CAPÍTULO QUATRO
Metamorfomaga
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Era um dia particularmente quente de agosto e Lily estava dando graças aos céus por estar bem fresquinho dentro do supermercado. Mas já sofria por antecipação ao pensar nas 3 quadras que teria que caminhar sob aquele sol de rachar até chegar em sua casa.
Tinha-se oferecido para fazer compras para a mãe por já não agüentar mais nem um segundo sob o mesmo teto que Petúnia e aquele leão-marinho, namorado dela. Tudo bem que beleza não é essencial para se ter um relacionamento amoroso, mas Walter Dursley, além de gordo e bigodudo, era particularmente insuportável! Se bem que os dois faziam um belo par... Ela, magricela e fofoqueira, ele, gordo e chato, ambos insuportáveis. Sim, eles tinham futuro!
E agora, lá estava ela, segurando aquela cesta pesada, aguardando em uma fila imensa para o caixa. Será que não tinha nenhum cavalheiro por perto para ajudá-la com a cesta, pelo menos?
Cavalheiro... isso fez com que Lily sorrisse ao se lembrar de Remo Lupin, seu melhor amigo em Hogwarts. Ele era a gentileza em traços agradáveis e gestos suaves. Sabia dizer as coisas certas quando necessário, ou simplesmente criar um clima agradável mesmo estando em silêncio. Ah, como ela tinha saudades de suas conversas, ou dos momentos em que dividiam a mesma mesa de estudo, apreciando a presença um do outro, mesmo sem se falarem. Era tão bom tê-lo por perto!
No entanto, provavelmente Remo estava em Londres nesse momento, mais especificamente no Beco Diagonal, comprando os materiais escolares com seus amigos. E não havia naquele supermercado nenhum ser disposto a ajudá-la com a cesta.
Resignada, a garota pousou a cesta no chão para descansar o braço, onde permaneciam as marcas de suas alças. Remo vinha escrevendo para ela todas as semanas desde que deixaram Hogwarts. Ele dissera que iria ao Beco Diagonal naquela manhã e pedira, se possível, para que eles se encontrassem por lá e tomassem um sorvete juntos, porém Lily tinha recusado o convite com toda a educação. É claro que ela adoraria ver Remo, conversar pessoalmente com ele a respeito dos progressos que vinha tendo com seu dom e os sonhos estranhos, entretanto não queria ter o desprazer de encontrar-se com os amigos inseparáveis do garoto - sim, pois certamente eles estariam juntos, os quatro marotos.
Suas férias já estavam sendo um fiasco sem mais essa para piorar ainda mais a situação. Lily esperava que Marlene e Alice, suas melhores amigas e colegas de classe, fossem visitá-la, ou então que combinassem de se encontrar, no entanto elas mal escreviam duas linhas em pergaminhos cada vez mais raros. É claro que elas estavam ocupadas com os namoradinhos delas. Humpt!
A fila do caixa andou um pouco e Lily empurrou a cesta com os pés, para não ter que levantá-la novamente. Ao posicionar-se mais à frente, alguma coisa chamou sua atenção, fazendo com que ela esticasse o pescoço e encontrasse um par de olhos azul-piscina encarando-a. Um rapaz alto de aparentemente 18 ou 19 anos, cabelos amarelos e lábios finos parecia dividir sua atenção entre empacotar as compras dos clientes e observá-la. Pego desprevenido, o rapaz desviou os olhos rapidamente, porém voltou logo a encará-la, com um bonito sorriso nos lábios rosados e finos. Oh, sim, o rapaz era muito bonito! E dessa vez foi Lily quem desviou os olhos, desconcertada pela intensidade daquele olhar. Porém sorriu e começou a observá-lo de esguelha.
Talvez ela pudesse brincar um pouco com suas habilidade, só para treinar, é claro... Com esse propósito em mente, Lily aguçou seus sentidos, concentrando sua atenção - não para as revistas que observava no caixa cada vez mais próximo, mas para o rapaz de bonitos olhos azuis. Não precisava mais olhá-lo para saber de seus movimentos. Podia senti-los, quase adivinhando cada reação dele.
O garoto observava-a a todo instante, procurando-a entre o mar de pessoas que se espremiam nas filas, tendo sua vista dificultada tanto pela multidão quanto pela baixa estatura da ruiva. Lily sorriu. Faltava pouco agora para sua vez e o rapaz não parava de olhá-la. Talvez, se ela tentasse ir um pouco além disso, se ela conseguisse mais um contato visual, talvez alcançasse a linha de pensamentos dele...
