As semanas seguiram lentamente, com o calor servindo apenas para desanimar a execução de qualquer tarefa, mesmo as mais simples. Naquele mormaço úmido, tudo parecia se transformar em um verdadeiro processo cansativo, moroso e gradual. Principalmente, quando se tratava de reformar a casa do Spinners End e torná-la um lugar habitável. Um lar em que Snape pudesse viver, organizar o seu pequeno laboratório e começar a vida com a conclusão de seus estudos.

Eram os últimos dias de férias e ainda havia muito a ser feito. Nem tudo possibilitava a utilização de magia e, isso, o cansava. Sentado no chão, olhando para as paredes pintadas de cinza abrigando estantes e livros, seus músculos pareciam castigados pelo trabalho, por seus ânimos e, também, pelas suas vontades que não cessavam. Nesse ponto, a sua exaustão e o sentimento crescente de solidão, se mostravam mais fortes e inexplicáveis do que nunca... por mais que, Andromeda e Narcissa o ajudasse, não permitindo que ficasse sozinho por muito tempo, não bastava. Faltava algo e não sabia ao certo expressar o quê.

Na verdade, em seu íntimo, tinha a resposta. Aquela estranha sensação que se apoderava de seus pensamentos, era a dura constatação de que, jamais imaginara o quão difícil, era ser o único responsável por suas próprias escolhas. Não existindo uma alternativa, além da que estava diante de seus olhos e o fazia seguir em frente, teria de confrontar os novos desafios que se escondiam pelos cantos mais sombrios de seu destino. A cada dia, ficava mais próximo o momento em que decidiria por qual estrada trilharia e realizaria os seus sonhos...

Cartas, fotografias, convites para aniversários e casamentos, a lista com o material escolar para o seu último ano, se empilhavam sobre a mesa... ao lado, uma edição do Daily Prophet trazia o mais novo escândalo promovido por Sirius, dentre tantos outros que protagonizara durante os meses de junho até aquele instante. Entretanto, os últimos dias pareciam ter sido bem mais intensos.

Em duas semanas, o primogênito de Orion e Walburga, incendiara o mundo bruxo com uma série de desordens de todo o gênero, número e grau de absurdos. Primeiro, depois de um breve retorno à casa dos pais, decidira sair de lá aos berros pelas ruas e apedrejar o carro de um muggle, que estacionava no momento, acertando o pobre homem na cabeça.

Em sua explosão de raiva, além da agressão, afrontou os seus genitores com uma série de xingamentos de todos os níveis. Esbravejando, para quem quisesse ouvir, o quanto gostaria que eles fossem queimados vivos por defenderem a supremacia dos sangues puros, saiu chutando o que via pela frente. Até decidir retornar para a frente da residência e adicionar às ofensas, uma lista enorme com o nome de várias nascidas muggles com as quais transara, com a intenção de escandalizar os mais velhos... o que conseguiu brilhantemente, ao ver a mãe desmaiar de vergonha.

Saindo de lá, Sirius promoveu algumas badernas pelas ruas de Londres, juntamente com o melhor amigo James Potter, para comemorar a formalização de seu relacionamento com Bellatrix... estava animado e não enxergava outro cenário que não fosse o de seu absoluto sucesso. Mais uma vez, teria o que desejava, ignorando à vontade dos demais. Ela seria sua, como bem pretendia, realizando todos os seus desejos.

Somado a isso, a convicção de que Delphini era sua filha, prosseguia e se tornava mais intensa do que nunca. Algum erro devia ter ocorrido na árvore maldita, para esconder a mais pura verdade. A menina era uma Black, era uma herdeira e nada mais importava... tudo lhe pertencia. A casa, a fortuna, a prima e a criança. Todos deveriam se curvar àquele que seria o mais novo senhor daquela família e respeitar as regras que ditasse.

Resumidamente, em poucas horas, os dois Marauders se embebedaram e iniciaram um passeio de motocicleta pelas ruas. Cruzando avenidas em alta velocidade, sem se afetar com o bem-estar as pessoas ou as leis de trânsito existentes, por pouco não causaram um grave acidente... um carro na tentativa de desviar, quase colidiu de frente com um caminhão, sendo motivo de gargalhadas por parte deles. Fazendo com que, a anarquia generalizada, fosse a capa da edição daquela manhã...

