Encontros e desencontros.
Após uma forte e rápida chuva de verão, o céu mostrava-se limpo novamente, como uma cortina que se abre em um grande teatro para a apresentção de seus astros: uma maravilhosa lua cheia e suas coadjuvantes de uma bela noite, as estrelas. Olhando da janela de seu apartamento, cuja vista abrangia toda a capital, Sesshoumaru perdia-se em pensamentos, pouco se importando com aquele maravilhoso espetáculo sobre sua cabeça. Preocupava-se mais com os planos para seu próximo golpe. O olhar estava perdido na paisagem, mas a mente o fazia enxargar claramente cada detalhe do protegido cofre do Banco de Tokio.
"Câmeras no chão..." repassou aquela informação diversas vezes "Trancas eletrônicas...".
Passou a mão pela cabeça, inquieto pelo fato de que a única pessoa boa o suficiente para entrar no sistema de dados do banco era Sango, e esta no momento era uma opção indisponível.
"Teremos que arranjar alguém tão bom quanto ela..." pensava enquanto a mão direita se enfiava no bolso de uma pequena maleta em cima de um aparador e retirava um palmtop "Não conheço ninguém com a habilidade da Sango".
Começou a fuçar na agenda de endereços, mantida em sigilo com a ajuda de uma senha no pequeno aparelho, procurando nomes que pudessem lhe ser úteis. Quase derrubou o palmtop quando ouviu o telefone celular, jogado sobre o sofá, tocar aquela entediante melodia de quando recebia uma chamada desconhecida.
- Droga! - reclamou desligando o aparelho e caminhando devagar para atender o telefonema – Quem pode ser?
Conferiu o número no visor antes de atender, e estava com o pensamento tão longe que sequer lembrou-se que podia ser a garota do banco, Rin, e atendeu de forma impaciente.
- Fala! - disse frio.
A pessoa do outro lado hesitou em prosseguir por um instante, tirando o pouco de delicadeza que restava em Sesshoumaru.
- O que você quer? - perguntou ele com a voz baixa, mas bastante amedrontadora.
- É o Sr Sesshoumaru Nakami? - uma voz feminina quase infantil perguntou do outro lado da linha.
- Não... - respondeu irritado – É o Dalai Lama! Quem está falando?
Não houve resposta, então ele desligou na cara da ousada menina que lhe passava um trote certamente. Jogou o celular novamente no sofá, sentando-se depois ao lado dele, e voltando a fuçar os nomes no palmtop. Demorou uns dois minutos para que a mente pudesse agir com coerência, e ele notasse que aquela voz no telefone não lhe era desconhecida.
- Merda! - xingou quando finalmente se lembrou de ter dado seu número de telefone para Rin – Merda! Merda! Merda!
Desta vez foi o palmtop que foi jogado sobre o sofá, enquanto as mãos agarravam a pequeno aparelho telefônico, e procurava pelo número da última ligação. Retornou a chamada, esperando que se fosse mesmo Rin, o perdoasse pela falta de educação. Ouviu o barulho de chamada, passando a mão pela testa, ansioso pelo atendimento.
- Atenda... - pedia ele – Por favor...
Rin olhou para o identificador de chamadas e reconheceu o número do telefone. Sentada no sofá de sua casa, com a tia ao lado assistindo um programa na tv, segurava-se para não roer as unhas enquanto ouvia ansiosa aqueles toques da campainha.
- Não vai atender? - perguntou a tia já irritada com o barulho que a impedia de escutar seu telejornal direito.
- Não sei...
- É o rapaz para quem você acabou de ligar?
- Ele mesmo...
A tia rapidamente jogou-se sobre Rin, agarrando o telefone e o levando até o ouvido, para espanto da sobrinha.
- Alô? - disse a tia séria.
- Olá... eu...
- Quem está falando? - interrompeu a tia decidida a devolver a indelicadeza com que Rin fora tratada.
- É Sesshoumaru Nakami...
- Oras, se não é o Dalai Lama! - debochou a tia, para desespero de Rin, que escutava tentava em vão tirar o telefone da mulher.
- Perdoe minha grosseria, mas é que eu imaginei que fosse uma pessoa de quem eu não gosto e...
- Acha que pedir perdão adianta? - a mulher elevava a voz a cada palavra – Seu grosso, mal-educado, sorte sua eu não saber onde encontrá-lo...