Ela já tinha praticado isso algumas vezes com seus familiares. Não fora uma experiência de todo ruim, até que - em um momento de completo tédio - ela se aventurou a invadir os pensamentos de Dursley. Até que ela se divertiu bastante ao saber o quanto incomodava o namorado da irmã, mas não era uma experiência que ela ansiava por repetir. Ele tinha a pior impressão possível a respeito de sua "condição especial". Provavelmente Petúnia tinha enchido sua cabeça com histórias terríveis depois que ele acidentalmente presenciou uma das conversas de Lily com seus pais, a respeito de Hogwarts, mas Lily suspeitava que a maioria daquele preconceito não precisou do empurrãozinho de sua irmã para criar raízes na mente daquele pançudo. Era incrível o fato como ele se recusava a dizer palavras simples como "magia" ou "bruxa" até mesmo em seus pensamentos!
Lily obrigou-se a voltar a mente para o presente novamente, já faltando somente uma pessoa para que chegasse sua vez no caixa. Deixou seus belíssimos olhos verde-esmeralda encontrarem-se quase casualmente com aquelas piscinas límpidas de um azul-celeste. "Que olhos maravilhosos!" ela escutou o pensamento invadir sua mente, como se sussurrado em seus ouvidos por uma voz suave e masculina. Então sentiu as bochechas corarem, novamente desviando o olhar para a própria cesta e começando a colocar suas compras na esteira do caixa, sem impedir os comentários de circularem livremente em sua mente.
"Nunca vi uma garota tão linda! Que cabelo lindo! Aposto como é cheiroso também..."
Lily mordeu o lábio inferior impedindo-se de sorrir estupidamente. Estava achando o garoto cada vez mais interessante!
"Será que eu arrisco um elogio? Será que ela olharia para mim novamente? Ahh, aqueles olhos! Que perfeição! Vamos, olhe para mim mais uma vez, bonequinha!"
Lily já não sabia como conter o rubor de suas faces. Será que arriscaria olhar para ele mais uma vez? Seria capaz de fazê-lo novamente? Sem querer - ou talvez querendo muito - ela deixou que seu olhar passasse casualmente pelas pessoas que transitavam no lado de fora e então encontrar-se com as íris do rapaz, que aproveitou a oportunidade para sorrir encantadoramente mais uma vez.
"Isso! Que coisa divina!"
Lily teve consciência de que retribuiu o sorriso antes de voltar sua atenção para a atendente do caixa, que perguntou a forma de pagamento.
"Essas sardinhas são mais charmosas vistas de perto! Eu tinha razão, o cabelo é mesmo muito cheiroso! E esse jeitinho doce é encantador! E se eu tocasse nela?"
- Oh, me desculpe - disse o garoto e Lily só percebeu que ele tinha realmente dito isso por causa do leve esbarrão de suas mãos, que fez com que ela o encarasse por um breve segundo.
- Não foi nada - respondeu sem jeito, colocando uma mecha de cabelos para trás da orelha.
Ainda conseguia perceber cada movimento do rapaz, cada olhar furtivo, mesmo sem encará-lo. Observou - com a atenção dividida - sua compra ser registrada e separada em sacolas pequenas pelo rapaz. Lamentou-se por ter comprado tão poucos itens, pois em um piscar de olhos já estava tudo somado e ensacado e a moça informou-lhe a quantia. Lily se viu um pouco perdida.
Oh, é claro, tinha que pagar, não é mesmo? Meio atrapalhada por ter-se distraído, Lily deu as costas ao garoto e abriu a bolsinha que carregava no cós da saia e retirou o dinheiro para pagar. No entanto, enquanto aguardava o troco, sentiu alguma coisa muito estranha e... desconcertante! Voltou a atenção novamente para o garoto, sem contudo se virar, e finalmente percebeu aonde os olhos do rapaz estavam fixados! Sentiu-se ficar roxa de vergonha.
"Hummm que delícia! Tenho que ganhar essa garota! Essa ruivinha é mesmo muito gost..."
Antes que a sentença se completasse, entretanto, a vergonha tinha dado lugar à raiva e ela expulsou aquela voz intrometida e descarada de sua mente. Então era como se a razão tivesse voltado à ela depois de uma longa viagem. Ora, onde ela estava com a cabeça ao dar atenção a um garoto! Só faltava essa agora! Onde já se viu?
Teve consciência de que pareceu um pouco rude ao tomar o troco da mão da moça do caixa sem sequer dar ouvidos às frases de agradecimento que ela recitava - conforme as normas do supermercado - e ainda mais rude na hora de tomar os pacotes da mão do rapaz, que ficou até mesmo um pouco assustado diante da mudança brusca na atitude da garota.