- Esses imbecis são mais estúpidos do que eu imaginava... – Snape disse em voz alta ao iniciar a leitura.

Segundo Rita Skeeter, policiais ficaram feridos por feitiços desconhecidos, Aurors acabaram agredidos por pessoas furiosas, uma criança foi atropelada e, para completar o caos, Death Eaters foram vistos sobrevoando à região. Notícias que geraram discussões acaloradas dentro do Ministério da Magia e a abertura imediata de um processo contra os envolvidos.

As testemunhas, que não eram mágicas, tiveram suas memórias recolhidas e, depois, adulteradas pelo Anullo. Contudo, antes da audiência, Dumbledore saiu em defesa dos seus inocentes gryffindors, alegando que tudo não passara de uma simples brincadeira, um pequeno deslize trazido pelo fogo da puberdade e a alegria de viver.

Lendo aquilo, Snape refletiu consigo mesmo que, atropelar um inocente de 8 anos e fugir sem prestar socorro, não era nada comparado ao catálogo de ofensas, insultos e violências de todos os gêneros, que ambos já possuíam em sua vasta ficha criminal ocultada pelo diretor. Certamente, se fosse encontrada e revisada com calma, constariam inúmeras tentativas fracassadas de assassinato... realmente, eles eram ótimas pessoas.

O que Dumbledore alegava ser um entretenimento de adolescentes, provocou a paraplegia de um menino... três policiais com gargantas cortadas e um Auror com o braço decepado. Indenizações anônimas foram pagas, ultrapassando a quantia de 500 mil libras, além dos galeões enviados para a família do jovem impossibilitado de seguir trabalhando por tempo indeterminado.

O fato era que, se qualquer outro bruxo, ferisse muggles daquele modo, ou atacasse um membro do Ministério, iria para Azkaban sem volta. Todo o julgamento se desenrolaria com o infrator preso. No entanto, James e Sirius estavam soltos. Qual era a diferença?

A cada instante, cada frase lida e cada ponderação feita, Snape ficava ainda mais enojado com tudo o que observava de errado. A Terra se virara do avesso e ninguém se preocupara com os abusos e barbaridades diárias. Na sua concepção, Sirius não passava de um parasita, mimado, hipócrita, vagabundo, briguento e cafajeste.

Devia ser, aos olhos dos outros, muito bonito quando ele enchia o peito para gritar, a plenos pulmões, que era avesso à defesa da pureza de sangue ou que tinha um amigo considerado como traidor e, outro, que era mestiço. Contudo, não se privava de xingar os desafetos com palavras ou agressões dignas da mais alta cúpula dos Death Eaters... nunca esqueceria do dia em que escutara, os sussurros vindos daqueles dois, de que ele não passava de um morto de fome com sangue sujo.

Mas, o mais curioso era que, como um grande defensor da liberdade, Sirius queria a todo o custo, obrigar uma exímia defensora dos Sacred Twenty-Eight a ser sua esposa. Talvez, aquela atitude, fosse somente mais uma prova de que nunca deixara de ser um estúpido, irritante, que usava os sentimentos como escudo e bandeira... apresentando toda a contradição de um excelente demagogo, fazendo jus às artimanhas que os Black sempre se valeram em seus comunicados solenes.

Foi em meio a esse caos que setembro chegou e, com ele, o anúncio de que aquele ano letivo seria bem pior do que pensara. Ou danosamente, mais irreal do que todas as obras de ficção científica que lera. Era terrível ver que o anormal se transformara em um hábito cotidiano... e, dentro desse cenário incomum, Andromeda decidira acompanhá-lo até Kings Cross.

Revisando algumas vezes o malão, antes de atravessarem a parede que os conduzia até a Plataforma 9, ela o enchia de recomendações para que aproveitasse ao máximo o seu último ano e as oportunidades que estavam surgindo. Não eram todos os alunos que haviam recebido a chance de trabalhar junto com Slughorn, ou melhor, que ele se empenhara em indicar para que fizesse estágio com Flamel.

- Logo, você estará no Ministério da Magia... quem sabe, assumirá o posto de Pocionista Chefe do Saint Mungus? – comentava, arrumando as vestes de Snape para que entrasse apresentável no vagão.

- Você ficará orgulhosa de mim? – questionou Andromeda a fazendo encará-lo com seriedade.

