Não Era Pra Ser Assim - Capítulo III – Apenas um Humano

- Isso... tem que parar! - ele olhava para cima - tem que ter um fim!

- E quem disse que não terá, Dr.? Quem disse?

- Não era pra ser assim, nós... nós os construímos com as melhores das intenções, mas vocês...

- Vocês... o que? - ele brandia o sabre laser, o qual demonstrou ser bem mais perigoso do que aparentava - vamos, Dr. Light, responda.

- Não os criamos para serem nosso carrascos! - e, mesmo ajoelhado e no fim de suas forças, ele trincava seus dentes para o Reploid.

- Vocês nos criarem melhores, maiores e em quantidade excessiva, Dr... e agora querem nos destruir. Que mal há em nos defendermos? Afinal, não é exatamente a mesma coisa que vocês fazem?

- Você não é como nós, e nunca será!

- Não mesmo. Sou mais do que um humano, muito mais do que um mero robô. - e, ouvindo atentamente cada palavra, Light tornava a fazer algo que fizera constantemente nas últimas horas.

Ele chorou.

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Laboratório do Dr. Light, horas atrás...

Estava exausto. A conversa com Willy apenas serviu para desgastá-lo e pouco lhe acrescentou, na verdade, piorou as coisas.

Onde estava com a cabeça quando foi atrás daquele homem? Por acaso esperava ouvir uma palavra de consolo?

E não era verdade? Podia ter pedido conselhos ao Dr. Cossack, mas apenas Willy e somente Willy realmente o entenderia.

Assim como os motivos de seu sofrimento.

"Por que somos cientistas", ele se lembrava. Não eram as últimas palavras de Willy, mas eram as que iriam ficar marcadas em sua mente até o fim de seus dias.

O que criaram? Até onde foram, como foram capazes de desrespeitar as mais básicas leis da ética que seus professores fizeram questão de ensinar para eles?

Ele se senta na maca improvisada para Rock, observando o corpo frio de seu filho, o qual descansava ali.

Teria Willy razão? Ele quis brincar de Deus e não se deu conta disso?

Nunca foi sua intenção, mas... e se foi o que acabou fazendo, mesmo que não - intencionalmente?

- Sente-se bem, bom Dr.? - a voz de Rock lhe chamava a atenção.

- Não, digo, sim, ou melhor eu... - e olhava para o jovem robô diante dele, o qual mesmo deitado, movia seus lábios mecânicos - como... como você se reativou?!?!?

- Já faz tempo, Dr. Light... no principio fui criado para ser seu assistente, lembra? Ainda mantenho muito da minha programação original, a qual inclui te ajudar, lembra?

- Sim, lembro - e falava, não acreditando muito no que acabara de ouvir e com um certo temor na voz.

- O senhor passou o dia todo fora, segundo meus computadores. O que aconteceu durante o período em que estive desativado?

- Você pode acessar o banco de dados central e se atualizar, Megaman.

- Eu sei, mas gostaria de ouvir isso do senhor - e se sentava na maca, observando o velho cientista e seu olhar desconfiado.

- Nada de diferente, a cidade tem estado em paz desde então.

- E o senhor, como tem passado?

- Um pouco agitado, mas nada demais. Não precisa se preocupar.

- Não mesmo? Sinto algo diferente no senhor.

- Sente? Você... sente? - e olhava de lado para ele - Rock, você... você não pode sentir! - e se erguia, assustado mais com o tom de sua voz do que com o que Megaman acabara de dizer.

- Doutor? - ele se ergue da maca, não entendendo a súbita mudança de seu criador - o que está havendo? Tem certeza de que está bem? Tem algo errado acontecendo?

- Sim, Rock... tudo! Tudo isso está errado, tudo!

- O que está errado, Dr.? Não entendo o que o senhor diz. O Willy está preso, e com certeza aqueles outros reploids serão detidos, do que o senhor está...

- Você realmente não entende? - e erguia os olhos, retirando seus ôculos e encarando aquele emaranhado de circuitos que formavam os olhos de sua maior criação - Eu te criei com tanto amor e carinho, fiz constantes avanços em você, você realmente não entende o que eu estou querendo dizer? Eu não acredito, Rock. Simplesmente não acredito.

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Para as pessoas que habitavam naquela cidade, os últimos dias nunca foram tão assustadores.