Saiu para a rua bufando e pisando duro.
- Garotos! - disse para si mesma. - São todos iguais, Lílian Evans! Todos iguais!
Lily não conseguia acreditar na própria estupidez. Tinha realmente dado bola para aquele rapaz só por causa de um par de olhos claros e um sorriso bonito?
- Ah, mas isso não vai se repetir jamais! Nesse buraco eu não caio duas vezes, não mesmo!
Então ela continuou o caminho até sua casa, decidida. O nome Tiago Potter oportunamente lhe veio à memória depois desse incidente, o que só fez com que ela reafirmasse que nenhum garoto no mundo prestava! Exceto, é claro, Remo Lupin. E seu pai, é claro, mas ele era um homem, não um garoto... Seu priminho de 5 anos também era bem engraçadinho, mas ele ainda era uma criança...
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Depois de rodopiar por diversas lareiras, Remo finalmente sentiu o movimento cessar e teve que se agarrar em algum lugar para não cair. Realmente, Sirius e Tiago tinham toda razão em reclamar das viagens via Pó de Flu. Arrumou os finos cabelos castanhos - que atingiam os ombros - atrás das orelhas e ergueu a cabeça com calma para não piorar a tontura que sentia.
Remo Lupin era um garoto reservado, do tipo que não chama muita atenção para si. Suas feições eram suaves e agradáveis e as roupas um pouco gastas indicavam sua condição simples, apesar de ele ser bastante determinado.
O garoto respirou fundo, consciente da fadiga de cada músculo do seu corpo. Ele devia estar repousando durante todo esse dia - de acordo com o que sua mãe tão sabiamente instruíra, relutante em deixá-lo sair de casa logo na primeira manhã de lua Minguante. Ele tinha passado a noite em forma de uma fera sedenta de sangue e agora sentia certa dificuldade para sustentar seu próprio corpo maltratado.
Ao contrário do que dissera a seus amigos, essa última transformação fora bastante violenta. Ele quase não se lembrava do que acontecera, pois os instintos da besta tinham praticamente extinguido sua consciência, tal a sua fúria e dor. Sim, dor. A solidão doía ao lobisomem.
- Oh, aí está você, Remo, querido - o garoto piscou seus olhos castanhos para focalizar a Sra. Potter, que amparou-o e rapidamente removeu a fuligem e os chamuscados de suas vestes e da pouca pele que as vestes de bruxo não cobriam. - Você está bem, querido? Parece um pouco enjoado...
- Estou bem, obrigado, Sra. Potter.
- Ótimo - ela ofereceu-lhe um sorriso bondoso.
Estavam na espaçosa sala de estar da Mansão Potter. Já fazia mais de um ano que Remo não entrava naquele lar aconchegante e ele passou os olhos pela mobília com um pequeno sorriso nostálgico nos lábios. Pedro já tinha se sentado no sofá e dava pequenos pulos, como se para comprovar o quão macio ele era. Ele era o mais baixo dos quatro, gordinho, de cabelos loiros curtos cortados em formato de cuia. Seus olhos eram azuis e lacrimosos, e o nariz era fino e pontudo, dando-lhe um certo ar ratinheiro.
Sentado elegantemente no sofá ao lado, Howard Potter observava a diversão do maroto mais gordinho com um sorriso contemplativo nos lábios. O Sr. Potter tinha os cabelos completamente grisalhos, apesar de suas feições serem bastante joviais, sem nenhuma ruga acentuada. Era alto e magro, mas sua postura irradiava disposição.
Sirius e Tiago... bem, onde estavam Sirius e Tiago?
- Hey, vocês dois! Voltem já aqui! - ralhou a Sra. Potter com as mãos na cintura, parecendo ter sido assaltada pela mesma dúvida que Remo. - Eu ainda não terminei com vocês!
- Ah, mãe - choramingou Tiago, voltando a descer as escadas, emburrado.
Sirius desceu logo atrás, com as mãos no bolso, jogando o cabelo para trás em uma atitude descolada.
- Nem "A", nem "B", rapazinho! Eu e seu pai estamos muito decepcionados com o que você fez, não é mesmo, Howard? Howard?
- Como? - o Sr. Potter piscou, perecendo finalmente acordar de seu torpor.
A Sra. Potter bufou e repetiu contrariada:
- Eu estava dizendo para seu filho que o que ele fez nos deixou muito desapontados!
- Ora, querida, todo mundo sabe que aquela loja já está falida, e...
- Howard! - interrompeu a Sra. Potter, com um quê de desespero. - Ele explodiu a loja!
