Capítulo Cinco: Sombras do Passado

"Quando você elimina o impossível, o que sobra por mais incrível que pareça só pode ser a verdade". Arthur Conan Doyle

Valfenda, 2460 T.E.

Eámanë colocou a carta do pai no bolso secreto da mochila e deixou seu quarto a procura de alguém com quem falar. A solidão esmagava seu peito e a bela Imladris estava melancólica demais para seu gosto naquele dia. A carta fez com que ela ansiasse pela família. Elfos Silvestres, sendo criaturas alegres e brincalhonas, não lidavam bem com a tristeza. Então Eámanë dedicou-se a dispersar a escuridão.

Ao passar pelo escritório de Elrond, ela escutou um som abafado que indicava que ele já estava enfiado no trabalho. Ela queria perguntar a ele quando os mensageiros estariam de partida novamente para que pudesse enviar uma missiva. As terras estavam calmas, era verdade, mas entre a Última Casa Amiga e os Salões de Thranduil ainda havia lugares bastantes para emboscadas onde as criaturas sombrias do mundo habitavam. Cautela era mister.

Ainda que Eámanë fosse bem aceita em Valfenda, não seria nada bom interromper uma reunião importante por motivos que não fossem urgentes, então ela decidiu que falaria com Elrond depois. Com um suspiro cansado, ela dirigiu-se à cozinha em busca das pessoas alegres que lá trabalhavam. Os Elfos da cozinha de Elrond eram bem-humorados e gostavam de ouvir as travessuras que ela aprontava. Boa companhia em qualquer momento, em contraste com os Senhores Élficos e guardas mais sérios.

"Salve, Tulquar! O que há de interessante hoje?"

O Elfo moreno nem sequer levantou os olhos do cozido que vigiava. "Nada, igualzinho a ontem quando me perguntaste da última vez".

Eámanë fez um barulho estranho enquanto tentava reprimir a gargalhada. Tulquar era bem-humorado, mas sua versão de humor podia enganar um incauto. Ele gostava de se fazer de rabugento. Gostava tanto, de fato, que havia quem acreditasse. Ele fingia suportar os outros, e em particular seus assistentes, que por sua vez fingiam que acreditavam. Lisso sorriu com os cantos da boca e piscou para ela. "O que queres hoje, linda? Eu não fiz as sobremesas ainda, então será o que a dama escolher".

"Você me deixa fazer?"

"Não", Tulquar e Lisso responderam ao mesmo tempo.

"Eu sou perfeitamente capaz de cozinhar".

"E agradeço a intenção, mas prefiro segurar as rédeas. E as colheres", Tulquar disse acidamente. Eámanë estirou-lhe a língua.

Lisso arrodeou a mesa e arrastou-a para o outro lado da cozinha. Ainda que fossem todos bons amigos agora, estes Elfos evitavam contato físico, então tudo o que Eámanë sentiu foi uma leve e fria pressão de suas mãos nos ombros dela. E ainda isso foi breve, quando haviam andado o que Lisso considerou uma distância razoável, ele a soltou.

"Queres mesmo ajudar?"

"Sim, por favor. Se não me achar algo o que fazer, Erestor vai tentar me fazer recitar a Elegia de Gil-galad, e eu não quero..."

"Mas por quê, diga-me? Não deverias estar te dedicando ao estudo da sabedoria e das tradições antigas? Ou Glorfindel está atrapalhando tuas aulas com todo aquele bater de espadas e ficaste para trás em tuas lições?"

Eámanë franziu o cenho. "Você faz isso soar como uma coisa ruim. Eu te digo, o Senhor Glorfindel está apenas preocupado com a minha segurança. É verdade que agora viajamos em grupos, mas o mundo é ainda um lugar perigoso, e é melhor não depender da habilidade dos outros. De fato, eu costumava 'brincar na lama' como dizem, muito antes de conhecer –"

"Paz!' Lisso gargalhou, as mãos jogadas para o alto. "Eu não quis ofender o Senhor Glorfindel e portanto não necessitas defendê-lo."