- Embora você não acredite, seu canalha, eu sempre senti muito orgulho do seu brio, da sua inteligência e da sua dignidade – disse com um ar de preocupação sem tirar os olhos do rosto dele.

- Não faça nenhuma besteira, Severus – declarou ainda o encarando.

- Não se preocupe... – apenas respondeu refletindo quanto a estranheza de tudo aquilo.

Era, no mínimo, inusitado ver Andromeda assumindo uma responsabilidade tão grande e se dispusesse a cuidá-lo com tanto zelo. Ainda mais, quando ingressou no vagão e a viu parada, junto à estação, esperando até que o Expresso de Hogwarts partisse.

- Eu não vou lhe decepcionar, Andy... pode ter certeza disso – sussurrou, acenando da janela, em um gesto recíproco de despedida.

Dentro do trem, as horas passaram tortuosamente preguiçosas, enquanto deslizava pelos trilhos. Na cabine, Snape lia Dostoiévski, Evan cochilava com a cabeça reclinada no encosto do assento e, Bellatrix, brincava com Mr. Scarecrow... quem os visse de longe, pensaria que nada havia mudado desde a primeira viagem até aquele momento. Porém, em nada aquela cena se assemelhava a tudo o que um dia fora...

O paradoxo do tempo e a desorganização se apoderaram de suas motivações, como uma série de equívocos e inconsistências, funcionando engenhosamente. Em outras palavras, era como se achassem uma complexa engrenagem que unia três desconhecidos, sem qualquer interesse em comum, no mesmo espaço. Ou ainda possuíam sonhos e projetos em comum, contudo, se negavam a dizer?

O mesmo problema se dilatou para os seus dias e meses, tornado tudo mais complicado do que parecia ser... podia roubar o Time-Turner, concedido a Bartemius Crouch Junior e realizar mais tarefas. Entretanto, não queria mais desafiar Chronos, o que o outro fizera já fora mais do que o suficiente por inúmeras existências.

Com tais pensamentos, ao vagar pelos corredores de Hogwarts, se identificava como um verdadeiro estranho... alguém que não se enquadrava mais naquele contexto de pessoas imaturas, conversando a respeito de futilidades e receios menores. Snape era um jovem adulto que odiava adolescentes e as suas infantilidades constantes. Era árduo, mas, faltavam apenas meses para se libertar de tudo aquilo e nunca mais pôr os pés naquele lugar que detestava.

A solidão só não o alcançava porque, misteriosamente, Bellatrix decidira voltar a importuná-lo com bobagens, todas as vezes que o encontrava. Quase sempre, insistia em lhe mostrar fotos que havia recebido de Delphini... uma nova gracinha, um movimento ou um aprendizado, tudo era razão para que ela passasse horas comentando o quanto a filha era uma criança inteligentíssima. Na verdade, na opinião que expunha, era certamente a bruxinha mais poderosa e genial que já nascera. Ainda tinha Evan e seus problemas com a noiva, Elizabeth...

Por mais que tentasse negar, gostaria de passar mais tempo com os dois. Eram sempre bons os instantes em que não tinham nada para fazer e riam dos pequenos problemas que os cercavam... com eles, a vida parecia ser mais simples. O mesmo pensamento ocorria em Evan e Bellatrix, por também não conseguirem assimilar o que sucedera para que tivessem se afastado sem qualquer justificativa aparente.

Com tais pensamentos e conjecturações que Snape, andou com passos apressados pelos corredores até a aula de Transfiguração. Era somente mais um, entre tantos, caminhos para o profundo, absoluto e verdadeiro inferno... aquela turma era onde ensinamentos e o espaço físico convergiam em uma verdadeira câmara de tortura à sua inteligência.

Na verdade, era quase uma experiência de meditação e autoconhecimento, ter de realizar um gigantesco esforço de conviver com uma horda de idiotas, analfabetos, cabeças ocas e burros. Respirando fundo, a única certeza que o fazia querer entrar ali era que, aquele horror, algum dia o ajudariam a obter a maestria naquele campo de pesquisa.

