Narcissa estava desnorteada. Com o seu coração pulsando forte e descompassado, sua mente girava com as inúmeras possibilidades e dúvidas que surgiam em seus pensamentos. Temia a respeito de seu futuro. Entretanto, não voltaria atrás e nem pediria perdão por algo que nunca foi sua culpa. Havia feito uma escolha digna, honesta e que não afetava a vida de ninguém... a mais difícil da sua existência, por imaginar que perderia o amor das irmãs com a mesma violência e ojeriza que observou nos olhos de seus pais.
Sentindo os primeiros sinais e medos diante das consequências que a aguardavam, se encheu de coragem para seguir em frente. Com semblante sério e reflexivo, retirou os sapatos e os jogou para longe, em um gesto de abandono absoluto da sua antiga vida. Queria se distanciar daquela mansão, dos seus pais incapazes de sentir o mínimo de compaixão ante a sua dor.
Correndo, o mais rápido que pode e arrancando do corpo o vestido ensanguentado, Narcissa usou o Evanescet e o Videntur para retornar à casa em Paris... ali seria o fim de um ciclo. O término de uma vivência hipócrita e torturante, de uma criação castradora e doentia, de uma dissimulação contínua que a sobrecarregava.
Analisando a destruição que se expunha, perante os seus olhos, ofegou baixinho se enfurecendo com aquele absurdo. Para Lucius não bastara a humilhação que a fizera passar... ele havia danificado os seus pertences, deixando-os espalhados pelo chão em meio aos cacos dos cristais destroçado, e, não satisfeito, agredira a sua elfa doméstica que tentara evitar tamanho estrago.
Se sentando ao lado de Jaiane, na escada, o rosto de Narcissa mostrava toda a sua preocupação. Cada avaria, apontava para a ausência de emoções e afetos, cercando o seu entorno de sofrimentos em nome da ganância e do entusiasmo ao presenciar a amargura alheia. A sua apreensão aumentou ao levantar, gentilmente, o rosto da pequena para examinar os ferimentos e secar as lágrimas que caíam.
- O que aconteceu aqui? – perguntou avaliando os inúmeros estragos.
- Senhora Cissy... Jaiane não pôde impedir o senhor Lucius de destruir os objetos. Ele bateu muito em Jaiane e chamou de elfa má e traidora – respondeu chorando abalada por não ter tido forças para proteger à casa e, principalmente, a pessoa a qual tanto gostava.
- Eu estou mais do que convicta de que você fez o melhor que pode... Jaiane, você é uma ótima elfa e eu a tenho como uma amiga fiel. Quem falhou fui eu ao tê-la deixado tão exposta. Me perdoe por ter sido uma péssima pessoa e tão egocêntrica. Eu vou libertá-la, lhe dar o direito de escolha quanto ao que quer fazer da sua vida... eu não posso mantê-la como uma propriedade, como uma escravizada, porque você não é um objeto. Se quiser, pode partir... eu desejo, de todo o coração, que seja muito feliz – afirmou reprimindo o tom de lamentação que ousava transparecer em sua voz.
- Jaiane quer ficar junto com a senhora Cissy... a senhora sempre foi boa – confessou mexendo no vestidinho azul que ganhara.
- Bem, eu fico feliz em ter o seu apoio – falou dando um sorriso fraco.
- Como pode notar, essa combinação que estou usando não me protege contra o frio que está fazendo hoje. Façamos o seguinte, Jaiane... nós vamos realizar as nossas higienes e limpar esses ferimentos. Depois, reunimos os nossos pertences para partirmos o quanto antes. Não quero que os meus pais a encontrem e a machuquem. Sequer anseio que, algum dia, recebam notícias a nosso respeito – afirmou tentando sustentar a sua postura calma e orgulhosa.
- Se nos acharem aqui, dentro de uma hora, vão nos matar... após tudo o que eu vivi e presenciei hoje, não duvido que sejam capazes de realizar tamanha brutalidade. Dói constatar isso, especialmente, ao ter a certeza de que não passam de pessoas horríveis – concluiu com uma expressão decepcionada e temerosa.
Assim foi feito ao terminarem o asseio. Colocando na sala as caixas e as malas, Narcissa girou a varinha para diminuí-los de tamanho e guardar dentro dos bolsos do casaco. Era a melhor a ser feito para que saíssem discretamente e sem causar mais alarde. Em um rápido vislumbrar, as duas se despediram da residência e partiram.
