Cap 3- Sangue e os fragmentos da jóia de quatro almas

"Prometa!".

Não via nada, a neblina cobria seus olhos da mesma forma que aquelas palavras cobriam seus ouvidos.

"Junte... Junte todos...".

Sua mente girava, seu corpo encontrava-se fraco. Estava confusa, aquele cheiro de incenso a enjoava. Tentava respirar, mas não conseguia. Pedia por socorro, mas parecia que ninguém a ouvia.

-SOCORRO! –gritou.

Sua respiração era acelerada, suava frio, seu coração batia forte e rápido. Mais uma vez esse pesadelo.

-Mais uma vez... –Suspirou – Será um mau presságio?

Devagar se levantou e ajeitou seu quimono azul que usava para dormir. Andou até o espelho e olhou-se, a roupa estava grudada em seu corpo, o cabelo negro molhado, os olhos castanhos assustados e estavam destacados pelas olheiras. Pegou a bacia d'água ao seu lado e lavou a face. Passou rapidamente o pente nas mechas de seu cabelo. Com movimentos leves e graciosos pegou um balde e saiu da pequena cabana caminhando até uma lagoa próxima. Um lugar calmo e tranqüilo.

Ouvia vozes de crianças. Estavam longe, mas eram alegres. Sorriu, deviam estar brincando, era um bom lugar onde Kaede a havia deixado, havia pessoas a ajudar e a tranquilidade reinava. Pena que a velha mestra não estava ali em sua companhia.

-Kaede-san...

Continuou andando, até que chegou ao lago. A água era limpa, fresca e gostosa. Lentamente retirou o quimono, respirou profundamente e caminhou até a margem. Lavou os rosto e olhou-se, o líquido refletia seu corpo nu. Agora ela era uma simples jovem... Não era mais a sacerdotisa dedicada. Somente ela mesma, sem proteção e com preocupações de toda garota de quinze anos.

-Quinze anos... –suspirou –É... Completo quinze anos hoje, mas quem irá importar-se com isso? Aqui não me vêem como um ser humano, apesar de serem tão bons comigo.

Entrou na água devagar, sentindo o ambiente. Mergulhou, nadando aparentemente deliciada, mas sua mente estava inquieta.

"Kaede-san...".

Subiu à superfície para respirar. Tinha saudades de sua mestra. Ela, Kagome, de certa maneira ainda era pupila da sábia.

Mais uma vez emergiu, sentindo tudo se esvair.

Estava num lugar longínquo. O sol batia em seu rosto, havia uma cabana em sua frente. Alguém andava em sua direção... Era Kaede!

-Minha Kagome... Venha... Preciso... ajuda...

-Kaede! Ajuda?! O que...?!

-Criança... Ajude-me... Venha para cá, Kagome, no castelo de Tai.

-Por que, mestra?

A velha não respondeu, foi engolida pela neblina. Kagome sentia todo o seu corpo dormente, leve e ao mesmo tempo triste por não saber a resposta. De repente, uma força a puxou e começou a cair. Sua voz era como um grito sem eco. Então, um calor a invadiu. Devagar abriu seus olhos e viu uma silhueta, só conseguia enxergar longos cabelos prateados ao vento e olhos dourados que brilhavam na escuridão. Segurava sua mão.

-Olá Kagome. –Disse sua voz.

Ela não entendeu, como ele sabia seu nome?

Olhou seu rosto com mais atenção. Ele parecia sorrir. Seria deboche?

-Como...?

-Shiiii... Eu sei porque sei. –Ele falava em tom suave, Kagome corou –Eu me chamo...

Sua voz se distanciava, mas ele sorria com a cabeleira prateada voando e olhos dourados sempre brilhando.

Ela se distanciava com a voz doce do rapaz em sua mente. Até que abriu os olhos e viu-se boiando no meio da lagoa, a água era como um véu cobrindo seu corpo nu. Sues dedos já estavam enrugados. Fora uma visão, somente isso.

Nadou até a margem. Estava tremula, cansada, a visão roubara-lhe muita energia preciosa. Tentou ir se se arrastando até o quimono, o pegou em seguida desmaiou. Estava muito, muito cansada.




-A brincadeira acabou! –Disse com um sorriso malicioso.

Preparou a espada na mão e saltou, dando um golpe vertical ao chegar ao solo. A arma do oponente virou pó, enquanto as sua mãos sangravam, manchando o tatame de vermelho escuro.

-Minhas mãos... Meu sabre...

O olhar superior do vencedor brilhava. Deu um riso de deboche e falou:

-Fraco. Eu disse que não iria brincar mais.

O rosto do perdedor se contorceu em fúria, vendo suas mãos e sua arma, tentou levantar, mas o golpe havia deslocado seu joelho também.

