Severus passou cento e sessenta e oito horas, resumidos a sete dias da semana tentando fugir de Hermione Prince. Ele conseguiu que os médicos viessem avaliar a recuperação dela com mais frequência e sempre se desencontravam nas refeições, na verdade, ele conseguiu ampliar espaço do laboratório o suficiente para uma mesa e desde então não saiu de lá. Excerto as noites.
Na terceira noite após seu casamento, seus pés levavam seu corpo cansado para o quarto quando seus ouvidos atentos a escutaram chorar. Imediatamente ele abriu a porta do quarto para encontrá-la recolhida contra a cabeceira, abraçada aos próprios joelhos, com uma varinha em riste e o olhar de quem tinha pelo menos centenas de azarações passando pela mente em segundos.
No instante que seu cérebro processou a imagem do homem a porta, ela descontraiu
– Aconteceu algo, senhorita?
– São os pesadelos. Ele sempre vem a noite e me leva de volta. E tudo se repete – Hermione voltou os olhos para um ponto qualquer – acaba quando eu acordo, mas ainda me sinto sufocada pelos lençóis.
– Quando isto começou?
– Na noite do casamento – "três dias" a mente dele completou – E piorou quando o senhor se isolou. Os médicos não sabem o que aconteceu e eu não quero ser a pobre heroína que ainda sofre pela guerra quando muitos outros perderam mais. Teddy vai crescer sem os pais e Ginny nunca mais vai ser amada por Dean, porque ele também se foi.
Severus permaneceu imóvel ainda na soleira. O anel queimava como inferno no anelar esquerdo, mas ele não tomaria a garota para sua esposa. Ainda não. Ele sentia em suas palavras o quanto que ela ainda estava quebrada e ele não era o bastardo que pensava apenas com os desejos
– No meu laboratório há rascunhos do sono sem sonhos e ao amanhecer, a senhorita reforçará as enfermarias da casa e porá novas nos seus aposentos, se desejar
– Mas o senhor não viria, se eu pusesse minha assinatura.
– Não é minha intenção.
– Severus... Nós somos casados – Ela disse empurrando os lençóis da perna – Sua magia está intimamente ligada à minha enquanto vivermos.
– Compreendo, senhorita, mas...
– A única forma que nos tornemos um só, você sabe... – Ela colocava-se para fora da cama – Eu... não quero voltar para o Grimmauld porque a família Weasley sabe que sua morte poderá me deixar livre. Embora eu duvide muito, mas Molly Weasley matou Bellatrix Lestrange apenas por ameaçar a Ginny mesmo que Luna e eu a tenhamos defendido instantaneamente. Eu não duvido muito que ela fara quando souber que eu estou viva e Rose morta. E Harry ficará calado, ela não disse nada diretamente, mas eu vi quando ela o fez se sentir culpado pela morte de Fred e pela prisão de Percy.
– E o que a senhorita está dizendo?
– Eu quero que você me tome por sua esposa – Respondeu próxima a ele – Nós dois sabemos que quando estivermos totalmente ligados, nem mesmo as palavras dele, o grande salvador do mundo bruxo, ou do próprio Merlim será capaz de desfazer isso
Então lá estava Severus, observando os papeis do ministério emitidos pelo cartório irlandês sobre a cerimônia. Ele não conseguia ver Hermione como esposa, uma companheira para o restante da vida? Possivelmente.
Uma futura ministra da magia? Essa era uma opção viável.
O fato de ele e ela assinarem magicamente aquele pergaminho e ligarem-se um ao outro davam a ela um leque de oportunidades e mesmo que ela decidisse colocar os pés de molho e acompanhasse o crescimento da filha, ela poderia. Não perderia tempo nenhum em panelas ou serviços domésticos. Não, ele sabia que Hermione não era uma pessoa "do lar".