Seus olhos lacrimejaram... secando o rosto com as costas das mãos, decidira que não iria chorar por conta daqueles que jamais a amaram. Se interrogando para onde iria, seu peito se encheu de esperanças com a chance de se deparar com um mundo normal, em que recuperaria toda a confiança que, por anos, lhe roubaram.
Exteriorizaria toda a sua força e resolução. Trilharia o seu próprio caminho, escrevendo em linhas tortas o seu destino. Alguns a julgariam, alegando que sua atitude não passava de uma completa loucura. Uma menina arrogante e mimada que renegava aos pais carinhosos e abnegados. Alguém que se revelava inescrupulosa, desprezando as regras que regiam à sociedade que a cercava. Em outras palavras, a qualificariam como uma meretriz.
Por maiores que fossem os infortúnios, era o momento em que teria de aprender a sobreviver sozinha, sem contar com a perspectiva de que receberia algum apoio ou contar com a compaixão alheia. Era preferível cogitar o pior a passar por uma nova frustração. Seu coração se achava descrente e machucado, para se permitir sonhar que lhe estenderiam a mão naquele momento de necessidade.
E se todos decidissem abandoná-la? Se a considerassem indigna? Aquelas suposições a desestruturaram e entristeceram. O que fizera para que o mundo a tratasse com tamanha crueldade e insensatez?
Da mesma maneira, percebia o quanto se sentia envergonhada de tentar procurar o auxílio de Andromeda e relatar os acontecimentos. Rodolphus, certamente, não a aceitaria na mansão e isso acabaria estremecendo o casamento da irmã... caso pretendesse lhe socorrer. Não a prejudicaria com as suas adversidades e imperfeições.
- Toujours pur... – sussurrou, ponderando o quanto tamanha vaidade acabaria por separar e destroçar toda aquela família.
Os minutos passaram lentos, com Narcissa presa às suas ponderações a respeito de tudo o que teria de resolver antes de desaparecer por alguns dias. Deixando que o ar entrasse calmamente em seus pulmões, aos poucos, foi acalmando as suas ansiedades e colocando as ideias em ordem. Era fundamental para que fosse capaz de ir adiante, com o intuito de que as suas pernas não insistissem em fincar raízes no solo que não mais lhe pertencia.
- Jaiane, me ouça. Eu acho que nós vamos para Hogsmeade, por enquanto. No Three Broomsticks sempre há alguns quartos disponíveis para os viajantes e, ao contrário do The Leaky Cauldron, estaremos seguras. A Madame Rosmerta não nos entregaria ao Lucius... ela sempre se mostrou uma pessoa bastante confiável para essas situações mais complexas – declarou com uma falsa firmeza que lhe dava a determinação imperativa para continuar com os seus planos.
- Vai dar tudo certo, senhora Cissy! Quando a senhora conversar com o senhor Snape, ele saberá o que fazer e nos ajudará. Jaiane está segura de que o senhor vai nos dizer onde podemos morar. Ele é um bruxo decente – a elfa comentou esperançosa.
- Assim espero... No entanto, não quero criar grandes esperanças quanto a isso. Severus, ultimamente, vem se expressando de um jeito muito enigmático e distante. Eu o amo... contudo, me interrogo se isso é recíproco – suspirou com um semblante desanimado.
O tempo passou depressa, intenso, desassossegado e louco, trazendo o final de semana alvo e com uma frialdade cortante. A neve caía despretensiosa, espalhando a branquidão por todos os cantos, fazendo com que os corpos se curvassem para suportar o frio intenso e a crueldade daquele mês de janeiro escocês. Parecia que o inverno jamais se encerraria, muito menos, que os problemas seriam resolvidos com alguma celeridade.
Era uma espécie de emaranhado difícil de explicar. O sentimento de ansiedade e amargura reverberava em alguns corações dentro dos muros de Hogwarts. Tudo parecia sombrio e melancólico.
Caminhando a passos largos e duros, Regulus e Bellatrix conversavam a respeito do que havia sucedido com Narcissa. Os sentimentos de raiva e impotência queimavam os seus corpos e dilaceravam as suas almas, em níveis martirizantes. Sensações ruins, barbaramente potencializadas, após receberem as cartas de seus respectivos pais, ordenando que a renegassem e a esquecessem por completo.
- Então, você conseguiu ter alguma notícia? Adiantou ter gastado o seu dinheiro? – questionava Regulus com uma expressão contrariada e nervosa.
- Já disse e repito, eu não tenho nenhuma informação... queria saber onde ela se enfiou para que pudesse encontrá-la e falar que está tudo bem. A Cissy precisa do nosso apoio, Reg... minha irmãzinha deve estar sofrendo e se sentindo abandonada – comentou, quase mecanicamente, encarando o corredor com o olhar perdido e desolado.