Uma pessoa que estivesse de passagem perceberia isso no ato. Todos ali estavam assustados. Amedrontados era o termo mais correto. De uma hora para a outra, haviam perdido algo muito, mas muito importante.

Não sua liberdade, tampouco suas esperanças, longe disso, era algo muito, mas muito mais importante.

Prédio da Câmara Federal, o qual, em breve, seria palco de uma discussão muito importante não apenas para aquela cidade, mas para o resto do mundo, pois as decisões tomadas ali iriam, de um jeito ou de outro, refletir por todo o globo.

Muitos ainda estavam apreensivos de realizá-la ali, tendo em vista os últimos acontecimentos, outros insistiam em seguir em frente, mas todos ainda tinham um certo receio de que uma retaliação viesse a acontecer.

E, claro, haviam aqueles que inocentemente acreditavam que, com o fim próximo daquele que fora o maior inimigo da lei e da ordem, as coisas iriam se acalmar, apegando-se ao seu tolo mundo de ilusões.

E eram justamente essas tais pessoas que caminhavam por ali, admirando aquele lugar, a magnitude de sua estrutura, a beleza de sua arquitetura.

Os guardas - robôs de outrora haviam sido substituídos por guardas humanos e por sistemas de segurança mais eficazes, tudo fruto do medo que se espalhava pela atmosfera. O medo de uma nova revolta era tamanho que, em alguns pontos da cidade, alguns reploids indefesos eram atacados e destruídos, fruto de um novo ódio que nascia entre as pessoas.

Caminhando pela calçada, um dos senadores se aproximava do prédio, tendo em mente as decisões tomadas e suas conseqüências. Nunca imaginou que as coisas chegariam àquele patamar, muito menos em seu mandato. Pessoalmente falando não era simpatizante de muitas das idéias ali mostradas, mas as imagens que viu pela tv - as quais foram assistidas por milhões de pessoas em todas as partes do mundo - não podiam ser simplesmente ignoradas.

A Câmara Federal, lugar aonde tantas leis e projetos foram votados e debatidos, naquele dia estava prestes a tomar uma decisão que entraria para a história.

Ou não.

Em seu intimo, ele se perguntava o motivo de ter se surpreendido tanto com aquilo, afinal, tal coisa já era esperada. Em um rápido movimento ele se joga para o lado, escapando de um projétil luminoso que teria reduzido-o a nada. – claro que poderia estar exagerando, mas não gostaria de arriscar.

Com a roupa suja, ele arregala os olhos para contemplar tudo o que estava acontecendo diante de seus olhos. Parecia um pesadelo, mas do nada aqueles reploids haviam surgido e estavam atacando aquela rua. Carros eram arremessados contra prédios, postes eram retorcidos cortando a energia do local, loja eram atacadas... era um verdadeiro inferno.

Sim, finalmente aquele dia havia chegado. Imaginou que algo assim fosse acontecer, de um jeito ou de outro. Afinal, cresceu lendo histórias em quadrinhos e vendo filmes aonde as máquinas se revoltavam. Em seu intimo, sempre imaginou que tal coisa iria acabar acontecendo.

Só não esperava que fosse em seu mandato.

Tanto que ele pouco faz quando um dos reploids cinzas para bem diante dele e, apontando seu braço para ele, retrai o punho, o qual dá lugar a sua arma.

- Vá em frente – ele se erguia, encarando o reploid com os olhos cerrados – pode me matar. Mas grave uma coisa muito importante nesse seu banco de dados: um dia, alguém parecido comigo irá dar fim a todas vocês, máquinas – e retirava os óculos, empurrando-o – a todos vocês!!!

Mas, em seu intimo, estava morrendo de medo, ainda mais que reconhecia aquele reploid. Era igual a um daqueles que haviam derrubado um prédio – e matado centenas de pessoas – encima de Megaman.

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- Dr. Light, meus sensores indicam uma alteração em sua temperatura corporal e a produção de uma taxa de testosterona acima do comum. O senhor está muito cansado, precisa descansar.

- Não consigo descansar, não diante de todo o mal que fiz.

- Do que está falando, doutor? Que mal é esse do qual tanto fala?

- Você não entende, não é mesmo? Ah, meu filho... se você conseguisse imaginar toda a dor que eu causei desde que o criei...

- Me criou? – seus circuitos não conseguiam processar tal informação – Dr, o senhor está bem?

- Ah, Rock... tantos upgrades, e até agora você não é capaz de entender, não é mesmo?