- Tia! - Rin quase gritou – Me dê esse telefone!
- Ah, Rin – a tia continuou tentava evitar que a jovem pegasse o telefone – Esse cara é um baita de um grosseirão...
Do outro lado da linha, Sesshoumaru sentia-se envergonhado pela situação desencadeada. Escutava a voz de Rin exigindo da suposta tia o aparelho, enquanto a "gentil" mulher continuava a chamá-lo de vários adjetivos nada simpáticos.
A contenda durou pouco menos de um minuto, com Rin saindo vencedora no embate. Logo a voz quase infantil se mostrava dona total do telefone.
- Alô? - disse ela um pouco esbaforida.
- Rin?
- Sr Sesshoumaru Nakami? - disse ela tentando manter a voz firme – Olá!
- Primeiro quero pedir minhas mais sinceras desculpas pelo acontecido há pouco... - disse Sesshoumaru – Eu juro que atendi o telefone sem me lembrar que poderia ser você, e como ando recebendo trotes de alguma pessoa sem ter o que fazer, atendi já com cinco pedras na mão...
- Imagine... - disse Rin sorrindo – Não foi nada. Eu entendo o que é isso. Ás vezes acontece isso aqui também...
- Tonto! - esbravejou a tia já sem se importar com seu jornal na tv – E você é muito boba, Rin...
A jovem franziu a testa em retaliação aos comentários da tia, e ouviu Sesshoumaru pedir desculpas também a mulher que o xingara tanto.
- Ela aceita suas desculpas – disse Rin fazendo com o dedo indicador sobre os lábios um sinal para que a tia ficasse quieta.
- Está ocupada?
- Não... - disse ela olhando para o relógio que mostrava quase nove da noite – Cheguei agorinha da faculdade, aí resolvi ligar para você.
- Pretende ir dormir agora? - perguntou Sesshoumaru deixando a garota envergonhada, já que já estava vestida com seu adorado pijama.
- Não... - respondeu ela cobrindo-se com um lençol como se o rapaz pudesse vê-la através do aparelho e descobrir que ela mentia – Por quê?
- Quer dar uma volta?
Os olhos dela se arregalaram. Ouvira mesmo aquilo?
- Uma volta? - repetiu ela ainda incerta – Agora?
- Se não puder...
- Posso! - interrompeu Rin quase gritando – Quero dizer... eu adoraria.
- Então eu vou te pegar – disse ele com naturalidade – É só me dizer onde está...
- Em casa! - respondeu com voz descontrolada de novo – Eu estou em casa...
- Diga o endereço, e estarei aí o mais rápido possível...
Rin mordeu o canto da boca, enquanto o olhar buscava a desbocada tia ao seu lado.
- Um momentinho... - ela pediu ao rapaz, tapando o bocal do fone e se dirigindo à tia – Tia Megumi, eu preciso mesmo de um favor...
- Humpf! - fez a tia já imaginando o que seria – Eu ficarei quieta se ele vir aqui...Está bom assim?
- Eu amo você, tia! - disse a garota toda animada e tirando a mão do fone – Sesshoumaru?
- Sim?
- Vou passar meu endereço...
Assim que desligou o telefone, Rin saltou do sofá como uma gazela. Chutou as pantufas longe e correu escada acima, chegando cansada ao quarto.
- Preciso me exercitar mais... - reclamou de sua facilidade para se cansar enquanto abria o guarda-roupa – Vejamos o que eu posso usar...
Separou um monte de roupas, acreditando na previsão de Sesshoumaru, que havia dito que demoraria pelo menos meia hora até chegar em sua casa. Escolheu algo discreto, uma saia até os joelhos branca e de tecido leve, unido à um top da mesma cor, coberto por uma jaquetinha jeans que a protegeria do fraco vento da noite. Tomou um banho rápido, e se vestiu. Olhou para uma sandália de salto rázoavel para calçar nos pés, mas lembrou-se que não era muito amiga desses tipos de sapatos, e não queria levar um tombo já no primeiro encontro com Sesshoumaru. Optou por algo seguro, uma sandálinha indiana baixa. Prendeu os cabelos em um coque, mas julgou-se "tão professora¹" com aquele visual e logo os soltou de novo. Nos lábios, um brilho rosa foi julgado maquiagem suficiente para o encontro. Pegou a bolsa que estava sobre a cama, e desceu para a sala, sentando-se ao lado da tia, já adormecida no móvel, aguardando com ansiedade a chegada de Sesshoumaru.