- É a mais pura verdade, certo e muito verdadeiro. Aquilo que está embaixo é tal e qual o que está em cima. Da mesma forma, o que está em cima é idêntico ao que está embaixo. Se imaginar, vai desvendar e realizar todos os milagres de uma única coisa... assim como todas as coisas vieram do Um, elas tendem a ser únicas, por conta de uma adaptação. Aprenda que o Tudo e o Nada são o mesmo para o Universo – começou a recitar baixinho os preceitos da Tabula Smaragdina, redigida por Hermes Trismegisto, que deu início aos preceitos da Alquimia.

- O Sol é o pai, a Lua é a mãe, o Vento é quem o embala em seu ventre e a Terra é aquela que alimenta. O Pai de toda Telesma do mundo está nisso, porque o poder do agente mágico é pleno, quando se é convertido em Terra. Seja sábio e separarás a Terra do Fogo, o sutil do denso, suavemente e com grande perícia. Feita a prece sobe da Terra para o Céu, desce novamente à Terra e recolhe toda a força das coisas superiores e inferiores, para que o caminho seja completo. É desse modo que obterás toda a glória e a verdade do mundo e se afastarão todas as trevas - Snape prosseguiu fechando os olhos prestes a colocar a mão para empurrar a porta e entrar na sala.

- Nisso, ó jovem sábio, consiste o poder mais poderoso de todo o poder. Vencerás todas as coisas sutis e penetrarás em tudo o que é sólido. Se compreender isso, entenderá como o mundo foi criado e a sua fonte admirável de adaptações. Por esta razão, ele foi chamado de Hermes Trismegisto, pois era aquele que possuía as três pares da filosofia universal e, tudo o que disse, a respeito da Obra Solar foi completo e absoluto – concluiu como se tivesse realizado uma oração que o encheu de forças e o fez sorrir com a rápida ideia que lhe passou pela cabeça ao olhar para os colegas.

- Depois, eu cuspo na cara daquele arrogante do Potter que, o antepassado dele pode ter criado uma maldita poção para cabelos... contudo, sou eu que conheço toda a Tabula Smaragdina e sei a Tria Prima de Paracelsus. Duvido que esses animais assimilem os princípios mais básicos da alquimia. Certamente, explodiriam toda essa merda tentando misturar Mercúrio, Enxofre e Sal – seus olhos começaram a brilhar intensamente com tais pensamentos que não cessariam tão facilmente.

- Para completar, ainda vou roubar o amiguinho lobisomem dele, aprimorando o Acônito e o transformando em um autêntico Mata Cão – sorriu maldosamente concluindo as suas ideias que se somavam e ficavam mais claras.

- Após esses 7 anos, eu ainda me pergunto como é possível isso... essa aula é formada, exclusivamente, por imbecis! – continuou sussurrando para si mesmo, agora, arrumando as coisas sobre a mesa.

Dando um suspiro vencido e entediado, analisou a maneira que Marlene McKinnon e Lily se portavam, desesperadas, para chamar a atenção de James e Sirius a todo o custo. Aquilo somente lhe servia para constatar que elas não diferiam muito das mulheres que ficavam perambulando pelas ruas do Spinners End... a distinção estava em que aquelas o faziam para se sustentar e dar alimento aos filhos, o que não era o caso daquelas duas.

Enquanto isso, alheios aos interesses escusos que lhe estavam sendo destinados, acompanhados por Lupin e Peter, se dedicavam a importunar os alunos tidos como inferiores. Depois, se colocariam como vítimas de perseguição por parte de pessoas que invejavam o seu sucesso.

Visualizando, rapidamente, todas as opções de dupla que teria, acabou preferindo ficar no fundo da sala escondido. Não suportava ter de encarar a sombra da metade de seus colegas, com os seus constantes assuntos vazios e cíclicos, que não levavam a lugar algum.

- Olá bonitinho... eu concordo com você. Eles são todos uns merdas mesmo. Agora me responda, meu amado cunhadinho, a McGonagall já iniciou a matéria ou essa palhaçada que chamam de aula recém começou? – perguntou Bellatrix sussurrando, ainda meio ofegante, por ter de se apressar para não chegar ainda mais atrasada.

- Bella, eu já disse que não sou seu cunhado... pare com isso – resmungou contrariado, a observando se ajeitar na cadeira, como se nada tivesse acontecido ali.

Abrindo o livro, enquanto espiava a página em que o dele estava aberto, separou também o seu material. Quase mecanicamente, ambos, olharam ao mesmo tempo para a porta... se abrindo, mais uma vez, viram a entrada de Evan e Elizabeth com passos lentos para não serem descobertos.

