CAPÍTULO III

Instantes depois, na mansão Luthor

Ao chegar à propriedade dos Luthor, Clark se surpreendeu ao ver o carro de Lana estacionado no pátio logo em frente. Sem pestanejar, entrou à mansão, e enquanto atravessava o corredor em direção ao escritório de Lex, sentiu que alguma coisa estava errada. De certa forma, sentiu que iria se arrepender se passasse daquela porta em diante. Mas algo o impelia a prosseguir.

Cauteloso, ele se aproximou o bastante para ver uma cena que o estarreceu. Lana e Lex se beijavam apaixonadamente sentados ao sofá, com Lex praticamente deitado sobre sua até então namorada.

O choque daquele quadro simplesmente paralisou Clark por completo. E ele não sabia o que fazer. Não sabia o que pensar. Sabia, porém, que havia muitas coisas que queria dizer, gritar. Coisas que estavam engasgadas já há algum tempo em relação a Lex.

Agora, quanto a Lana, aquilo realmente o havia pego de surpresa. E um turbilhão de pensamentos se apoderou dele. Imaginou que o rompimento com Lana naquela manhã havia sido bem oportuno para ela. E ele não conseguia entender. Logo ela, que dizia repudiar tanto segredos e mentiras... Uma lágrima brotou no olho de Clark. Seu ex-melhor amigo, sua ex-namorada e grande amor de sua vida. A maior traição de sua vida.

"Espere" disse Lana, afastando gentilmente Lex para ver a porta onde Clark estava.

Lex se virou para ver o que era. Mas não havia nada ali.

"O quê foi?" perguntou ele, com o nariz roçando por sua face.

"Achei que havia alguém ali" sussurrou ela.

"Impressão sua" disse ele, beijando suas faces.

"Pode ser" concordou ela, sorrindo, e beijando-o novamente.

Centro Médico Smallville

"O quê veio fazer aqui, Smallville?" perguntou Lois, ao vê-lo entrar no quarto, enquanto ela vestia o casaco. "Eu disse que não precisava vir! Aliás, já estou de saída. Não vou ficar esperando o tal do Dr. Baylock para fazer ressonância magnética coisa nenhuma. Se tem algo que eu abomino, é esperar -"

Notou, então que ele estava estranho, mudo, e com o olhar perdido, muito mais do que o de costume.

"Terra chamando Clark?"

Mas ele não respondeu.

Lois então o encarou, e resolveu arriscar, ou ficariam ali a noite inteira:

"Muito bem. O quê houve dessa vez entre você e a Lana?"

Clark finalmente a encarou.

"O quê foi que disse?"

Lois sorriu.

"Eu sabia. Para deixá-lo assim, nesse estado catatônico, só mesmo a Lana!" exclamou ela, vitoriosa. "O quê foi dessa vez?"

"Nada" respondeu ele, ainda atordoado.

"Tudo bem, então" disse ela, saindo do quarto.

"Onde está indo?" perguntou ele, indo logo atrás.

"Embora, ué"

"Não pode ir assim, Lois" disse ele, preocupado. "E os exames?"

"Eu estou bem, Smallville!" disse ela, ignorando-o, enquanto atravessava os corredores da emergência.

"Lois!" chamou ele.

Lois se virou então para vê-lo. Cruzou os braços e, impaciente, esperou.

"O quê foi?"

"Você machucou a cabeça com a queda" disse ele. "Pode ser sério"

"Não mesmo" retrucou ela, dando-lhe as costas.

"Lois... você estava delirando!" exclamou ele, ainda pensando naquela coisa de capa vermelha.

"Ah, é? Tá preocupado, Smallville?"

"Estou!"

Lois simplesmente parou e se virou para encara-lo. O sorriso foi inevitável, e ele tentou remediar:

"Claro que estou... como estaria se fosse qualquer outra pessoa -"

"Que meigo" disse ela, sorrindo com o canto dos lábios. "Só tem uma coisa, Smallville. Resolva seus problemas com a Lana de uma vez por todas, e larga do meu pé, tá bom?"

Clark arquou as sobrancelhas, completamente surpreso com aquela revelação.

"Como é que é?"

"Isso mesmo que você ouviu" disse ela, continuando a caminhar pelos corredores do hospital, até que chegaram à porta da entrada, e Lois olhou para a rua, à procura de alguma coisa.

"Acha que eu não percebo? Toda vez que a senhorita 'olhar melancólico' aparece com uma das suas você vai ao Talon para me atazanar a vida. Então, por que outra razão estaria aqui?" indagou ela, encarando-o com firmeza.

Clark também a encarou. E sorriu.

Ela era mesmo incrível, pensou. Como podia pensar aquilo dele? Por mais que estivesse decepcionado com Lana e com Lex, estar ali nada tinha a ver com a situação. Estava triste. Estava magoado. E até desolado. Mas naquele momento, como todos os outros, buscar a companhia de Lois nada mais era do que satisfazer unicamente uma necessidade pessoal, da qual, até aquele momento ele não havia se dado conta:

"Eu só queria estar ao lado de alguém que realmente me faz sentir bem -" desabafou ele, então, quase não acreditando nas suas próprias palavras.

Lois sorriu, confusa, e se virou.

Clark ficou observando-a, imaginando se teria dito alguma besteira, se seus pensamentos estavam confusos por conta dos últimos acontecimentos, e antes que pudesse dizer qualquer coisa, ou pedir desculpas por algo do qual ele ainda não tinha certeza, ela deu um assobio ao ver um táxi passar.

O veículo deu a volta pela rua, e parou em frente ao hospital.

