Após um longo tempo de silêncio, os primeiros raios solares invadiram as janelas da ala hospitalar, enchendo o ambiente de luminosidade e expectativas. Aquilo parecia ter servido, igualmente, para orientar os pensamentos de Snape que olhava para o teto fixamente. Seu corpo doía e sua mente refletia sobre todos os horrores que vivenciara na noite anterior. A quietude aparentava normalizar o clima e deixar o lugar estranhamente tranquilo... ou, pelo menos, era o que considerava naquele instante.

Conceitos, imagens, concepções, ideias e algumas noções de tempo-espaço, se somavam e se chocavam, enquanto ponderava quanto ao que deveria fazer. Como reagir perante tamanha barbárie? Por piores que fossem as suas idealizações, não havia feito absolutamente nada para merecer aquela tortura. Ao menos, era o que o seu discernimento o levava a crer.

O fato era que Snape se via tão absorto em suas próprias ponderações e percepções que, sequer notara a presença de Lupin, a duas macas de distância, o encarrando com uma expressão doente e de desespero... seu medo era de ter sido o único responsável por tudo aquilo e não existiam palavras ou gestos que expusessem a intensidade de sua culpa. Se incriminando, por tamanha violência e crueldade, se sentia desolado e se enxergava como um verdadeiro monstro que merecia a morte por atacar um colega inocente.

Quando chegara, minutos antes, vira o outro se debatendo, gritando e delirando por conta da febre alta e da angústia. Falando coisas desconexas, expôs quem era o seu maior inimigo... o seu próprio conhecimento se transformara quase em uma entidade sobrenatural, perigosa e hostil, lutando para defender a si mesma do restante do mundo e das mudanças que o cercavam.

Eram intensas e chocantes, as frases que proferia, como se o seu íntimo estivesse se partindo em múltiplos pedaços. Consequências, de uma agressão inenarrável, que se ampliavam e se tornavam muito maiores do que os cortes e os ossos quebrados. Eram marcas antigas, forjadas a ferro em brasa na alma que se abriam, sangrando novamente.

Lupin assimilava cada gesto, vulto, as mais breves nuances na expressão de mortificação que vinha de Snape. Isso o destruía de um modo inexplicável... se fosse real o que lhe disseram, Sirius havia ido longe demais. Entretanto, existiam lesões que ele seria incapaz de infringir em outra pessoa. Aquilo ia mais além do seu sadismo habitual. Alguém se aproveitara do ataque para extravasar toda a sua selvageria desmedida. Mas, quem seria capaz de tamanha atrocidade?

- Você vai ficar me admirando por mais tempo ou já foi o suficiente? – Snape o questionou, o encarando, incomodado.

- Me desculpe por tudo o que houve à noite passada... por mais que tenham me garantido que eu não sou o causador, eu quero enfatizar o quanto eu sinto muito – respondeu, franzindo o cenho, enquanto pesava as palavras que iria utilizar para ingressar no assunto.

- O seu passeio noturno para admirar a Lua Cheia não o torna responsável pela minha desgraça. Aqueles delinquentes, a quem você chama de amigos, foram os únicos executores de tudo isso – afirmou, com o olhar ainda fixo no rosto do outro.

- Você se recorda quem fez isso? – indagou, se arrependendo logo depois.

- Sim... – falou brevemente, dando um bufo baixo de aborrecimento, não se dando por vencido de imediato.

- Sei que você quer saber os detalhes, Lupin. Eles me aguardaram na saída da biblioteca e bateram com uma tábua no meu rosto. Aproveitando que eu estava atordoado pela pancada, os três, me carregaram até o canto em que eu fui encontrado. Potter riu várias vezes ao assegurar que jamais seriam pegos, pois se apreendessem as varinhas, não localizariam feitiços de agressão... – Snape deu uma pausa, como se visualizasse alguma coisa diante de seus olhos, antes de prosseguir.