Mas ele ainda não a via como sua esposa. Mesmo todo o futuro se descrevendo a sua frente, ele não conseguia tocá-la intimamente. Sua mente lembrava-o de Lilian, constantemente. E não era difícil ele se lembrar da primeira guerra, da descrição de Albus sobre a casa, o corpo e o bebê no berço que ela protegeu.
Hermione também morreria pelo Potter... Mas ele chegou a tempo dessa vez.
E lá estava ele, sentado em seu novo refúgio no próprio refúgio. Observando a certidão de casamento pelas últimas oito horas até que pediu a um elfo para chamá-la.
Hermione adentrou o laboratório andando melhor que conseguia. Já não mais cambaleava, mas ainda sentia dores na região do fêmur recém-restaurado. O suficiente para parar depois de alguns passos, mas andar como se nada tivesse acontecido
– Boa tarde, Severus. Queria me ver?
– Sim, senhorita. Sente-se – Ofereceu uma banqueta próximo ao balcão onde um caldeirão jazia sobre o queimador desligado – Estive analisando a nossa situação e, embora eu a tenha prometido a minha proteção, primeiramente por Lilian depois por Eileen, eu não consigo tocá-la mesmo que o feitiço ainda esteja vigente
– Eu imaginei... – Hermione respondeu com um desapontamento na voz – Eu estive olhando outras opções de escola caso eu... Não volte para Hogwarts sem ser pega pela família Weasley.
– A senhorita não me deixou finalizar. – Severus rosnou – Eu vejo em você a Lily quem se sacrificou por Harry e a Eileen quem teve um destino trágico. Também vejo uma criança de onze, tagarela e que mal pode manter o braço abaixado depois de uma pergunta.
– Oh! — Foi tudo o que ela conseguiu dizer
– Mas há muito sei que não é mais assim. Então, devido nossos arranjos às pressas – Pigarreou – e como sei que a senhorita tem o orgulho de Gryffindor e ficará até o fim disto, eu proponho cortejá-la e, consequentemente, levá-la para meus aposentos. Adequadamente. De qualquer forma, a casa é grande o suficiente para que não nos encontremos pelo restante das nossas vidas e podemos revezar os dias na biblioteca.
– Você espera que isso dê certo?
Severus virou-se e juntou uma porção de pergaminhos. Deu a volta no balcão e sentou na cadeira ao lado dela
– Esses são os ingredientes que faltarão para montarmos a pedra filosofal e recriarmos o elixir da vida. Não bastam as circunstâncias que a criança nascerá, eu não gostaria que a sua infância fosse a casas separadas ou com pais que mal se veem. Conheço muitas famílias que foram criadas assim e os filhos jamais souberam o que foi um afeto.
Hermione tomou a lista das mãos do homem analisando cada 'item'. Ela leu sobre a pedra nos dias solitários na biblioteca, alguns precisavam de meses para ser encontrados e se ela ainda tivesse contato com Charlie Weasley, certeza que conseguiria o sangue de dragão escarlate a meia-noite de lua cheia sem custos adicionais.
– Nós calcularemos os riscos? Digo, há uma grande possibilidade de isto dar certo, mas... há uma ínfima hipótese de eu perder tudo novamente. Eu não posso reviver tudo de novo.
Severus abaixou as mãos dela, atraindo o seu olhar para ele
– Isso vai funcionar. Confie em mim. Agora, vamos nos arrumar para o jantar – as bochechas de Hermione queimaram lentamente e ela baixou a cabeça na intenção de não o deixar ver.
– Certo. Salão de jantar?
– Não. Não se preocupe, senhora Prince. Eu tenho tudo sob controle
Hermione foi acompanhada por Severus para fora do laboratório e pode ver o sol se pondo por uma das grandes janelas. O homem em questão estendeu o braço a ela e a acompanhou até o olhar e ficaram apreciando a obra da natureza nos terrenos da família. Por um instante, Severus perguntou se seria esta a vida que ele levaria com Lilian caso ela o tivesse perdoado e não escolhido ao Potter. A mão esquerda dele afagou a dela sobre o antebraço então silenciosamente, caminharam até os quartos.