- Eu gostaria, Dr. Light. Gostaria muito.

- Eu pensei que você fosse capaz de entender, ainda mais depois do que você disse quando derrotou Willy pela última vez.

- O que eu havia dito? – ele rapidamente acessa seu banco de dados, procurando o registro de suas ações. Procura o que estava armazenado, até que encontra – "Sou mais do que um rob"... é isso o que o preocupa?

- E não deveria?

- Dr... sou o seu melhor projeto, um robô criado para auxiliar a humanidade... sou mais do que um robô, pois o senhor me deu capacidades para analisar melhor as situações, aprender com elas e agir da melhor forma possível.

- Não, Rock... não foi isso o que quis dizer... na verdade foi sim, mas sua resposta me atentou para algo mais, para o que eu, no fim das contas, criei.

- Infelizmente o senhor não tem um computador embutido em seu cérebro, Dr. Light, logo não posso acessar toda a informação que o senhor quer transmitir de uma vez só. Seja o que o senhor quer dizer, terei que recebe-la aos poucos e ir processando-a lentamente.

- Como quiser – e se ajeitava aonde estava sentado – aprender... você age como se fosse humano, meu filho.

- O senhor me construiu assim.

- Eu sei, mas temo que tenha me empenhado demais. Lembro-me de que, antes de transforma-lo em um guerreiro, você agiu contra uma de suas programações básicas, lembra-se? Oh, perdão, como posso perguntar isso? Você não precisa se lembrar, basta apenas acessar seu banco de dados e obter tais informações, não é mesmo?

- Sim – ele respondia depois de alguns segundos inerte – Willy raptou a mim e a Roll. Eu dei a ele informações que se contradiziam, e graças a isso, consegui fugir.

- Ou seja, você mentiu.

- Dr., o senhor tem certeza de que não quer descansar? O senhor parece bastante alterado, parece...

- Frio? – ele erguia uma sobrancelha – acho que era você quem deveria ser assim, não concorda?

- Talvez por que o senhor tenha me dado um sistema lógico que me permita aprender, de modo que eu possa mimetizar as emoções dos seres ao meu redor, aprendendo com eles e agindo da melhor forma possível para interagir com eles – O reploid guerreiro Megaman, vulgo Rock, respondia sem a menos emoção, assim que seus circuitos começam a processar o estado emocional do Dr. Light – não concorda?

- Sim... e não fiz tal coisa com nenhum dos meus demais Reploids... Seu irmão não é tão sociável quanto você, Rush tem parte disso, mas tem suas limitações,mas você... – ele se ergue, caminhando pela sala – eu te criei com tanto amor e carinho, Rock... me dediquei a você de todas as formas, eu literalmente coloquei a minha alma dentro de você.

- Eu não tenho alma, bom Dr. – respondia secamente – sou apenas um monte de porcas e parafusos.

- Ironia. Isso é muito bom. Um robô agindo ironicamente... você é muito especial, meu filho.

- Se te incomoda tanto que eu aja como um ser humano, Dr... eu posso ser um mero robô desprovido de emoções que apenas executa a função para a qual fora designado, se assim deseja.

- Abdicar de algo em prol de outra pessoa. Outra característica humana. Mais uma prova de minha arrogância em tentar imitar Deus.

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Um assobio, essa era sua única lembrança. Um assobio saído de lugar algum, o que o fez abrir os olhos e comprovar que a morte ainda não havia chegado.

Às vezes, o milagre vem de onde menos esperamos. Para aquele homem, o milagre era vermelho, usava um cachecol e era frio.

Parado diante dele, um reploid o protegia com um escudo, o qual usara para bloquear o ataque do outro reploid. O homem em questão reconhecia tal ser, mas devido a situação, estava levemente surpreso, na verdade, ainda estava um pouco assustado.

- Você, saia daqui. Eu irei detê-los. – e apontava seu canhão de plasma para um dos robôs que havia erguido um carro para atirar contra uma loja. Um poderoso raio de plasma é emitido, atingido o reploid, fazendo-o perder momentaneamente o controle e deixando o carro cair encima de si mesmo – rápido!

- E eu ainda quis defender vocês – ele se erguia, fitando seu salvador – nunca fui a favor da total desativação de vocês, mas veja só... no fim, vocês acabaram se revoltando – e dava passos para trás – e você, o que fará?

- Eu apenas protejo as pessoas – respondia friamente – apenas isso. Essa é a minha função, e nada mais importa além disso.