Os olhos dourados encararam mais uma vez o relógio digital no painel do carro. Já se aproximava das dez e meia, e ainda estava perdido em um trevo que supostamente daria acesso ao bairro onde Rin morava.
- Como pode? - perguntou-se irritado – Conheço essa cidade tão bem, mas nunca ouvi falar desse bairro...
O jeito era pedir informação. Parou o carro em um acostamento, e sem nenhum púdor abordou um apaixonado casal que se entretia sugando o pulmão um do outro.
- Com licença! - ele pediu após pigarreae para chamar a atenção.
O casal se largou momentaneamente, e o rapaz um pouco constrangido o indicou o caminho certo.
- Obrigado! - disse Sesshoumaru voltando ao Porsche negro estacionado no meio-fio – E cuidado. Aqui há muitos ladrões...
Partiu, observando pelo retrovisor o casal se enfiar em seu carro e abandonar o perigoso local. Riu da mentira falada, e riu ainda mais quando se lembrou que ele mesmo era um ladrão. De alto nível, mas definitivamente ladrão.
Em menos de cinco minutos encontrou a rua onde Rin morava. Daquele momento em diante, jamais erraria novamente aquele caminho, pois tinha uma memória excepcional. Encontrou o número 52 da estreita rua, e parou o carro em frente à pequena, mas bela casa. Desceu, ajeitando a camisa negra social, largada charmosamente para fora da calça jeans também negra e desbotada, e procurou pela campainha na cerca baixa que circundava o imóvel.
- Um sino? - ele estranhou ao deparar-se com tão inusitado objeto – Mas...
Olhou para os lados, julgando se o som do sino causaria muito estardalhaço na vizinhança. Prevenido, achou melhor ligar para Rin, pedindo que ela o encontrasse ali fora.
Rin, que nesse momento já havia retornado ao quarto, pensando seriamente em trocar de roupa, escutou o telefone tocar e desceu correndo as escadas. Por sorte a tia já havia ido se deitar, e ela podia atender sem esconder sua angústia. Afinal, era o telefone de Sesshoumaru que o identificador de chamadas mostrava, e pela demora dele, imaginou que não haveria mais nenhum encontro.
- Alô? - a voz saiu falha.
- Rin?
- Oi?
- Eu já estou na frente da sua casa... - ouviu a voz firme de Sesshoumaru – Eu não toquei o "sino" pois imaginei que isso ia fazer um barulho danado...
Um sorriso enorme se formou no rosto de Rin. Ela abriu uma parte da cortina, notando o rapaz encostado no carro.
- Já "tô" saindo! - disse ela desligando e pegando a bolsa.
Apesar dos dez minutos que já estavam dentro do carro, pouco assunto fora encontrado pelos dois, deixando no ar uma atmosfera incomôda. Rin olhava para fora, parecendo ter medo de encarar Sesshoumaru. Ele, mantinha o olhar atento na direção, desviando-o para a garota esporádicamente.
- O que estuda? - perguntou ele após mais de um minuto de silêncio mortal.
- Matemática...- respondeu ela rápido – Quero ser professora.
- Já desvendou a Teoria de Fermat²? Perguntou ele atraindo o olhar dela.
- Você a conhece? - perguntou Rin surpresa.
- Sim... - disse ele – Li sobre isso em algumas revistas...
- Nossa, muito legal – disse ela sorrindo – Já sai com caras que nem sequer sabiam o que são números primos... e você...
- Espera aí – disse Sesshoumaru sorrindo – Eu não disse que sei resolver o teorema... apenas já li sobre isso...
- E quem é que consegue resolver aquilo? Mas o simples fato de saber o que é, já demonstra que você não é uma pessoa qualquer.
Calou-se assim que percebeu o modo como falava. Perguntou-se se não estava parecendo muito bajuladora, e o que Sesshoumaru pensaria dela. Resolveu mudar de assunto, para também não ficar parecendo uma CDF de faculdade.
- Já sabe onde vamos? - ela perguntou notando que não seguiam na direção do centro, onde ficava a agitação.
- Comer – respondeu prontamente.
- Comer? Mas...
