Os opostos se distraem.
Inspirado em É tarde para saber de Josué Guimarães.
Se dentro de um minuto a coruja de Draco não entrasse por aquela janela Virgínia nunca mais sairia daquele quarto. Fecharia as cortinas, não desceria mais para fazer as refeições e ignoraria as visitas das amigas. Foi até à janela e observou o vôo dos pássaros e a maneira como o azul do dia se unia com o vermelho do fim de tarde. Já deveria ter passado das cinco horas. Há uma semana que não tinha notícias dele. Jogou-se na cama exatamente como estava - de sandálias e tudo - e derramou lágrimas de desespero.
Sentiu ódio de si própria. Já deveria estar acostumada com os sumiços de Draco. Ele era assim. Fechou os olhos e formou a imagem do loiro em sua mente. O sorriso misterioso e a expressão desconfiada no olhar. Draco de quê? Draco, simplesmente. Ele dizia que um nome só bastava, que um sobrenome não dizia nada sobre uma pessoa. Há uma semana atrás Draco parecia mais misterioso do que nunca. Gina sentira um ímpetuo de abraçá-lo ou pegar em sua mão com medo. Medo que que ele pudesse nunca mais voltar para os braços dela.
Ouviu passos no andar baixo. Provavelmente a mãe cozinhando. Ouviu também a porta abrir e fechar várias vezes. Os irmãos que saíam e entravam a toda hora para isso e para aquilo.
Lembrou-se do último encontro. O encontro em que Draco estava mais misterioso do que em qualquer outro dia. Encontram-se na esquina da casa dela e foram até a praia que havia ali perto. Ele com as mãos enfiadas nos bolsos dos jeans e ela segurando as sandálias nas mãos. Draco caminhava-se sempre mais a frente e costumava alhear-se no meio da conversa. Observava alguma coisa, ou os cabelos ruivos dela ou então os seus lábios vermelhos. Ele vivia se dispersando. Pelo menos, era por causa dela. Sorriu ao pensar assim.
Draco vivia sumindo. Sempre tinha alguma coisa importante a resolver. Chegou a pensar que ele pudesse ter outra namorada. Perguntou a ele.
- Não tenho namorada, nem noiva, nem amante. Você sabem muito bem disso. Nunca mais diga uma coisa dessa, está ouvindo? - esbravejou ele. Havia ficado terrivelmente irritado.
E ela por sua vez, havia ficado tremendamente triste com o súbito comportamento do namorado, quase sempre, tão calmo e gentil. Talvez ele tivesse percebido isso, porque logo desfez a expressão séria e irritada para uma mais amena e disse:
- Você sabe que é a única que ocupa meus pensamentos.
Já deveria ter passado um minuto e ela continuava a esperar pela coruja de Draco. Se ele nunca mais a procurasse não saberia o que fazer. Não saberia. Queria poder sair para procurá-lo. Sem lenço e sem documento. Sairia exatamente como estava declarando seu amor ao sete ventos pedindo que o loiro voltasse para ela. Mas não sabia como encontrá-lo. Draco não tinha endereço ou sobrenome. Sabia muito pouco dele. E era sempre assim...sumia durante dias e aparecia como que por milagre, saído sabe-se lá de onde.
Aparecia com as calças jeans. Sempre uma diferente, de modo que sabia que pobre ele não era. As camisas de estilo social para fora da calça e um pouco abertas, o cabelo despenteado - um pouco comprido - enconbrido-lhe um pouco o olhar desconfiado de sempre, mas que deixava transparecer - ao menos para ela - que havia uma verdade dentro daquele olhar. E a verdade era a de que ele não era como os outros. Era alguém que sabia querer as coisas como ninguém e que era capaz de ficar longos e ternos momentos a fitá-la acariciando seus cabelos sentado na praia com as pernas entrelaçadas. Era quando ele demonstrava ser alguém jovem, humano, frágil e quem sabe até, inseguro.
Mas logo então tudo que acabava como que por encanto ou magia e lá estava ele com o cigarro na boca, alheio a tudo e todos - até mesmo ela - pensando em alguma coisa que ela não saberia dizer o que era.
