bem, o que você quer saber?"

"O roubo. O que aconteceu?"

"Eu já contei."

"Eu quero ouvir de novo, só que dessa vez com mais detalhes."

"Você não conhece a lenda, Hiei? Uma guerra entre o mundo Espiritual e o das Trevas, há milhares de anos, pôs frente a frente 6 armas espirituais e 6 armas demoníacas, os famosos Tesouros das Luzes e das Sombras. O resultado foi uma matança em ambos os lados. O empate mais sangrento de qualquer história. Então, o que fizeram os Grandes Reis? Deram os Tesouros a um guerreiro, o transformaram em guardião e lhe concederam um pequeno presente: o Décimo Terceiro Tesouro."

"Todos conhecem a história, Lyn. Mas porque esse Tesouro é tão importante? Porque se meter com Kayo, se todos o protegem e o veneram? O Makai tem milhares de outros tesouros."

"Nenhum deles é como esse!" – explicou ela, pacientemente – "O Décimo Terceiro Tesouro é a única coisa capaz de quebrar o lacre da urna que guarda as Armas Sagradas, mas também, dá ao portador o direito a um pedido."

"Por isso você matou Kayo? Para ter as Armas Sagradas?"

Uma faísca cruzou os olhos e uma raiva surgiu dentro deles, tão visível na claridade do azul. - "O que você disse?"

Hiei hesitou.

"Quem lhe disse isso? Eles?" – ela perguntou, cravando seus olhos azuis no demônio, quase alcançando seus pensamentos.

"Eles acham que você matou e roubou Kayo, estão aqui em nome dos Reis e de Koenma. Você sabe que o que você fez foi loucura, ninguém chega perto de Kayo e sai ileso!"

"Você acredita que matei Kayo?" – ela perguntou fria.

Novamente não houve resposta.

"Você acredita!" – gritou ela.

"Não adianta gritar, Lyn. Só responda de uma vez."

Os olhos dela se enfureceram: "Eu sou uma ladra, não uma assassina, Hiei. O matador aqui é você."

Hiei fitou os olhos da ladra e neles não havia nem mentira nem qualquer intenção de enganar. Aquilo bastava para ele. Conhecia Lyn, mentir não era do seu feitio e por causa disso, não aceitava de maneira nenhuma que duvidassem de sua palavra.

"Quem foi, então?"

"As sombras nas paredes."

"Odeio quando você usa enigmas, você é péssima nisso!" – ele resmungou cruzando os braços.

"Não é um enigma, idiota! Alguém controlava as sombras nas paredes, alguém que esperou Kayo chegar à casa de banhos e o matou assim que ele ficou sozinho. Um ladrão que queria o Tesouro e não contava com outro ladrão naquela noite."

Os olhos vermelhos de Hiei verificaram as sombras na tenda, mas não passavam de monstros disformes e inofensivos. Lyn tirou a pedra verde do bolso e mostrou a Hiei. O artefato não ocupava mais que sua palma, era de um verde profundo e o núcleo tinha milhares de pontos brilhantes como se fosse um universo inteiro preso dentro de uma pequena esfera.

"Pra que você quer este Tesouro? Você quer as armas ou alguém a contratou para pegá-lo?" – ele perguntou sem dar importância à pedra.

"Ninguém me contratou e eu também não quero as armas. Você deveria saber que eu só me interesso pelo poder que eu posso alcançar sozinha, se eu quiser matar o Makai inteiro, faço isso apenas com a minha espada e não com uma relíquia velha e sem fio escondida por milhares de Eras num baú qualquer! Quero o Tesouro pelo desejo que ele concede e não o quero para mim." – ela ficou um momento calada apreciando as revoluções que o núcleo da pedra fazia e depois continuou num tom mais leve – "E se formos parar para pensar eu nem mesmo roubei essa pedra, pois Kayo já estava morto quando cheguei, portanto, o Tesouro não tinha mais dono. Eu apenas o peguei sob minha guarda."

"Eu não acredito que Yusuke vá considerar isso um álibi."

"Eu não me importo, vou terminar o que comecei. Vou pagar uma dívida."