- Você já jantou? - ele mesmo completou – Eu já imaginava isso. Por isso mesmo vamos comer algo diferente...
- Diferente? - perguntou Rin sem imaginar o que poderia ser.
Mas cinco minutos e chegaram ao local. Rin leu o luminoso no alto do recatado imóvel ao lado de sua janela, e sorriu surpresa.
- "Gelateria Ícaro"? - ela repetiu em voz alta.
- Acho que você consegue comer um sorvete pelo menos, não é? - perguntou Sesshoumaru educadamente abrindo a porta do carro, como fizera para que ela entrasse.
- Certamente... - respondeu a garota – Acho que aguento uns dois ou três sundaes...
- Quando você vir o sundae deles, aposto que vai querer comer mais do que três apenas... - brincou Sesshoumaru.
- Miroku olhou de soslaio para a mulher que adentrava o salão. Mais que depressa sentiu uma dor forte no rim, e virou com um sorriso descarado para a esposa que estava sentada ao seu lado.
- He he, Sango – disse ele com a maior cara-de-pau – O que eu fiz?
- Descarado! - disse ela se levantando e pegando a bolsa de cima da mesa – Vamos embora, pois o local aqui está muito mais interessante para você do que para mim.
Miroku seguiu a mulher em direção a porta. Saíram do Night Club quando já passava das onze da noite. Sango esperou que o marido abrisse a porta do carro para ela entrar, mas o olhar dele encontrou uma moça do outro lado da rua, vestindo uma micro-saia e um top tomara-que-caia.
- Hei, Don Juan? - Sango chamou séria – Se não parar de olhar para aquela mulher e abrir a porta para mim, vamos ter uma conversinha em casa.
Miroku engoliu seco. As "conversinhas" da mulher nunca eram agradáveis, com ele sempre levando a pior no fim das contas. Correu para o lado do passageiro, abrindo a porta e acomodando a esposa com todo carinho no banco. Até mesmo o cinto ele mesmo colocou nela.
- Já está melhorando – disse Sango – Mas vamos ver até chegar em casa.
Meia hora depois, quando finalmente estacionaram em frente ao sobrado em que moravam, ambos olharam surpresos para o carro de Inuyasha parado na garagem.
- O que ele está fazendo aqui? - perguntou Sango soltando o cinto e descendo do carro.
- Posso imaginar... - disse Miroku também descendo do carro.
Inuyasha quase teve um infarto quando bateram no vidro do carro o assustando.
- Você está louco, Miroku? - perguntou ele irritado - Eu estava tirando um cochilo...
- O que você está fazendo aqui? - perguntou o amigo – Não, não fala! Deixa eu imaginar... - Miroku levou a mão ao queixo e fingindo pensar muito – Já sei! Você e a Kikyou brigaram?
- E não? - respondeu Inuyasha abrindo a porta do carro e mostrando uma bolsa no banco do passageiro – Dessa vez ela me mandou embora.
Miroku explodiu numa gargalhada, mas logo se conteve ao notar o rosto nada alegre do amigo.
- Desculpa aí, amigão! - disse ele dando um tapinha nas costas de Inuyasha – E o que você vai fazer agora?
- Agora, agora mesmo... - disse o amigo - eu queria pedir para você e a Sango me deixarem passar a noite aqui... Mas é só hoje, eu juro!
- E seu irmão? - perguntou Miroku vendo sua expectativa de uma noite caliente com sua esposa ir para o beleléu – Não pode ir para o apartamento dele?
- Deixa de ser ruim, Miroku – disse Sango chegando perto dos dois – Você pode dormir aqui sim, Inuyasha. Eu vou arrumar o quarto de hóspedes para você.
- Obrigado, Sango. E além do mais, o Sesshoumaru não estava na casa dele. E o porteiro não gosta de mim, não deixaria eu esperar nem em frente ao prédio.
- Vamos entrar – chamou Sango abraçando Miroku – Assim você conta para nós o que aconteceu... Quero dizer, se você quiser contar, é claro!
Rin ficou boquiaberta ao ver os sorvetes estampados no menu.
- Eles são desse jeitinho – disse Sesshoumaru – Não são só bonitos na foto, como em outros lugares.
- Eu vou pedir esse aqui – disse Rin apontando uma das fotos – Parece delicioso!