-Como...? Como ousa?!

O sorriso do vencedor mudou para uma expressão de desprezo.

-Você realmente é fraco Houjou...

-Você não tem coração Inu-Yasha!

-Bah! Humanos... Não sei como aceitei lutar com você. O golpe que eu dei foi tão fraco, mas mesmo assim fez tanto estrago...

-Metade de você é humano!

-E a outra metade é youkai. E só com essa metade ganho quantas vezes quiser de você.

Houjou continuava a olhar com raiva para o príncipe.

-Um dia Inu-Yasha, ganharei de você em qualquer coisa!

-Duvido. –E virou as costas para o salão e saiu –Chamarei algum médico para cuidar de você.

Inu-Yasha, após falar com o guarda na porta da sala, saiu para o jardim. Era um jovem forte de vinte e dois anos, mas seu rosto continuava a ter os mesmos traços suaves de uma criança. Seus olhos e cabelos não mudaram, dourados e prateados, como sempre.

Parou na sombra da árvore que sempre descansava. Não soube quanto tempo ficou ali, somente fechou os olhos e embarcou na terra dos sonhos, até que alguém o acordou.



-Filosofando, príncipe Inu-Yasha? –Perguntou uma voz.

-Hã? –O meio youkai levantou os olhos e viu uma senhora idosa –Ah, é você velha?

-Mais respeito com a senhora Kaede, Inu-Yasha! –Disse uma voz doce, porém com um tom bravo, era Tsukimisou.

-Glump... –Disse engolindo seco ao ver sua mãe.

-Hump! Peça desculpas, Inu-Yasha!

-Não precisa, Tsukimisou... Ele é só um moleque rebelde.

-Moleques rebeldes precisam ser educados.

A sábia balançou a cabeça:

-Não só isso, mas também alguém que cure seus corações.

-Bem... Estamos voltando do dojo, fomos ver o pobre Houjou. Inu-Yasha... Não devia ter feito isso. Ele é muito mais fraco que você.

-Ele que me desafiou. E eu não nego desafios.

A rainha suspirou e deu um olhar triste ao filho.

-Inu-Yasha... –Suspirou –Bem Kaede, o que é que você estava comentando sobre aquela sacerdotisa? Vem morar aqui?

-Ah sim! Você e Inu-Yasha a conhecem. Ela é aquela garotinha, que eu trouxe há doze anos atrás, você deu uma tsukimisou à ela, lembra-se?

O rosto da mulher iluminou-se. Deu um belo sorriso.

-Lembro, sim! Aquela linda garotinha, mas hoje deve estar uma mulher. Quantos anos têm agora a Ka... Kamo...?

-Kagome. Ela deve ter quinze anos hoje, na verdade, faz anos hoje...

-Como o tempo passa... Era tão jovem quando a vi pela primeira vez... Agora não viverei por muito tempo, mas como sabe que ela virá, se nem mandou um mensageiro?

-Não diga isso minha rainha!

-É mãe... –Disse inu-Yasha entrando na conversa –Pare de falar asneiras.

-Certo... Mas como sabe que ela virá, se nem mandou um mensageiro? -Repetiu a pergunta.

Kaede deu uma risada discreta.

-Avisei por visão... Está bem mais forte do que quanto a deixei, há três atrás. Seu chii pode mover-se muito, mas receio que esteja desmaiada agora. Também, assim que chegarmos ao palácio, irei mandar um mensageiro. Se a senhora permitir, é claro, que ela venha para cá. Estou velha... Agora que tenho certeza que... –Kaede parou –Mas olhe a hora... Precisamos voltar!

-Oh! É mesmo! Nos acompanha, meu filho?

-Desculpe-me mãe, mas quero ficar sozinho.

-Claro... Vamos Kaede-san?

E as duas foram andando para a residência real.

-Essa velha... –Resmungou Inu-Yasha –Está escondendo alguma coisa...

O meio-youkai continuou olhando para as nuvens, pensando no sonho que tivera hoje. Aquela garota de olhos castanhos... Aqueles olhos que brilhavam... Quem seria?

-Olhos que brilham... –Sussurrou.

Ouviu ecos de sua voz doce rindo quando o viu, mas ela desapareceu na neblina e ele acordou.

Então dormiu mais uma vez, sonhando com aqueles olhos, aquela voz.




-Hã...? O que...?

Ela acordou em cima do quimono. Olhou para o céu. O sol estava alto, devia ser tarde.

Sentou-se nas pedras, estava queimada. Devia ter ficado muito tempo lá, desmaiada. Suspirou, precisaria voltar, mas estava suja novamente, caminhou até a margem encheu o balde, lavando-se aos poucos. Passava pétalas de flores no corpo, o perfume enchia o ambiente.

