Capítulo 8 – A hora da conversa

A cabeça de Harry ainda não parara de girar e ele se sentou na cama, com Severus ao seu lado.

– Talvez você queira beber um vinho.

– A essa hora da manhã?

– Não acha que a ocasião pede algo?

– Não, eu... Não poderia.

– Sem problemas – concordou Severus.

Harry olhou para ele, nervoso. Ele sempre achara que esse momento ia chegar, mas nunca imaginou que fosse assim. A verdade é que ele tinha imaginado um milhão de possibilidades, mas nunca que ele ia ser a pessoa a interromper o jogo de sedução de Severus. Ele tinha armado todo o cenário, levado Harry para sua própria cama, até tinha tido a cautela de cuidar de Harry para que ele não sentisse dor caso eles decidissem se engajar em atividades mais... físicas.

– Eu... – ele tentou dizer. – Severus, eu...

– Por que você não me disse nada?

– Porque você estava com Remus. Achei que vocês se gostassem e é óbvio que eu não iria interferir. Além do mais, Severus, eu quero ser seu amigo. Sempre. Não quero estragar essa amizade. Você cuida de mim há tanto tempo, e não sei o que faria sem você. Sou absurdamente grato e não queria misturar tudo isso, mas acho que foi mais forte que eu. – Harry inspirou fundo, dando-se conta de que estava sem ar, tagarelando sem controle por puro nervosismo. – Acho que tive medo.

Severus tentou chegar perto dele de novo:

– Você confia em mim?

Os olhos verdes o encararam,cheios de devoção:

– Claro que sim.

– Não entendo por que você só me disse agora.

– Só agora você e Remus se separaram. Aí eu resolvi arriscar. Primeiro fui sondar você, saber se você gostaria de tê-lo de volta. Você não soube responder, mas sugeriu usar as flores. Bom, eu achei essa idéia boa e optei pela flor vermelha, mas aí... Remus também mandou um buquê e eu vi você... você olhou as flores... parecia que ia... que ia aceitá-lo de volta...

– Potter, há quanto tempo você se sente assim?

– Ah, não sei. Isso importa?

– Importa se isso significar que você se isolou do mundo por minha causa. Isso é muito lisonjeiro, mas é inaceitável. Eu realmente gostaria que você tivesse vindo falar comigo antes.

– Bom, já passou. Não há muito que se possa fazer agora.

– Na verdade, há muito que se pode fazer.

Harry arregalou os olhos ao ver como um simples comentário, com a voz de Severus, podia parecer tão sexy e sedutor. O Mestre de Poções continuou:

– Mas você insiste em apenas conversar, então... – Ele deu de ombros, um brilho divertido nos olhos.

– Fala sério mesmo? Você quer... quero dizer, gostaria de...

– Estou disposto a seguir no seu passo. No seu ritmo.

– Severus... – O rapaz estremeceu, mas tinha que dizer. – Olhe, não precisa fazer nada disso. Não quero que se sinta forçado a nada. Só porque você descobriu como eu me sinto, não é motivo para retribuir. Podemos voltar a ser bons amigos e esquecer que qualquer coisa tenha acontecido.

– Potter, eu quero que isso aconteça.

– É que isso realmente é importante para mim. Não é uma brincadeira, nem algo inconseqüente.

Severus se aproximou e pegou uma mão de Harry delicadamente. Depois usou a outra mão para acariciar seu rosto, com um sorriso suave:

– Nunca me passou pela cabeça brincar com seus sentimentos. Mas eu preferia que você tivesse me dado alguma outra pista além de uma simples planta da família das liliáceas. Também teria sido agradável saber que aquela pessoa de quem você falava com tanta paixão era eu mesmo. Eu estava começando a ficar com ciúmes.

Severus retirou a mão que acariciava o rosto de Harry, e evitou olhar o rapaz.

– Eu achava que nunca ninguém poderia ter sentimentos desse tipo por mim. Aliás, disseram-me literalmente que gente como eu não tinha direito a essas coisas. Eu... entendo que você em breve se canse de mim, depois de finalmente conseguir o que quer há tanto tempo. Mas até esse dia chegar, espero que acredite que eu o aceito pelo período que desejar.

– Não! Isso não é verdade. Odeio ver você falando isso de si mesmo. Eu sei quem foi que disse esses absurdos e ele está totalmente equivocado. Ele também não se acha digno de ser amado e eu tentei dizer-lhe que estava errado. Mas ele que se resolva. Agora pretendo convencer você de que estou sendo sincero.

– O que você está oferecendo?

– Se você aceitar... uma vida a dois. Ou enquanto agüentarmos um ao outro sem nos matarmos. Mas só se você quiser.

Severus o encarou, os olhos voltando a brilhar daquele jeito que fazia o coração de Harry se acelerar:

– Com duas condições.

– Condições?

