III
Afinal amor?
Olhar o teto era meu passatempo favorito quando eu tinha alguma crise de insônia. Na verdade, eu olhava o teto porque era mais fácil do que olhar pra dentro e ver os problemas. Mas eu tinha que olhar pra dentro, pra encontrar respostas pra tudo que tava acontecendo.
Eu costumava ter nojo de um casal de gays ou lésbicas. Eu costumava achar horrível duas amigas se beijarem. Eu achava que o meu destino era casar com o Harry e ser feliz para sempre. Eu achava que eu ia ter filhos e levá-los todo ano a plataforma 9 e ½ para pegar o Expresso de Hogwarts. Eu achava que nós, eu e o Harry, iríamos visitar o Rony e a Mione todo o fim de semana. Eu sonhava que um dia eu ainda seria feliz.
Bom, não é assim que as coisas acontecem e eu simplesmente sabia que nada daquilo podia acontecer mais. Quer dizer, o Harry tinha arruinado a minha vida, e eu agora me via totalmente apaixonada por uma garota. E ela ainda acha que eu gosto mesmo é do Malfoy. Não sei se ela não deveria pensar melhor no que diz...
Tá certo que o Malfoy é bonito. Tá certo que o Malfoy rondou a ala hospitalar atrás de mim. Tá certo que ele me beijou do nada. E tá certo que eu gostei. Mas agora tudo tá muito confuso. Confuso porque a Mione talvez goste de mim a ponto de ter dado um tempo com o Rony. Confuso porque o Malfoy pode gostar de mim. Confuso porque eu já não tenho certeza do que eu quero. Confuso porque eu sou muito nova pra decidir algumas coisas. Mas muito velha pra me dar ao luxo de ter medo de enfrentar as coisas complicadas.
Alguma vez você já olhou pra quem você ama e sentiu indiferença dessa pessoa? Era o que eu sentia ao olhar a Hermione. E às vezes era muito pior. As vezes ela me olhava com raiva.
O mais doído era ver que ela e o Rony tinham voltado. E cada vez que eu olhava pra ela, a Mione dava um jeito e beijava ele. Podia ser no meio do Salão Principal, na frente do Dumbledore, onde fosse. Era assim e eu tinha que conviver com isso.
A minha sorte é que já era quase maio, ou seja, dois meses de aula e fim. Exceto se a Mione fosse passar as férias lá em casa como o Rony queria. Aí seria um verão de dor e sofrimento.
O fato é que o Malfoy sempre dava um jeito de me achar sozinha e me fazer perguntas indiscretas. E me beijar, daquele jeito agressivo e doce que só ele sabe como fazer. E eu acabava deixando, já que não tinha muita opção.
Eu estava quase desistindo da Mione, quando um dia eu entrei no quarto e encontrei ela, na minha cama chorando.
-Mione?
-Gina... A gente precisa conversar. Lá.
Eu fiquei muito confusa. O que estava acontecendo? Por que a Mione chorava tanto? Por que ela estava na minha cama, me esperando?
Eu caminhei até aquela sala com pesar. Seria a última vez que eu a veria a sós, eu tinha certeza. Chovia lá fora, e por dentro de mim, as nuvens estavam carregadas. Eu precisava acabar com tudo aquilo. Hermione não era pra mim, muito menos Draco. Eu era como um ET, ninguém me queria de verdade. Todos tinham pena de mim e nada vai mudar isso.
-Mione, o que aconteceu?
Ela estava lá, sozinha dentro da sala chorando muito.
-Gina, desculpa, eu...
Ela falava um pouco enrolada e, misturadas ao choro, suas palavras eram quase incompreensíveis.
-Mione, o que que houve? – Eu sentei ao lado dela no chão.
-Gina, o seu irmão descobriu. Ele achou meu diário, leu tudo, a gente brigou... Eu não sei o que fazer. Gina, ele sabe que... Que...
-Que...?
-Que eu gosto de ti.
Eu fiquei muito perturbada. No mínimo toda Grifinória sabia que eu e a Mione... Espera aí! Ela disse que gosta de mim. Ela disse que gosta de mim! De MIM!
Loucura ou não eu a beijei. Certa ou errada, eu continuei ali, no chão abraçada na garota que eu amo. Pela última vez na minha vida, eu merecia ser feliz. Pela última vez na minha vida, eu merecia ter uma razão para sorrir. E essa razão tinha um nome: Hermione Granger.
Nós ficamos ali por um bom tempo. Ouvia-se passos do lado de fora da sala o tempo todo. Passos nervosos, alguns gritos e silêncio. Depois haviam mais gritos, pessoas correndo e barulhos que eu nunca vou saber o que era.
-Mione, o que está acontecendo lá fora?
-Eu não sei. Mas acho que a gente estaria mais segura na Sala Comunal da Grifinória.
-Você acha que Você-Sabe-Quem está aqui?
-Espero que não Gina. Agora vamos, é mais seguro lá do que aqui.
-Tá. Vamos.
Nós duas colocamos os casacos e nos levantamos. Mione disse para eu ir o mais rápido possível, mas sem fazer barulho. Ela abriu a porta e nós saímos pelos corredores com cautela, com varinhas em mãos e olhos atentos. Mas nada cruzou nosso caminho.
O quadro da mulher gorda estava aberto quando chegamos, e o quadro em si estava todo rasgado. Parecia aquela noite que Sirius entrou na Torre da Grifinória. Tudo estava revirado e não havia sinal de vida ali.
-Vamos procurar nos dormitórios. Quem sabe tem alguém escondido? Você começa por ali, Gina. Eu vou por aqui. Qualquer coisa grita.
Eu entrei no quarto dos meninos do 7º ano. As camas reviradas, principalmente a do Potter. E assim era nos dormitórios que entrava.
-Ahh!
-Mione? - Eu gritei e fui até onde ela estava.
Era o seu próprio dormitório, e ela estava aterrorizada. Não era pra menos. No chão jaziam os corpos de Lilá Brown e Parvati Patil, as duas mortas. Meu coração batia rápido. Eu tinha um mau pressentimento.
-Hermione, eu estou com medo.
-Gina, eu não sei onde nos esconder. Vamos procurar alguém.
-Quem Hermione? Todo mundo deve estar morto. Me abraça, Mione.
E ela me abraçou, como se fosse minha mãe. Me abraçou e não tive dúvida, naquele momento, que ela me amava mais que tudo. Ela me protegeu, me acolheu. O medo parecia não existir mais. Mas ela me soltou depois de um tempo, e só disse que era melhor buscar ajuda.
Correr para não morrer. Em qualquer esquina eu e ela podíamos achar a morte. Mione me puxava pela mão e nós duas procurávamos qualquer sinal de vida.
A morte pairava nos corredores do castelo. O clima era como se as trevas reinassem de novo, e logo nós duas sucumbiríamos ao poder de Você-Sabe-Quem. Eu estava angustiada e quase estava parando quando palavras sibilosas e uma forte luz verde irrompeu no ambiente. Havia acabado afinal.