Levantou-se depressa. Que horas seriam, já? Puxou os fios da cortina e viu que a noite chegara forte. As estrelas no céu negro e a lua no alto, cinza e triste. Exatamente como Gina se sentia.
Os passeios com Draco tendiam a ser curtos. Ele parecia ser alguém muito ocupado. Talvez ele fosse alguém importante, tão diferente dela. Ela ainda era uma menina, como ele vivia dizendo. Tinha uma vida toda pela frente. - Você ainda tem anos de escola pela frente e festinhas de escola para freqüentar, pequena. - era o que ele lhe dizia.
Ela negava veemente.
- Você não é tão mais velho que eu assim, Draco. - retrucava.
- Sou mais velho o bastante. - resmungava ele, dando outro trago no cigarro. - O bastante para ter muitas responsabilidades e um trabalho muito importante a fazer.
Gina sabia que havia uma guerra lá fora e às vezes tinha medo por Draco. Talvez ele trabalhasse na guerra e não quisesse lhe contar. Seria isso? Seria por isso? Tinha medo de que pudesse ser isso e então um dia descobria ele morto e não haveria nada que pudesse fazer sobre isso. Sentia calafrios e ficava toda arrepiada só de pensar.
Sete dias. O oitavo estava se aproximando e Draco não havia dado sinal ainda. Nunca havia passado de sete dias, seria aquele dia, o dia?
Foi até o banheiro e olhou-se no espelho. Viu diante dele um rosto estranho de uma garota ruiva de olhos claros e sardas espalhadas pelo rosto. Mas além disso, viu profundas olheiras, cabelos desgrenhados e um ar cansado. Sentou-se no chão e colocou a cabeça entre os joelhos. Respirou fundo. Tinha de fazer algo para passar o tempo e deixar de pensar em Draco nem que fosse por apenas um segundo.
Resolveu tomar um banho. Deixou as sandálias plataforma no piso gelado e encaminhou-se até o chuveiro. Despirou a blusa de algodão branca e deixou escorregar pelas longas e torneadas pernas a saia longa de linho rosa. Lançou um olhar apreensivo para a janela mais uma vez antes de entrar embaixo da água quente. Nada havia lá.
Deixou a água escorrer pelo seu corpo. Sentiu os músculos se resetarem para então relaxarem embaixo da massagem natural que a água quente fazia. Fechou os olhos inspirou fundo. Draco era sempre tão limpo. Impecável, diria. Mesmo com todo aquele ar rebelde e olhar desconfiado ele deveria ser algo muito importante. Sabia disso. Mesmo ele tentando não aparentar nada daquilo sabia que ele era alguém rico e de muitas responsabilidades. Ele não conseguia esconder a classe e elegância que possuia naturalmente, mesmo tenteando. Virgínia sorriu. Gostava disso nele. Aquele contraste entre o rude e o elegante. Era um belo contraste.
Saiu debaixo da água quente e enrolou-se na toalha de banho felpuda. Os cabelos molhados pingando no piso. Sabia que se a mão visse aquilo brigaria, não gostava de nada fora do lugar. Mas naquele momento, nada importava. Não quando escutava um barulho de asas vindo de perto de sua janela. Saiu de um pulo do banheiro e correu até a janela certa de que era a coruja de Draco quem a esperava. Mas enganou-se, eram apenas pássaros. Seu quarto mergulhou no silêncio novamente e ela prometeu que esperaria apenas mais um dia.
A coruja chegou de manhã, bem cedo e Draco combinava um encontro para aquele mesmo dia na esquina de sua casa, como se costume. Arrumou-se rapidamente com um par de sandálias brancas e um vestido branco e saiu em disparada até a esquina de sua casa. Mal disse até logo à sua mãe.
Draco vestia uma das habituais calças jeans e uma camisa preta. Os cabelos mais rebeldes do que nunca e o olhar penetrante a fitá-la incansavelmente. Ficaram a olhar-se por alguns momentos. E pelo que Virgínia conhecia do loiro ele nada teria dito se não tivesse se adiantado:
- Por Merlin, Draco, por onde é que você andou?
- Por aí. Tinha negócios a tratar.
- Você quase me fez morrer de preocupação, Draco. Você não tem idéia...Achei que tivesse morrido!
- Que loucura. Porque, diabos, eu haveria de morrer?