"É apenas que... Há quem diga ser pouco feminino, ser tão interessada em lutas de espadas..."

"Alguém te insultou?" Tulquar perguntou de seu canto da cozinha. Audição Élfica, Eámanë decidiu corando, era tanto benção quanto maldição.

"Ninguém ousaria", ela murmurou, amarga. Não diante dela, pelo menos, e não intencionalmente. Mas o choque que ela via nos olhos dos outros a deixava constrangida. Ela respirou fundo e mudou de assunto. "E não digo que não gostaria de recitar o poema porque não o sei. Eu o digo porque Erestor gosta deste poema em particular e me faz recitá-lo sempre".

Lisso ergueu as sobrancelhas. "E...?"

"Ele tem duzentos mil versos", Eámanë falou, com profundo horror.

Lisso apenas repetiu-se. "E...?"

A Elfa Silvestre soltou um gritinho de frustração.

"Dá-lhe uma tarefa, por caridade", Tulquar ordenou. Eámanë recompôs-se e sorriu para Lisso.

"Que seja. Se a dama desejar, pode preparar a segunda fornalha. Tulquar quer fazer algumas tortas de maçã".

Eámanë se preparou para armar a maior confusão, tomou fôlego e abriu a boca, enfurecida. Entre os Elfos, os homens é que geralmente tomavam para si a tarefa de cozinhar, verdade, mas as Ellith podiam fazer pães e bolos. Tulquar estava a negar-lhe uma tarefa que lhe caberia.

Mas então seus olhos pousaram no final do corredor, e ela congelou. Perdido entre enormes chaleiras de água fervente e ervas de todos os tipos estava um Erestor extremamente afobado fazendo o que tinha que ser chá suficiente para um batalhão. Erestor podia ser incrivelmente irritante às vezes, mas era também prestativo e atencioso. Eámanë lutou contra o embaraço e rezou para que ele estivesse perdido em pensamentos, e não tivesse ouvido ela reclamar. Mas era improvável.

"Salve, Senhor Erestor. Está com tanta sede assim? Parece-me que tem o bastante para afogar um Elfo!" Ela brincou, e seu coração saltava dentro do peito.

Erestor olhou para cima, um pouco surpreso, mas relaxou quando viu que era Eámanë. Ela estava de bom humor, o que era um alívio. A atmosfera triste e apreensiva que pairava sobre Imladris desde que os guardiões chegaram para reportar a Elrond precisava ser dispersa.

Além do mais, ele gostava muito dela.

"Não tenho essa intenção", ele respondeu com um sorrisinho, "ao menos por enquanto. Parece que todos os cozinheiros estão ocupados, e Elrond precisa de refrescos para um grupo de viajantes cansados. Típico!" Ele abriu a torneira da chaleira –uma invenção engenhosa de Imladris – e encheu as xícaras. Ele abriu um largo sorriso para Eámanë.

"Gostaria de tomar um chá? Eu teria feito de camomila também, para acalmar certos ânimos, mas temo que os Mortais cairiam em profundo sono, e não podemos deixar que isso aconteça ainda. O que acha?"

Eámanë sorriu. Erestor não ouviu seus comentários sobre o poema favorito dele, e ele tinha um brilho de prazer genuíno em seus olhos e sorriso. Aquele sorriso era contagioso, e ela sentiu em si uma vontade enorme de gargalhar e provocar e fazer travessuras.

"Acho que os Mortais bebem chá de camomila também, mas não tão forte quanto o que costumamos fazer, meu Senhor", ela disse, aceitando a xícara que ele estendia, deixando que seus dedos tocassem levemente – ela era uma Elfa Silvestre, por caridade, não um Noldo estufado e orgulhoso, e se havia alguém que precisava relaxar, o Mestre Erestor estava no topo da lista. E de repente ela percebeu que ainda não o tinha visto aquele dia, nem mesmo quando foi à biblioteca devolver a história de Lúthien e Beren.