- Ontem, o Sirius me fez a mesma pergunta, porque está preocupado... acredita? Pelo visto, há a eventualidade dele ter descoberto que possuí algum apego com os outros. Ou, talvez, tenha parado de se admirar tanto na frente do espelho – continuou expondo e indagava, vagamente, como a situação se desenrolava.
Torcendo um pouco o nariz, ao passar por um grupo de pessoas, olhou de relance para Regulus e bufou... tudo estava a irritando e, a qualquer instante, arrumaria alguma briga para desviar os maus pensamentos que rondavam a sua mente. Seu medo era que Narcissa estivesse morta e jamais pudesse a ver novamente.
Em uma sociedade seguidora de padrões vitorianos de ética e conduta, como a que viviam, os crimes de honra eram aceitos como normais e sequer cogitados para serem levados a julgamento. Em especial, quando se referia aos Sacred Twenty-Eight, em que os homens se enxergavam como donos da carne, da alma e do sangue de suas mulheres.
Fossem suas mães, suas esposas, suas noivas, suas namoradas, suas sobrinhas ou suas filhas, todas, sem qualquer exceção, eram consideradas como suas propriedades... sempre regradas e condicionadas a seguirem cegamente às ordens, destituídas do privilégio de se opor a tais desmandos. Era chocante imaginar que nunca tamanha atrocidade seria alterada e vidas seguiriam sendo ceifadas de todas as formas.
- Meu pai e a tia Druella brigaram... está uma confusão generalizada na família, caso queiram saber. Os Rosier estão se opondo ao que os Black permitiram que fosse feito à Narcissa – Evan, com a voz ofegante, alcançou os dois mencionando a novidade.
- Como sabe? – Regulus o indagou curioso e cético.
- Minha mãe me enviou uma coruja e eu li o pergaminho agora a pouco – respondeu sério e decidido quanto ao modo que deveria proceder em tal conjuntura.
- Vocês compreendem que foi uma afronta tal fato, não é? – interrogou com a voz aborrecida.
- Não importa quais foram as mentiras que o Lucius inventou... quando meu pai declarou o Severus como filho, mesmo que ilegítimo, invalidou todo o discurso de que o sangue estava sendo manchado ou corrompido! Eu não aceito que a minha prima tenha sido banida sem uma justificativa decente – afirmou manifestando toda a sua indignação.
- Ao invocar o demônio, ele surge à nossa frente... vejam quem está brigando com uma xícara na nossa mesa – apontou Bellatrix, em direção a Snape, ao entrarem no Great Hall para o café da manhã.
- Nosso pai está prestes a ir ao Ministério da Magia reivindicar os seus direitos e amaldiçoar toda a família Malfoy, Severus... espero que ele dê uma surra naquele corrupto do Abraxas e, outra, no ensebado do Lucius – Evan se sentou ao seu lado, repassando a notícia, antes de pegar as primeiras torradas e o copo de suco.
- Todos sabem que eu não sou filho do Rosier... uma hora ou outra, essa mentira seria desfeita. A verdade veio à tona e atingiu uma inocente. Você assimila a gravidade que rondam tais circunstâncias? É por minha culpa que a Cissy está sendo tratada como uma criminosa e foi expulsa de casa, Evan! Eu não deveria ter me aproximado dela e, muito menos, ter permitido que nos envolvêssemos com tanta intensidade – Snape declarou com um olhar desesperado e triste.
- Isso jamais nos interessou... porque não importa, Severus! Desde o momento em que entrou nas nossas vidas, você sempre foi o meu irmão, meu amigo e eu invadiria aquela bosta de Ministério para jurar que o seu sangue pertence aos Sacred Twenty-Eight. Seja pelos Rosier ou pelos Prince... você não é um mestiço imundo, Severus! Você é um dos nossos, sem exceções ou impedimentos, sem nenhuma razão que deponha contra – enfatizou o outro, furioso, o olhando fixamente.
- O Lord das Trevas não iria aceitar um general que não fosse digno ou que possuísse o sangue sujo, cunhadinho. Quanto à Cissy, você não deve se martirizar... ela só lhe concedeu uma chance, como a que teve, por ter distinguido valores que a conquistaram – Bellatrix mencionou, dando de ombros, em concordância com o que o primo ressaltara.
- Regulus, alguém já entrou em contato com aquele tio de vocês? – Snape o questionou desviando o foco do assunto.