- Faz pouco que iniciou, mas fique quieta... você sabe o quanto ela nos odeia – disse tirando o livro de perto de Bellatrix, virando rapidamente a página para que ela parasse de enrolar a execução da tarefa.

No entanto, antes de conseguirem dar os primeiros passos no trabalho solicitado, foram interrompidos por McGonagall. Detendo os outros dois antes que pudesse se sentar próximos à dupla, lançou um olhar fuzilante ao trio, excluindo completamente Elizabeth de tudo o que iria dizer. De fato, mais do que nunca, se mostrava decidida a repreendê-los devido à demora com que chegaram.

- Os senhores gostariam de compartilhar o assunto com o restante da turma? Ou preferem que eu feche a boca dos três para que não falem mais nada? – os questionou, totalmente, sem paciência e prestes a descontar os pontos da Slytherin assim que tentassem se defender.

- Não é necessário, professora... – respondeu Snape, se segurando ao máximo para não expressar qualquer afirmação irônica, pois analisava que aquilo não passava de uma armadilha.

Por mais que estivesse cansada de todas aquelas injustiças sofridas, pontuação roubada, entre outros abusos de autoridade, não teria um acesso de raiva. Muito menos, permitiria que Bellatrix rompesse os nervos e partisse para a briga... algo que estava muito próximo de suceder, se não a policiasse com atenção. Apertando a mão dela, debaixo da classe, respirava fundo, enraivecido pelos risos dos membros da Gryffindor e os cochichos relacionados a eles. Nada daquilo o abalaria, manteria o controle, olhando dentro dos olhos de McGonagall com o semblante mais calmo que era capaz de fazer.

Sem pressa, apontou com uma das mãos para a mesa, expondo que já haviam separado todo o material que seria usado para a execução do feitiço transubstancial, Depuro licor. Aliás, estavam prestes a iniciar os processos quando houve a descontinuidade pela advertência que estavam sofrendo.

- Com licença, professa McGonagall. Embora, eu tenha chegado com atraso, junto à Elizabeth, posso assegurar que estudamos como essa transfiguração remove substâncias tóxicas ou não desejadas de um líquido. A partir dessa retirada, ocorre a sua purificação absoluta – Evan complementou, aproveitando para se sentar com a noiva, nas cadeiras mais próximas.

Sua resposta, por mais correta que estivesse, recebeu um olhar de reprovação por parte da professora. Tal hostilidade incompreensível, o fez recuar e não comentar absolutamente mais nada... previu que ela estava aguardando qualquer deslize. Especialmente, depois que Slughorn havia divulgado, para toda a escola, que Snape fora aceito para um estágio de dois anos com Flamel na França.

O plano, seguramente feito por Dumbledore, era colocá-los em detenção e manchar o currículo acadêmico do aluno para que perdesse a oportunidade... que toda a Gryffindor alegava que, por direito, pertencia exclusivamente aos Potter. Isso o revoltava. Mesmo que tivesse de ir pessoalmente na reunião dos Sacred Twenty-Eight, para acusar cada um dos envolvidos, não deixaria tamanha arbitrariedade passar impunemente.

- Muito bem, senhor Rosier. Eu agradeço por me fazer recordar de um feitiço que eu ensino há anos. Decerto, o senhor deva ter mais conhecimento do que eu em relação a este tema – afirmou com os olhos cravados em Evan, que arrumava algumas coisas, para também iniciar o trabalho.

- Eu, certamente, não sei... mas, o meu irmão, inegavelmente sabe muito mais – murmurou sem virar o rosto, fazendo um gesto de negação com a cabeça.

Sua sagacidade o impedia de dar uma brecha que fosse para ser prejudicado. Era inteligente demais para cair em certas artimanhas tão malfeitas e frágeis, sobretudo, as que serviam como programa de proteção aos marginais prediletos do diretor.

- Me diz uma coisa... qual é o seu problema, sua velha louca? Ninguém aqui fez nada de errado! Evan lhe disse a resposta certa e tomou um coice ao invés de incentivo. Que bosta de escola é essa que persegue alunos? É inveja daquele porco de quatro olhos, por que ele não tem capacidade de trabalhar nem como limpador de bosta de trasgo? – Bellatrix esbravejou, afrontando McGonagall, quase dando um soco na mesa ao apontar para James.