Sesshoumaru fez os pedidos, e em pouco tempo o garçom voltava trazendo duas belíssimas taças decoradas com frutas tropicais sobre um delicioso sorvete de chocolate e marshmallow. Fizeram um trato de comerem todo o sorvete que aguentassem, depois veriam quem era o vencedor da 1ª Olimpíada do Sorvete, nome dado por Rin à estranha competição.
Embora Rin tivesse adorado o sabor do sorvete, não conseguiu passar daquela primeira taça. Já Sesshoumaru venceu por uma pequena casquinha de baunilha, comemorando a vitória com um enorme copo de água.
Quando sossegaram, esperando que o corpo fizesse a digestão dos sorvetes, é que puderam enfim conversar de forma a se conhecerem um pouco mais.
- Então, aquela adorável mulher que me atendeu é sua tia? - perguntou Sesshoumaru.
- É... - disse Rin envergonhada – Eu peço mil desculpas pelo que ela falou ao telefone, ela não é muito simpática...
- Eu é quem devo desculpas à você – interrompeu ele – Afinal, fui eu quem atendi o telefone de um jeito rude primeiro. Jamais faria aquilo se soubesse que era você, eu juro.
- Esquece isso. Eu sei como é atender o telefone sem saber quem é e ser um pouco antipático.
Sesshoumaru se endireitou na cadeira ao ouvi-la falar sobre o banco. Aquele assunto era bastante interessante, não só para conhecer melhor a jovem à sua frente, como também para conhecer melhor alguns detalhes do lugar onde ele agiria num futuro próximo.
- É muito estafante o trabalho no banco? - ele perguntou fingindo pouco interesse.
- Não muito... - respondeu ela – Mas como eu sou a mais nova, o pessoal joga todo o trabalho sujo nas minhas costas. Acredita que até uns dias atrás eu ainda fazia cafézinho para o pessoal?
- Eles sempre fazem isso com os novatos. Até mesmo quando eu me formei eu passei por isso.
- É verdade... - ela disse se lembrando de algo que ele dissera – Você era médico, não era?
Sesshoumaru balançou a cabeça confirmando. Esperava que Rin não se aprofundasse naquele assunto, pois não gostava de falar sobre aquilo.
- Aí você trocou de emprego – continuou ela – Virou empresário na área de informática, não é isso?
- Exato.
- Rapaz de coragem – ela elogiou – Mudar tão radicalmente de ramo exige muita coragem.
- Nem tanta coragem... - ele comentou se lembrando do verdadeiro motivo para ter deixado de ser médico – Às vezes o destino nos empurra para outro caminho.
- Assim como eu... Pensava em entrar na faculdade de Artes Plásticas, mas depois me apaixonei pelos números...
Sesshoumaru deixou escapar um sorriso discreto com o modo como ela gesticulava enquanto falava. Conversaram sobre a faculdade um pouco mais, descobrindo até mesmo alguns professores que tiveram em comum. Uma olhada discreta da jovem para o relógio fez com que ele se lembrasse que Rin não era tão livre quanto ele. Chamou o garçom e pediu a conta.
- Acho que já podemos ir, não é mesmo? - ele perguntou com um sorriso.
- Bem que eu gostaria de ficar mais, mas... - a garota enrubesceu um pouco - ... sei que minha tia vai encher o saco se eu voltar muito tarde.
- Melhor assim. Ruim seria se fosse uma largada na vida...
- Verdade.
Os dois deixaram a sorveteria e se dirigiram ao carro. Um pouco mais solta em relação ao rapaz, Rin ousou até mesmo criticar as músicas que ele escolhia no som do automóvel.
- Ópera não dá! - ela disse com um sorriso largo e abrindo a bolsa, buscando por algo em seu interior – Coloque esse cd!
Sesshoumaru pegou o cd na mão e o olhou por alguns segundos. Com uma expressão de "tudo bem" colocou o cd no aparelho de som e esperou pelas primeiras notas da canção.
- Vou ser sincero – disse ele – Jamais imaginei que colocaria um cd do Brian Adams para escutar, mas até que não é tão ruim.
- Ele é maravilhoso – ela comentou fechando os olhos para cantar um pequeno refrão da música - "I don't wanna let you go, so I'll stand in your way... I never needed anyone like I need you today... Do I have to say the words?...²". Essa música é a minha preferida.
- Nunca ouvi – confessou ele com um sorriso irônico, ligando o carro – Vamos?
