CAPÍTULO II

Mais tarde, no Talon

A cafeteria estava toda enfeitada com faixas, balões de gás e cartazes da campanha de Jonathan Kent. Várias pessoas seguravam pequenas bandeiras e usavam chapéus vermelhos com estrelas azuis, e aguardavam ansiosas o resultado das eleições senatoriais. Jonathan e Martha acabavam de chegar, e ele a ajudava com o casaco.

"Pode me ajudar com isso?" perguntou Martha então ao marido, entregando-lhe o colar que havia se desprendido para que ele novamente o abotoasse.

Jonathan sorriu, e o abotoava para a esposa, que segurava ao alto as madeixas.

"Só mais um distrito e você pode começar a pensar na idéia de ter uma residência em Topeka" disse ele.

Martha sorriu, e ele continuou:

"Mas o quê quer que aconteça, meu bem, a única grande vitória que eu considero na minha vida toda foi ter conquistado seu coração"

Emocionada, Martha se virou para Jonathan, sorriu, e os dois se beijaram.

Subitamente, alguns fotógrafos que estavam em meio à multidão se aproximaram e vários flashes iluminaram o casal Kent:

"Sr. Kent! Sr. Kent!" chamavam alguns deles.

"Eis o homem do momento!" exclamou alguém.

Após se desvencilhar dos fotógrafos, Jonathan viu Clark emergir no meio da multidão. Notou, então, que havia alguma coisa errada com ele. Naqueles últimos dias, via o filho sempre triste e diminuído, e isso o deixava muito preocupado. Algo o incomodava, e ele estava distante, pois não parecia compartilhar da mesma emoção que tomava conta de todos os demais presentes.

"Tudo bem, filho?" perguntou, preocupado.

"Tudo bem" respondeu Clark, com um pequeno sorriso.

Com a mão apoiada no ombro de Clark, Jonathan insistiu:

"Filho, o quê ouve?"

Clark encarou seu pai. De todas as pessoas, Jonathan era a única a quem ele não conseguia esconder coisa alguma. Seu pai era a pessoa que melhor o conhecia. Um olhar seu, já despontava a certeza em Jonathan de que alguma coisa estava errada. E embora aquele fosse um momento de grande expectativa, precisava dizer o que o atormentava:

"Lana e eu... acho que agora não tem mais volta"

De repente, ele levantou os olhos em direção à porta, e viu Lana que, um tanto distraida, ao vê-lo, afastou-se para o outro lado do Talon, onde poderia ficar o mais longe possível dele. Sem perdê-la de vista, porém, Clark a viu então enfiar a mão no bolso do casaco e tirar o celular, depois, saiu apressada. Na esperança de que ainda pudesse ter a chance de falar com ele, Clark simplesmente suspirou.

Jonathan enrugou a testa e o encarou com firmeza por alguns instantes, até que disse:

"Filho, nunca pensei que um dia fosse dizer isso, mas depois de ver o quanto esse relacionamento só lhe trouxe tristezas e ressentimentos, começo a ter certeza de que Lana talvez não seja a pessoa ideal para você -"

Clark, que ainda olhava em direção à porta por onde Lana havia acabado de sair, virou-se para o pai, visivelmente surpreso com o comentário.

"Mas pai, se não é Lana, então quem é a pessoa ideal para mim?" indagou ele, com o olhar cheio de tristeza.

Jonathan suspirou, e desejou saber a resposta para aquela pergunta. Fitou Clark nos olhos, e sorriu um sorriso amargo.

"Talvez se você não se desgastar tanto na tentativa de encontrar o que acredita ser o relacionamento perfeito, vai enxergar o que pode estar bem diante dos seus olhos" disse ele, simplesmente, embora não estivesse muito certo do significado daquilo.

Clark sorriu com o canto dos lábios, confuso com o conselho paterno, quando, de repente, todos ficaram em silêncio para ouvir o noticiário local, que apurava os últimos resultados da eleição.

Jonathan e Clark se viraram para ver:

"E agora, os números finais apontam -" disse o âncora local. " -Jonathan Kent é o Senador eleito!"

Todas as pessoas no Talon aplaudiram e se viraram para ver Jonathan, que não conseguia conter o sorriso, e se virou, com uma expressão de grande surpresa para Clark, que o puxou para um abraço orgulhoso, enquanto uma também sorridente Martha Kent atravessava a multidão para encontrar o marido e abraçá-lo também.