- E até quando fará isso? Por acaso pretende seguir tal programação quando seus criadores começaram a desmontar seus "semelhantes"?

- Eu não tenho semelhantes – ele retraia seu canhão de plasma, dando lugar a uma mão e colocava seu escudo nas costas – a única coisa similar a mim é um modelo da mesma série, e nada mais. Qualquer outro robô que se revolte contra os humanos está fugindo de sua programação e precisa ser detido – e saltava, atirando-se contra as outras máquinas.

O homem continuava parado por alguns segundos, até que começa a correr. Sabia que aquele campo de batalha não podia ser lutado por ele, e sim por pessoas mais capacitadas.

Mas, ainda assim, lamentava. Embora frias, as palavras daquele Reploid eram verdadeiras. Aqueles reploids que estavam atacando ou eram defeituosos, ou haviam sido programados propositalmente para tal ação.

O que lhe levava a seguinte questão: que mente doentia teria feito tal coisa?

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- Eu queria o bem da humanidade, sabe. Desde o principio, eu e Willy sempre quisemos tal coisa. Qual a diferença?

- O senhor tinha um ideal, Willy tinha seus desejos mesquinhos, suas ganância.

- Também... mas nós sempre compartilhamos de algo em comum: nossas ambições.

- Uma ambição doentia, você quer dizer.

- Por que usou essa palavra?

- Por que eu a aprendi com o senhor, Dr.

- Capacidade de aprender. Como uma criança. Você ainda não percebeu?

- Eu gostaria.

- Desejo. Interesse. Novamente, minha responsabilidade.

- Por que não vai direto ao ponto, Dr.?

- Impaciente, meu filho? Toda impaciência carrega um principio de raiva... realmente eu sou um gênio, não concorda?

- O senhor não precisa provar isso para ninguém.

- Sim, eu preciso. Preciso provar para mim mesmo a grandiosidade de minha obra, ou seja, você.

- Posso sentir o aumento da temperatura de seu corpo... meus sensores podem captar as reações químicas que ocorrem dentro do senhor e outras características suas... no entanto, algumas coisas eu não tenho como entender, como por exemplo, o fato do senhor estar tentando me transmitir alguma informação, mas não o fazê-la de maneira simples e direta, como se quisesse dificultar as coisas, ou então o senhor quer que eu capte as informações que me passa aos poucos com o intuito de me guiar até a resposta.

- Eu não teria dito melhor – ele bate palmas para Rock, sorrindo – brilhante dedução. Isso é a prova suprema de que você consegue fazer algo além do que minhas outras criações, as quais tomam decisões baseados em conhecimentos anteriores: você raciocina! Mais do que usar apenas o passado como base, você analisa a ocasião, o momento, e age conforme a "música", meu filho. Não se prende única e exclusivamente aos seus circuitos lógicos, apesar deles serem tão desenvolvidos que são capazes de imitar a mente humana. Meus parabéns. Atingi meu projeto definitivo há anos, e só agora me dei conta disso. Quis torná-lo em uma suprema maquina de batalha com todo o meu conhecimento, mas no fim acabei transcendendo tudo o que havia construído antes. Que coisa melhor para defender os seres humanos do que um ser humano? – e se sentava na mesma maca aonde Megaman estava, até que começa a ter um ataque de risos o qual se estende por longos minutos.

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Era um guerreiro e nada mais do que isso. Defender os seres humanos e destruir seus algozes era sua função, e nada mais.

Ocasionalmente prestava auxilio a um modelo de sua mesma série, o qual chamava de irmão, puro fruto de um vicio adquirido dos humanos, mas procurava nunca desvirtuar-se de sua missão primordial.

Por que era isso que ele era. Frio e impessoal, sabia o que tinha que fazer. Pouco lhe importava se teria que enfrentar seus próprios "semelhantes", se eles não fossem capazes de se adequar as leis de seus criadores, deveriam ser reconfigurados.

Exterminados, se necessário, como aqueles reploids. Ele pouco faz diante da cabeça do reploid que rola para seus pés, apenas pisa nela, neutralizando os demais circuitos da criatura.

Logo os demais se viram para ele, fitando-o. Era algo estranho para seus circuitos pouco avançados. Estavam ali única e exclusivamente para destruir aquele prédio legislativo e exterminar qualquer forma de vida humana presente, e não lutar contra outro reploid.