- Eu fui chutado e esmurrado diversas vezes. O Black cuspiu no meu rosto e me chamou de morto de fome, como sempre faz. Potter urinou em cima de mim, ressaltando que era o último líquido que eu beberia na minha vida, porque eu seria morto. Então, se divertindo com toda aquela tortura e progredindo com os insultos, o Wormtail descobriu a minha navalha no bolso e começou a me cortar. Foi uma sugestão do Black e do Potter que ele afiasse as unhas sujas e rasgasse a minha pele... era uma boa maneira de infeccionar as feridas que estavam sendo abertas – concluiu zangado e concentrado nas próprias frases.

- Eu não sei o dizer ante ao que me relatou... eu, em momento algum, imaginei que eles seriam capazes de ir tão a fundo em uma vingança – Lupin sacudiu a cabeça em negação horrorizado com o que escutara.

- Eu faria pior e me alegraria em assistir a miséria de cada um deles. Contudo, o meu método é solitário e mais eficaz do que o de todos aqueles tolos juntos – apontou sem sentimentos nos olhos.

- Mas... – tentou dizer algo que se perdeu em meio a interrupção abrupta de Snape.

- Não há espaço para a palavra "mas" ou arrependimentos, Lupin! Você é um maldito lobo... quando irritado deixa transparecer a sua animosidade no jeito que encara as pessoas. Contudo, é um hipócrita que insiste em provar que é uma boa pessoa, quando ninguém aqui é ou será capaz de se tornar algum dia. Honestamente, você não passa de um fraco, omisso e apenas me serve de cobaia na Elixirs – expôs com uma sinceridade fria e calculada.

- Ótimo, seu idiota! Quer saber qual é o seu destino, Snape? Você vai morrer sozinho porque usa as palavras para machucar os outros gratuitamente. Eu não vim até aqui somente para curar as minhas lesões, mas para ver como você estava e oferecer a minha amizade. Só que... esqueça! Você é incapaz de deixar de ser um completo estúpido e de dar coices em quem se aproxima – deu um murro na mesa, revoltado, se levantando para se retirar.

- Isso, corre atrás deles com o rabo entre as pernas – murmurou cruzando os braços junto ao peito.

- Farei isso, em contraposição a você que crê cegamente no seu sarcasmo como algo brilhante e singular... Snape, você não passa de um completo imbecil! – exclamou batendo com a porta.

Aproveitando o silêncio, que se restabelecera na ala hospitalar após a discussão, sua mente estava barulhenta com as melodias de Riders On The Storm, The End e Break On Through (To The Other Side), da banda The Doors. Progressivamente, ficava mais convencido de que manter o seu espírito distante, o ajudava a analisar e avaliar todas as possibilidades a respeito de como iria dar os seus próximos passos.

Independente da opinião alheia, iria sair daquela cama e fazer as duas últimas provas, de Aritmancia e História da Magia, que faltavam para encerrar os seus NEWTs. Não era uma mera questão de orgulho... se tratava da convicção que aqueles exames seriam os portais que restavam para sair daquele inferno.

Estava ansioso para se livrar daquele ambiente opressor, que sempre lhe fora hostil e discriminatório, e, seguir em direção a uma vida muito mais digna. Sua convicção de que esse era o seu único e melhor caminho, se preciso fosse, o levaria a se arrastar até o Great Hall e prestar as avaliações. Ninguém lhe roubaria o direito de se formar com todas as honrarias merecidas. Essa era a única verdade que lhe interessava.

Em outro ponto de Hogwarts, Narcissa andava com passos largos e decididos, relendo a carta que Bellatrix lhe enviara. Seu peito queimava e o seu coração palpitava aceleradamente em função da raiva crescente que a consumia. Não permitiria que, toda aquela barbárie narrada, passasse impune. Dumbledore teria de fazer alguma coisa... a sua displicência e a sua inaptidão para lidar com tais absurdos, não encontravam mais espaço diante da obrigação de preservar o bem-estar físico e o psicológico dos alunos.

Seus pensamentos eram fortes, cruéis e firmes, enquanto se encaminhava para a sala do diretor para debater o assunto. Nada a abalaria ou faria que declinasse da sua opinião. No mínimo, Sirius teria que ser expulso e impedido de se formar com os demais. Definitivamente, ele não merecia as oportunidades que a vida lhe oferecera desde o dia de seu nascimento... e, com tal raciocínio, entrou no gabinete com o semblante sério.

