Capítulo 21: Cabeça-dura, Insistente, Teimoso, Impertinente

21 de Março de 2000.

Dois dias voaram. Dois dias nos quais Snape se viu, repentinamente, jogado em um novo e estranho mundo, caleidoscópico, inundado do perfume e da presença dela.Uma nova realidade, onde tudo, absolutamente tudo poderia acontecer... desde que ele dissesse as palavras certas. Sua vida habitual tornou-se repentinamente desimportante: as aulas eram todas iguais, as salas desfilavam diante de seus olhos sem que coisa alguma o absorvesse (embora Severus disfarçasse muito bem). Nem mesmo Potter o irritava mais. A única coisa que realmente existia dentro dele era aquela sensação de ansiedade, o estômago se revirando desconfortavelmente, o desejo secreto de encontrá-la na próxima esquina.

Nesses dois dias, ele havia mantido uma distância respeitosa, como Tonks pedira. Mas a distância não o impedia de se lembrar, ou talvez, o forçasse a se recordar, de como o mais simples toque dos lábios dela era capaz de despertá-lo de uma forma muito intensa, deixando-o viciado pelo contato, ansiando dolorosamente por mais. E ela estava tão próxima agora, ali do lado dele, o ombro tocando suavemente o dele, assistindo juntos à lua nascendo por trás da Floresta Proibida...

Snape não era um homem romântico, exagerado ou dramático. Então, era assustador constatar que a queria mais do que qualquer outra coisa no mundo inteiro. E bastava dizer algumas palavras... Ele suspirou e esticou os dedos, que alcançaram a mão dela, pendendo de cima da amurada do castelo. Dedos compridos acompanharam lenta e suavemente a curva graciosa da mão, que era pequena, quente e feminina sob a sua. Uma sensação toda nova de seda e veludo encontrando aço e pedra. Os dedos dele se insinuaram por entre os dela; e Snape jurou tê-la ouvido suspirar. Seu coração batia de uma forma que ele jamais pensara ser possível.

Estava ali, ele queria, bastava apenas...

"Não foi o ódio que em levou a fazer aquilo"; ele disse afinal, numa voz estrangulada, olhando para a frente. Tonks se virou, surpresa e curiosidade cintilando nos olhos, tentando disfarçar um sorriso que se tornava enorme a cada segundo. Snape pigarreou e então continuou, com seu habitual tom de voz, levemente desinteressado. "Eu precisava tirá-lo do caminho", concluiu, sentindo as faces pegando fogo de vergonhas mil.

"E isso quer dizer..."

... queria dizer que... ele... estava ali! Mas, maldita mania de guardar tudo para si mesmo e não saber como e não querer colocar para fora. Durante anos havia sido seu maior trunfo, transformado-o no maior oclumente vivo. Mas agora ele trocaria facilmente todos aqueles anos por um mísero segundo onde fosse capaz de dizer a ela tudo o que sentia, o fogo que o consumia, o carinho... não, não era carinho, obviamente... o algo mais imenso, intenso e insano que sentia por ela... era tão simples, apenas três palavras, mas ele se via incapaz de pronunciá-las. Lutou consigo mesmo enquanto Tonks o observava, aguardando muito quieta. Mas não, também não seria naquela noite... e já havia dado um passo, afinal, não? E teria ser o suficiente por enquanto, quisesse ela ou não. Então, Snape se fez de ranzinza e disse, olhando para a Floresta lá embaixo:

"Ora, Tonks, nós dois sabemos o que quer dizer"; ele disse, secamente.

Ela virou a mão dele para cima e percorreu preguiçosamente a palma com as pontas de seda dos dedos, deixando-o arrepiado e controlando-se para não suspirar como ela. Tonks, então, mordeu o lábio e depois sorriu, as covinhas que ele tanto amava marcando os dois lados da face, os olhos brilhando como nunca.

"Bom, pode ser umas duas ou três coisas, você sabe..."

"Não, Tonks, não pode. Pode ser apenas uma coisa..." ele disse, desdenhoso, mas então, sua expressão se abrandou, "e você sabe disso."

"Teria certeza, se você não fosse tão cabeça-dura."

Snape olhou com o canto do olho e ela sorria o sorriso mais provocante... a menos de dez polegadas de distância dos lábios dele. Se ela imaginasse o quanto o estava deixando perturbado... talvez estivesse fazendo de propósito. Não seria novidade alguma em se tratando dela, que sorria, esperando. Ele estreitou os olhos e sibilou:

"Insistente."

Ela riu e ergueu a sobrancelha; e se aproximando perigosamente perto demais, sussurrou...