"Uma dívida com quem?" – a voz de Hiei saiu trêmula prevendo o que ela responderia em seguida.

"Eu só tenho uma dívida, Hiei, e ela é com você." – os olhos do koorime se arregalaram com a confirmação e ele perdeu as palavras no meio dos pensamentos – "Você ainda acha que foi uma loucura?"

"Não," – ele murmurou ainda confuso – "agora estou achando que foi uma estupidez. Você não tem dívida nenhuma comigo, Lyn!" – e deu-lhe as costas, pronto para ir embora.

"Não entendi o porquê da surpresa, você sempre soube que eu faria isso um dia. Uma vida não custa pouco, Hiei..." – Lyn falou antes que ele pudesse sair.

Hiei não tinha mais palavras, sua língua afiada estava perdida, meio dormente, em sua boca.

"Como eu disse, o portador da pedra tem direito a um pedido - Lyn continuou, começando a desamarrar as fitas do cabelo, sabendo que Hiei continuaria ali para ouvi-la – "Eu vou dar a pedra a você, porém, antes preciso fazer um pedido. Vou pedir o paradeiro do assassino de Kayo." – ela fez uma pausa brincando com as fitas nos dedos – "Acho que é um pagamento à altura, não?"

"Eu não quero um pagamento, Lyn" – ele respondeu ainda de costas, mas ela fingiu não ouvir.

"Seus amigos estão aqui pela Pedra e por Kayo. A pedra é sua. Você pode fazer o que quiser com ela, até entregá-la a eles, eu não me incomodo."

Hiei se virou para ela sem responder. A determinação de Lyn o intimidara como poucas vezes havia sido. Ela abriu um sorriso leve e Hiei percebeu que já não lembrava mais de como era belo.

"Mas há um preço." – ela disse com uma voz sedutora e um meio sorriso.

"E qual é?" – ele perguntou, irritado com a forma que Lyn dominava a conversa e atropelava seus pensamentos, conduzindo-o para onde queria.

"Eu quero matar o assassino de Kayo." – ela disse e depois se calou, encarando-o.

Hiei viu que os olhos de Lyn estavam cinzas. Eles quase nunca ficavam daquela cor a menos que algo a atormentasse profundamente e parecia que aquele assassinato fazia exatamente isso com ela, deixava-a descontrolada, fazia-a perder todo o sangue-frio. Hiei desejou saber quem ele era e o que fizera para deixá-la de tal jeito. Não era só ódio que ela sentia por aquele assassino desconhecido.

Enquanto isso Lyn fitava os olhos conhecidos de Hiei a procura de um lugar de descanso daquela loucura que tinha virado sua vida. Eles lhe traziam um mínimo de conforto embora nunca assumisse tal coisa para si. Estava cansada demais e o silêncio entre os dois lhe deu uma chance de relaxar os músculos.

O sangue corria rápido e o coração disparado. A ferida latejava sempre que ela pensava em vingança e, por um momento, cedeu à tudo. O corpo esguio amoleceu, as pernas vacilaram e ela deixou-se cair lentamente para frente.

Hiei a aparou pelos ombros, desajeitadamente. Os cabelos dela roçaram nas suas mãos.

"Lyn!"

"Você vai aceitar o trato ou não?" – ela disse ainda tonta, tentando dominar o corpo novamente e com uma voz repentinamente cansada – "Eu uso a pedra para chegar ao assassino de Kayo, você a usa para o que quiser."

Hiei pensou em Yusuke e nos outros que estavam ali para resolver tudo aquilo e depois lembrou dos olhos de Lyn e a determinação dela em achar o assassino. Se ele aceitasse a pedra como pagamento, deveria aceitar também o trato que Lyn propunha. E ele não recusaria tal pagamento, recusaria?

"Eu não posso deixar que ninguém chegue a esse youkai antes de mim e se isso significar deixá-los sem a pedra eu o farei." – Lyn continuou, vendo que Hiei ainda hesitava.

Claro que ele não recusaria tal pagamento.

"Eu aceito seu trato."

Ela sorriu aliviada - "Agora me deixe sozinha." – pediu – "E diga aos seus amigos que eu mesma vou falar com eles, ainda hoje."