Se sentando, em uma das cadeiras, Narcissa começou a analisar os detalhes daquele ambiente. Lembrava de ter entrado ali uma única vez, quando tinha 15 anos, em função de uma briga. Bufando baixinho, incomodada com a recordação de ter jogado água no rosto de Lily e todos os abusos que ocorreram depois, se levantou estressada. Sua fisionomia denunciava a total aversão que sentia de tudo aquilo... sobretudo, porque sua memória insistia em mostrar como fora a detenção de 3 meses que recebera.

Respirando fundo, tentava afastar a forte sensação de tédio, desprezo e aversão àquele ambiente. Como pudera esquecer daqueles infindáveis dias limpando banheiros e quase perder o seu distintivo de monitora? Como foi capaz de imaginar que, futuramente, os seus filhos vindouros estudariam ali? Reconhecia que, as políticas internas que eram desenvolvidas, mudariam o regime de arbitrariedade e favoritismo, dentro daquelas paredes opressoras.

Aquela escola não passava de um lugar inseguro, hostil, autoritário, discriminatório e atroz, a todos os que não se enquadrassem nos parâmetros ditados por Dumbledore. A óbvia predileção e proteção aos gryffindors, comprovavam as inúmeras práticas de injustiça, violência e tráfico de influências que rondavam aqueles corredores planejados para sujeitar aos que eram excluídos.

Após minutos intermináveis, escutando com absoluto desinteresse, os detalhes do que lhe fora dito, Narcissa iniciou uma forte discussão com o diretor. Se irritara com as atitudes e a postura dele ao descrever como a conduta de Snape fora a única causadora do ataque que sofrera. Não admitiria que, quem quer que fosse, expusesse o seu namorado de maneira tão pejorativa e preconceituosa. Especialmente, quando ouvira o quanto Sirius e os demais eram inocentes, ameaçando expor publicamente o comportamento nocivo do outro com os colegas.

Com palavras serenas e aparência tranquila, adotava um procedimento intimidador, prometendo denunciá-lo ao Ministério da Magia. Ainda mais, quando considerava a seu favor o fato de que Abraxas Malfoy, adoraria ordenar uma investigação aprofundada a respeito da vida daquele que humilhara o seu único filho.

- Ora, senhorita Black, entendemos que o senhor Snape destratou e brigou várias vezes com o seu primo. Isso sem considerar a sua constante agressividade para lidar com os demais, que em nenhuma hipótese revidaram, tais ofensas. Perceba que, não há um professor em Hogwarts que desconheça o quanto aquele rapaz pode ser dissimulado e mentiroso... o modo que ele a trata não se estende aos demais. Por isso, a aconselho a abrir os olhos com relação a esse ponto – Dumbledore argumentou, enfaticamente, em tom acusatório e difamador.

A examinando a cada frase, com um olhar analítico e falsamente bondoso, julgava estar atingindo o seu objetivo de desestabilizá-la. Se tivesse o poder de afastar os dois, manipularia ao máximo para alcançar o seu propósito. Narcissa, por sua vez, o encarava com uma expressão de ódio genuíno... o que o incentivava a continuar com as suas conjecturações sorrateiras e injustificáveis. Confiava que ela não seria páreo ou empecilho ao seu projeto de ascensão ao poder.

- Eu julgo que isso deva ser hereditário. Por mais que um ser tente mudar a sua essência, a natureza lhe conduz ao seu verdadeiro e único eu. Não há como alterar, de repente, os seus sentimentos, pensamentos e atos... especialmente, quando o seu ego transitorial é um eterno parênteses e impedimentos negativos, levando a resultados ocos ou fantasiosos. De qualquer forma, a senhorita deve ter conhecimento do tipo de pessoa que o pai dele era... logo, com quem está lidando – concluiu com um sorriso astuto.

- O senhor pode evidenciar e acentuar o quanto supõe que, o Severus, não passe de um moleque mau-caráter e ganancioso. Contudo, suas alegações vão de encontro as minhas certezas e, perante elas, se anulam. Como bem ressaltou, eu sei com quem eu estou convivendo e, ao contrário do que insinua, eu não me arrependo – declarou com uma firmeza assustadora na voz, não o deixando a contrapor antes que finalizasse o seu raciocínio.