O estômago de Hermione revirava-se pensando se finalmente estava indo para a sua liberdade ao lado do seu ex-professor. Ela não o amava. Tinha apreço, admiração, agradecimento. Mas não era o mesmo sentimento que ela achou sentir por Ron.
Lembrar-se do ex-amigo e namorado, Hermione pegou relembrando de ele a abandonando sozinha nas masmorras e então, atos atrás de atos até Rose. Estremeceu.
Mas logo estavam em frente aos quartos dela, o estomago deu outra embrulhada e quase as pernas fraquejaram. Por um segundo Hermione se lembrou do estrago em seu corpo que ainda recuperava, talvez por este motivo que o seu marido não a queria.
Severus lentamente abriu a porta do quarto e então moveu para retirar a mão do seu antebraço e levou aos lábios, beijando aos nos dos dedos
– Vejo você no jantar, senhorita
Ela ainda absorvia tudo quando ele retornou para o corredor e entrou na porta que achou ser seus aposentos, quando finalmente a ficha caiu, ela abraçou a mão esquerda e adentrou no quarto.
Tempos mais tarde, Severus tomava uma dose do seu uísque enquanto os olhos vagavam para um ponto da lareira apagada quando Hermione apareceu. As roupas das mulheres Prince serviam perfeitamente em seu corpo, apesar de ser épocas passadas, pareciam ter sido feitas exatamente para ela.
Isso levava a questão de uma aparição pública de ambos, ela precisaria de roupas novas e ele precisaria dá-la acesso ao cofre da família. Uma visita no Diagon Alley de dois ex-mortos chamaria toda uma atenção que era desnecessária até agora. Para ela.
– Senhorita Prince – levantou e estendeu a mão para recebê-la no como – Devo dizer que está encantadora essa noite.
– Obrigada, senhor. – Hermione lutava contra o calor nas bochechas – Eu creio que meu marido apreciará bastante.
– Um homem de sorte, diria eu. Nosso jantar nos aguarda nos jardins, mas antes... – ele voltou para a mesa de centro e recolheu uma poção de coloração vermelha – Isto é para a senhorita. Para evitarmos... Imprevistos.
– Oh! Ela envergonhou-se – Não é desmerecendo seu trabalho e preocupação, mas não acredito que esse tipo poções funcione em mim. – Sua voz denotava um tom de tristeza enquanto usava a palma para segurar a base do frasco – Rose não foi a primeira, o outro... se foi tão novo que... nem foi contabilizado. O médico não notou. Mas eu sabia que ele estava lá. Então pedi ao médico por essas poções, mas Rose ainda veio
As mãos tremiam e Severus segurou as duas com as suas, mantendo o frasco no meio.
– Garanto senhorita. Essa é a melhor poção existente, eu estudei o seu prontuário e repassei em minha mente diariamente desde os preparativos do casamento. Eu sei quais as substâncias que anularam ao efeito da outra e trabalhei para que esta tivesse um resultado totalmente diferente.
Hermione usou todo o seu peso para quebrar o contato das mãos e envolvê-lo em um abraço.
– Obrigada Severus, é mais que eu mereço
– Apenas tome isto, senhorita. E começaremos nossa noite.
Ela tirou os braços do corpo dele e abriu o frasco preparando-se para o gosto ruim. Mas não foi isso que aconteceu. Havia um gosto de cereja que chegava a ser agradável aos lábios e ela quase soltou um gemido de satisfação enquanto o líquido descia levemente por sua garganta.
Ele recebeu o frasco assim que ela o retirou dos lábios e o descartou de alguma forma que pareceu não se importar. Lentamente voltou estender a mão para ela, e guiar até fora da casa. Desde a Islândia, Hermione não saia da casa, não tina visto o jardim além da sua varanda ou das janelas da sala de refeição enquanto esperava que o tempo passasse mais rápido.
