Capítulo I
Os mesmos pés que o tiraram de lá o traziam. O caminho era conhecido, mas nem por isso, menos árduo de enfrentar. Reservava-lhe, e de braços abertos, a prova mais dura de toda a sua vida: Vê-los novamente.
Hum... Nada pode ter mudado tanto... E eu sei que eles irão me reconhecer.
7 anos. Esse fora o seu tempo indeterminado. Horas depois de sua partida da casa dos Souma, sentara-se num banco, planejando definir um rumo para suas andanças. Como escolher um destino quando ele mesmo impunha-lhe tantos obstáculos? Bem, Kyo optou pela opção mais simples e voltou para a casa de seu "pai", Kazuma.
O que vivera lá o ensinou a ver o mundo de um modo diferente. A maior parte de sua personalidade fora preservada, mas desejos haviam sido substituídos e a meta antiga, que era ganhar de Yuki, parecia muito infantil agora. Sua única vontade fora a que dissera para a doce menina, na hora mais difícil de sua vida: Sua partida.
"O dia mais feliz da minha vida será quando eu puder abraçá-la, Tohru".
Obviamente, a maldição ainda guardava seu corpo. Era inútil tentar lutar contra ela. Porém, era ainda mais tolo lutar contra a própria frustração que sentia, a impotência que vinha surgindo quando pensamentos mais adultos o acometiam. Sempre assim viveria? Temendo tocá-la e virar um animal?
Preferia correr o risco. Antes um animal feliz do que um humano incompleto.
Pôs-se a andar pela estradinha que levaria a casa dos Souma. Involuntariamente, seus lábios tremeram e a palma das mãos começou a suar. A respiração falhou a as pernas não se contiveram. Kyo esqueceu da calma que o pai lhe incitara a ter e correu feito um louco para seu antigo lar.
Ainda está aqui... Graças a Kami...
Jamais havia percebido o quanto à casa que Shigure cuidadosamente escolhera era bonita. Tão harmoniosa. Seus olhos correram para a porta que ele e Yuki insistiam em rasgar cada vez que duelavam. E que ela, com dedicação e paciência, consertava. As lembranças vieram num turbilhão e o peito explodiu, junto a voz que gritou, com lágrimas de emoção nos olhos. "TOHRU!".
Pássaros voaram. Árvores balançaram. Outros sons foram ouvidos, mas... não foi ela que foi recebê-lo.
"Kyo?", um arquear despontou na sobrancelha do rapaz que veio atendê-lo. "Não é possível... pensei que nunca iria voltar".
"Yuki", é, tinha de ter lembrado que sete anos mudam um adolescente delicado para um homem bem afeiçoado. A ratazana deveria estar fazendo sucesso com as mulheres agora. Havia aumentado consideravelmente de tamanho e o rosto ganhara uma expressão masculina e sombria. Aproximou-se dele e bem diferente do que o primo pensou que ele iria fazer, ergueu a mão. "Faz tempo".
Ele piscou várias vezes antes de entender o que estava acontecendo. Assim que conseguiu, apertou a mão em frente à dele e disse, com o tom neutro. "Realmente, faz muito tempo. Voltou para ficar?".
"Sinceramente não sei", que estranho. Pela primeira vez, estava tendo uma conversa decente com Yuki. Embora não fosse ele quem quisesse realmente ver. "E onde está...?".
"Shigure?", Yuki completou e Kyo fez uma careta discreta. Não era do escritor que queria saber, mas de qualquer modo... "Casou-se e não mora mais aqui".
"Ca... casou-se!", arregalou os olhos.
"Por que o espanto?", o rato riu abertamente. "Ele já tem 34 anos. Está casado com a editora dele. Você se lembra dela, não?".
"Mais ou menos", o que mais o surpreenda fora o fato dele ter se casado com uma pessoa que não pertencesse ao circulo dos Souma. Um sorriso contente despontou em sua fase. As transformações que Shigure sofria não deveriam ser empecilhos para que a esposa o amasse. "Fico feliz por ele".
"Bem...", Yuki voltou-se, olhando-o por sobre o ombro. "Vamos entrando".
Kyo seguiu o ex-arquiinimigo e entrou na casa. Assim que colocou o primeiro pé na casa, soube que havia algo de errado. O delicioso cheiro de preparados havia sumido. Uma brisa gelada circulava-o e deslizava pelas paredes sem cor e sem vida. A limpeza era a mesma, senão ainda mais perfeita. Apenas lhe faltava o toque carinhoso de um lar de verdade.