Por um instante, Erestor estava ciente do contato dos dedos de Eámanë com os seus, em um modo deveras deliberado.

Ai, Valar! Muitos anos se tinham passado desde que algo do tipo lhe acontecera pela última vez. E, como no assunto das técnicas de combate, ele estava bastante enferrujado.

"Camomila", ele gaguejou. "Fazer uma boa infusão é considerada uma arte aqui no vale. Os Mortais podem ter a idéia básica, mas eles nem sempre extraem as partes certas da planta. O resultado é um chá com gosto de folhas e..."

Percebendo que estava tagarelando, Erestor tomou um gole de seu próprio chá, que tinha cor levemente rosada por causa da infusão de morango. Ele sentiu as bochechas ardendo e tão rosadas quanto o chá, então começou a colocar as xícaras nas bandejas.

Eámanë ficou muito satisfeita em ver o Elfo corar. 'Devo estar mais solitária do que percebi, ' ela pesou.

Erestor olhou para o resultado de seus esforços e percebeu que havia arranjado duas bandejas.

"Ahn... você acha que poderia me ajudar com isto?"

"Claro. Para onde?" Ela pergunto, colocando a xícara vazia na pia e levantando a bandeja mais próxima. Ela tinha desejado algo que fazer, e agora o tinha. E Senhores Élficos pareciam muito menos intimidadores quando suas orelhas estavam vermelhas.

"O escritório de Elrond".Erestor tomou a dianteira e mostrou o caminho com passadas rápidas.

Ele hesitou um segundo diante da porta. "Com licença, Senhor Elrond. Trouxemos chá".

Eámanë era esperta o suficiente para saber que Erestor estava avisando a quem estivesse dentro da sala que ele tinha companhia, e deveriam usar de discrição. Ambos esperaram que Elrond respondesse.

Quando receberam licença, a Elfa entrou na sala sem fazer barulho. Ela não pôde evitar olhar ao redor. Havia uma espécie de reunião acontecendo no escritório. Imladris, ainda que adorável, tendo sido criada como um refúgio para os sobreviventes de Eregion, não dispunha da grandeza majestosa da Floresta das Trevas, nem de um Salão de Julgamento ou Câmara de Debates. Quaisquer assembléias políticas tomariam lugar no escritório de Elrond ou no pátio atrás do Monumento a Narsil. Mas no presente momento eles estavam no escritório, porque eram poucos. Elrond, Mithrandir, um outro senhor idoso em trajes desbotados que poderiam ter um dia sido marrom, um gigante Mortal com cabelos negros como a noite sem estrelas e os maiores e mais musculosos braços que ela jamais tinha visto em um Mortal, e dois homens longilíneos com a figura e seriedade que ela tinha aprendido a associar aos Dunedain. Altos, taciturnos, com longos cabelos escuros e olhos cinzentos profundos.

Todos agradeceram o lanche com movimentos curtos de cabeça e ela se preparou para sair. Era óbvio que estavam ansiosos para retornar a discussão de assuntos urgentes e importantes, e Eámanë estava atrapalhando. Elrond, contudo, a chamou de volta.

"Talvez devas ficar, Senhora Eámanë".Ela não tinha título, mas Elrond era sempre tão educado.

Estranhamente, foi Erestor quem se opôs. "Meu Senhor Elrond, eu jamais questionaria sua sabedoria ou liderança, mas devo perguntar-lhe se tem certeza". O tom de sua voz era quase normal. Eámanë ainda não o conhecia o suficiente para adivinhar os motivos atrás da pequena variação de postura, ou por que ele achava que ela não era de confiança.

Mas ainda assim, ela se sentiu magoada. Eámanë tinha tanta certeza de que eram amigos.

Elrond talvez soubesse o que causara o protesto do conselheiro, porque ambos ficaram a se digladiar com os olhos. Então Elrond fez que sim com a cabeça, e pareceu a Eámanë que ele tinha dito algo a Erestor com aquele olhar penetrante. "Tenho certeza, meu amigo".Ele virou-se para ela. "Senta-te, por favor".