Já ele não se prende a tais pormenores, apenas salta e, aproveitando o impulso, atinge um poderoso soco na face de outro dos robôs, arremessando-o contra uma das paredes de tal forma, que seus sensores são danificados, impedindo-o de agir. Ele não perde tempo, faz surgir seu canhão de plasma e, com um único e preciso disparo, atinge o ser metálico de tal forma que ele explode.

Como se sua programação inicial tivesse sido reativada – se auto preservarem - os demais robôs avançam contra ele, procurando detê-lo. Destruí-lo seria o melhor termo, mas tal coisa estava longe de ser conseguida.

Pois ele era mais do que um mero robô, era um guerreiro construído para proteger os seres humanos. Na verdade, um robô - social, cujo projeto fora deturpado pelo Dr. Willy para seus princípios de conquista e guerra. No entanto, as leis mais primarias que foram gravadas em seus circuitos ainda permaneceram, o que permitiu que ele escapasse do antro de Willy e, ao seu modo, auxiliasse a humanidade.

Não se prendia a meras emoções humanas, como o modelo que chama de irmão. Elas o atrapalhariam. Agia como precisava, do jeito que precisava. Obedecia cegamente as leis da robótica, mas acima de tudo, executava sua missão.

Este era Protoman, o reploid – guerreiro.

Como uma máquina de batalha – e era isso que ele era – ele avançava insensantemente. Pouco lhe importava o que estaria sendo decidido ali, não era nenhuma máquina estúpida, sabia muito bem dos planos dos humanos, do que pretendiam fazer com todos eles.

Isso realmente não importava – ele continuava lutando, abrindo uma trilha de metal retorcido e circuitos queimados com os corpos dos reploids revoltados – e sim sua missão, seu objetivo.

Protoman, um robô – social, feito para ajudar a humanidade. Mesmo desvirtuado por Willy, ele ainda seguia seu projeto inicial, ao seu modo.

Este era Protoman.

E essa é a sua história.

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- Quando o grande Isaac criou as leis da robótica, ele as criou com um grande principio, sabe. Ele tinha em mente a preservação da espécie humana. Afinal, por mais avançados que as máquinas fossem, elas não eram dotadas de princípios morais para controlar seus atos. No entanto, em minha cegueira, não respeitei nenhuma e segui adiante, tudo isso em prol do bem do mundo. Willy também o fez, mas nunca negou tal coisa. De certa forma, ambos desejávamos atingir o máximo de nossas capacidades, nos desenvolver ao extremo de nossas capacidades. Ele criou sua obra prima e eu, você. Você é praticamente humano, ou melhor, é melhor do que um mero humano – e olhava de lado para seu filho – mas eu me pergunto... o que foi que eu criei? Quantos princípios morais eu joguei para o lado, em prol do desenvolvimento tecnológico?

- Dr, o senhor não tem culpa daquelas mortes! Foi Willy quem...

- Não, Rock... longe de ser Willy... mas suas criações. No fim Willy criou sua obra prima, mas... e quanto a mim? Ele atingiu a perfeição ao criar algo que se julga acima de todas as coisas, a ponto de desprezar por completo a vida humana.

- Eu não sou assim, Dr.! O senhor Não me programou assim!

- Mas poderia, e é essa a questão. Ou melhor, você poderia fazer tal coisa. Uma inteligência artificial tão avançada, que a mesma é capaz de questionar as atitudes de seus criadores, simples. Não há o que dizer, é a mais pura verdade. Um robô que mata seres humanos é muito mais do que uma máquina descontrolada e sim uma ameaça à liberdade, ao direito de existir de cada criatura.

- AS máquinas jamais irão destruir os seres humanos, Dr! Eu não vou deixar!

- Preocupação. Nobreza. Mas até quando, Rock? Há coisas que não podem ser destruídas por um simples disparo de plasma: "dio, ira, intolerância... eu sempre imaginei que a mítica guerra "homem x máquinas" que vários dos meus professores contavam viria a ocorrer em um tempo futuro ou, na pior das hipóteses, que Willy seria o responsável por ela.

- Mas qual é o problema? Até hoje sua tecnologia nunca fora usada de maneira impensada, por que a preocupação?

- Há coisas que estão além do meu próprio controle – e ria bem baixo – sempre haverá algo assim. É o principio das coisas, compreende? Os homens sempre tiveram o habito de querer desbravar os seus limites e, após fazer isso, tomarem medidas para evitar que seus erros se repetissem.