Uma brisa fria entrou na barraca quando Hiei saiu. Lyn levou algum tempo até se dar conta que estava finalmente sozinha. Lavou o rosto cheio de poeira e arranhões, tirou a blusa rasgada e percebeu que a ferida na barriga abrira, manchando as bandagens que ela fizera. Suspirou cansada e sentou-se num colchão de palha largado em um canto. Não agüentava mais a dor nem os tremores de cansaço. Mais ainda, não suportava esperar a morte. Nem mesmo a idéia da vingança lhe dava algum alento. De dia ela era quase capaz de se convencer que a vingança que havia imposto para si mesma resolveria tudo aquilo, mas, quando a noite caía, um arrepio cruzava seu corpo ao menor pensamento de encontrar seu inimigo.

Esfregou as mãos no rosto, tentando espantar o cansaço. Desde que roubara a pedra não conseguia dormir, vigiava as sombras no acampamento até que as tochas se apagassem e, quando isso acontecia, ela voltava para sua tenda no completo escuro e aguardava que seu inimigo invisível surgisse sem que ela pudesse vê-lo.

Ele matara o escolhido dos Senhores dos Mundos, o que não poderia fazer com ela?

Um arrepio correu sua espinha.

Sentia um pavor de sua própria vingança, um medo que em dezenas de anos não sentia.


Já era noite alta quando Lyn saiu novamente de sua tenda. A arena criada de tarde estava coberta de ladrões que dormiam profundamente depois de uma noite de assados e lutas. Era sempre assim no fim dos desafios, aqueles que venciam faziam um banquete em homenagem à vitória e qualquer discussão sempre terminava em brigas menores onde um ou outro quebrava um braço e algumas costelas.

Ela trocara as roupas, os cabelos negros estavam novamente presos em fitas vinho, na cintura levava sua katana de punho vermelho e da luta só sobrara um corte fino no rosto desde a altura do olho esquerdo até o queixo, que deixava suas feições mais rígidas. Mas logo sumiria e sua beleza fria ficaria inalterada.

Os estrangeiros estavam sentados sob uma árvore, eram os únicos ainda acordados no acampamento. Ela se aproximou dos quatro esquecendo a dor e a fraqueza que sentia, tentando manter sua postura de líder. Hiei foi o primeiro a se levantar prevendo as reações tempestuosas de Lyn, mas, para seu espanto, ela olhou Kurama e Yusuke sem dizer nada, esperou que se levantassem, cumprimentou-os e só então disparou:

"Vocês viram como acusações são tratadas aqui. Não devem fazê-las pelas costas, isso não é bem visto."

"Ei, mocinha! Olha lá como você fala! Tá pensan-" – Yusuke não conseguiu terminar, pois Lyn já havia estendido sua katana até ele e a ponta roçava em seu pescoço, tão próxima que ele não poderia nem mesmo engolir.

"Olha lá como você fala, ningen! Estes são os meus domínios, o meu bando e a vida de vocês está nas minhas mãos."

"Abaixe a espada, Lyn." – Hiei ordenou sem ser obedecido – "Abaixe a espada!"

A youkai afastou a lâmina a contragosto, trincando os dentes de raiva.

"Fomos mandados aqui para recuperar o Décimo Terceiro Tesouro e para levar o assassino de Kayo a julgamento, Lyn." – Kurama falou tranqüilamente, encarando-a com olhos pacíficos, mas Lyn notava o brilho ameaçador dentro daquele verde e percebia que Kurama era muito mais do que um mero humano. O youko continuou – "Se o Tesouro estiver com você, infelizmente, nós teremos que prendê-la. Você poderá apenas escolher se quer que a levemos a força ou não. "

Lyn deu um riso forçado.

"Porque não disse isso antes que eu lhes cedesse abrigo? Poderiam poupar um dia da viagem de vocês e me poupariam a surpresa desagradável."

"O que você teria dito antes?" – Kurama perguntou sem demonstrar impaciência.