"Teimoso."

... contra os lábios dele. Completamente embriagado pelo hálito dela, Severus fechou os olhos; e Tonks ainda ouviu-o murmurar 'impertinente' antes que seus lábios finalmente se encontrassem.

Ele a beijou muito suavemente a princípio, experimentando reações. Então, Tonks colou seus lábios entreabertos contra os dele, deixando claro que não o rejeitaria outra vez. Snape se aproximou mais, intensificou o beijo e então, forçou os lábios dela a se abrirem mais, insinuando a língua por entre eles. Sentiu-a suspirando contra sua boca. O interior era quente e doce, e sua língua o acariciava lenta porém intensamente. As mãos dela, em algum momento, passaram a envolver seu pescoço, dedos se entrelaçando nos cabelos. As mãos dele igualmente se entrelaçavam nos cabelos dela, afagando-os ternamente. Tudo o que existia era o som das respirações pesadas, bocas se unindo, línguas deslizando, mãos acariciando. Era ainda melhor do que qualquer coisa que ele poderia ter suposto: era doce, quente, sensual, suave e intenso. Mas então, um ruído vindo de fora o despertou do beijo. Snape se afastou, e enxergou uma sombra felina surgindo por um corredor que deveria estar deserto.

"Filch", sibilou; e no instante seguinte ele se viu sendo puxado pela mão por uma Tonks que ria alto e se viu subindo correndo, puxado por ela, um lance inteiro de escadas; atravessar, ainda correndo, o corredor e finalmente se ver trancado do lado de dentro do quarto dela. Tonks fechou a porta com um estrondo e se escorou nela, rindo, ofegando, os lábios ainda mais vermelhos que o normal, como se esperasse que Filch aparecesse ali a qualquer segundo, como se ainda fossem estudantes fazendo algo errado. E lá estava ele, ofegando também, afogueado, fugindo do zelador como um adolescente... aos quarenta anos de idade. Snape não sabia se ria ou chorava.

"Você é louca", ele disse com um canto da boca se crispando e distorcendo o sorriso.

Tonks riu e o puxou pela mão.

"Ah, vamos, disso eu já sei. Me fala algo que eu ainda não ouvi", ela sussurrou, insinuante.

Um desafio? Ele era muito bom naquilo... estreitando os olhos, Snape disparou, com seu tom de voz mais macio, mais sedoso...

"Quero você."

Ela abriu e fechou a boca; e então, engoliu em seco. Oh, como era maravilhoso vê-la sem palavras, sem saber o que dizer para variar um pouco. Aos poucos, ele sorriu, carinhosamente, e suspirou. Oh, Tonks...

"Oh, bem", ela finalmente gaguejou, "isso é algo novo..."

O que era apenas uma provocação se tornou real; e dessa vez foi ele quem a puxou para bem pertinho; e sussurrou de novo no ouvido dela:

"Quero tanto, Tonks..."

Ela suspirou em resposta, enlaçando o pescoço dele com os braços. Atraídos por uma força magnética, inexorável, lábios encontraram lábios. Iniciou-se então um longo beijo, suave a princípio, mas que logo se tornou intenso, interrompido apenas por breves pausas para respirar. Era fascinante o modo como os lábios dela se moviam sobre os dele, entreabertos, deixando-o provar, apenas provar, o gosto dela, mas se negando a deixa-lo ir além, provocando-o e então... ele sentia a língua dela invadir sua boca. Snape sentia que poderia ficar horas apenas a beijando dessa forma.

Ele afastou as longas mechas negras e onduladas que ela usava naquela noite; e a língua dele deslizou pelo rosto, até a orelha dela, que passou a beijar muito suavemente. A pele era cremosa e pálida... parecia um creme, sorvete quente... tão deliciosa quanto. Logo Tonks murmurava coisas desconexas e Snape se sentiu sorrindo contra o pescoço dela... era óbvio que seria assim, falando demais, se expondo demais... em absolutamente todos os momentos. Tão adorável, tão única a sua Tonks... Ele sentiu seu coração inchando mais um pouco de tanto amor.

"Ah, Snape..."

A voz dela era doce como mel, quente como pimenta, quando murmurou o nome dele. Em algum momento, seus corpos haviam se entrelaçado. O coração dele batia agora completamente descompassado; e muito logo as coisas estavam saindo de controle. Snape, sempre tão controlado, de repente se via no limite da excitação; sentia algo se avolumando nas calças. Queria livrar-se das roupas, das roupas dela, levá-la pra a cama, amá-la insanamente, mas... não estava certo. Era doloroso se afastar, mas ele não queria se descontrolar e não era como ele havia planejado as coisas... apressar tudo daquela forma. Tonks não era apenas uma mulher que ele desejava levar para a cama... mas alguém tão, tão especial que doía.