- Há uma guerra lá fora, Draco.
- E eu estou aqui. - sorriu ele. Aquele sorriso que não era gentil, mas também não era bruto. Era um sorriso totalmente dele. Dele e de ninguém mais.
- Estou vendo. - murmurou, amuada.
Seria sempre assim, então? Ele desapareceria por dias e voltaria sem nenhuma explicação? Não agüentaria se assim fosse. Sabia que não agüentaria. Precisava dele ao seu lado. Já não conseguia imaginar sua vida sem Draco fazendo parte dela. Draco era uma parte sua que todos desconheciam. Sua mãe, seu pai, seus irmãos... Era algo só dela e demais ninguém. Porque ele não podia demonstrar que sentia o mesmo? Às vezes não o entendia e isso a fazia sentir uma dor lacinante no peito. Uma dor que desconhecia o significado. Só sabia que, como qualquer dor, significava ser algo ruim.
- Vamos. - chamou ele, enlaçando-a pela cintura, a trazendo para mais perto de si. - Eu te pago um sorvete. - beijou-lhe o pescoço e juntos caminharam pela rua até a sorveteria mais próxima.
Sentaram-se de frente um para o outro. Virgínia lamentou-se por dentro. Queria ele por perto. Tanto tempo que não se viam e ele parecia nem sentir. Viu Draco assoprar a fumaça do cigarro bem alto e fechar os olhos, sem dizer uma palavra. Até o seu silêncio era algo reconfortante. Ao menos sabia que ele estava ali, seguro.
- Já sei - lamentou-se ela -, você veio aqui dizer que não quer mais se encontrar comigo.
- Não. - respondeu ele, simplesmente. Abrindo os olhos com agilidade e pegando na mão da ruiva com carinho:
- Desculpe, não foi a minha intenção se passar uma imagem errada das coisas para você.
- Não sei porque você é assim comigo, Draco. Me trata como se eu fosse um bicho diferente. Eu queria que você me deixasse entrar na sua vida e aceitasse que já entrou na minha. Você ia se surpreender em como nós somos parecidos.
- Não sei porque, diabos, você não compreende que eu faço parte de um mundo e você de outro. Não é culpa nossa, mas é assim que funciona, pequena.
- Apenas porque você quer.
- Não é porque eu queria. E sim, porque as coisas são assim e ninguém pode mudar isso só porque está com vontade. As coisas não acontecessem assim. Se você soubesse...se você soubesse... aí então entenderia meus motivos.
- Então porque não me conta?
- Quem dera eu pudesse, querida.
- Você pode. - murmurou ela, baixinho.
- Não, não posso. E você sabe. - censurou ele, mas sem nenhum sinal de irritação. Somente de carinho. - Eu tenho muitas coisas a resolver, sabe? Eu sou totalmente o oposto de você. Você é toda simples - e não falo de dinheiro...
- Vai repetir que nós não fomos feitos um para o outro e não sei mais o quê? - esbravejou ela, frustrada. - Eu não quero ouvir, Draco. Não quero.
O loiro fez uma careta.
- Mas é a verdade, pequena.
- Então porque você ainda está comigo?
Ele ficou em silêncio, como se procurasse uma respota para o que ela perguntava. Na visão dela era tudo muito simples e era ele que complicava demais. Ele concordava, na maioria das vezes. Draco dizia que era um cara complicado mesmo e tinha um peso enorme nas costas, que tinha de resolver. Ela não compreendia.
- Você não gosta de mim. - choramingou ela, olhando para as pequenas mãos que mantinha sobre a mesa.
- Isso não é verdade. Você sabe. - disse ele, pegando em sua mão novamente.
- Não, não sei. Já não sei mais, Draco. - suspirou profundamente. - Porque desaparece dias e dias, não deixa um recado, um aviso, um sinal? Você não se importa comigo e nem gosta de mim.
- Eu te adoro, pequena
Virgínia apertou-lhe a mão e respondeu:
- Eu também, Draco. Eu também.
Ele levantou então, repentinamente e avisou que tinha de ir. Que já era tarde.
- Você sempre faz isso.
- Eu preciso, amor, você sabe.
- É, eu sei.