- A Andy foi à casa do tio Alphard... ele está procurando à Cissy e falou com o Arthur Weasley para que conversasse com alguns Aurors de confiança. Só aqueles que tem credibilidade com o Alastor Moody estão envolvidos nas buscas – respondeu, se levantando com um pedaço de bolo na mão, dando dois passos para se retirar.
- Aliás, eu ia esquecendo de um detalhe importantíssimo... os Marauders estão propondo uma trégua até que a Cissy seja localizada – disse, dando meia volta, para beber um copo de suco.
- Quem sugeriu? – Snape o indagou com uma expressão desconfiada e atenta.
- O Lupin veio como porta-voz do grupo... Sirius é muito orgulhoso para admitir qualquer coisa publicamente. Entretanto, estou convicto, de que está de acordo com a oferta que o amigo nos fez – explicou, limpando a boca na manga do uniforme, já se despedindo para ir ao treino de Quidditch.
- Porco... – Bellatrix murmurou, incomodada com a postura do primo, fazendo uma expressão de nojo.
- Eu aceito... contudo, diga ao Lupin, que o Wormtail não participa das buscas. Isso é irrevogável para que o acordo seja fechado! Não quero aquele rato rastreando a Cissy... ele não é confiável – reiterou, se erguendo também, sem se alimentar direito.
- Perfeito! Eu encontro o idiota do Potter, que já deve estar voltando com o pessoal da Gryffindor, e repasso o aviso. Não sei se ele irá com os outros para Hogsmeade... entretanto, sempre o esperam para conversar. Uma sugestão, que eu tenho para vocês, é irem ao Cabeça de Javali e pegarem informações com o Dumbledore legal... – Regulus concluiu, acenando para os três, correndo para não se atrasar.
- Bella? Você tem algo que pertença à Cissy? – Snape indagou, com um semblante crítico, avaliando a ideia que lhe surgira.
- Sim... por quê? – perguntou interessado no questionamento que lhe fora feito.
- Aquele chorão cheio de pulgas pode farejar onde a Cissy está. É o melhor que o Black pode fazer para nos ajudar – falou, fingindo indiferença, lutando para não revelar a angústia que dominava.
Apressado e cada vez mais inquieto, Snape se afastou de Bellatrix, Evan e Elizabeth. Seus pensamentos sombrios, se intensificando progressivamente, o abalavam e transformavam em possibilidades reais todos os cenários criados por sua imaginação. Seu espírito era puro desalento, desespero e desconsolo.
Contemplando o movimento das ruas de Hogsmeade, se via alheio a tudo aquilo, sua mente estava muito distante para perceber o que os demais faziam. Na realidade, identificava o quanto aqueles fatos o atordoaram intensamente e o seu coração doía. Presumia que eram consequências das suas faltas e do seu egoísmo... nada do que expusessem, modificariam a sua convicção de que, todo o sofrimento de Narcissa, era sua responsabilidade.
No mesmo instante, James e Lupin, debatiam firmemente sobre algo e entravam em algumas lojas. Evan e Elizabeth foram para às áreas mais afastadas, que se destinavam apenas às moradias de alguns habitantes do vilarejo. Sirius, por sua vez, seguira a sugestão dada por Bellatrix... a que ela lhe garantira ser sua, para não dar margem a que houvesse uma negativa.
Se locomovendo entre os transeuntes, atento e tenso, não se daria por vencido até encontrá-la e cumprir a sua promessa. Aspirando os odores de tudo e de todos, o cachorro de pelagem preta e brilhante, perambulava sem uma direção precisa. O que já lhe despertava uma forte apreensão... até que, parou, inalando o cheiro de jasmim com rosas vindo em sua direção.
Correndo e latindo alto, manifestava toda a sua animação, girando em torno do próprio corpo. Em segundos, estava em frente à Narcissa, quase pulando nela de felicidade. Chamando a atenção dos demais, fez com que Lupin, James, Snape e Bellatrix, fossem na sua direção. Sendo que, os dois primeiros, optaram por não permanecer muito tempo ali... constatavam que se tratava de um assunto íntimo, ao qual, não tinham o direito de participar. Snape, no que lhe concernia, optou por assistir o reencontro em silêncio e sem impor a sua presença.
- Sai daqui, Sirius! Pare de escândalo... as pessoas estão olhando – ordenou, incomodada, empurrando o primo para que se afastasse.
- Ora, priminha... você quebra todas as regras, muda a cor do cabelo e ainda me enxota, como se eu fosse um nada? Acredite ou não, todos estavam extremamente perturbados com o seu sumiço! Você deve ser maluca para nos dar um susto como esse – enfatizou arrogante, após retornar a sua forma normal, a encarando com um sorriso galanteador no rosto.