- A reunião na câmara legislativa.

- Exato. No fim das contas, acabamos nos dando conta do quão longe havíamos ido – ele olhava para seu filho de maneira terna e piedosa – acabamos de perceber do nossa criação realmente é capaz e, como um criador que não aceita imperfeições, tomamos uma medida radical para proteger nosso modo de vida.

- Tão ruim assim? – o reploid abaixa sua cabeça, fechando suas pupilas digitais.

- Pior. Desde os primórdios do desenvolvimento tecnológico, desde os primeiros protótipos de robôs e inteligência artificial, o homem teme que sua criatura se revolte contra ele.

- Sabe – Megaman se ergue da maca, caminhando até um dos computadores – certa vez fiquei "curioso" a respeito da forma como os seres humanos agiam em relação as demais criaturas deste planeta, e acessei o banco de dados da biblioteca pública. Encontrei o relato de um cavalo que atropelou uma mulher e... bem, ele foi sacrificado.

- Confuso, não é mesmo?

- Não fazia sentido, doutor – ele se virava – o cavalo não agiu com más intenções, e tirar-lhe a vida não reverteria o erro, então, por que?

- É parte da condição humana. Mesmo que não faça sentido, foi feito. Você poderia classificar tal coisa como vingança, alguns chamariam de corrigir erros e evitar problemas futuros, mas... até hoje nem nós mesmos conseguimos nos entender por completo.

- Mas... isso não tem lógica, pai!

- Eu sei... que bom, você não tem as respostas para tudo, meu filho.

- Isso não é algo bom.

- Pelo contrário – ele sorria – é algo muito bom. Quando você disse que era mais do que um robô, temi que você se voltasse contra a humanidade que protegia com tanto afinco, por se julgar acima dela, mas... vejo que me enganei. Você realmente é mais do que um robô, Rock. – ele se erguia e, dando alguns passos, dá um abraço no corpo frio e sem vida do reploid – você um humano.

- Eu... – ele não fazia nada, pois não sabia como reagir – mas... – pois fora a primeira vez que recebera tal tratamento. Sempre considerou Light como algo mais do que seu criador, mas nunca tinha compreendido por completo o sentido da palavra "pai", apesar de tê-la usado diversas vezes – Dr, eu... – e o que era aquilo que passava pelo seu corpo? Era diferente, mas muito diferente de tudo o que havia experimentado antes.

Na verdade, só agora ele se tocou o quão familiar era tal coisa. Certa vez acessou os arquivos de seu projeto para tentar entender o que foi que o grande Light fez para que ele fosse o que era, mas tais projetos não continham todos os detalhes, tampouco o elemento principal: o que fazia com que ele tivesse tanta compaixão pelos seres humanos. Longe de apenas um sentimento de dever com eles, mas um amor ferrenho que o faz protege-los. Mais do que uma mera programação, era algo que ele literalmente SENTIA.

Ele não era humano, disso ele sempre soube. Mas, só depois de muito tempo, ele compreendeu o que seu criador tanto queria. Mais do que um mero reploid, mas sim um ser vivo que se importava com as pessoas, que se dedicava e dava o seu melhor em prol delas.

Um filho.

E, para tanto, doutor Thomas Xavier Light deu a sua maior criação o seu maior presente: sua alma.

Esse era Rock, vulgo Megaman. Um corpo titânico provido de habilidades sobre-humanas mas, de uma forma que ninguém saberia explicar, provido de uma alma humana.

- Eu... – ele não sabia o que fazer, tampouco como reagir. Como se chamava aquele sentimento que os seres vivos demonstravam em relação aos outros? Raiva? Ira? Ansiedade? Ingratidão?

Amor.

Como devolver? Podia sentir com seus sensores o calor do corpo de seu criador, o qual o abraçava fortemente, como se não quisesse larga-lo mas, de alguma forma, sentia que ele estava lhe passando algo mais.

Mais do que isso, pela força do abraço e pelos olhos de seu criador, podia entender seu estado emocional. Muito mais do que uma análise química, podia realmente SENTIR o sofrimento dele, seu desespero, sua tristeza. Como um pai que iria perder o filho e nada poderia fazer.

Tudo ficava claro. Light se dedicou a ele, criando o ser mais próximo do ser humano mas, devido ao medo dos mesmos por causa de eventos recentes e outros que provavelmente estavam para acontecer, ele perderia seu maior projeto.