Ela balançou a cabeça e sentou-se, concentrando-se nas pontas de suas sandálias.

Elrond sentou-se também e falou, seus olhos fixos nela. Gentileza e pesar, e uma vontade férrea por baixo de tudo: isso foi o que ela sentiu enquanto as palavras lhe açoitavam.

"Temos novas que serão difíceis para você, minha cara. Não há como minimizar o impacto, O Necromante retornou a Dol Guldur".

"Isto é certo?" Ela perguntou, procurando a resposta nos olhos de Elrond e seus amigos. "Não há dúvida alguma?"

"Não há dúvidas", disse o gigante. "Todas as criaturas selvagens fogem para longe da colina, e o próprio ar da noite é cheio de malícia".

"Eu mesmo averigüei este fato, e os Dunedain me ajudaram", falou Mithrandir. "Não há dúvidas, o mestre reclamou sua fortaleza".

"Ele não é o mestre!" Eámanë gritou, lívida. "Aquelas terras são nossas, compradas e mantidas com suor e sangue desde que ali paramos na Grande Marcha, e elas nos pertencem! A nós! Ele as roubou".Ela respirou fundo, e o ar tremeu enquanto exalava. "Ele as roubou, e as violou, e as corrompeu, mas não as possui. São nossas por direito".

"Seja como for", falou Mithrandir, "ele retornou.'

"Quanto..." Ela precisou parar e respirar fundo de novo, porque o terror ameaçava engoli-la inteira. "Quantas milhas ele já retomou, sabe me dizer?"

"Muitas", respondeu um dos dunedain. "A maior parte do que já tinha antes, e muito das que não possuía. Não sei ao certo o quanto ele tomou em sua primeira invasão, mas arrisco-me a dizer que ele é agora muito mais forte".

Eámanë teve que fechar os olhos com força, teve que esconder a face na palma da mão como se aquela defesa frágil pudesse salvá-la do golpe. Alguém lhe segurou a outra mão gentilmente. Ela sabia quem era, e sabia agora porque ele tentara mantê-la longe da reunião. Curiosamente, ela não se sentia mais com raiva, embora quisesse sentir-se assim. Raiva seria muito mais simples do que aquele medo sem fim.

Ela pousou as mãos no colo. "Thranduil foi avisado?"

"Ele não poderia deixar de notar, Senhora", falou o dúnadan novamente."O Necromante não tenta ser sutil desta vez".

"Ele jamais o fez", ela murmurou. E falou, quase consigo mesma. "E agora?"

"Precisaremos nos reunir todos e discutir esta questão".Elrond posicionou-se mais confortavelmente na cadeira. Que coisa, Eámanë pensou. Ela nunca tinha visto Elrond pouco à vontade antes. "Os mensageiros começarão sua viagem pela manhã".

Eámanë franziu o cenho. Erestor inclinou-se sobre ela para sussurrar ao seu ouvido, e não viu Elrond apertar os olhos.

"O Senhor Celeborn necessita ser avisado, embora eu creia que ele já sabe. Dol Guldur fica mais próximo da Floresta Dourada que da Floresta das Trevas, embora esteja em terras do Rhovannion".

Eámanë sentiu-se uma perfeita idiota. "Ah. Entendi. Pensam então em um esforço conjunto?"

Ela levou um momento para processar o olhar espantado dos rostos dos outros. E então a raiva chegou, enfim, rápida e quente como as chamas da Montanha da Perdição.

"Agradeço a cortesia de me avisar", ela replicou, gélida, e levantou-se. "Mas têm ainda muito que discutir, e não há mais necessidade da minha presença aqui. Com a sua licença, meus Senhores".

E então ela saiu da sala como um foguete, para arrumar as malas.


A.N.: A linha temporal deste capítulo é 185 anos depois da Festa de Aniversário de Arwen. E agora, mini-ensaio!