"O mesmo que digo agora: que não roubei e, menos ainda, que matei o Guardião Kayo." - os olhos de Lyn não demonstraram incerteza, eram sérios e verdadeiros, não tinham sequer uma sombra de dúvida.

"Você está mentindo!" – Yusuke resmungou, fazendo com que Lyn levasse a mão ao cabo da espada novamente.

"Esse menino quer morrer, não é mesmo?" – ela rosnou impaciente - "Eu não estou mentindo, tentei roubar Kayo sim, mas ele já estava morto quando cheguei, portanto, o Tesouro não foi roubado, apenas trocou de dono. Também não matei Kayo, outra pessoa o fez no momento em que eu invadia o local. Vocês deveriam estar atrás de outra pessoa, não de mim."

O grupo ficou em silêncio ponderando as palavras de Lyn que encarava-os cheia de confiança. Kurama a olhou com cuidado, seus olhos verdes examinavam cada parte de seu rosto, a forma como mexia os olhos, para onde olhava, se piscava e como piscava, se estava apreensiva ou não e a observação só deixou mais clara a verdade dentro dela.

"Você viu quem foi?" – Kurama perguntou.

"Não, mas eu vou saber quem é. Tenho coisas a acertar com ele. Este foi o trato, vocês vêm comigo e eu lhes dou a pedra e o assassino."

"Nós não fizemos trato nenhum, Lyn." – falou Kurama.

"Ela fez um trato comigo." – Hiei interrompeu – "A pedra será de vocês com a condição que Lyn possa fazer um pedido."

"Hiei, você ficou maluco! Como você pode deixar uma coisa dessas? E se ela pedir para saber onde estão os outros Tesouros!" – Yusuke gritou enfurecido abanando as mãos.

"Eu não quero saber onde eles estão, não me interessa nem um pouco." – respondeu Lyn - "Vou pedir para saber onde está o assassino de Kayo apenas isso. Depois a pedra é de Hiei, para ele fazer o que quiser. Eu dou a minha palavra. Com certeza, o assassino quer o Tesouro e, provavelmente, todas as armas sagradas. Vocês até podem tentar levar a pedra... à força como Kurama disse, mas não sei se deveriam quebrar um trato já firmado. Não fica bem e vocês já fizeram besteiras demais para um dia apenas." – ela terminou com um tom vitorioso.

"Hiei?" – Kurama olhou o amigo pedindo uma confirmação. Hiei balançou a cabeça, encorajando-o.

"É a verdade." – Hiei respondeu.

Lyn olhava cada um tentando descobrir o que pensavam, mas não conseguiu. Hiei encarava Kurama e Yusuke inabalável, o humano não conseguia acreditar na honestidade estampada no rosto de uma ladra. "Isso não pode ser verdade, ela é uma ladra e ladrões mentem!" – pensou, mas não conseguia se convencer da própria idéia.

"Tudo bem." – Yusuke disse por fim surpreendendo até mesmo Kurama – "Nós aceitamos o trato, mas se você fizer qualquer coisa errada terá que nos enfrentar."

"Eu deveria ter medo dessa sua ameaça?" – zombou ela.

"Deveria ter muito medo, mocinha!" – Kuwabara falou mostrando os punhos cerrados para ela.

"Então acho que devemos ir." – Lyn falou.

"Para onde?" – Kuwabara perguntou ainda em posição de ataque.

"Fazer o pedido. A pedra guarda o mapa para o local exato."

"Vamos, então. Não temos tempo." – Hiei disse virando as costas, pronto para seguir viagem.

"Me esperem depois do bosque, eu preciso fazer algo antes. Encontro vocês em breve."

Yusuke a encarou seriamente. Ele não iria cair nessa história, seria só se afastar que Lyn nunca mais apareceria.

"Eu não vou fugir Yusuke."

"Eu prefiro ficar bem aqui." – ele respondeu pondo as mãos nos bolsos.

"Vamos, Yusuke. Ela não vai tentar fugir." – Hiei falou, olhando-a pelo canto dos olhos. Ele tinha visto o olhar de Lyn e reconhecia nele o brilho de alguém que vai tomar uma decisão muito difícil. A presença deles era mais do que dispensável.