Perderia seu filho. Se tivesse pupilas, Rock choraria. Como não tinha, ele fazia apenas o que podia: abraçava seu pai. Não sentia ódio dos humanos, mas conseguia SENTIR uma enorme PENA pelo seu criador, pelo sofrimento que ele estava passando.

Ficaram assim por longos minutos, com Light abraçando-o. Ele era seu filho, sua vida. E, apesar de suas imperfeições como cientista, dedicou-se por completo a Rock, como um pai que sempre quer o bem de seu maior tesouro.

E agora estava prestes a perdê-lo. Megaman tentava processar aquelas informações, mas seus computadores só conseguiam resultados lógicos, e definitivamente não havia nada de lógico no que sentia, pelo contrário. Sempre que era avariado, podia contar com o bom dr. para consertá-lo, mas nunca se deu conta do quão preocupado seu criador ficava e,diante dos últimos acontecimentos, só agora ele compreendia todo o desespero dele, o real motivo de Light ter chorado quando ele foi ficou gravemente avariado no ultimo combate.

Poderiam ficar daquele jeito durante horas, se o monitor do computador atrás de ambos não se ativasse automaticamente. Não deram muita atenção, mas quando a palavra "ESTADO DE ALERTA" fora pronunciada, ambos se viraram para ver aquilo.

- Perigo? – Rock começava a captar as informações transmitidas – mas... droga! Eles novamente!

- Céus – ele mal podia acreditar na destruição que as cameras mostravam e, mais do que isso, no reploid vermelho que estava sendo focalizado.

- Protoman? – Rock observava incrédulo. Não acreditava que seu "irmão" era responsável por tal coisa, por tamanha destruição.

Light, por outro lado, arregala os olhos ao ver, em um outro ponto enfocado pela câmera, uma silhueta há alguns metros de Protoman. Devido ao estado da câmera e da falha das transmissões não conseguia identifica-lo, mas não parecia a de nenhum ser que ele já tenha visto.

E, observando bem, Protoman parecia gravemente ferido, na verdade... estava sem um dos braços e com um corte bem profundo no peito, de modo que vários circuitos seus poderiam ser vistos.

Algo que Rock não demorou muito para perceber.

- Droga, dr.! Temos que ajuda-lo!!!

- Céus... – Light cobria a face, não acreditando naquilo – será que é...

- O que, dr.? – Megaman não conseguia acreditar, ainda mais ao ver seu irmão avançar com tudo contra a silhueta negra. A câmera sofre uma leve interferência quando ele se aproxima e, no momento seguinte, todos podiam ver o corpo de Protoman, ainda de pé, um pouco longe do estranho ser.

- Sim, é ele.

- Quem, dr? – quase gritava Megaman, sem se dar conta de que havia aumentado e muito seu tom de voz.

- É ele – e maneava a cabeça.

- Ele, quem? – Rock quase sofre um curto ao ver, durante um rápido instante, o improvável acontecer.

Nem Light acreditava, mas... aconteceu. Um corte profundo surgiu no pescoço do reploid rubro, de forma que sua cabeça se separa por completo do corpo, rolando pelo chão. Não obstante, o corpo cai de joelhos, emitindo algumas faíscas até que, em uma curta seqüência, explode. Light observa a tudo deforma impassível, enquanto o fogo consome lentamente o corpo de sua primeira criação.

A câmera, focando tudo, apenas capta a cabeça de Protoman rolando em sua direção, totalmente desativada.

- PROTO!!! – Megaman não conseguia processar a informação. Não acreditava que seu irmão, o qual o salvou de tantas enrascadas, tinha sido... sido... destruído.

- Sim, é ele. Era justamente quem eu temia, Megaman: a obra prima de Willy – e, em um último momento antes de perder a transmissão de vez, a câmera focaliza algo na mão direita do reploid, algo que havia passado despercebido por ela antes. Parecia um feixe de luz emanando dela, mas o brilho era tão poderoso, que um bom observador poderia perceber que ele tinha sido capaz de se materializar na forma de uma arma capaz de partir ao meio o poderoso guerreiro rubro.

Megaman já estava do lado de fora do laboratório enquanto Light se prendia a esse ultimo detalhe, aquela espada de energia.

Não, não era uma espada comum, era bem mais do que isso.

Era um sabre.

Um sabre laser.

Continua...

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