- Hey, eu não fiz isso sozinho! - defendeu-se Tiago, indignado.
Sirius arqueou uma sobrancelha, cuidando para permanecer impassível.
- Está vendo, Howard! - a Sra. Potter apontou um dedo ameaçador para o filho. - Ele admite que fez essa barbaridade! E você ainda passa a mão na cabeça dele?
- Mas, querida... foi só uma brincadeirinha saudável...
- Saudável? - agora ela estava realmente histérica. - Você acha que explodir uma loja lotada em pleno Beco Diagonal é uma brincadeirinha saudável? Você está querendo que seu filho se torne um vândalo?
- Que exagero, meu bem - respondeu o homem placidamente. - Ninguém se machucou...
- Oh, graças aos céus que ninguém se machucou! Eu nem quero imaginar o que aconteceria caso isso tivesse acontecido...
- É bom ter o papai em casa, não é mesmo? - Remo ouviu Tiago cochichar para Sirius, que acenou positivamente, piscando um olho enquanto os donos da casa continuavam discutindo.
- Eles não vão fazer mais isso, querida, não se preocupe - garantiu o Sr. Potter voltando-se agora para o filho, fazendo uma cara cômica que indicava "problemas" ao empurrar os discretos óculos encaixando-os melhor no rosto. - Não é meu filho?
Tiago adquiriu uma postura de anjo, unindo as mãos atrás de si e encarando-os por cima dos óculos redondos.
- Sim, papai - ele reforçou com acenos de cabeça.
- Oh, eu desisto!
A Sra. Potter bufou e saiu em direção à cozinha, dando-se por vencida.
- Papai? - Tiago saltitou até o pai apoiando-se no braço do sofá e inclinando-se para frente de um modo infantil. - Será que nós podemos brincar na piscina hoje?
- Bem, deixe-me pensar... - o Sr. Potter fez cara de concentração. - Talvez você não mereça, mas... eu vou deixar só porque você tem visitas, ok?
Ele piscou um olho para o filho, que pulou, exultante.
- Yeah! Valeu pai! Vamos, marotos! Trajes de banho!
E correu feito um furacão escada acima, sendo seguido pelos outros - que caminharam educadamente até o topo da escada e então, longe da vista do dono da casa, apostaram corrida até o quarto de Tiago. Remo não resistiu à brincadeira. Seus amigos tinham essa influência sobre ele. Faziam-no se esquecer de qualquer dor e segui-los nas brincadeiras mais infantis possíveis.
Ao chegarem no quarto - Pedro por último, respirando com dificuldade - encontraram Tiago revirando seu guarda-roupa, atirando algumas bermudas em cima da cama.
- Uma... duas... - ele ia contando conforme encontrava-as no que Remo só poderia definir como um embolado de roupas. - Três e... quatro!
- O que exatamente é isso? - perguntou Sirius com cara de nojo apontando a última peça, uma bermuda frouxa, gasta e florida. - Pelas espinhas do Rabicho, Pontas, não acredito que você tenha uma fantasia dessas!
- Hey, eu não tenho espinhas! - retrucou Pedro, indignado.
- Nem eu tenho uma fantasia dessas! - respondeu Tiago risonho. - Essas duas bermudas são minhas - ele apontou para uma preta sedosa e outra azul, de aparência mais pesada e um pouco mais comprida. - Essa aqui é do meu pai - ele apontou para uma terceira, de um marrom desbotado e aparência mofada. - E essa aqui - enfim, com os sobrancelhas arqueadas diabolicamente ele apontou para a maior, com imensas flores vermelhas e amarelas. - É da minha mãe!
Tiago deu uma gargalhada estrondosa, esperando ser acompanhado por Sirius, porém o maroto mais alto tinha uma expressão ainda mais travessa no rosto, e agilmente apossou-se da melhor bermuda - a preta.
- Essa é minha! - e sem se demorar sequer um segundo a mais, saiu correndo em direção ao banheiro.
- Hey, hey, hey, Almofadinhas! Volte aqui! - gritou Tiago correndo atrás dele o mais depressa que pôde. - Essa é minha! Me dááá!
PAM! A porta do banheiro bateu a centímetros de seu nariz.
- Seu cachorro, filho da mãe! - Tiago socou a porta, mas então alguma coisa muito mais urgente passou por sua mente.
Ele disparou até a cama novamente, arrancando a bermuda azul da mão de Pedro, que colocava-a em frente aos quadris medindo-as. Remo limitou-se a arquear uma sobrancelha, observando Tiago berrar como um garotinho mimado.