Rin apenas balançou a cabeça concordando, e continuou com a dublagem da música, e para alegria de Sesshoumaru, a jovem até que tinha uma voz boa o bastante para cantar.
- Então, como sempre, o problema é dinheiro? - disse Miroku estendendo uma xícara com chá para Inuyasha.
- Sempre – ele admitiu – Não dá para deixar passar todas as loucuras da Kikyou. Só esse mês eu já paguei o equivalente ao valor do meu carro, zero, em compras de roupas. Ela quer acabar comigo.
- Sei que esse conselho é meio radical – disse Sango que estava sentada ao lado de Inuyasha – Mas será que não está na hora de vocês repensarem esse casamento? Vocês já não se dão bem há um bom tempo... é briga atrás de briga.
- Ainda assim... - disse Inuyasha – Eu gosto da Kikyou. Desde quando eu a conheço? Desde quando éramos crianças, não? Assim como vocês dois. Não posso fingir que é fácil deixá-la assim, sem mais nem menos.
- Sem mais nem menos? - Sango quase gargalhou com a frase do amigo – Há três anos que vocês brigam sem parar por causa de dinheiro, de falta de respeito por parte dela... Sinceramente, Inuyasha, já está mais do que na hora de você partir para alguma coisa melhor.
- Hmm... - Miroku deixou um som escapar da boca, e colocou a mão no queixo, pensativo.
O olhar de Miroku parecia indicar um dos infalíveis conselhos do amigo em poucos segundos. Sango e Inuyasha ficaram olhando para ele, esperando a explosão de sabedoria do rapaz.
- Acho que coloquei muito açucar nesse chá... - comentou Miroku quase derrubando os amigos no chão.
Sango se levantou do sofá, arrancando a xícara da mão do marido.
- Eu vou deitar – disse ela – Se quiserem continuar conversando, podem ficar sossegados...
- Eu vou mesmo bater mais um papinho com o Mi... - Inuyasha começou a falar quando viu o amigo, atrás da esposa, gesticulando que não era para ele continuar a conversa - ...er, pensando bem, eu acho que eu também já vou me deitar.
- Tem certeza? - perguntou Sango – Você parece que precisa de alguém para conversar e...
- Imagine... - disse ele – Eu já estou morrendo de sono... Uahhh! - Inuyasha fingiu um bocejo.
- Então, boa noite! - disse Sango indo para a cozinha para levar as xícaras – Você sabe onde é o quarto já, fique à vontade.
Miroku esperou a mulher sair da sala e aproximou-se do amigo.
- Valeu, Inuyasha – disse ele com uma cara de pervertido – Você salvou a minha noite...
- Você fica me devendo essa...
O Porsche estacionou em frente à casa, enquanto seus ocupantes soltavam os cintos de segurança sem muita pressa.
- Adorei aquela sorveteria – disse Rin – Certamente vou voltar lá um dia...
- Certamente – ele confirmou – Se quiser podemos ir amanhã.
- Amanhã? - Rin sorriu com a expectativa de um novo encontro – Claro que quero... - o sorriso deu lugar a uma expressão de frustração com algo que ela se lembrou – Espera... amanhã?
- Tem algum outro compromisso?
- Sim... - ela respondeu chateada – Não é bem um compromisso. Eu tenho que levar minha tia à praia. Eu prometi que a levaria esse fim de semana.
- Tudo bem – disse Sesshoumaru – Podemos ir um outro dia. Você só voltará no domingo?
- Sim...
Ambos ficaram em silêncio, criando coragem para abrir a porta e deixarem o carro. Rin parecia um pouco mais pensativa, e por um momento balançou a cabeça negativamente, como se porcurasse afastar uma idéia tola.
- Algo errado? - ele perguntou.
- Bem... - ela disse sorrindo envergonhada – Por um minuto eu pensei em convidá-lo para ir junto... mas...
- Mas?
- Mas... seria muito abuso meu, não é mesmo? Além do que, eu nem sei se você pode ficar viajando assim, sem mais nem menos... e ainda tem minha tia, que com certeza vai criar algum momento embaraçoso e...
- Eu adoraria ir – Sesshoumaru a interrompeu – Mas não para ficar até domingo...
- Não? -disse ela desfazendo o sorriso animado de segundos antes.