Os olhos dela demoraram a acostumar a escuridão até avistar a parte dos jardins mais claros. Havia uma mesa, velas cercando por todos os lados, flores no entorno e o cheiro avisava que a comida não estava muito distante.
O homem puxou a cadeira para ela e sentou-se na outra, o vinho foi servido magicamente e Hermione perguntou se usaria a mesmo magia em Hogwarts. A resposta veio quando o prato encheu de especiarias desconhecidas por ela no lugar e horário da sopa que ela estava acostumada a tomar a noite na companhia dos elfo.
– De onde tirou essa ideia? – Perguntou depois de um tempo em silêncio. Esperava que a distração realmente o fizesse comer a ficar remexendo no prato
– Há um quadro, meus avós vieram de casamentos arranjados e também fizeram o mesmo jantar pós casamento. Depois da concepção de Eileen, viraram melhores amigos. Por isto que, se eu não tivesse reivindicado o sobrenome e matado a raça dos Snape, não existiriam mais Prince para perpetuar.
– Não adiantou muita coisa – Hermione murmurou
– Mas é melhor a passar o restante da minha vida preso ao nome que me causa repulsa. Snape foi tudo, menos um pai e esposo.
– Não deixemos isso estragar o nosso jantar – a mão dela voou por cima da mesa para afagar a ele – Você não é e nem será seu pai. Me conte mais sobre seus avós. O que você sabe?
– Mathias Prince foi prometido ainda no berço para a família de Aurora Rosier. Mas quando esta fugiu e casou com um trouxa, morta tempos depois, ele casou com a melhor amiga Elizabeth Perverell.
– Perverell? Esse não era o sobrenome da...
- Da familia do conto. Quando Iolanthe casou-se com Hardwin Linfred, tinha uma descente. A garota herdou apenas o sobrenome da mãe, mas sabe que o sangue do pai era puro. A senhora Linfred garantiu que a filha fizesse um bom casamento antes que a próxima se tornasse uma...Potter.
– Oh meu... Merlim, você e Harry são...
– Não. Iolanthe confessou mais tarde que Elizabeth foi dada a ela ainda no berço. Nunca disse de quem era a família. Então a linhagem dos Prince junta-se a do Perverell apenas por falta de informações.
Hermione abaixou a vista somente para notar que a sobremesa estava servida, o cheiro inconfundível do chocolate a fez ter o estomago revirado, era a que a sua mãe sempre preparava quando estavam nas férias.
Notando o desconforto da jovem, Severus levantou-se e foi até ela
– A senhorita aceitaria uma dança?
– Sinto, eu não tenho a coordenação motora ainda
– Deixe que eu a conduzo. Eu disse, tenho tudo sob controle.
O espaço entre a mesa, iluminado pelas velas, diminuíram um tom quando Severus pousou a mão na cintura dela. Embora ela não reconhecesse aquela sinfonia, parecendo ser antiga o suficiente para que ela nunca tivesse ouvido falar, sua mente vagava apenas notas de Beethoven.
Foi somente quando o rosto pousou no peito do seu acompanhante, que ela notou, ele cheirava bem. Não eram ervas, não era o cheiro que ela reconhecia por ficar no seu cabelo após muito tempo cozinhando poções. Ele, seu marido, a estava cortejando. Não era o professor de poções e não era Severus Prince.
Temerosamente, ela levantou os olhos para encontrar os deles, e as mãos foram a nunca para puxá-lo para um beijo enquanto continuavam a balançar ao som. Era agradável o encontro dos lábios, não eram urgentes, não tinham necessidades. Era apenas os dois tentando dar certo.
– Eu aceito...– Começou incerto – Ser o seu marido.
Os lábios dela abriram num sorriso que ele se perguntou se alguém já havia sorrido para ele verdadeiramente como ela o estava fazendo.
Ali, cercado por braços longos, em passos desajeitados, estava toda a companhia que ele precisava para o restante da sua vida