- Não cabe em você, seu gordo! - disse, zangado. - Vou me trocar no quarto da mamãe. Esse cachorro me paga, ah se me paga! - e saiu bufando.
Remo olhou para a bermuda marrom, depois para a florida e então para o quadril de Pedro.
- Oh, sinto muito, Rabicho... - disse, pesaroso. - Eu não me importaria em usar a florida se coubesse em mim - ele não convencia nem a si mesmo com essas palavras, mas Pedro parecia não ter notado isso, portanto continuou: - E, você sabe, não posso usar a varinha para encolhê-la...
- Tudo bem - Pedro deu de ombros pegando a "fantasia" e alargando o elástico experimentalmente.
Remo tinha a impressão de que a peça ainda ficaria apertada, porém achou melhor ficar calado. Nesse momento, Sirius saiu do banheiro teatralmente.
- Ta-ran! - ele apoiou uma mão no batente, estufando o peito nu. A bermuda parecia mais um shorts em seu corpo comprido, cobrindo-o somente até o meio das coxas.
Só então Remo reparou que havia algo faltando.
- Espere aí, Pontas esqueceu de nos emprestar camisetas.
- É mesmo! Eu não tenho camisetas velhas - lamentou-se Pedro. - Se eu estragar uma das minhas, minha mãe me mata!
- Bahhh! - Sirius fez um gesto como se espantasse um mosquitinho do nariz. - Pra quê isso? Não precisa!
- Almofadinhas! - repreendeu Remo. - Por mais que a Sra. Potter insista que você é da casa, você tem que mostrar um pouco de educação, ora essa! Onde já se viu andar praticamente nu na casa dos outros!
- Eu não faço isso nem na minha própria casa! - Pedro arregalou seus olhinhos lacrimosos e encolheu as mãos como um ratinho acuado.
- Então, estão prontos? - Tiago apareceu na porta chamando a atenção de todos. Só pelo tom descontraído de sua voz, Remo confirmou o que já suspeitava: a discussão de momentos antes estava totalmente perdoada e esquecida.
Voltando-se para trás, Remo teve que suspirar e menear a cabeça. Lá estava Tiago, com a bermuda azul que lhe atingia os joelhos. Só a bermuda. Tiago colocou as mãos na cintura de um modo muito familiar - o mesmo modo com que a Sra. Potter demonstrava seu descontentamento.
- Como vocês são moles! Ainda nem se trocaram! Vamos, vamos! Vistam-se de uma vez!
- Pode ir primeiro, Rabicho - ofereceu Remo gentilmente, ignorando a risada zombeteira de Sirius ao ver o loiro trancar-se no banheiro com a bermuda florida.
- Vamos, Almofadinhas, vamos descendo. Péricles disse que sua prima acabou de chegar.
- Andy! - gritou Sirius, excitado.
Remo franziu o cenho. Andrômeda Black? Na casa dos Potter?
- Essa mesmo - disse Tiago, impaciente, gesticulando exasperado com a mão para que ele se apressasse. - Vamos logo, sua mula!
- Mula é a vovoz... ora, deixa pra lá - Sirius atravessou o quarto em passos largos e saiu para o corredor, dirigindo-se com Tiago para o andar de baixo.
- Hey, Pontas! Pontas, espere - Remo correu até a porta também, mas eles já estavam muito longe, correndo escada a baixo. Suspirou novamente. - Vou ter que arrumar alguma camisa pra vestir...
Sua bagagem já tinha sido trazida pelos elfos, então ele vasculhou suas roupas em busca de alguma coisa para usar. Sim, pois ele definitivamente desaprovava a falta de respeito dos outros dois marotos. Eles estavam recebendo visitas daquele jeito! Enfim encontrou duas camisetas velhas grandes que ele detestava. Nunca ficou tão grato por sua mãe sempre enfiar mais algumas roupas em seu malão sem pedir licença. Então ouviu o barulho da tranca do banheiro.
- Erm... - a cabeça loira de Pedro surgiu por uma fresta. - Será que você não pode encontrar uma camiseta por aí, Aluado?
Remo sorriu e estendeu uma camiseta cinza, que não combinava muito com a bermuda florida, mas em todo caso...
- Aqui está. Pode usar uma das minhas.
- Valeu!