Os pensamentos de Lyn estavam perdidos na clareira onde vinte ladrões dormiam bêbados pelo chão, vigiados por seus olhos azuis. Milhares de vezes ela fizera aquilo, milhares de vezes ficara de vigia para que seus escolhidos comemorassem qualquer coisa que tivesse um motivo: um bom saque, um bom negócio, um bom plano. E eles comemoraram muitas coisas.

Lyn sabia cada um pelo nome, pela voz e pela energia que emanavam, alguns até pelo cheiro. Sabia as habilidades e inaptidões de cada um, sabia os piores erros e, apesar de normalmente fingir que só recordava os erros, ela se lembrava, também, de cada grande feito. Eram seus escolhidos, seguiriam com ela para qualquer lugar, ouviriam suas ordens a qualquer momento e agüentariam suas fúrias quietos e firmes.

Se não partisse naquele momento ficaria presa a eles até o momento de sua morte, que, ela sentia, estava cada vez mais próximo. Eles seguiriam com ela e ninguém seria capaz de impedir. Nem mesmo Zen, que era o segundo em comando, poderia impedir que eles a seguissem porque ele, provavelmente, também seguiria com ela apesar das ordens contrárias.

Tinha que partir ou eles a veriam morrer sem motivos, sem nunca saber porque ela caminhou tão longe, para uma caverna esquecida do mundo com quatro desconhecidos que surgiram numa tarde de duelo. Precisava deixá-los antes que tivesse que explicar toda a sua vida e mostrar que ela era feita de decisões solitárias que, apesar de mais difíceis, poupavam-na de qualquer aborrecimento futuro. Se errasse, ela pagava e mais ninguém. E aquela era apenas mais uma decisão que precisaria tomar sozinha por que escolhera a sua vida daquela maneira, sem saber se era a melhor forma ou não.

Aquele bando agora ficaria sem líder. Acreditava que Zen o manteria unido por ser o segundo em comando, mas não sabia por quanto tempo, nem queria pensar nisso. Se o bando se mantinha ou não, não a perturbava mais. Lyn sabia que as riquezas e a vida que prometera a cada um deles, ela foi capaz de dar.

O que pensariam dela? Que era uma covarde, traidora, fraca, irresponsável, estúpida e ao mesmo tempo pensariam que todas essas palavras eram mentiras. Lyn tinha certeza que tinha provado seu valor, sua força e tudo mais que pudessem pôr em dúvida.

Era por isso que ia deixá-los.

Triste, talvez. Mas sem culpa nenhuma.

Entrou em sua tenda novamente, abriu uma caixa de madeira e tirou de lá duas espadas curtas e ligeiramente curvas e uma bainha cruzada. As espadas eram muito parecidas com as que Lyn tinha perdido no dia do roubo, porém, aquelas eram muito mais valiosas e estavam guardadas há muitos anos, à espera de uma luta que valesse sua importância. E a luta, finalmente se aproximava.

"Você vai com eles?"

A voz fez com que ela parasse o que estava fazendo.

"Vou, Zen." – ela disse sem olhar para ele. Agora que sua partida tinha sido descoberta se sentia um pouco envergonhada.

"E não vai voltar." – observou ele.

"Não." – Lyn confirmou, olhando finalmente para ele.

"Você está fugindo no meio da noite." – ele disse com raiva, os olhos negros viraram vermelhos rapidamente.

"Eu não estou fugindo." – rebateu ela.

"Não? O que é isso, então?"

Lyn não teve palavras para responder.

"Eu tenho que ir, Zen." – ela se limitou a dizer e sabia que ele tinha razão, então deixou que liberasse a sua raiva sem oposição.

"E o que acontece depois? Você não pensou nisso!"

"Não. Não cabe mais a mim pensar no que "acontece depois" por aqui."

"Você vai abandonar os ladrões!"

"Eu vou embora... Pense nisso como quiser."

"Porquê? Porque você foi desafiada? Está com o orgulho ferido e acha que pode simplesmente ir embora, acha que vai apagar o que aconteceu aqui? Não vai! Sua liderança foi posta em dúvida e você fez com que todos continuassem acreditando em você, se for embora, vão achar que Gunn estava certo."

