Capítulo Dois: Dor e Solidão
Ginny ouviu o som de alguém se materializando naquele quarto escuro mas não abriu os olhos. Deixou-se ficar deitada no chão esperando que a morte ou alguém a viesse salvar.
-Trouxe-te comida e água.- ela ouviu Malfoy dizer mas não se mexeu.- Levanta-te e come!- ele disse levantando a voz. Ginny abriu os olhos e olhou-o mas continuou sem se mexer. Ele aproximou-se do local onde ela estava deitada.- Estás planeando em morrer de fome?- ele perguntou numa voz sibilosa. Ginny manteve-se quieta. -E morrer de sede também?- ele continuou mas ela não lhe prestou atenção. Talvez ele se cansasse e se fosse embora porque ela planeava fazer exactamente o que ele estava dizendo.
Draco caminhou na direcção da rapariga até os seus pés estarem a alguns centimetros da barriga dela. Ela estava começando a pô-lo irritado.
-Weasley eu fiz-te duas perguntas. Os teus pais não te ensinaram que quando alguém nos faz uma pergunta devemos responder?
Ginny finalmente decidiu responder:
-Sim e sim. Os meus pais ensinaram-me muito bem e sim eu estou planeando morrer de sede e de fome!- ela gritou. Draco agarrou-lhe pelo cabelo e puxou-a para cima pondo-na de pé.
-Tu vais comer a bem ou a mal!- ele empurrou-a com força contra a parede- E acredita que é melhor que seja a bem!
Ginny afogou-se na escuridão dos olhos dele. Algo naqueles olhos cinzentos e gelados a lembravam um rapaz em quem ela tinha confiado quando tinha onze anos e quase a tinha morto. Draco Malfoy estava seguindo as pegadas de Tom Riddle. Tanto ódio, maldade, frieza e poder dentro dele que assustaria muitas pessoas, mas ela não era covarde e não se iria render.
-Eu não vou comer! Tortura-me se quiseres mas eu não vou comer ou beber ou fazer qualquer outra coisa que queiras que eu faça!
-Péssima decisão Ruiva. Esta com esperanças que já tivesses perdido essa estupidez a que chamam de bravura. Parece-me que será da pior maneira! Crucio!
Ginny sentiu como se todos os ossos do seu corpo estivessem partindo, centenas de agulhas estivessem penetrando na sua pele, como se ela estivesse queimando por dentro e como se o seu cérebro estivesse aumentando e o seu cránio fosse rebentar. O gosto de sangue chegou-lhe á boca vindo do nariz que já estava sangrando. E a dor não ia embora. Ela sentiu Draco largar o seu cabelo e ela caiu no chão gritando com todos os seus pulmoes de dor. E de repente parou. A dor tinha se ido como tinha vindo, tão de repente.
-Essa é a minha maneira! Então vais comer ou não?
Ginny estava dorida demais para falar mas não queria ser torturada mais uma vez por isso quando Draco colocou o pão e o copo com água ao lado dela, ela forçou-se a comer amaldiçoando-se por ser tão fraca.
-Linda menina! Não és tão parva afinal.- Draco disse caminhando pela masmorra olhando-a com um sorriso escarninho- Sabes, vou gostar disto. Ainda não esqueci aquele feitiçozinho que me lançaste no meu quinto ano. Queres ver o feitiço que Lord Voldemort me ensinou?
Ginny tremeu. Nenhum Devorador da Morte tinha a coragem de chamar o Senhor das Trevas pelo nome mas Draco dizia-o com uma naturalidade assustadora. Ele dizia-o com prazer demoniaco. Ginny tinha perdido o medo daquele nome há muito tempo mas na voz de Draco tornava-se apavorante.
-Não! Eu mostro-te na mesma! Praefocus!