Pedro voltou a se trancar e só saiu totalmente vestido. Remo podia adivinhar que ele estava murchando a barriga - por causa do inchaço incomum na altura do estômago - mas novamente achou melhor ficar calado. Apossou-se da bermuda marrom-manchado e entrou no banheiro depois dele. Ao contrário do que parecia, o tecido era bastante confortável. A aparência mofada era só por causa da cor esquisita da peça, mas a camiseta preta que ele jogou por sobre o peito cheio de feridas não totalmente cicatrizadas acabou quebrando um pouco a má-impressão causada pela cor. Remo sentiu um arrepio na espinha ao pensar no que seus amigos diriam se vissem suas feridas. Pelo menos as mangas não eram tão curtas a ponto de deixarem alguma das marcas para fora. Apenas um arranhão ficara exposto na parte interna de seu braço esquerdo, porém não era um lugar muito visível.
Por fim, deixou o banheiro e Pedro acompanhou-o em direção à sala de estar da Mansão Potter, onde provavelmente todos estariam reunidos. Remo sentiu uma contração no estômago de vergonha por estar tão parcamente vestido, tendo metade das pernas à mostra e os braços parcialmente nus. Pedro não parecia tão desconfortável quanto ele em seus calções floridos. Não pode deixar de achar aqueles trajes um abuso à boa vontade da hospitaleira Sra. Potter. Considerou por alguns instantes voltar para o quarto de Tiago e pegar suas vestes de bruxo, mas então descobriu-se já de frente para as escadas e desceu antes que se arrependesse.
Ouviu uma voz grave e feminina que não podia ser de outra pessoa que não uma Black. E lá estava Andrômeda Black - ou melhor, Andrômeda Tonks - abraçando carinhosamente o primo, do jeitinho que ele se lembrava dela dos tempos que ela ainda freqüentava Hogwarts. Alta e esguia, com os cabelos negros compridos e escorridos. Havia um ar cansado em suas feições, mas isso não fazia com que ela se tornasse menos agradável a seus olhos. Era muito bonita, como qualquer uma de suas irmãs.
Estendendo um dos braços para o lado, Remo barrou a passagem de Pedro e pediu silêncio levando um dedo aos lábios e então - diante da expressão confusa de Pedro - apontou para as pessoas ao centro da sala.
- Oh, que saudades eu estava de você, garotinho! - disse Andrômeda com ternura, finalmente largando o primo para encará-lo, segurando seu rosto entre as mãos elegantes. - Continua maravilhoso, como sempre... - seu olhar então passeou pelo peito nu do garoto e seus olhos adquiriram um brilho divertido - Hum, e extremamente charmoso! Suponho que as garotas não te dão sossego, não é mesmo?
- Supõe corretamente, Andy - gabou-se o moreno, ainda que em tom de brincadeira. - Sempre tão observadora!
Andrômeda deu uma risada gostosa, jogando a cabeça para trás do mesmo jeito que Sirius costumava fazer.
- Tenho tanto orgulho de você, Sirius.
Ela bagunçou os cabelos do primo e só então Remo reparou no visível contentamento que seu amigo sustentava em seu sorriso confiante. Eles pareciam uma família feliz, apesar de tudo e Remo se sentiu um intruso, mesmo não sendo o único a presenciar aquela demonstração de carinho. A Sra. Potter e Tiago estavam meio abraçados, assistindo de longe e sorrindo satisfeitos. Pedro era o único que não parecia muito interessado na cena, tentando tirar alguma coisa dos bolsos. E pelo barulho, Remo podia apostar que eram balinhas de caramelo que ele tinha afortunadamente descoberto nesse compartimento.
- E você, mocinha? - a atenção de Remo voltou para o centro da sala novamente, onde uma nova personagem acabava de se mostrar, presa firmemente na barra das vestes de Andrômeda como um acessório de seu figurino e ele se admirou quando aquela coisinha pequena se mexeu levemente.
- Vamos, Ninfadora, deixe de ser vergonhosa, cumprimente seu primo!
A garotinha, que parecia uma miniatura da mulher - inclusive com uma miniatura de vestes negras de bruxo - largou a barra das vestes da - mãe? - e estendeu uma mãozinha rechonchuda para Sirius, que cobriu-a quase até o pulso com sua mão enorme.
- Muito prazer, Ninfadora, eu me chamo Sirius!
Remo observou maravilhado a adorável garotinha fazer um gesto discreto com a outra mãozinha e Sirius abaixou-se, chegando mais perto dela, como ela dera a entender pelo gesto. Ninfadora aproximou-se de seu ouvido e disse, num sussurro que foi ouvido por todos na sala:
- Me chame de Tonks - disse graciosamente em sua vozinha infantil.
- Ninfadora! - ralhou Andrômeda, parecendo indignada.