- Se o Severus cometeu algum erro, eu também recomendo que deva ser punido... quanto a isso, não discordo. No entanto, não aceito que o senhor o criminalize em uma situação em que ele é uma vítima da gangue chefiada pelo Sirius e pelo Potter. Eles são marginais da pior espécie e, parafraseando as suas palavras, não há um aluno nesse colégio que não tenha passado por algum tipo de humilhação nas mãos deles – falou buscando manter a calma, mesmo que aquilo a indignasse.

- Ou o senhor esqueceu da prática de bullying contra todos aqueles que eram tidos como inferiores? Ou, quem sabe, o senhor presuma que seja normal alguém cogitar atiçar um lobisomem contra um colega de classe? Há ainda um ponto a ser levantado... já imaginou que, ao sair de Hogwarts, eu mesma posso ir ao Ministério pedir ao meu tio que coloque os Aurors para apurar quem são os únicos responsáveis por uma tentativa de homicídio? O que os pais dos alunos diriam ao descobrir que o diretor acoberta potenciais assassinos? – questionou, moderando a fúria que lutava para se anunciar, ao soltar a respiração pesada.

- Sirius pode não ter usufruído dos benefícios que um lobisomem lhe traria, mas ele rasgou a pele do Severus com uma lâmina. Há cortes infeccionados por todo o corpo dele, inclusive, próximo a região da genitália. O senhor defende algo do gênero? Severus quase foi castrado... como o senhor tem a audácia de lhe jogar a culpa?! – completou, lançando um olhar agressivo, deixando clara toda a sua repulsa e ira.

- Observo que, a senhorita, compactua com os hábitos belicosos e ardilosos, justificando o insustentável. Sejamos sinceros, não sabemos o que o senhor Snape fez para que o seu primo, um rapaz tão gentil e bem-educado, agisse de maneira tão impensada e desagradável – Dumbledore sorriu, satisfeito com o próprio veneno derramado.

- O senhor tem a capacidade de afirmar, para uma pessoa que conhece o Sirius desde que nasceu, que aquele animal é amável? Ele é asqueroso, mimado, prepotente, truculento, estúpido e cafajeste! É o pior tipo de pessoa que eu já vi em toda a minha vida... é um completo maníaco insidioso e psicopata – apontou sem alterar um tom sequer da sua voz, embora os seus olhos já estivessem em brasas.

Intimamente, Narcissa não duvidava que Snape fosse capaz de iniciar uma briga ou executar feitiços muito piores do que, aqueles que os Marauders, pretendiam empregar em seus desafetos. Se desejasse, incendiaria aquele castelo e destruiria a todos. Porém, negaria até a morte tal fato e o defenderia, se fosse necessário, de qualquer delação. Qualificava o primo como um indivíduo exponencialmente mais perigoso e atroz... especialmente, com as chances de fuga e defesa que possuía.

- Quem está resguardando um potencial criminoso é a senhorita – respondeu a olhando, como uma expressão de pseudo-afabilidade, como se lesse as suas ponderações.

- É mesmo? Entrando na sua perspectiva, eu vou lhe expor o meu ponto de vista. Se o Severus fizesse o mesmo com o Sirius ou com o Potter, nesse exato instante, ele estaria sendo mandado para Azkaban sem qualquer direito a apelação... apesar de que, eu julgue que o faria para se proteger de uma ofensiva extrema – salientou, acidamente, permanecendo na sua melhor postura inabalável e aristocrática, o encarando com um semblante de nojo.

- Eu não vou mais debater com a senhorita tais questões. Creio que já encerramos o nosso assunto – fez um gesto cortês para que Narcissa saísse, a impedindo de exprimir tudo o que considerava, ao fingir que não mais a escutava.

- Antes que eu me retire, eu aviso ao senhor que, se o Severus quebrar uma unha nos próximos dias, eu vou transformar a sua vida em um verdadeiro inferno. Porque, caso não esteja informado, eu possuo poder suficiente para fazer isso... não será o seu pacto, seus estudos, ou o que quer que seja, que irá me impedir – ameaçou, segurando firme a varinha, dando dois passos em direção a ele.