"O que aconteceu?" Ela franziu a testa, ainda recostada contra a parede, lânguida, os lábios machucados, vermelhos e entreabertos, tão apetitosos...

"Não pretendia ir tão longe... planejava esperar...você é tão..." Snape fez uma longa pausa; e então, murmurou quase que para si mesmo: "especial."

Ela riu suavemente, ainda recostada contra a parede, os olhos semicerrados, um sorriso nos lábios intumescidos. Ela tocou com a mão espalmada o lado do rosto dele, dedos se insinuando lentamente por entre os cabelos negros; virou-o para que ele a encarasse e murmurou:

"Você é tão doce, Sev... nunca te imaginei agindo assim..."

"Não sou doce", ele disse emburrado, olhando para o lado, fazendo-a rir.

"Doce e azedo...", ela enlaçou o pescoço dele e sussurrou em seu ouvido, entre beijos muito leves: "Eu também não planejava isso... as coisas acontecendo assim tão rápido. Mas quando você me beija...", ela fechou os olhos e suspirou pesadamente, sem completar a frase.

"O que é que acontece?" Ele perguntou, se aproximando e murmurando no ouvido. Aquilo fazia um bem para o ego... e era a coisa mais maravilhosa do mundo vê-a daquele jeito, tão exausta de tanto beijá-lo. Tão, tão linda sua Tonks.

"Esqueço até que existo."

Ele se sentiu ainda mais excitado e, ao mesmo tempo, tomado por uma ternura enorme; e mais uma vez não encontrou palavras para expressar o que sentia. Mas aqueles poucos minutos foram suficientes para que ele recuperasse o controle.

"Eu diria que é recíproco...", e ela sorriu; e ele estendeu a mão e tocou suavemente a bochecha dela, finalizando, agora completamente controlado: "mas não pretendo ir mais longe por hoje."

Tonks se endireitou e, franzindo a testa, disse:

"Também não pretendia ir tão longe e...", ele jurou vê-la corando, "por mais que eu queira, Sev... ainda não."

"Tudo bem", ele murmurou e, se adiantando, segurou a mão dela, levou-a aos lábios e beijou-a carinhosamente. De onde havia saído aquele gesto? Não que Snape fosse realmente mal-educado com a maior partes das mulheres, mas... a intenção por trás do gesto era um ato completamente novo. De qualquer forma, parecia tão normal agir daquele jeito com ela...

"Sev? Posso te pedir uma coisa?"

Ele assentiu com a cabeça.

"Fica aqui comigo? Erm...", ela baixou os olhos e então, sorriu meio tímida, uma covinha de cada lado. "Quero dizer, dorme comigo? Mas eu quero dizer... dormir mesmo."

Ele suspirou e revirou os olhos fingido exasperação.

"Para quê isso?"

"Porque estou pedindo, oras."

Ele estreitou os olhos.

"Porque está pedindo?"

Ela riu.

"Bobo. Porque eu... ainda não consigo dormir muito bem, mas... com você... sei que vou. E porque... não quero acordar de manhã e pensar que foi tudo um sonho", ela terminou numa voz estranha, vacilante, mas brutalmente sincera. Dessa vez, foi ele quem ficou sem palavras. Então, para não se ajoelhar aos pés dela e dizer coisas com as quais ele não estava acostumado, Snape cruzou os braços na frente do corpo e ergueu a sobrancelha:

"Com uma condição."

"Qual?"

"Nada de roncos."

"Mas, mas... eu não ronco!"

"Quando dormiu no meu quarto, tive que abafar a cama com um feitiço silenciador."

Ela escancarou a boca. Então, Snape fez algo surpreendente: jogou a cabeça para trás e riu.

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Então! D chega de angst, né? Pelo menos por enquanto, mwahahahah! Adoro esse capítulo, é tão meigo. Bom, preciso acrescentar uma coisa: não acho que o Snape seja assim tão, hm, fofo na intimidade, numa regra geral. Mas é a Tonks; e eles já tinham uma longa história, de ANOS (cinco anos) antes de acontecer a cena deste capítulo. Então, é meio que um caso à parte ;)

Sheylam, esse foi pra vc, seus comentários são os melhores ;D não fica brava comigo, please? (olho de cachorro pidão) sem querer desmerecer os outros comentários, bluememory, sandymione, cnetaura... ;) obrigada, garotas!