Erestor - essa vai pra hobbit. Ninguém sabe de onde exatamente o Erestor é. Mas como eu já mencionei, essa fic é um enorme RPG editado (na verdade, dois RPGS editados, porque eu e a Jenny estávamos nos divertindo demais para abandonar os personagens quando o primeiro RPG afundou).

Erestor Noldo e da Casa de Celebrimbor, que viveu em Ost-in-Edhil, Eregion, é invenção da Jenny (Eu era a Eámanë e, algum tempo depois, assumi o Elrond quando um jogador saiu). Ele é filho de mãe Noldo e pai Sinda, na verdade, e tem quatro mil e quinhentos aninhos de idade mais ou menos. Erestor estava presente na cidade quando de Ost-in-Edhil quando ela foi sitiada e destruída, conheceu Elrond Meio-Elfo na fuga dos sobreviventes (vide N.A. capítulo dois, ponto um, Ost-in-Edhil), ajudou na construção de Valfenda e lutou na Primeira Guerra do Anel. E falando no Erestor, já que ele estava dando bronca no Glorfindel por ser 'pomposo', o Erestor tem uma concordância mais relaxada também. Coisa de gente humilde, que não gosta de se fazer de tampa de Crush (e nem matar a escritora de dor de cabeça...)

1- Mitos, poemas e canções sendo eternos, os Elfos tinham um problema sério de falta do que fazer. Há registros de que uma harpa levaria 30 anos para ser completada, que cada corte na madeira poderia levar dias, estudando os veios na madeira, sempre procurando a perfeição. O domínio da linguagem, a retórica, os diferentes estilos de diálogo e a caligrafia também eram muito apreciados e estudados entre os Elfos. Eu parto do princípio de que papel não era lá tão abundante assim, mesmo com a 'tecnologia' ou 'magia' élfica (eu não vejo Elfos cortando árvores a torto e a direito pra fazer papel...), embora livros sejam muito amados por criaturas que tem uma queda por linguagem e história. Mas muito da História dos Elfos era passada oralmente também: Aragorn canta a história de Lúthien e Beren para os hobbits nos Ermos, antes de chegarem à torre de Amon Sûr.

A balada de Lúthien e Beren: Beren, Mortal, se apaixona pela filha de Elu Thingol e Melian a Maia. Thingol exige um dote impossível e suicida para 'permitir' o casamento: A Silmaril que Melkor roubou de Feanor, (vide N.A. cap. Dez, Saudades do Mar). Beren peitou o desafio. Pra quem não sabe como essa história terminou: quem morreu foi Finrod Felagund, irmão da Galadriel e rei de Nargothrond, para salvar o amigo Beren. Lúthien pressentiu o perigo e revoltou-se, fugiu da torre onde papai a trancara, entrou na fortaleza de Melkor só com o cãozinho de estimação (ri não que é sério!) Huon, enfeitiça o vilão com uma Canção de Poder e liberta o amado. Os dois pombinhos terminaram ficando juntos, mas como Beren morre na luta contra um lobo gigantesco que tinha engolido a jóia com a mão dele e tudo e depois fugiu correndo (quem disse que Tolkien não tinha humor negro?) logo após dar o maldito dote pro rei, Lúthien foi até Mandos pedir o amado de volta