- Também, agora, eu posso garantir que me tornei o herói do dia – terminou a sua autocongratulação piscando para ela.
- A cada dia que passa, eu percebo que você nunca será capaz de se tornar alguém decente! Sirius, sinceramente, você é só um idiota presunçoso e muito mal-educado... agradeço o seu esforço, no entanto, isso não me obriga a permitir que se aproxime de mim. Eu não gosto de você – disse, com o tom ríspido e sério, o deixando confuso com sua atitude insultuosa.
- Era só o que me faltava... eu faço um favor e recebo, como gratidão, uma patada – Sirius alterou um pouco a voz a afrontando.
- Eu vou lhe dar um aviso... se você ousar levantar o tom comigo novamente, eu o amaldiçoo e essa sua varinha pequena não voltará a fazer feitiços. Estamos entendidos? Ou anseia que eu seja mais clara? – Narcissa o ameaçou semicerrando os olhos tiranicamente.
- Quanto a você, não vejo razões para que me diga o quanto eu a envergonhei e, muito menos, que eu sou uma maldita traidora de sangue... foi uma má ideia eu ter vindo para cá – salientou, dando as costas para partir, assim que avistou a irmã a olhando confusa.
- Eu não ia abandonar a minha irmãzinha perfeita... a que mais parece com uma boneca! – Bellatrix, sem pensar e um pouco assustada com a maneira dura e estranha, que Narcissa agira, a abraçou o mais forte que pode.
- Se fosse a Andy... eu teria a chutado e cuspido nela! Porém, você ainda é muito doce e gentil para lidar com toda a minha crueldade. Mesmo que tenha deixado as trevas entrarem na sua vida, eu não deixarei de enxergá-la como a princesinha loira da nossa família – sussurrou, a apertando mais forte, para que não fugisse.
- O que você quer Bella? Sei o quanto é terrível e nem um pouco amável, o que me leva a desconfiar da sua conduta... a não ser que esteja querendo bancar a rebelde ou se ache doente – falou, dando um meio sorriso, se virando para retribuir o gesto carinhoso.
- Eu me esforço para ser horrível... prometo me transformar em alguém muito pior no futuro. Porém, reconheça que eu estou sendo uma ótima irmã e espero receber a merecida recompensa. Depois, pode contar à Andy que eu a chamei de vadia – riu, se distanciando um pouco para olhá-la nos olhos.
- Como ela está? – Narcissa a questionou incerta.
- Apreensiva e triste desde que você desapareceu... a Andy e o Rodolphus reviraram os vilarejos bruxos e algumas cidades tentando descobrir onde você havia se escondido. Chegamos a pensar que estivesse morta – Bellatrix respirou fundo, ao comentar essa última parte, bloqueando as lágrimas que surgiram.
- Eu sinto muito... não esperava que vocês sofressem. Sendo bastante franca, eu cogitei que fossem me desprezar na primeira chance que surgisse – confessou com uma expressão comovida.
- Bom, eu vou passear com o Sirius um pouco, antes de retornarmos para Hogwarts. Vamos mandar uma coruja avisando a Andy que a encontramos... acredito que obrigarei o Sirius a expor os garranchos dele para relatar, ao tio Alphard, que você está bem e segura – disse, abrindo um grande sorriso atrevido e cheio de intenções não reveladas, olhando em direção ao primo que assentiu.
Sem dar tempo de resposta para Narcissa, Bellatrix saiu o puxando pelo braço, com uma certa pressa. Seu coração se mostrava leve e tranquilo, diante da constatação de que a irmã se encontrava sã e salva, o que lhe possibilitava pôr em prática outros planos. Aproveitaria, igualmente, para tirar a expressão sisuda que ele expunha após ser enxotado. De qualquer modo, o dia seria muito curto para apaziguar todas as suas vontades... principalmente, quando as horas pareciam voar.
A partida dos dois era a ocasião oportuna que Snape aguardava. Finalmente, poderia conversar com Narcissa, calmamente, a sós. Ansiava tanto por evidenciar a totalidade dos seus sentimentos e pensamentos com relação aos fatos. O problema era que as palavras lhe faltavam... jamais fora bom em expressar as suas emoções, abertamente, sem parecer confuso e obscuro.
- Cissy? – a chamou após verificar que Sirius e Bellatrix já se achavam afastados.
- É bom lhe ver novamente, Sevie... eu achei que tivesse me abandonado. Pela primeira vez, eu senti o medo genuíno de morrer sozinha e foi terrível, sabe? Ninguém tentou me socorrer e eu só me deparei com a maldade nos olhares dos outros – expôs o seu abatimento, encarando para os próprios pés.