– Sim, duas. A primeira é que você vai me deixar seduzi-lo de maneira apropriada. O quanto antes. Hoje à noite seria excelente. A segunda é que você vai me prometer sair desse isolamento. Não precisa nem voltar a ser o Rapaz-Que-Matou-Voldemort, pode ser como James Harris, mesmo. Mas quero que saia, divirta-se, deixe aquela casa mais vezes. De preferência, comigo, mas também pode chamar aquela horda de Gryffindors a quem chama de amigos.

– Está bem. Vou tentar. Podemos repetir hoje a noite de vinhos e queijos. Que tal?

– Não precisa se incomodar com isso. Eu me encarrego de tudo. Quero apenas que você tome suas poções corretamente e relaxe. As dores que sentiu hoje foram pura tensão muscular, o que pode agravar seu caso.

– Está bem. – Harry sorriu e timidamente tentou se aninhar nos braços de Severus, ainda inseguro que ele quisesse mesmo tanta proximidade. – Posso contar com outra massagem?

Severus deu um sorrisinho antes de responder:

– Só se prometer ser bonzinho.

Harry abriu um sorriso luminoso, mal podendo acreditar que aquilo finalmente estava acontecendo. Ele ergueu a cabeça para olhar Severus, que o encarou de volta, os olhos encontrando-se no ar, e sua respiração começou a falhar de novo.

Que mágica tinha aquele homem que o deixava totalmente exposto, vulnerável e à mercê de seus encantos? Naquele minuto, Harry estava de tal maneira feliz que começou a sentir um pouco de medo. Se tudo aquilo fosse apenas temporário, aquele tempo tinha sido o mais feliz de que ele se lembrava.

Seu companheiro não estava em melhores condições. Que mágica tinha aquele rapaz para capturá-lo tão completamente nos olhos verdes? Severus não conseguia descobrir, mas sabia que algo dentro de si gostava daquele olhar. Porque nunca, nunca, desde que podia se lembrar, ele tivera alguém olhando desse jeito para ele. Oh, ele reconhecia o olhar. Era daquele tipo que transforma um rosto, Claro, não era dirigido a ele, mas Severus se lembrava de tê-lo visto uma vez, há anos, numa ocasião em que o dono do olhar pensava que não estar sendo observado. Quando Severus viu o jeito que Arthur Weasley encarava Molly, aquilo o marcou. Era como se os olhos de Molly carregassem o ar de que Arthur precisava para viver. Era uma necessidade, mas não havia desespero. Era uma entrega genuína, espontânea e integral. Total confiança. Ninguém nunca olhara Severus desta maneira.

Até aquele momento.

Porque era assim que Harry o encarava. E ele se sentia estranho, como nunca antes. Nada mais natural que abaixar a cabeça e, pela segunda vez, fazer os lábios se encostarem. Só que desta vez Severus queria mais.

Harry imaginou que ia ser um beijo casto e delicado. Na verdade, começou assim. Os lábios firmes de Severus encontraram os seus e era uma suave pressão, apenas uma presença. Mas lentamente, suavemente, a pressão foi aumentando e Severus estreitou Harry em seus braços, e não desgrudou os lábios dos dele.

E quando a boca de Severus se abriu sob a de Harry e uma língua apareceu em cena, Harry podia jurar que seu coração ia saltar para fora do peito. Havia um universo de calor e de umidade. Severus tinha gosto de ervas, de madeiras, de vapores e de terra. Uma sensação nova percorreu seu corpo, uma que nenhuma poção de Severus tinha provocado antes. Não era nada parecido ao que ele tinha imaginado que os beijos de Severus seriam, e eram tudo que ele imaginara. Era insano, inigualável, inesperado, e insuperável.

Harry não teve consciência de como aconteceu, mas, quando se deu conta, ele estava deitado na cama, Severus por cima de seu corpo, sua anatomia evidenciando seu interesse, lábios e língua furiosamente em ação, esquentando o clima da manhã fria. Num reflexo, Harry ofereceu o pescoço para onde os lábios de Severus se dirigiam, as mãos percorrendo seu corpo desnudo e besuntado de bálsamo analgésico, as respirações ofegantes. Era um festival de sensações e Harry estava rapidamente se inebriando nelas.

Rápido demais.

– Espere. Não, por favor.

– Alguma coisa errada?

– Não, não, claro que não. Mas... se eu não interromper isso agora, não vou conseguir parar até terminar. E eu prometi que iria deixá-lo seduzir-me apropriadamente.

Severus sorriu e afastou-se, cuidando para beijar-lhe a testa com carinho:

– É claro. Afinal, agora estamos apenas conversando. É hora de seu tratamento médico. Podemos deixar outros tipos de conversa para esta noite.

– Posso chegar às sete?

– Perfeito.

– Tem certeza de que não quer que eu traga o vinho?

– Eu me encarrego das bebidas, mas apreciaria se trouxesse uma seleção de chocolates para a sobremesa. Não terei tempo de prepará-la.

– Certo. – Harry sentou-se na cama, recuperando sua camisa. – Então continuamos isso à noite?

Severus abriu um sorriso tão cheio de segundas intenções que Harry sentiu o coração mais uma vez falhando.

– Certamente, Sr. Harris. Estou contando com isso.