"Se acharem isso não mereciam estar comigo de qualquer maneira." – ela respondeu, terminando de amarrar a bainha – "Eu não me importo em quem eles vão acreditar, mas tenho certeza que se acreditarem em Gunn, não merecem mais nada de mim a não ser desprezo." - ela suspirou olhando o ladrão - "É o seu tempo agora, Zen. O que eu tenho que fazer é muito mais importante do que isso aqui." – e saiu da tenda sem olhar para trás.

Zen a seguiu.

"Eu tenho uma última ordem." – ela disse quando o vampiro a alcançou, ignorando a raiva que ele disparava sobre ela. Ele tinha todo o direito... – "E você tem que cumpri-la, eu confio em você, por isso estou pedindo."

Ele concordou com a cabeça, esperançoso.

"Você não vai me seguir, Zen." – ela falou seca, pegando-o de surpresa – "Se você me seguir vai estar me traindo e eu sei que você nunca fará isso. Se fizer, eu vou ter que te matar... e eu, não quero fazer isso."

"Você não pode me pedir isso."

"Eu não estou pedindo, eu estou mandando."

O ladrão estacou no meio da noite enquanto Lyn se afastava determinada para dentro do bosque, sumindo na escuridão.

"O que você quer que eu diga a eles?" – ele gritou de longe.

"Diga o que quiser!" – ela respondeu com um aceno displicente sem olhar para trás e completou em voz baixa para si mesma – "Eles vão te ouvir."

No dia seguinte, à medida que acordavam da bebedeira da noite anterior os ladrões se deparavam com a notícia de Zen e parecia que todos eles ficaram afundados momentaneamente num estado de choque.

Zen proibiu qualquer um de seguí-la e todos obedeceram. Ele não acreditou em uma palavra do que ela dissera.

Lyn estava realmente triste de uma forma que ela nunca imaginou que sentiria. Ela, que não gostava de mentiras, cuspira várias delas para Zen e suas palavras, agora, perturbavam-na, mesmo sabendo que eram necessárias para manterem seu segundo em comando a distância. Achava que depois de tudo que falara para Zen, se ele ou qualquer outro acreditasse em Gunn, poderia até ter um fio de razão.

A cada passo que dava pensava em voltar e, na passada seguinte, decidia seguir em frente pensando em uma razão maior. Nunca imaginou que se acostumaria a ter companhia e, mais ainda, que sentiria falta de ter pessoas ao seu redor. Agora ela percebia que os seus domínios eram muito mais que apenas uma terra que havia tomado para si, eram também suas raízes e parte da sua história. E ela simplesmente estava deixando-os sem olhar para trás.

"Achamos que tinha desistido." – Yusuke falou quando Lyn se aproximou, mas a escuridão não deixou que o humano visse o olhar triste dela. Não queria conversar, na verdade, queria ir para longe dali o mais rápido possível. Mais perto da sua vingança e o mais longe possível das suas terras.

"Para onde vamos exatamente?" – perguntou Kurama.

"Para onde o mapa indicou, é um lugar ermo no sul, nunca estive lá."

"E cadê esse mapa, vamos dar uma olhada nele." – Kuwabara pediu.

Lyn tirou o Tesouro do bolso com certo receio e mostrou-o rapidamente. A pedra verde emanou um brilho pálido na escuridão. Os três não acreditaram no que viram.

"É uma pedra, não tem mapa nenhum aí!" – Kuwabara falou cruzando os braços – "Isso tá me cheirando a embromação!"

"O mapa só se mostra a uma pessoa pura."

"Desde quando você é uma pessoa pura, Lyn?" – Hiei perguntou irônico.

"Eu tive que encontrar uma, o que nesse maldito mundo não é uma coisa fácil!"


Quinto capítulo no ar... desculpem a demora mas é que o texto precisou passar por uma revisão de urgência antes de ser postado.

Gostaria muito de saber o que vocês estão achando. Eu sei que a história ainda está no início masas opiniões só fazem a história melhorar. Portanto, quem quiser deixar reviewsé mais do que bem-vindo.

Valeu!

Misha.