- Eu tenho algumas coisas para fazer no domingo, mas adoraria ficar o dia de amanhã inteiro na praia com você, e até mesmo com sua tia.
Rin adorou a idéia. Passaria o dia com ele, e quem sabe até conseguissem ficar longe da tia, evitando os comentários nada agradáveis dela. Marcaram de se encontrar às 9 da manhã, ali mesmo na casa de Rin. Desceram do automóvel, indo de encontro ao portão.
- Bom... - disse Sesshoumaru olhando para o relógio – Sua tia não vai reclamar muito... ainda não é uma da madrugada.
Ela sorriu, encostando-se no portão para procurar a chave da casa dentro da bolsa. Sesshoumaru esperou pacientemente que ela encontrasse o objeto, antes de dar por encerrada a noite.
- Pronto! - disse ela exibindo o chaveirinho de Piu-Piu com algumas chaves – Consegui encontrar...
Sesshoumaru segurou a mão onde o chaveiro balançava fazendo um barulhinho irritante. A outra mão dele foi de encontro ao pescoço da jovem, retirando algumas mechas de cabelos que estavam caídos ali. Levou sua boca com calma até a dela, dando tempo suficiente para que Rin o afastasse se não desejasse o beijo.
Rin não recusou o beijo. Congelou no tempo por um instante, ao sentir os lábios quentes do belo rapaz contra o seu, mas logo recuperou o movimento, deixando sua mão agarrar a dele, apertando entre as duas palmas o chaveiro infantil. O beijo começou tímido, apenas o contato dos lábios mesmo, como num filme antigo. Mas quando Sesshoumaru puxou Rin um pouco, unindo seu corpo ao dela, foi impossível manter aquele clima inocente. A língua dele procurou, exigiu tocar a dela, e teve sua ordem recebida sem nenhuma barreira. O beijo agora era mais sensual, ardente, assim como qualquer filme com Brad Pitt e Angelina Jolie. Não durou mais que dois minutos, mas foi o suficiente para aquecer os dois o bastante para serem obrigados a se separar rapidamente.
- Bom... - disse ele recuperando aos poucos o controle – Acho que é bom terminarmos a noite agora, não é? Amanhã teremos muito tempo para... conversar dessa maneira.
- Certo... - concordou Rin ofegante – Acho que já é mesmo hora de eu entrar.
Despediram-se com mais um beijo, sem tanta ânsia, mas também sem um conservadorismo exagerado. Ambos sabiam que de onde havia saído aquele outro beijo ainda saíriam muitos outros, por isso não precisavam se apressar com nada.
Rin esperou o Porsche desaparecer no fim da rua, antes de dar um pulo de alegria e correr para dentro de casa. Deparou-se com a tia sentada no sofá, na escuridão, quase dando um grito com o susto.
- O rapaz é bonito! - comentou a tia séria – E parece rico também... Se for os dois, eu aprovo o seu casamente agora mesmo.
- Ai, tia... - Rin falou sorrindo – A sra adora brincar, não é?
A tia olhou para a sobrinha séria.
- Não estou brincando... - disse ela – Aprovo o casamento mesmo!
Rin subiu as escadas para o quarto ainda entorpecida pelo beijo. Sabia que sonharia a noite inteira com ele. Só no alto da escada se lembrou que devia falar para a tia que o levaria para a praia.
"Ah... amanhã cedo eu conto..." pensou rindo com a simples imagem do olhar da tia para o rapaz.
Sesshoumaru abriu a porta do apartamento e atravessou a sala escura, indo direto para mesa de escrivaninha onde estava a secretária-eletrônica. A voz robótica da máquina o informou sobre quatro mensagens, e ele logo apertou o botão que as revelava.
Primeira mensagem... mensagem recebida hoje às 21:45 horas...
"- Sesshoumaru. Aqui é a Kikyou... se seu irmão estiver aí, manda ele me ligar. Eu preciso muito conversar com ele... obrigada, tchau!".
- Brigaram... com certeza... - comentou esperando pela segunda mensagem.
A voz do aparelhoinformou que a outra mensagem fora recebida apenas 10 minutos depois da primeira, e novamente era Kikyou procurando pelo marido.
- Espero que tenha notado que aqui ele não veio, cunhadinha...
A terceira mensagem também era de Kikyou, cinco minutos depois e com um pouco menos de educação.