Entre muitos sorrisos, Clark percebeu que alguma coisa estava errada. Embora o barulho de todas aquelas pessoas festejando fosse ensurdecedor para ouvidos normais, ainda assim, havia um silêncio incômodo. E ele notou que alguém que esteve por perto durante toda a campanha não estava ali. Uma pessoa, sem a qual, talvez seu pai não tivesse vencido a eleição. Justo aquela a quem ele acreditava que já não suportava mais ter por perto.

Clark então se virou e olhou ao redor. Não havia qualquer sinal dela. Ele então olhou para o alto das escadas do Talon, e que davam acesso ao apartamento de Lois. Com sua super-audição, Clark ouviu uns ruídos estranhos, como estalos elétricos e água correndo, e entre esses sons, uma tosse quase inaudível, a qual reconheceu ser de Lois.

Apressado, desvencilhando-se das várias pessoas que se atravessavam na sua frente, Clark subiu os degraus, e ao chegar ao piso de cima, abriu abruptamente a porta do apartamento.

Viu, então, que havia água por todo o chão, a torneira estava aberta, e uma torradeira ligada à tomada caída ao chão, onde a água começava a bater, causando os estalos elétricos que ele havia escutado. Aproximou-se, e por trás da mesa da cozinha, viu Lois caída, desacordada, porém mexendo a cabeça e emitindo uns gemidos inaudíveis.

"Lois!" exclamou.

Mas ela não se mexia. E, mais do que depressa, Clark a tomou nos braços e a levantou do chão, no exato momento em que a água avançou de vez contra a torradeira, causando uma descarga elétrica que se alastrou por todo o piso molhado, culminando, ainda, num curto-circuito que deixou o Talon às escuras.

Preocupado, Clark olhou ao redor, imaginando o que poderia ter acontecido, e depois voltou o olhar para Lois, em seus braços, que lentamente abriu os olhos, e murmurou:

"Você..." e sorriu. "Eu sabia..." continuou, com os olhos fechados. "A capa vermelha..." e desmaiou novamente.

E Clark suspirou, sem entender os delírios de Lois, mas aliviado por tê-la encontrado a tempo.

Enquanto isso, na festa da comemoração

Todos estavam se retirando do Talon, em razão da falta de eletricidade, porém, a alegria era geral e constante por conta dos resultados da eleição, e Jonathan, sorrindo e ainda cumprimentando alguns conhecidos e eleitores, atendeu o celular que tocava incessantemente no bolso do seu paletó:

"Sim, quem fala?" perguntou, sorridente, imaginando se era mais alguém para congratulá-lo.

"Quero lhe dar os meus parabéns, Senador!" disse Lionel, falando enquanto dirigia. Jonathan parou de sorrir. "Agora que venceu a eleição, há algumas coisas das quais precisamos discutir -"

Enquanto isso, na mansão Luthor

No escritório, iluminado apenas pela luz da lareira, Lex servia dois copos de uisque, tentando não derramar para fora. Sorriu, visivelmente embriagado, depois fez um brende, e bebeu de uma só vez de um deles.

"Lex, você está bem?" perguntou Lana, aproximando-se dele. "Você parecia chateado na mensagem que me mandou pelo celular"

Lex se virou para vê-la.

"Eu não deveria tê-la chamado... eu não deveria ter feito muitas coisas... mas de um jeito ou de outro, sempre acabo fazendo" disse ele, virando-se para pegar o outro copo cheio. "Tenho certeza de que você quer voltar para a festa, então -"

"Na verdade, eu estava meio que procurando um motivo para sair de lá" disse ela, com o olhar perdido.

Surpreso, Lex arqueou a sobrancelha e se aproximou.

"Clark e eu tivemos nossa última discussão" explicou ela, encarando-o, como se esperasse algum consolo. Naqueles dias, sua proximidade com Lex fazia-a sentir-se nesse direito. Ele vinha sendo seu melhor amigo. Confidenciavam não apenas sobre o dia da segunda chuva de meteoros, mas também, sobre os acontecimentos misteriosos em Smallville.

Houve um grande silêncio, enquanto Lex pensava em como responder àquilo. Ele então se aproximou o bastante dela, e levantou uma mão para tocar sua face, mas ele não o fez, ainda.

"Última?" indagou ele, evitando um sorriso de satisfação.

Os dois trocaram um longo e profundo olhar.

"É -" respondeu ela, afastando-se dele, e olhando ao redor. "Sabe, por muito tempo fiquei esperando que a armadura se rompesse, então passei a acreditar que se fosse paciente o bastante, talvez um dia ele me deixasse entrar nela, mas acho que as pessoas têm armaduras por algum motivo, então -"

"Lana" interrompeu Lex, aproximando-se novamente dela. "Odeio ter que dizer isso, mas acho que é possível que o Clark nunca confie em você -"

Confusa, Lana o encarou.