Ginny só teve tempo de ver uma luz violeta indo na sua direcção antes de sentir seus pulmões encolherem. Ela tentava respirar mas não conseguia, era como se lhe tivessem colocado algo demasiado pesado em cima do peito. Ela começou a sentir-se estonteada e os seus olhos começavam a ficar pesados. O seu ritmo cardíaco começava a baixar. Ela sentia seu cerebro cansado, precisando oxigénio. Ela fazia de tudo tentando forçar algum ar a entrar nos seus pulmões. Quando parou os seus movimentos desesperados procurando uma maneira de se ver livre daquela sensação o doce sabor do ar entrou-lhe ela boca e encheu-lhe os pulmões. Ela respirou fundo três vezes antes de começar a tremer descontroladamente. Mais uma maldição daquelas e ela achava que ia ficar inconsciente.
-É engraçada não é? Quero dizer, não a deves ter achado muito engraçada mas não é nada comparada com o que farei a seguir.- a voz desdenhosa dele mudou para uma profunda e perigosa.- A dor física é difícil de suportar mas há outra dor muito mais profunda e dolorosa. Uma dor que demora muito mais a desaparecer. Uma dor que preferias trocar por qualquer outra dor. A dor da solidão. Dias e dias sozinha, sem contacto algum com humanos. Começas a falar sozinha tentando encontrar uma maneira de preencher o vazio. Mas a tua voz não é suficiente e começas a deambular, correr, fazer qualquer coisa que te distraia mas o vazio aumenta e começa a doer cada vez mais. Começas a fazer todo o tipo de coisas só para esquecer mas a dor não vai embora. Depois tentas encontrar outra dor que substitua essa, que seja pior que essa, qualquer uma só para esqueceres o vazio por uns minutos. Dás pontapés, choras, bates com a cabeça na parede até ao dia que não aguentas mais e desejas morrer mas não podes porque eu não deixo!
Ginny sabia o que era a solidão. Ela já tinha tido uma pequena experiência do que esse sentimento era mas tinha a certeza que não era nada comparado com o que Draco descrevera. Algo dentro dela lhe dizia que só alguém que já tivesse se sentido daquela maneira poderia descrevê-la tão bem.
-Tu deves saber! Parece-me que já tiveste essa experiência.
-Não! Acontece é que já fiz disto muitas vezes por isso é fácil prever o que te vai acontecer.- ele disse depois de uns longos minutos de silêncio mas algo na sua voz se tinha enfraquecido.
Ginny sentiu algo próximo de pena. Talvez ele fosse tão cruel para fugir á solidão.
"Virgina Weasley estás sentindo pena do homem que acaba de te torturar! A maldição Cruciatus deve ter feito algum dano no teu cérebro!" ela ouviu a vos da sua consciência gritar-lhe.
-Vemo-nos não muito breve Weasley!- e dito isto ele desmaterializou-se.
As palavras de Draco ficaram ecoando dentro da cabeça de Ginny: "... Começas a falar sozinha tentando encontrar uma maneira de preencher o vazio. Mas a tua voz não é suficiente e começas a deambular, correr, fazer qualquer coisa que te distraia mas o vazio aumenta e começa a doer cada vez mais. Começas a fazer todo o tipo de coisas so para esquecer mas a dor não vai embora. Depois tentas encontrar outra dor que substitua essa que seja pior que essa, qualquer uma só para esqueceres o vazio por uns minutos. Dás pontapés, choras, bates com a cabeça na parede até ao dia que não aguentas mais e desejas morrer...". Ela apercebeu-se como estava sozinha. De repente o som do oceano era demasiado baixo, o quarto demasiado escuro, as suas roupas demasiado frias. A ausência de Harry era mais notória que nunca. Mais uma vez as lágrimas correram-lhe pelo rosto levando com elas o sangue que se espalhara pelas suas bochechas. Ela tinha a certeza de que a solidão era muito dolorosa mas havia algo mais doloroso: o facto de que o Harry iria sofrer por causa dela e ela não podia fazer nada para evitar a dor da pessoa que amava. Essa sim era a dor mais angustiante que alguém podia ter.
Ela olhou pela janela. O quarto era iluminado por tons de violeta e laranja. O sol estava se pondo. Em breve a noite cairia e ela tinha sobrevivido ao primeiro de muitos dias fechada naquela prisão.