- De modo algum eu seria capaz de uma atrocidade como essa, Narcissa! Como pôde imaginar que eu pudesse a desamparar? Especialmente, em um momento como esse, quando está carecendo da minha presença e auxílio – declarou um pouco ofendido com tal julgamento.
- Eu fui avisado do que aquele covarde lhe fez... e eu peço perdão por ter sido o responsável pelo seu sofrimento. Eu não desejava ser o causador de tanto mal à sua vida – prosseguiu, engolindo o próprio orgulho e a sensação de agravo que o oprimia, para abraçá-la gentilmente.
- Sevie? Você não tem culpa... quem me fez perder o emprego e, acima de tudo, ser rechaçada pelos meus pais, foi o Lucius – confessou se abalando com aquelas lembranças.
- Seus pais e seus tios se mostraram fanáticos e desequilibrados. No que tange àquele trabalho... ele não era importante, Cissy! As fórmulas são suas e, onde quer que esteja, você será fantástica nas suas criações. Foram aqueles idiotas que perderam ao lhe demitir... eu li aqueles contratos e, você, não disponibilizou os seus procedimentos e métodos a eles – expôs analisando todas as probabilidades e perspectivas quanto ao tema.
- Eu vou lhe proteger e a amparar... eu não faço a menor ideia de como vamos iniciar o nosso ofício ou em que lugar, contudo, eu estarei ao seu lado – assegurou, levantando o queixo dela com delicadeza, a fazendo sorrir.
- Eu amo você – Narcissa se pôs na ponta dos pés para beijá-lo, levemente, nos lábios.
- Eu também amo você, flor de Narciso perfeita! Não esqueça do quanto é inteligente, sagaz e sábia... não há nada no mundo que a impeça de conseguir o que almeja – falou, com um semblante incentivador, acariciando o seu rosto.
- Agora, me diga, onde está hospedada? – perguntou com a voz séria e tensa.
- No Three Broomsticks, acompanhada pela Jaiane... – explicou, sendo interrompida por ele, que começara a se encaminhar em direção ao bar, segurando a sua mão firmemente.
- Você virá para Hogwarts comigo... até que tudo se resolva e eu consiga a autorização necessária para lhe levar para casa – prosseguiu, evidenciando as suas ideias, entrelaçando os seus dedos nos dela.
- E o professor Slughorn? Também tem o diretor e... Severus, há muitas pessoas que devem autorizar a minha presença dentro da escola – Narcissa argumentava preocupada e temerosa.
- Dumbledore sempre declara, aos quatro ventos, que aquela bosta de colégio está de portas abertas a quem precisa! Você necessita de abrigo nesse instante e não é nenhuma estranha ou psicopata – contestou decidido, observando o olhar contrariado e de desconfiança que ela lhe destinava.
- Você está sendo muito dramático – sorriu, dando um leve tapa no braço de Snape, se sentindo feliz.
Arrumando alguns pertences, que estavam espalhados pelo quarto, averiguaram cuidadosamente cada detalhe, para atestar que nada fora esquecido. Era o momento de Narcissa partir novamente e seguir com a vida. Com novas perspectivas e esperanças, seu coração se enchia de felicidades ao constatar que uma jornada tranquila se desenhava em seu horizonte.
A começar por Snape que, em um gesto cavalheiresco, fizera questão de pagar pelas diárias. Gastando todo o dinheiro que economizara, por meses, ele se via realizado em ser capaz de fazer algo para garantir o bem-estar dela. A amava e isso era mais do que o suficiente para protegê-la e impedir que gastasse um galeão que fosse... a enxergava como sua responsabilidade e o seu maior compromisso.
Andando pela trilha aberta na neve, parando vez ou outra para auxiliarem Jaiane com as suas botinhas, conversavam amenidades e deixavam o tempo passar devagar. Não tinham pressa para as novidades que encontrariam ao cruzarem os portões de Hogwarts... quanto àquele assunto, seus corações batiam apreensivamente nervosos, ansiosos pelo o que ocorreria.
Será que autorizariam a presença de Narcissa na escola? Foi com essa dúvida que entraram, se encaminhando à sala de Slughorn, sem se preocuparem em avisar aos demais. Ambos buscavam o apoio e o consentimento que tanto careceriam ao debater o tema com Dumbledore e McGonagall... precisavam das garantias que, só o diretor da Slytherin, poderia lhes oferecer naquele momento.