(Tem uma antecâmara em Mandos onde as almas dos Elfos e Homens se separam, os homens vão para aquele Grande Mistério de onde ninguém volta, e os Elfos para os Salões de Espera). Ela terminou tendo o pedido aceito, mas com o preço de virar mortal também. De quebra, a Silmaril do dote dela causou Duas Ruínas de Doriath, o reino de Elu. De prima: Thingol pediu aos Anões para fazerem uma jóia com aquela gema, e os anões usaram umas pérolas especiais aí deles, um colar chamado Nauglamir. Resultado: quando Thingol requisitou o produto acabado, cadê que os anões queriam devolver? Taí o início do quebra-pau entre Elfos e Anões, uma guerra acírradissima, onde um chamava o outro de ladrão (os Elfos pela Silmaril e os Anões pelas pérolas). Thingol morreu na sua própria sala de tesouro, assassinado pelos anões. Assumiu o filho de Lúthien e Beren, Dior, porque Melian cruza o mar de volta pra Valinor, arrasada. Mas quando Lúthien finalmente morreu, a jóia Silmaril foi-lhe dada como herança, e os Filhos de Feanor invadiram Doriath atrás da Silmaril. Foi a Última Ruína de Doriath, e morreu quase todo mundo. Inclusive Dior.

1.2 Elegia de Gil-galad, eu não consegui fazer uma tradução legal de 'Fall of Gil-galad' – Tombamento de Gil-galad parece coisa de preservação de monumento, não história do Alto-rei. Essa balada existe, foi provavelmente composta um bom tempo depois do fim da Segunda Era, porque descreve a morte de GG como algo que aconteceu 'há muito tempo atrás'. Bilbo traduziu essa longa canção para a Língua Comum e a ensinou ao jovem Sam Gamgi. Sam chega a cantar as primeiras estrofes dela na casa de Elrond. 'Gil-galad era um marinheiro...'

2- A divisão da tarefa entre os sexos –feministas de plantão, contenham-se! Os homens cozinham, à exceção de pães e massas. Destaque especial para o pão de viagem élfico, o famoso lembas – fazê-lo era uma grande honra, e dava prestígio e status social para a padeira. Eles também são os guerreiros. As mulheres são curadoras, padeiras e fazedoras de lembas. O resto das profissões era livre pra quem tivesse vocação e gosto. (vide N.A. do capítulo dois, ponto dois, Mulheres élficas e o combate armado)

3- O retorno da Sombra e o Conselho Branco:

Sauron retorna para Dol Guldur em 2460 T.E., após quase 400 anos de Paz Vigilante. Mas o Conselho Branco só é formado em 2463. Estes três aninhos terão uma importância crucial para a fic. ;)

4- Dunedain: O SdA me passa a impressão de que os Guardiões são todos parecidos. Já reparou em como Tolkien frisa a semelhança entre Halbarad e Aragorn? Verdade que eram primos, mas se você pensar que os Dunedain são todos descendentes de Elendil ou de seus vassalos, e que os Dunedain Exilados também eram todos aparentados entre si, não é muita viagem achar que estes antepassados de Aragorn teriam a mesma descrição física que ele. Claro, não mencionando a 'incrível nobreza de semblante' e blá blá blá de Aragorn. Estes Dunedain podem ou não ser da linhagem direta de Isildur. Não muda o rumo da história, então aceite o que achar melhor. ;)

5- O gigante moreno - idem, ibidem, adivinha quem? Beorn, claro. Há quem ache que ele era um espírito urso que um dia... Não, brincadeirinha. A descrição física confere também.

6-Eámanë tendo um piripaque no escritório de Elrond: sério, para um dos mais sábios seres da Terra Média às vezes o Gandalf vacila feio. Você já tá contando para uma Elfa da Floresta das Trevas que o Grande Vilão está de volta, ainda dizer pra ela que ele é o dono das terras... Ui. Ui, ui. Gandalf mau, vai ficar sem biscoito. Saca a descrição do Clã pelo Professor: They differed from the High-elves of the West, and were more dangerous and less wise. Diferenciavam-se dos Altos-Elfos do Oeste (Noldor e Sindar), e eram mais perigosos e menos sábios. Essa doeu...