"Olha, Sesshoumaru... se o Inu estiver aí, é melhor mandar ele me ligar logo... Eu já estou de saco cheio dessa palhaçada... tchau!".
- Eu mereço mesmo... - comentou entediado – Até já sei de quem é a quarta ligação.
"Cansei! Cansei mesmo! Se vocês dois acham que eu sou estúpida, podem ter certeza que acharam isso da pessoa errada. E quanto a você Sesshoumaru, fica protegendo seu irmão como se tivesse mesmo algum sentimento protetor com ele. Seu falso! Você e ele merecem mesmo ser da mesma família...
Um clique no botão stop interrompeu a ladainha de Kikyou. Sesshoumaru não precisava ficar escutando ofensas da cunhada, por quem não nutria simpatia nenhuma. Ainda mais depois de tudo o que ele passara por causa das sandices da mulher do irmão. Sentou-se no sofá, permanecendo na sala escura, apenas pensando no que levaria para a praia, quando o telefone tocou. Esperou primeiro que a secretária-eletrônica atendesse, pois se fosse Kikyou não atenderia.
"Porra, Sesshoumaru!" - a voz feminina nada combinava como palavreado vulgar - "Por que você está ajudando o Inuyasha, hein? Fala para ele atender logo essa droga de telefone, senão eu vou aí buscá-lo e...
Foi o que bastava para que Sesshumaru perdesse a paciência e atendesse o telefone.
- Então vem, Kikyou – disse ele com a voz baixa mas firme – Vem aqui, eu vou gostar muito que faça isso. Mas só para você saber antes: O seu marido não está aqui, e não o vi a noite toda. Mas se ainda assim você quiser vir, saiba que eu vou esperá-la. E juro por minha alma que te darei a surra que aquele imbecil do meu irmão não tem coragem de te dar!
- O quê? - Kikyou parecia ainda mais nervosa – Isso é uma ameaça?
- Ainda é só uma ameaça – disse ele – Mas pode vir, pois eu vou cumprir com o que disse, pois já estou cansado de ouvir sua voz irritante perguntando sobre o Inuyasha. Vai procurar ele em outro lugar, e me deixa em paz!
Desligou o telefone e arrancou o fio que o conectava à parede. Respirou profundamente, tentando diminuir a tensão que estava sentindo. Só mesmo sua cunhada conseguia tirá-lo do sério, e fazê-lo agir da mesma forma de um adolescente.
Deixou a sala, disposto a dormir e deixar o irmão e a mulher dele de lado. Conhecera uma pessoa maravilhosa, e não deixaria a lembrança daquele beijo entre os dois se apagar por conta de brigas de família. Tirou toda a roupa, jogando-se nú na cama. Não demorou muito para que o sono o levasse por sonhos desconexos e agradáveis. O dia seguinte guardava surpresas inimagináveis para ele e Rin, e outros também.
1) Teorema de Fermat: Se alguém que lê essa fic é doido o suficiente para estar fazendo a facul de Matemática sabe do que se trata. Eu só sei que é um cálculo esquisito que muitos matemáticos tentam resolver, e nunca chegam ao fim dele. Fiquei sabendo disso através do meu amado Franklin...
2) Ai, ai, essa música: A música cantada por Rin é "Do I have to say the words?" do Brian Adams. Eu amo essa música, e ia usá-la na minha outra fic À sombra da meia lua, mas como não me veio nenhuma outra para usar nessa fic, eu a peguei. Então, não me achem sem criatividade se de repente lerem a outra fic e verem a mesma música. E aconselho que a escutem, eu pelo menos amo. Sei que ela é um pouquinho "velha", de 92, e que a maioria nunca vai ter ouvido falar dela, mas espero que gostem.
Perdoem minha demora, mas às vezes o tempo parece correr mais rápido do que gostaríamos, e terminar algumas coisas planejadas se tornam impossíveis. Espero que gostem desse capítulo, e quero dizer que no começo dessa fic eu vou primeiro juntar todos os personagens num grupo de conhecidos, pois só assim a trama vai se desencadear. Isso significa que ainda vai ter muito romance e briga antes deles irem aos "finalmente", ou seja, assaltarem o banco. Agradeço de coração as reviews dos dois primeiros capítulos, e peço também de coração que continuem mandando reviews e deixando essa que vos escreve subindo pelas paredes de tanta felicidade.
Abraços e beijos...
Lady...