Caminharam de mãos dadas até a esquina de sua casa e então desprenderam-se. Ele fez um sinal com a cabeça de adeus e desapareceu rua abaixo. Virgínia ainda se manteve ali por alguns instantes vendo-o atravessar ir embora tentando não olhar para trás.
Retornou devagar, entrando na casa silenciosamente. Acomodou-se num sofá de canto e dormiu profundamente sem nem esperar muito. Dormiu como há dias não dormia. E sonhou com Draco. Sonhou que os dois eram felizes e andavam pela beira da praia de mãos dadas, sem maiores complicações. Quando acordou, já altas horas da noite, o mundo era belo de novo.
Dois dias se passaram e Draco não mandara outra coruja até então. Mas ainda era cedo, de qualquer forma. Virgínia revia agora em sua mente o encontro anterior, ainda vivo em sua memória. O momento em que ele havia pego na sua mão e então o outro quando ele havia dito que a adorava. Sentiu um calor dentro do peito e sorriu, feliz. Queria aproveitar nem que fosse por aquele momento o gostinho de se sentir importante para Draco. Sabia que eles não eram um casal comum e com pesar pensava que nunca iriam ser. Mas não importava. Nada importava se pelo menos pudesse vê-lo. Era tudo o que pedia. Mas já estava cansada de viver de migalhas.
Às vezes chegava a pensar que ele estava mesmo certo. Ele era calado e ela tagarela. Ele era sério e ela alegre. Ele era velho - pelo menos uns cinco anos mais velho que ela - e ela ainda era jovem. Tinha apenas dezesseis anos. Muito em breve faria dezoito. Será que Draco esperaria por ela? Porque aí então não teria de dar satisfações para ninguém e poderia fugir com ele para algum lugar onde ninguém se importaria com o que eles faziam ou deixavam de fazer. Sorriu com seus planos malucos que nunca dariam certo. Estava ficando fora da razão. Nunca fora assim, uma pessoa sonhadora. Sempre fora pés no chão e agora isso. No que se transformara? Sabia no que se transformara. Agora era apenas uma sombra. Uma sombra que esperava por algum sinal de Draco. Uma sombra que esperava por um mero gesto de carinho da parte dele. Isto não estava certo. Não estava.
Imaginou que ele estaria em um apartamento qualquer, em alguma rua em um bairro qualquer debruçado sobre uma mesa cheia de papéis. Talvez ele fosse um homem de negócios. Talvez um soldado. Mas preferia pensar que não. Não suportaria pensar que Draco pudesse estar na guerra. Mas se assim fosse, porque não estava no campo de batalha como Harry, seu antigo namorado? Ele estava lá lutando. Diziando que Harry era o único capaz de vencer Voldemort.
Harry era um bom partido. Era o que dizia a mãe. Harry era parecido com Virgínia e quando eles haviam namorado, por um breve espaço de tempo antes de ele ir para guerra, ele havia se mostrado completamente o oposto de Draco. Harry era politicamente correto e sem muitas rebeldias. Harry era uma jogada certa. Mas talvez Virgínia fosse um pouco rebelde e preferia Draco. Mas o loiro dizia que eles eram diferentes...O que ela era para ele? O que os dois eram juntos? Não saberia dizer. Era tudo muito difuso para ela. Tudo muito complicado.
Jogou-se na cama de bruços desejando fortemente que as coisas fossem mais simples e belas.
Olá, gente!
Escrevi essa fic agoorinha!
Não sei o que deu em mim hoje. To com uma baita inspiração.
Eu fiquei matutando essa idéia lá na praia...Comprei um livro chamado É tarde para saber do Josué Guimarães, não terminei de ler ainda mas me apaixonei. Robei a idéia central e resolvi escrever algo sobre isso. Ou seja, 'O romance de um profundo e desesperado amor entre dois jovens que trilhavam caminhos diferentes' palavras dele, não minhas. Isso fique bem claro.
Bom, só sei que eu adorei escrever essa fic. Sei lá, ficou diferente das coisas que eu já escrevi. Ficou meio confusa e sofrida, sei lá.
Já terminei ela hoje mesmo, então...eu posso postar já...mas como eu sou má...Só vou postar o segundo e último cap quando eu tiver reviews legais e satisfatórios.
beeeijos!