Explicando, o que sucedera e o quão grande seria o seu auxílio, Snape seguia com a mão unida a dela, como se nada pudesse separá-los daquele dia em diante. Aguardando, alguns minutos, enquanto o professor refletia sobre o que poderia fazer, os dois se entreolhavam angustiados. Até que o silêncio se rompeu.
- A sua presença será muito útil, senhorita Black! Eu me achava postergando uma viagem urgente, por não ter quem me substituísse com as turmas dos primeiros anos... gostaria de poder contar com o senhor Snape, porém, ele deve se interessar apenas pelos NEWTs que se aproximam. Agora, tenho a chance de partir para obter alguns ingredientes raros para as poções – avaliou os pormenores daquela decisão com um semblante pensativo, ao mesmo tempo em que falava.
- Muito obrigada, professor! O senhor sempre se mostrou muito gentil comigo. Prometo que não irei decepcioná-lo e farei o meu melhor com essas turmas – sorriu, afavelmente, agradecida pela oportunidade que lhe era oferecida.
- Falarei com o Dumbledore a esse respeito. Não se preocupem com esse pequeno detalhe, pois, eu resolverei tudo. Enquanto isso, a senhorita pode se acomodar, no dormitório feminino do 7º ano, em companhia de sua irmã. Creio que ela ficará muito feliz ao ser informada que terá a sua presença durante estes dias – enfatizou, direcionando um olhar oblíquo para os dois, encerrando a questão.
Assentindo seriamente, se retiraram da sala, andando pelos corredores com passos um pouco apressados. Jaiane já havia ido procurar Regulus para anunciar a vinda de Narcissa ao colégio e tudo parecia bem.
Sem esconderem os seus olhares satisfeitos, Snape a abraçava, sem medo de demonstrar o carinho que sentia. Não viam qualquer razão para se ocultarem dos olhares de alguns colegas... experimentavam, enfim, a sensação de que eram livres para vivenciar as emoções e o amor que compartilhavam.
- Se quiser, após essa semana, você poderá morar na minha casa. Eu sei que o Spinner's End é um lugar horrível e que, jamais, estará à sua altura... entretanto, é o que eu posso lhe oferecer nesse instante. Ninguém entra lá sem a minha permissão, o que a deixará protegida o tempo todo – explicava apreensivo com a resposta que receberia.
- Antes que me conteste, eu gostaria de ressaltar que imponho uma condição de impedimento... eu peço que não transite por aquelas ruas sozinha. Aquelas pessoas são hostis e perigosas, em vários níveis, o que me obriga a enfatizar o quanto eu gostaria que, você, utilizasse apenas a lareira para se dirigir aos locais que desejasse – prosseguiu um pouco inseguro de impor uma condição restritiva a ela.
- Eu adoraria morar lá e compreendo toda a sua preocupação com a minha segurança. Você sempre será o meu príncipe cuidadoso e amável, mesmo que insista tanto em negar – Narcissa sorriu para ele como um brilho intenso e profundo nos olhos.
- A propósito, Flor de Narciso... você ficou mais bonita com esse cabelo de duas cores. Isso a torna muito mais rara e fascinante – comentou lhe dando um beijo carinhoso na testa.
A semana passou depressa, como se o tempo quisesse antecipar os sucessos mais importantes que estavam por vir... entre aulas, novos estudos na biblioteca, abraços, carinhos e notícias excelentes, Snape recebeu a autorização para que levasse Narcissa para casa. Usando a lareira da sala do diretor, eles entraram na residência eufóricos e satisfeitos com o que haviam conseguido.
As boas-novas o esperavam, assim que terminaram de ampliar as malas e as caixas, ouvindo batidas na porta da frente. Após alguns instantes de apreensão sobre quem se tratava, receberam a visita de Andromeda e Alphard, que se mostravam ansiosos em socorrê-los financeiramente. Era o que precisavam para dar os primeiros passos em seus trabalhos.
Narcissa produzia os cosméticos, com calma e segurança, indo algumas vezes visitar o tio para contar como estava levando a vida. Distribuindo amostras por algumas boticas e perfumarias do Diagon Alley e por Hogsmeade, não demorou muito para que as encomendas começassem a aparecer, em pequenas quantidades. Isso a alegrava... era o suficiente para se manter e prosseguir com o seu sonho.
Não demorou muito para que, Alphard, comprasse toda a produção da Parfumerie Belle Sorcières, arcando com os custos da fabricação, oportunizando a ela uma possibilidade de atender um número maior de pedidos... o deu a Narcissa uma ideia interessante e que, certamente, teria futuro. Abriria uma loja própria para vender os seus produtos.
Querido tio Alphard, como está?