- Cala a boca, sua doida – gritou ele em uma das fileiras da frente.

- Ah, cala a boca você, seu filho da puta, vesgo do caralho! Vai se foder - xingou já se levantando para ir brigar, fazendo com que Snape a segurasse pelo braço, para que parasse quieta.

Não suportaria mais, nem meio segundo, todo aquele teatro. Tudo estava, claramente, forjado, para prejudicá-los. Se a professora queria briga, a guerra estava declarada, dado a sucessão de absurdos que antecederam a sua explosão de raiva.

- Eu vou descontar 50 pontos de cada um, mais 20 pontos da senhorita Black pelo vocabulário utilizado em sala de aula... e, já aviso que, os três, estão em detenção por um mês. A senhorita está satisfeita? – perguntou, tendo como resposta um sorriso sarcástico e indecifrável, como se ela estivesse planejando algo mais adiante.

Porém, McGonagall não iria dar prosseguimento àquilo, dando às costas para os quatro, explicando as últimas considerações ao que deveria ser acrescido para o funcionamento do feitiço. Elizabeth olhava para Evan, e para os outros dois, sem entender nada... principalmente, a injustiça que fora cometida contra eles.

- Fica tranquila, Lilibeth... a velha vai se arrepender do que fez. Não imediatamente, porque agora eu estou ocupada, mas daqui a pouco – Bellatrix sussurrou piscando para a outra.

Em uma disputa, acirradamente, silenciosa e vertiginosa, todos se empenharam em realizar com muito cuidado aquela tarefa de nível tão elevado. Qualquer pequeno deslize, por mais mísero e irrelevante que fosse, tudo sairia do controle e acarretaria algum grave acidente, dependendo do erro. O quarteto de slytherins, no fundo da sala, desejavam competir até o último segundo... tudo para ver quem terminaria primeiro, obtendo o sucesso almejado.

Bellatrix, prestes a encerrar o trabalho e vendo que Snape o finalizara, olhou para ele fixamente, dando um sorriso zombeteiro. Com um olhar maléfico e travessamente malicioso, girou a varinha por debaixo da mesa, de forma bastante displicente e preguiçosa... em segundos, foi como se uma bomba explodisse duas fileiras à frente. Um grito desesperado ecoou e o tampo da bancada saiu voando, acertando Marlene no rosto.

Erguendo os olhos, com um ar inocente e tranquilo, para ver o estrago que fizera, ela torceu o lábio para o lado esquerdo. Dando um meio sorriso, estava mais do que clara a sua intenção. Não se importava com a dor ou com os ferimentos causados na outra que, certamente, havia perdido alguns dentes. O mais importante, era dar continuidade à atividade e encerrar o quanto antes.

Particularmente, Bellatrix não se lembrava quando fora a última vez que se sensibilizou com o sofrimento ou com o desespero alheio... talvez, quando Delphini resmungava por qualquer coisinha, seu coração se partisse. Entretanto, aquela pessoa tão pequena era um caso à parte. Era o seu amor e a sua vida, desde o dia em que a viu pela primeira vez.

Quanto ao que acabara de fazer com Marlene, estava tão orgulhosa de si mesma que, discretamente, apertou a mão de Snape e olhou em direção a Evan e Elizabeth, que disfarçavam os sorrisos satisfeitos. Sabiam que ela era a única responsável por aquele, suposto, acidente e os berros. No entanto, se iriam para a detenção por um mês, os três possuiriam uma recordação muito agradável para diverti-los e os auxiliar com o passar dos dias.

Com Bellatrix, Evan e Elizabeth, além de Snape, terem concluído o exercício antes dos demais. Especialmente, pela perfeição com que executaram o feitiço, cada um recebeu 20 pontos à Slytherin. Como também, foram encarregados de tentar transmutar um líquido em outro. Era o que precisavam... mais do que um impulso, para que se empenhassem meticulosamente no cumprimento da tarefa, aquilo era uma espécie de reconhecimento.

Terem recebido o encargo de praticarem o Fluidum, os elevava quase à categoria dos Uita Magistris ou dos Innominatum. Com os seus sucessos relativos, já nas primeiras tentativas, se envaideciam ao perceberem que chegavam muito próximos ao êxito sonhado. Porém, a felicidade fora efêmera... nada parecia ser bom o suficiente para ser duradouro naquelas paredes amaldiçoadas.