Tiago se esforçou para conter uma risada daquelas escandalosas que só ele sabia dar; A Sra. Potter deu um beliscão sem muita vontade no filho, apesar de parecer prestes a rir também; Pedro ergueu os olhos confuso, tentando entender o que se passava já que estivera muito concentrado com seu achado caramelado; e Remo sorriu deliciado, agradecendo por ainda não ter sido notado na sala.
Sirius, contrariando a tudo o que se esperava, deu uma gostosa gargalhada e num movimento fluído ergueu a Ninfadora nos braços fortes, girando-a. A pequena gritou, primeiro de susto e então divertida, aproveitando o delicioso vôo, os cabelos escorrendo para frente do rostinho rosado. Então Sirius segurou-a com uma habilidade que impressionou Remo. Aliás, só o fato de Sirius estar se dando tão bem com aquela criança já era algo surpreendente. Ele nunca imaginara que aquele maroto arrogante podia demonstrar tamanho afeto por uma criaturinha pequena como aquela. Julgava que ele achava crianças irritantes e impertinentes. Mas pelo visto, estava muito enganado.
- Então, mocinha - Sirius preferiu não chamá-la nem de Tonks nem de Ninfadora para não contrariar nenhuma delas. Uma sábia escolha, Remo tinha que admitir. - Fiquei sabendo que você é muito especial, é verdade?
De onde estava observando a cena, Remo não notou que as íris castanhas escuras que encaravam Sirius de repente tornaram-se de um cinza tempestuoso que era exatamente o espelho dos olhos do primo. Os olhos do maroto se arregalaram em espanto e deleite. Então Ninfadora, que parecia não ter nem notado o que acabara de fazer, levantou uma mãozinha rechonchuda e tocou a face de Sirius com um interesse curioso de um cientista diante de uma nova descoberta.
- O que é especial, Sir... Siru...
- Sirius, meu bem - ajudou Andrômeda com um tom inesperadamente gélido, diante da dificuldade da garota em pronunciar o nome do primo, e em um movimento rápido, ela tirou-a dos braços do maroto dando as costas a ele. - Onde está Ted, Nindiely?
Remo franziu o cenho, intrigado e percebeu que Sirius também parecia um pouco perdido com a atitude da prima. O lobisomem não tinha entendido o que Sirius queria dizer por "especial", mas adivinhou que a reação de Andrômeda devia-se exatamente àquilo.
- Está com Howard - respondeu a Sra. Potter. - Acho que eles foram para o jardim. Você quer ir para lá? Ou talvez queira um chá, querida?
- Sim, sim, eu aceito um chá - ela continuou com seu tom frio, colocando a pequena Ninfadora no chão.
- Mãe, nós vamos para a piscina - informou Tiago, já afastando-se da mãe em direção a uma das inúmeras portas do aposento.
- Tudo bem, querido. Juízo, heim?
- Está bem, mãe - Tiago revirou os olhos. - Vamos, Almofadinhas.
- Espere - rosnou Sirius, sem sequer olhá-lo e Tiago enterrou o rosto nas mãos, incrédulo. Quanto mais eles demorariam para se divertir?
Enquanto isso, subitamente, Remo sentiu como se seus olhos tivessem sido atraídos para outra direção, e ele viu-se encarando - e sendo encarando de volta - por Ninfadora Tonks. Mas antes que sequer um sorriso pudesse se formar corretamente em seu rosto, o que ele viu fez seus olhos se arregalarem. Conforme a menina se afastava mais, temerosa, de encontro ao corpo da mãe, seus olhos - antes... cinza? - tornaram-se castanhos em um piscar de olhos, assim como os cabelos adquiriram uma cor mais clara - exatamente como os seus próprios - e mais estranho ainda, eles estavam ficando mais curtos!
Seu queixo caiu diante dessa transformação. Andrômeda, atraída pela atitude da filha, voltou os olhos para baixo e encontrou-a daquela maneira.
- Ninfadora! - exasperou-se ela, abaixando-se e dando um chacoalhão na filha. - Você está fazendo de novo! O que eu disse pra você antes de sair de casa?
A garotinha finalmente desgrudou os olhos de Remo, vendo-se obrigada a encarar o rosto severo de sua mãe. Então, depois de um momento de hesitação ela finalmente pareceu entender e num piscar de olhos seus cabelos voltaram ao comprimento e cor originais, assim como os olhos voltaram ao tom escuro de sempre. E Ninfadora estava graciosamente envergonhada.
- Desculpe, mamãe. Foi sem querer...