"Clark" disse ela, virando-se para vê-lo mais uma vez antes de entrar no táxi. "Tenta resolver as coisas de uma vez por todas com a Lana, e pára de sofrer, ok? Se vocês não estão felizes, nada mais coerene do que cada um seguir seu rumo. Agora, faça um favor a si mesmo e aos seus pais, que devem estar transbordando de felicidade por causa do resultado das eleições: muda essa cara feia e vamos voltar ao Talon para comemorar com eles!"

Clark demorou a responder, pensativo nas coisas que Lois havia lhe dito e nos pensamentos que turbilhavam sua mente.

"Clark? O taxímetro está rodando -" disse ela, de dentro do veículo, com a porta aberta.

"Eles estão da fazenda -" disse ele.

"Hum. É mesmo. Eu esqueci que estraguei a festa... Bom, de qualquer modo tenho que voltar pra lá e arrumar a sujeira que ficou" disse ela, balançando a cabeça.

"Quer ajuda?" perguntou ele, oferecendo-se.

Lois sorriu enquanto o fitava. Havia alguma diferente em Clark que ela não sabia o que era.

"Não, Smallville. Você devia estar com seus pais, pois esse é um momento da família Kent, e pelo que me consta o terceiro membro do clã não está lá pra alegrar a festa -"

Clark sorriu, concordando, e se afastou e fechou a porta do carro para Lois:

"Tem como voltar?" perguntou ela.

"Eu dou um jeito" respondeu ele.

Lois lhe sorriu e deu um pequeno aceno.

Enquanto o táxi se afastava, indo para o Talon, ela o observava, ainda sorrindo, na esperança de que tivesse dito alguma coisa de efeito para ele.

Clark também sorriu enquanto a via ir embora. Lois estava certa, pensou ele. E algo nele se apaziguou. Como podia ser possível aquilo? pensou. Lois, a garota rude, grosseira e tagarela, de repente, era a pessoa que dizia as coisas certas nos piores momentos? Como se não bastasse, ela o fazia se sentir bem e, acima de tudo, sorrir.

E Clark ficou pensativo... Lana nunca o havia feito se sentir bem ou mesmo sorrir...

Enquanto isso, no Rancho Kent

"Senador Jonathan Kent!" exclamou Lionel descendo as escadas do loft ao ver Jonathan entrar no celeiro. "E eu achei que você não iria querer deixar a festa da vitória por nada nesse mundo. Mas estou aqui, e estou sozinho, como pediu"

"Bom" disse Jonathan, caminhando pelo celeiro, inquieto. "Então por que não chega mais perto e me encara, seu filho da mãe?"

"Hum. Talvez o Senador precise de algumas lições de bons modos, agora que está sob na mira da opinião pública -"

"Por que você não pára logo de enrolar, Luthor, e vai direto ao ponto? Eu sei que minha campanha aceitou sua proposta de financiamento, mas vou pagar cada centavo, pois não quero ficar devendo nada a você!"

"Fico imaginando o quão longe irá sua virtude depois que estiver no Senado"

Lionel desceu o último degrau das escadas do loft, e Jonathan se aproximou o bastante dele para estarem cara a cara.

"Só quero que você entenda que não sou nenhum fantoche" disse Jonathan, determinado.

"Espero que não. Não investi num candidato que pode ser o fantoche de qualquer um. Eu vejo isso mais como uma espécie de 'sociedade' -"

"O dia em que eu e você nos tornarmos sócios será o dia em que -"

"Devagar, devagar, Senador" interrompeu Lionel. "Não se esqueça que ambos temos um interesse em comum" disse, abrindo um envelope pardo. "Algo que protegeríamos com nossas vidas. Afinal, eu devo admitir que é admirável um homem se sujeitar a ficar sob a luz dos holofotes com um segredo tão perigoso... que deve permanecer escondido"

Lionel entregou a fotografia a Jonathan, e caminhou ao seu redor, esperando sua reação.

Jonathan então amassou e jogou fora a fotografia.

"Não vou deixar você destruir minha família!" exclamou, virando-se para Lionel e esbofeteando-o na face.

Enquanto Lionel tentava se levantar, Jonathan o agarrava pela gola do paletó e o erguia:

"Nós podemos suportar qualquer coisa que se abata sobre nós" disse, com falta de fôlego. "Porque temos uns aos outros. E isso é o que nos separa dos Luthor"

Lionel se afastou, ainda tentando recuperar o equilíbrio, e Jonathan, pálido, e respirando com dificuldade, disse:

"Agora por que você não... por que você não dá o fora da minha propriedade -"

Sem reagir, Lionel simplesmente se afastou, desaparecendo da vista de Jonathan, que, cambaleante, saiu do celeiro.

Do lado de fora, uma luz o cegou. Era o carro de Lois que se aproximava. Jonathan continuou a caminhar lentamente em direção a uma pilha de fenos.

"Jonathan?" indagou Martha descendo do automóvel, sem entender o que ele fazia ali.

Logo em seguida, Clark apareceu ao lado de sua mãe, com sua super velocidade. Ao perceber que seu pai estava estranho, aproximou-se, preocupado:

"Pai?"

Subitamente, Jonathan caiu próximo da cerca.

"Jonathan!" gritou Martha correndo com Clark em direção a ele.

"Pai? Vamos fazê-lo sentar aqui. Aqui, isso" disse Clark para Martha, ajudando o pai a se sentar numa pilha de fenos.

Abraçados, Jonathan olhou para Martha, e sorriu. Depois, olhou para Clark, e sorriu. Tentou dizer qualquer coisa ao filho, e levantou a mão até o pescoço dele. Foi então que seus lábios se moveram, e ele murmurou algo:

"Lionel... sabe" e seus olhos se fecharam para sempre, e seu corpo pendeu para o lado de Martha, que o abraçou:

"Jonathan! Nãããããããããão!" gritou ela, aos prantos.

"Paaaai!" exclamou Clark.

Continua...