Tão logo, atravessaram à porta para se encaminharem para as masmorras, animados conversando sobre a aula de Poções, misteriosamente foram atacados ao ingressarem no corredor. Repentinamente, Snape tropeçou nos próprios pés e caiu desajeitadamente no chão. O barulho de seu corpo tombando e o material se espalhando, foi acompanhado por gargalhadas que ecoavam pelas pedras frias.

Enfurecido, diante do ataque, dada a convicção de onde viera e de quem os afrontava... foi iniciado um duelo ferrenho. Feitiços cruzavam de um lado ao outro, cercados por xingamentos e palavrões de todos os níveis e lados. Não aceitariam que uma humilhação, como ser vítima de um Unbalance, ficasse impune. Snape não seria ridicularizado publicamente.

Com algumas varinhas perdidas ou quebradas no confronto, partiram às vias de fato, trocando socos e pontapés... Elizabeth correu para pedir ajuda e, ao encontrar alguns alunos da Slytherin e da Ravenclaw, relatou rapidamente os fatos. Apressados, assim que chegaram, se envolveram na briga, batendo nos gryffindors que viam pela frente.

A gritaria chamou a atenção dos professores, que para apartar tantas pessoas revoltadas, se viram obrigados a utilizar Seorsum e do Euadunt, separando os mais exaltados. Após a repreensão e alguns encaminhados para e enfermaria, com ossos ou dentes partidos, os demais seguiram escoltados por Argus Filch até a sala de Dumbledore.

Como era esperado, o diretor, ponderou quanto às responsabilidades de cada um, colocando os gryffindors na condição de vítimas de uma barbárie coletiva. Possivelmente, em algum momento, haviam se oposto às ideias agressivas e eugenistas dos slytherins... como seres brilhantes, excepcionais e maravilhosos que eram, seus leões lutariam contra a inveja daquele covil de serpentes horríveis e invejosas.

Consequentemente, em seus apontamentos, Evan, Bellatrix e, principalmente, Snape, lideraram uma gangue cruel e sanguinária, que fora a única responsável por tamanha hostilidade. A confusão se tornou ainda maior, quando os ravenclaws, foram acusados de auxiliarem no planejamento do ataque. Eles eram os prováveis mentores intelectuais de todo o plano sórdido.

Aproveitando que o caos se estabelecera novamente, quando Greengrass decidiu dar um soco em Frank Longbottom, Sirius puxou Bellatrix pelo braço. Queria que ela lhe desse atenção e se distanciasse, junto com ele, do centro de toda aquela confusão... aquilo foi o suficiente para a deixar, novamente, indignada.

Buscando um jeito de se desvencilhar dele, procurava se debater, dando tapas para que a libertasse... estava com raiva de ter perdido a varinha, quando quebrou o nariz e Lily, por não ter outra forma de se defender. Adoraria amaldiçoá-lo naquele instante, mas não era possível, lhe cabendo apenas o morder com força para que se afastasse.

Não se dando por vencido, a agarrando pela cintura e a prensando contra a parede, Sirius tentava acalmá-la de todas as formas possíveis e imagináveis. Queria aproveitar aqueles breves momentos com Bellatrix, porém, o que conseguia era a deixar ainda mais nervosa e perigosa em suas atitudes... beijos e carinhos acabaram sendo retribuídos por uma sequência de bofetadas, um chute entre as pernas e um empurrão, que o fez cair de joelhos no chão.

- Por Merlin, bruxa... nunca mais faça isso – afirmou, com uma das mãos nos testículos, enquanto se levantava, calmamente, por conta da dor.

Gostava do jeito selvagem e complexo dela e do quanto, quando ficava brava, dominava todos os seus sentidos. Sem pudores ou vergonha de ter apanhado, não esperou que lhe dissesse nada, a beijando novamente. Entrelaçando os dedos entre os cachos desgrenhados, para adquirir algum controle, experimentava a sensação de ter as pernas de Bellatrix envolvendo a sua cintura. Aquele era só mais um capítulo do tempestuoso e violento relacionamento que mantinham há tantos anos... e seguiria sendo daquele modo ou até pior.