- Oh, que falta de educação, a minha - a Sra. Potter bateu na própria testa e atravessou a sala em direção às escadas, onde Remo e Pedro ainda permaneciam congelados. - Andrômeda, esses são os amigos de Tiago e Sirius. Eles dividem o dormitório na Grifinória e são inseparáveis - ela sorriu, infiltrando-se no meio dos dois e passando os braços em suas costas, gentilmente incentivando-os a se adiantarem. - Vamos, queridos, não sejam tímidos!
E no instante seguinte ambos estavam no meio da sala, apertando a mão de Andrômeda. Porém Remo não conseguia desgrudar os olhos da criatura pequena e adorável que teimava em se esconder nos volumosos gomos das vestes negra da mãe.
- Oh, me desculpem, rapazes - desculpou-se Andrômeda. - Ela não está acostumada com estranhos, vocês compreendem...
O sorriso que Remo estava guardando para si finalmente apareceu. E junto com ele a compreensão. Ele estava diante de uma metamorfomaga! Isso era esplendido! Como o grande apreciador de livros que era, Remo Lupin já tinha lido muito a respeito dessa habilidade raríssima. Uma garotinha especial, sem dúvida! Um verdadeiro tesouro!
- Posso levar Ninfadora conosco, Andy? - seus pensamentos foram interrompidos pela voz irritada de Sirius, que já não conseguia mais se conter. Ainda não tinha se conformado com a reação de Andrômeda. Tudo bem que ela estivesse protegendo a filha, mas Sirius não era ameaça alguma! Nem ninguém daquela sala, ora essa!
E a reação de sua prima deixou-o ainda mais irritado.
- Não! - ela gritou, puxando a mãozinha da filha, trazendo-a mais perto do próprio corpo, então pareceu arrependida diante da evidente mágoa que causara no moreno. - Quer dizer... ora, Sirius, não me entenda mal. Ninfadora não está acostumada a sair de casa e... e eu não me sinto segura em perdê-la de vista, entende? Mais tarde eu a levo na piscina para ver vocês nadarem, ok?
Sirius limitou-se a bufar. Toda a mágoa mascarada em desprezo. Então marchou para fora sem esperar por Tiago. Este levantou as mãos para o teto, como se agradecesse aos céus por um milagre concedido e seguiu-o. Não sem antes chamar os outros dois autoritariamente.
Remo lançou um último olhar para a pequena, que deu um sorrisinho tímido, e então obrigou-se a seguir os amigos para fora. Enquanto dirigiam-se para a piscina, aos fundos da propriedade, Remo meditava ainda maravilhado com a conclusão a que chegara. Uma metamorfomaga! Que esplêndido! Lily ficaria espantada quando ele contasse o que presenciara! Prima de Sirius Black!
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N.A. Olá pessoal! Acho que tenho que me explicar pra vocês: eu panejava que o capítulo 5 seria já a volta para Hogwarts, mas o capítulo 4 estava ficando tão gigantesco que eu tive que dividi-lo em dois! O.O Bem, na verdade, eu planejava que eles voltariam para Hogwarts no capítulo 3, mas as cenas foram aumentando, crescendo, surgindo... e enfim, o que era pra ser o 2º capítulo ainda nem aconteceu! Afff, confundi vocês? o.O
É por isso que eu não vou me comprometer com vocês, porque sempre sai de outra maneira totalmente diferente do que planejei... hunf... Espero que tenham gostado! No próximo capítulo tem mais Ninfadora. Ops! Quer dizer... Tonks XD
Respostas por e-mail para: Washed Soul, Rodrigo Black Potter, Thiago Potter First, Larissa, .Miss.H.Granger., Alice, Lucca BR, LeLeCa SaPeCa, Sara Potter, aRTHuR BlaCK, Luana, Tata Black, Jeh Tonks, aNiTa JOyCe BeLiCe, LeNaHhH, KiNe Evans, Nessa Reinehr, Lunnafe.
Epa! Respondi pra todo mundo por e-mail dessa vez! Que legal! Vocês já sabem, se alguém não receber a resposta, me avisem e eu mando novamente! O presente de Natal de vocês já está aí, agora... e o meu? Estou esperando os comentários de vocês, ok? Feliz Natal e até sábado que vem!
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E no próximo capítulo...
Remo apontou a porta, mas quando todos olharam, já não havia mais nada. Remo correu até lá e observou Ninfadora Tonks já longe, correndo desabalada. Os outros três logo se juntaram a ele - Sirius novamente na forma humana.
- Oh, não! Não me diga que...? - lamentou-se Tiago.
Remo limitou-se a lançar um olhar acusador a Sirius, que estava lívido.
- Ai, que mancada! Vocês acham que ela viu Sirius se transformando em Almofadinhas? - Pedro colocou em palavras a dúvida de todos.