"Não entendo" disse ela. "Como pode uma pessoa mentir para quem ama?"

Lex então colocou o copo com uisque na mesa, e se aproximou o bastante de Lana para colocar uma mão em sua cintura e outra em sua face.

"Eu não devia -" disse ele.

E Lana o encarava nos olhos. Talvez eles devessem, era o que ela pensava. Gentilmente, com o consentimento que Lana lhe dara com aquele olhar, Lex a puxou para si, e os dois se beijaram. E Lana cedeu, abraçando-o, e retribuindo o beijo, no qual buscava esquecer todos os seus problemas e, principalmente, Clark.

Pouco depois, no Talon

Em frente à cafeteria ainda havia muita agitação. Amigos e eleitores de Jonathan Kent ainda estavam por perto. Bombeiros verificavam se havia mais algum perigo no apartamento de cima. Eletricistas consertavam o blackout. E paramédicos levavam Lois numa maca, cercados por várias pessoas.

"Preciso mesmo de uma audiência? Por favor, voltem todos à festa! Não se incomodem comigo! Ainda tem muito bolo de chocolate e nove caixas de Merlot!" exclamava ela, agitada.

"Lois, você ficou muito tempo desacordada" disse Clark, sorrindo, enquanto ela era levada até a ambulância. "Precisa ver se está tudo bem -"

"Eu tenho mesmo que ir ao hospital? Só porque fiz um pouco de sujeira na festa?"

Clark sorriu. Só mesmo Lois para achar graça de uma situação que poderia ter terminado tão tragicamente, pensou ele.

"Você vai junto?" perguntou o paramédico a Clark, referindo-se ao fato dele ir na ambulància com Lois.

E antes que ele respondesse, ela se sentou na maca, já dentro do carro:

"Ah, não! De jeito nenhum! Nem pense nisso, Smallville! Era só o que me faltava!"

Clark sorriu.

"Tudo bem, Lois" disse ele, tentando acalmá-la. E quando ela se deitou novamente na maca, novamente mais calma, ou pelo menos, mais calma ao estilo Lois Lane de ser, ele completou, apenas para irritá-la: "Eu não ia mesmo!"

Lois então abriu a boca, indignada, e antes que dissesse mais alguma coisa, o paramédico fechou a porta da ambulância, para alívio de Clark, que sorriu.

"Não se preocupe" disse o paramédico. "Ela está bem, claro, tirando o fato de que fala demais, e que praticamente tivemos que amarrá-la na maca para poder levá-la, como você viu. Vamos fazer uns exames de rotina para ver se está tudo bem e ela vai ficar em observação por algumas horas"

Clark assentiu, e o paramédico deu a volta no carro para entrar pela porta do lado do carona.

"Clark!" chamou Martha. "Você viu o seu pai? Eu não o encontro em parte alguma!"

"Ligou no celular?"

"Liguei, mas está desligado" respondeu ela, preocupada.

"Procuram o Senador?" perguntou um dos assistentes da campanha. "Ele recebeu um telefonema que parecia urgente, e foi embora. Parece que a Srta. Lane deixou as chaves do carro dela com ele, e pediu para entregar, caso precisassem" disse, entregando-as para Martha.

Clark olhou para a mãe, e disse:

"Ele deve ter voltado para a fazenda"

"Bom, nesse caso, acho que devemos ir também -" disse ela, confusa com a saída repentina do marido.

Clark concordou, e acompanhou a mãe até o carro de Lois, estacionado do outro lado da rua.

"Por que você não vai indo?" perguntou ele. "Eu encontro com vocês mais tarde"

"O quê vai fazer?" perguntou Martha.

"Não sei se devia" disse ele. "Mas acho que o Lex pode não estar se sentindo muito bem. Talvez fosse melhor passar por lá para ver como estão as coisas -"

"Não sei se é uma boa hora -" sugeriu Martha. "Com a vitória do seu pai, ele pode não recebê-lo muito bem -"

"É estranho. Mas algo me diz que eu devo ir"

Martha inclinou a cabeça, pensativa. Não duvida nem um pouco da intuição do filho.

"Se você acha que deve -" disse ela, sorrindo.

Clark sorriu.

"Depois vou ao hospital fazer companhia para a Lois... ou ela vai acabar deixando médicos e enfermeiros à beira de um ataque de nervos" disse ele, sorrindo.

Martha também sorriu, e ele esperou sua mãe sair e depois usou sua super velocidade até a mansão Luthor.

Continua...