- O senhor pode ter até dedicado a pesquisar tudo o que tenha relação com os Black... no entanto, nunca deve ter chegado nem perto da revelação dos níveis de magia que, somente as mulheres da minha família aprendem desde que nascem, não é mesmo? Eu lhe garanto que são terríveis e, acima de tudo, que o Sirius possua qualquer noção do que se trata. Igualmente, sugiro que nem se esforce em aliciar as minhas irmãs ou a minha tia, porque elas optariam pela morte a ter de propagar os nossos segredos para gentinha – atestou, dando às costas para partir, sem a pretensão de retornar algum dia.

Sua execração e ímpeto eram palpáveis, lhe queimando as entranhas, quase a obrigando a dar gritos para extravasar o seu ódio. Sobretudo, quando refletia o olhar de satisfação de Dumbledore ao acusar, indiscriminadamente, Snape para salvaguardar os Marauders. Com os passos lentos, mantinha o seu caminhar imponente e altivo, como se nada sucedesse para que se desassossegasse ou alterasse o seu ânimo. Não daria esse gosto de vitória àqueles a quem julgava insignificantes.

- Aqueles imbecis vão se arrepender amargamente pelo o que fizeram com o Severus – murmurou para si mesma, ansiando em encontrá-los, cogitando o tipo de vingança que executaria.

Demorou poucos minutos para que pudesse pôr o seu plano em prática. Avistando Sirius conversando, animadamente com Potter e Pettigrew, se esgueirou para esperar o momento certo. Olhando para os dois lados, examinou pormenorizadamente o que acontecia à volta, sorrindo ao constatar que eles estavam se separando. Isso lhe facilitaria a ideia de enfrentar um a um.

- Cadere – pronunciou, assim que se dispersaram, derrubando Pettigrew no chão.

- O que faz aqui, maldita traidora de sangue?! – proclamou com a voz estridente e temerosa.

- Vim presenteá-lo, rato imundo... Conscidisti – sussurrou, abrindo o primeiro corte, causando uma dor imensa que o fez urrar de dor.

- Você e aquele bando vão gritar muito nos próximos dias... confie no que eu lhe digo – Narcissa murmurou com uma expressão sórdida e sombria.

Assustado, com o olhar raivoso que recebera, junto à tortura, sentiu o seu coração batendo mais forte e aflito. Nem nos seus pensamentos mais obscuros, cogitava o que ela seria capaz de fazer... o que observava ali era uma espécie de divindade do mal lhe rodear, se divertindo com o seu suplício e o verter de seu sangue.

- Os meus amigos vão aparecer... você vai se dar muito mal. O Prongs vai lhe surrar, como o Malfoy deveria ter feito, espere para ver – advertiu, com um tom raivoso, tentando esconder que urinava nas próprias calças de medo.

- Eu meditei se deveria ser bondosa com você... entretanto, o que receberá agora é pouco, ante a afronta feita a quem lhe é infinitamente superior – mencionou indiferente aos xingamentos.

- Onde estão aqueles vagabundos? Vamos, Wormtail, revele! – ordenou, prensando o salto de seu sapato, contra o rosto de Pettigrew.

Sentindo a sua magia elemental oscilar, de um jeito assustador e preocupante, Narcissa permitiu que fosse criada uma atmosfera fria no entorno dos dois. Era o que bastava para lhe dar a coragem, que faltava, para prosseguir no seu intento. A retaliação principiava de um jeito, extremamente, promissor.

Antes de sair, o fez bramir como um animal ferido, lançando o Lacriman... rasgando não só as roupas, lhe despedaçava toda a dignidade que lhe restava até aquele instante. As ponderações dela, em tal ocasião, eram violentas e confusas. Será que não havia ido um pouco além do oportuno, no empreendimento, daquele ato? Ou, fora muito pouco, diante do que aquele ser merecia receber, depois de todo o mal que fora um dos agentes?

Reputando e pesando o jeito que agira, seu senso e o seu discernimento, colidiam e alimentavam a fúria que imperava em sua alma. Cada célula de seu corpo tornava as suas vontades mais intensas e brutais. Não toleraria que alguém se atrevesse a machucar aquele a quem amava.