Essas últimas semanas têm sido intensas com o aumento de solicitações e a alta produção de cosméticos que venho executando em casa. Nunca pensei que pudesse ser tão feliz! Em dois meses, Severus já estará formado e iniciará o seu estágio com o senhor Nicolas Flamel... um homem afável e cortês, que nos ofereceu moradia para não nos separarmos!
Acredito que, logo, nós nos casaremos e construiremos uma linda família! Só de imaginar, eu fico emocionada e radiante. O senhor será parte dela e, os lindos bebês que eu terei, o chamarão de avô. Nossa vida será, verdadeiramente maravilhosa! No entanto, não é pelos meus sonhos conjugais que estou entrando em contato, tio.
Ultimamente, venho refletindo quanto ao fato de que, nós podemos abrir uma loja e contratar, pelo menos, duas pessoas para me auxiliarem na fabricação dos cosméticos... creio que, inicialmente, poderíamos até ampliar para a venda de poções básicas. O que acha a esse respeito?
Um abraço carinhoso da sua sobrinha,
Narcissa
Não demorou muito para que a resposta chegasse... Alphard fora pessoalmente buscá-la para que o acompanhasse na procura da casa ideal em que montariam o estabelecimento. Com cuidado, junto ao tio, Narcissa andava pelas ruas com um olhar atento e criterioso. Indo em alguns vilarejos bruxos, uma semana se passara sem que nada fosse resolvido, até decidirem ir para a área que dividia o centro comercial e a parte residencial de Hogsmeade.
- Aqui será perfeito! Eu, simplesmente, adorei... – exclamou ao visualizar uma casa de dois andares, toda feita de tijolos, um pouco mais afastada que as outras.
- Você não prefere Ottery St. Catchpole, Falmouth, Caerphilly, Lancashire ou Little Whinging? Sei que sonha em morar em uma Victorian House, no Tufnell Park... a última seria mais adequada do que aqui? A não ser que, tenha mudado de ideia e, pretenda, residir nesse vilarejo – questionou um pouco receoso com o que escutaria.
- Não abandonei o meu sonho, só estou pensando em começar em uma região em que terei movimento na loja sempre. Além disso, veja... há um lago próximo e dá para ver as montanhas – comentou apontando para a paisagem atrás da casa.
- Vamos, então, examinar o interior para que eu possa observar as reformas que terão de ser feitas. Se continuar convicta de que isso é o que quer, eu entrarei em contato com os donos para fechar a compra – Alphard mencionou lhe dando passagem para que entrasse na residência.
Analisando todos os cômodos com atenção, Narcissa já imaginava como, no andar inferior, aproveitaria o revestimento de madeira para dar um toque especial. Haveria ali uma porta simples, dividindo a área de atendimento com a que seria destinada à produção dos cosméticos. Um balcão de mármore preto, cercado por plantas aromáticas e uma grande estante com as essências... pequenas mesas e cadeiras, para que os clientes tivessem conforto para realizar as encomendas e experimentar as fragrâncias.
Aos fundos, ficariam os ingredientes... a compartimentação entre aqueles que poderiam ficar em temperatura ambiente e os que careciam de um clima mais baixo, seria possível pela separação entre os andares impostas pela escadaria localizada naquele aposento. Definitivamente, um lugar dos sonhos em que realizaria os seus projetos.
- É aqui, sim, tio! A B Elixirs será um sucesso... eu estou convicta disso – afirmou confiante com os conceitos que criava em sua mente.
Por um mês ininterrupto, Narcissa se dividiu entre o Spinner's End e Hogsmeade, só podendo contar com a ajuda de Snape aos finais de semana... era difícil e cansativo, no entanto, nada que a impedisse de prosseguir. Faltava muito pouco, ainda mais, quando já possuía em mãos as certificações para o total funcionamento. Era uma questão de trabalho árduo para que tudo desse certo.
Em um dos sábados de maio, Narcissa chegara muito cedo à loja, observando quando Snape entrou acompanhado por Lupin e Virgínia. Indicando aos dois o que deveriam fazer, ele já dobrava as mangas da camisa para iniciar as suas tarefas... organizando frascos delicados para poções, arrumando caldeirões de todos os tamanhos e pesos, colocando as plantas em uma ordem lógica de nomes e aromas, lhe auxiliavam nas menores particularidades.
- Acredito que você encontrou os funcionários que eu tanto procurava, amor – Narcissa comentou, abraçando Snape pela cintura, ao apontar os outros que ainda trabalhavam.
- Sabia que a minha sugestão teria algum efeito... – respondeu com um ar orgulhoso.