7- Grande marcha: 'compradas e mantidas com suor e sangue desde que ali paramos na Grande Marcha'. Tudo bem que a OFC às vezes é dramática, mas dessa vez ela estava falando sério. Seríssimo, aliás. Os Valar chamaram os Elfos para habitarem em sua Ilha Abençoada (AKA Valinor, Terra dos Valar), bem antes do Sol e da Lua (e das Duas Árvores também. História Antiga pacas até em termos élficos), porque o irmãozinho mais velho deles estava detonando a Terra-Média. A Grande Marcha começou uns mil anos de Valinor (bem mais longos que os anos 'do Sol') antes da Primeira Era e durou duzentos anos no caso dos Noldor e Vanyar; e duzentos e trinta anos no caso dos Teleri. Foi aí, aliás, que surgiram as divisões entre os Elfos em clãs (eu que gosto desse termo, O Professor usa Casas). A primeira divisão foi entre os que atenderam o chamado, doravante chamados Elfos (!), e os que não atenderam o chamado, doravante chamados Avari, Recusadores (ou algo assim).

Dentre os Elfos (!), os Vanyar foram os primeiros da fila. Os Noldor foram os segundos, e os Teleri ou Lindar (como eles chamavam a si mesmos) fechavam o cortejo. Muitas confusões sofrem os escritores e leitores de fics por causa disso, já que os Teleri se dividiram em vários subgrupos:

Falmari, os que chegaram até Valinor; (alguns desses Fëanor matou em Alqualondë quando pirou geral)

Sindar, seguidores de Elwe que encontrou a maia no bosque, virou Elu Thingol e se deu muito bem até que se meteu a armar pro mortal assanhado que pediu a mão da filha dele... Mas enfim, uma boa parte dos Teleri ficou para trás tentando achar o tal do Elwe, e se tornaram os Elfos-Cinzentos (Sindar) de Beleriand (A área onde Thingol construiu seu império);

Nandor, que simplesmente pararam e mudaram de direção no meio do caminho, alguns foram para Beleriand e viveram em Ossiriand;

Outros se detiveram a leste das Montanhas Sombrias – e deram origem aos Galadhrim de Lothlórien e aos Elfos Silvestres da Floresta Verde/das Trevas. Estes últimos tiveram que segurar a barra - e sem Anel nenhum! - e se defender na tora contra Melkor O Primeiro Vilão Superpoderoso ®, levaram o maior cacete na Primeira Guerra do Anel perdendo dois terços do seu exército na batalha de Dagorlad (vide N.A. do capítulo um, ponto três, letra A, sobre a PGA) e também foram expulsos de suas cidades várias vezes na luta contra o Necromante (que era Sauron disfarçado) até serem acuados no norte. O palácio de Thranduil era todo construído sob a montanha, uma fortaleza em caso de eles serem atacados novamente.Na boa, os Silvestres se garantiam.

8-Nota sobre a linguagem dos ElfosEntre os Elfos Silvestres e Galadhrim, o Sindarin (Élfico Cinzento) é que era considerado a língua culta, e também era a língua mais usada entre os elfos. Evitava-se ao máximo usar Quenya (ou seja, só se não tiver outro jeito mesmo) em consideração aos irmãos Teleri assassinados pelos Noldor revoltosos em Alqualondë. Thingol, rei de Doriath, chegou a proibir o idioma em seu reino quando soube que aqueles seus priminhos Noldor legais hospedados em seu palácio eram assassinos de seus parentes. Depois ele expulsou-os de Doriath. Como os Sindar eram naquele tempo mais numerosos, os Noldor terminaram adotando o Sindarin no dia-a-dia, e o Quenya ficou relegado a cerimônias e alguns textos eruditos.

Com a popularização do Sindarin, o Nandorin ou Élfico Verde que era a língua dos Elfos Verdes (você pode usar esse termo para os Nandor de Ossiriand, Silvestres e Galadhrin) foi sendo esquecido e sobreviveu apenas em alguns nomes de pessoas e lugares. Não nesta fic. Aqui os Silvestres teimosos continuam com a sua própria língua, muito obrigada, mas são fluentes no 'Élfico Comum' também... (ver também o N.A. do capítulo dez, ponto seis, Diferenças de linguagem/cultura)

Putz! Terminei escrevendo um ensaio gigantesco.