Particularmente, enquanto raciocinava quais eram os próximos movimentos, não fora difícil localizar Potter se exibindo para os demais alunos... igualmente, sequer existiu qualquer tipo de esforço ou sacrifício para atacá-lo. Em uma dura e rápida sequência de Unbalance e de Expelled, o fez se desequilibrar e atravessar uma grande janela de vidro. Certamente, aquilo lhe proporcionaria uma bela cicatriz na face, uma hipótese que a deixava feliz.

De fato, considerava que seria uma lembrança excelente para recordar quando estivesse entediada ou chateada. Se unindo aos demais, que olhavam o revés com curiosidade e um pouco de contentamento, disfarçava para melhor analisar tudo e todos. Queria localizar Sirius e sanar a sua gana de enfiar a varinha na garganta dele... até que implorasse por perdão ou morresse sufocado pela própria arrogância.

- Veio visitar o Snivellus? – a voz inquisitiva, de quem procurava, soara próxima ao seu ouvido.

- Não o chame assim... – pressionou a varinha contra a região do baixo ventre dele.

- Você se aproveita, priminha, que eu não posso cobri-la de porrada... tem muita sorte por ser mulher, admita. Sendo bem sincero, espero que fique feliz que eu não perca o meu tempo espancando gente tão fraca quanto você – comentou arrogante, cuspindo cada sílaba de um modo debochado, sem medir as consequências que lhe aguardavam.

- Estou à disposição, caso queira tirar a varinha daí e pegar nele... me sinto bastante convicto de que jamais experimentou um homem de verdade e, a Bella, não se chatearia caso eu decidisse fazer esse favor – riu abertamente, até ter toda a sua zombaria encerrada, recebendo uma bofetada no rosto.

Em meio segundo, sua expressão de ironia se transformou em agonia intensa, experimentando uma sensação claustrofóbica de ser esmagado contra o chão. O ar se transfigurava em um tipo de gás venenoso, o asfixiando e o matando aos poucos. Em que conjuntura Narcissa atingira tamanha lucidez quanto aos níveis da via sinistrae e da via dexterae?

Sua mente estava perdida e vagava... apenas Andromeda, das mulheres da família, atingira o nível de uma bruxa cinzenta e transitava pelos dois lados. Durante o tempo em que se debatia, se formavam sombras perante os seus olhos, escutando sussurros incompreensíveis e aterradores. Aquele seria o seu fim.

O pouco que deduzia, o instigava a crer que se tratava do Verbis Diablo, a magia das trevas que sua mãe tantas vezes se orgulhara de dominar com precisão. Isso o aterrorizava, mas, não se daria por vencido e menosprezaria a própria desgraça.

- Não ouse me enfrentar... eu estraçalho você sem qualquer remorso, como faria com qualquer verme da sua laia, seu covarde obtuso! Eu já castrei aquele anormal do Pettigrew e, quanto ao seu namorado, eu o amaldiçoei antes de o jogar pela janela. Potter sucumbirá em sua insolência e empática. Contudo, isso não me basta, Sirius. Ele carregará a vadia mudblood para a ruína – mencionou sorrindo maleficamente para ele.

- Você se converteu a uma aberração, Narcissa! – afirmou, colocando as duas mãos na própria garganta, lutando para retirar o tormento que o estrangulava.

- Não querido... eu sou meramente uma bruxa que prestou atenção aos ensinamentos que lhe foram dados por anos. Você deveria ter feito o mesmo – contestou ironicamente, se distanciando da cena que se desenhava.

Apreciando os primeiros gritos de dor, resultantes dos espasmos fortes e o surgimento de feridas putrefatas se espalhando pelo corpo, visualizava as imagens de deterioração e horror que se formavam em sua consciência. As maldições que lançara sobre cada um, durariam por dias, e se ampliariam por toda a pele. Com um sorriso sádico, Narcissa, assentava a sua confiança de que, pelo menos, aqueles três ficariam impossibilitados de ferirem outras pessoas. Do mesmo jeito que, não alcançariam mais o futuro glorioso que lhes fora prometido.