Chegaram na sala de estar. Sentaram-se em frente a mesa e Kyo, não agüentando mais a pressão das próprias perguntas, inquiriu. "E Tohru?".
Uma sombra de tristeza atravessou os olhos violeta de Yuki. E mesmo assim, ele deu um sorriso cínico. "Você sempre foi ingênuo, Kyo. Não acredito que estava esperando encontrá-la aqui".
"Está querendo dizer que... que...", a respiração falhou antes que ele pudesse terminar a frase.
"Tohru não vive mais aqui".
"O que espera, Kyo? Que a casa dos Souma esteja no estado em que a deixou? Que Yuki-san ainda aceite suas provocações? Que Shigure ainda esteja sentado em frente ao computador escrevendo um livro sobre um pseudônimo estúpido? E ainda: Espera que Tohru lhe dê um sorriso e lhe ofereça Onigiri? Esqueça. Tudo mudou e não há como prever o que irá acontecer. Você não enviou notícias e nem permitiu que as mandasse para você".
Essas haviam sido as difíceis palavras de Kazuma. Respondera-as com um palavrão mas o medo não deixou de incrustar-se em sua mente. Porém, mais forte do que ele, a esperança de um passado intocável serviu de apoio nas noites solitárias. Por mais que dissesse que odiava aquele lugar, sentia falta dele como jamais sentira falta de nada no mundo.
Como... Como ela pôde partir!
O silêncio foi quebrado pela mão forte que acertou em cheio a mesa de centro. A mesma se espatifou em duas e a raiva de Kyo também se duplicou. "ISSO É IMPOSSÍVEL!"
Yuki continuou impassível, ainda na mesma posição. "Eu havia me esquecido que cada vez que entra nessa casa, quebra algo".
"E que diabos isso importa!", pegou-o pelo colarinho da camisa, torcendo o pano como se assim, a dor fosse se amenizar. Mas bem sabia que não seria tão simples. "Onde ela está, Yuki! Por que ela não está aqui! Ela é dessa casa, ela é da nossa família! Diga-me onde ela está para que eu possa ir buscá-la, droga!".
"Primeiro, solte-me", o jovem disse. "Assim poderei dar todas as explicações que desejar".
Kyo respirou fundo e o fez, murmurando um 'desculpe-me' contrariado.
"Um ano depois de sua partida, Kyo, Tohru também decidiu deixar essa casa. A convivência entre nós mudou bastante e nada a fazia sentir-se confortável sobre esse teto. Então, não houve tantas lágrimas. Pelo menos não da parte dela", Yuki suspirou. "Ela decidiu cortar as relações com a família Souma", sorriu com tristeza, em seguida. "Tohru abriu uma creche com o dinheiro que herdou do falecido avô e mora nela. Mesmo eu tentando voltar a nossa amizade, ela recusou-se terminantemente. E eu não a culpo".
"Mas... mas... porque ela não quis voltar para cá!", por que ela não pôde me esperar? Por que ela não quer mais ficar perto de nossa família?
"Isso...", o olhar dele praticamente o fuzilou. "Isso não te interessa".
Kyo também não queria saber. Tudo que importava era que sua volta havia sido mais difícil do que planejara. Só que não podia aceitar isso com tanta naturalidade! Não se importava que não eram mais crianças! Queria-a naquele lar, naquele instante, onde pudesse olhá-la, cuidar dela!
"O passado não vive em função de você, Kyo".
"Kazuma... Kazuma está errado", sussurrou, mais para si mesmo do que para Yuki.
O outro, sem entender nada, perguntou. "Nani?".
"Tudo está errado! E eu vou concertar!".
"Está louco? Sobre o que está falando!".
Kyo ergueu-se, com evidente determinação. "Me dê o endereço da creche!".
"Demo, Kyo...".
"Eu vou lá e vou trazê-la para cá de qualquer jeito!".
Eu não vou deixar que sete anos me ensinem o que eu tenho que perder!
Continua...
Hei, Minna!
Primeiro capítulo, que orgulho! Eu espero que estejam gostando... o texto tá todo pronto, é só ir postando. Vou tentar fazer isso uma fez por semana, tá?
Agradecimentos super especiais a Dani. Espero que a continuação tenha ficado de seu agrado!
Obrigada e continuem a ler!
Kisu!