Devagar, foi até uma pequena cachoeira, pegou suas vestes de sacerdotisa atrás de uma pedra, como sempre se banhava naquele lugar, já deixava suas roupas lá. Colocou-as rapidamente e voltou para a vila.

De repente, no meio da trilha para a vila, parou.

-O ar... Tem algo maligno por perto.

Olhou ao redor, tentando localizar algo, fechou os olhos, sim, havia algo. Concentrou-se, sentia varias presenças... Sorrisos... Olhos... Algo se aproximava... Eram orbes grandes e vermelhos! Orbes que traziam medo,arrepiavam. Podia sentir o olhar gelado e malicioso da criatura que se aproximava.

-Esses olhos... Ouço gritos... –Disse –A vila... Algo de olhos vermelhos está atacando o vilarejo!

Começou a correr, o ar tornava-se gelado, mas corria, quando saiu da mata viu um pássaro enorme, negro com olhos vermelhos. Desesperou-se ao olhar aquela ave perto das crianças, o que ele queria fazer com elas?

-CORRAM DAQUI! –Gritou.

Os moradores olharam para o lado, a viram e sorriram.

-SACERDOTISA KAGOME!

-SAIAM! –Gritou novamente.

"Estou sem meu arco..." Pensou olhando para o bicho. "Tenho que ir para minha cabana se quiser pegá-lo, mas... Não posso deixar as pessoas sozinhas com isso...".

Fechou os olhos, teria de dar certo.

Juntou as mãos e começou a invocar o elemento fogo. Não era boa nisso, mas tentou desesperadamente e conseguiu invocar uma pequena bola de fogo azulada.

Olhou atentamente para a bola e assustou-se.

-Esse brilho... Olhos amarelos... Olhos que brilham...

A bola aumentava. A sacerdotisa murmurava palavras sem sentido, concentrou toda a sua força na atividade, precisava conseguir daquela vez... Então, quando terminou a invocação, arregalou os orbes em fúria.

-Aqui! –Gritou.

O youkai pássaro olhou para o lado e viu Kagome, que atirou a bola de fogo e correu até sua cabana.

Entrou, sua cabana estava revirada.

-Alguém passou por aqui. –Disse com raiva no olhar –Ninguém da vila, presumo, mas... –Balançou a cabeça –Me preocupo com isso depois. Agora tenho que eliminar esse bicho.

Rapidamente pegou seu arco e agachou-se, esperando pacientemente.

"Será que ele não me seguiu?".

Devagar saiu rastejando, mas levantou-se, um pânico invadiu-a. Essa hora os moradores da vila podiam estar mortos se o youkai não tivesse a seguido-a.

-Onde es..

Kagome gemeu de dor. Olhou para as costas, havia sido atacada, sentia o sangue quente escorrer pelo seu corpo.

-Droga...

Olhou para trás e viu o pássaro, sua face gelou, perdendo toda a cor. Ele era três vezes seu tamanho. Pegou seu arco, mas ele, com suas garras, pegou Kagome, quebrando alguns ossos de seu corpo.

-ARG! -Sentia os estalos, não conseguia mexer-se.

Mas, para sua surpresa e talvez, sorte, aquele pássaro asqueroso a largou.

-O que... Ele esta bebendo meu sangue! –Falava arregalando os olhos –Vejo algo brilhando enroscada em suas asas... São teias de aranha! E há mais um brilho dentro dele... Mas essas teias... NÃO! Isso são fios de cabelo.

Estava deitada no chão, não podia mover-se, apenas olhar o entusiasmo do bicho à beber o líquido rubro. De repente, arregalou os olhos

-Essa coisa... Isso não é sua verdadeira forma. Gosta de comer pessoas... Isso é um Shibugarasu! Mas como ficou desse tamanho?... Acho que...

Olhou mais profundamente o animal e concluiu.

-Essa aura que brilha dentro dele deu mais força e esses fios de cabelo...

-Você consegue ver? -Exclamou uma voz sarcástica.

-Que-Quem é você?

-Huhu... Que garotinha linda... –Disse uma mulher saindo da floresta, tinha cabelos negros e curtos, seus olhos escuros tinham um brilho divertido –Você deve ser a dona daquela cabana... Não tinha nada de valor... –Disse com uma expressão triste -Ah! Deixe-me apresentar –Sorriu- Já ouviu falar da bela oni, Yura de cabelos invertidos? Sou eu, queridinha.

Ela aproximou-se de Kagome e arregalou os olhos vendo o pingente da sacerdotisa.

-Você tem um fragmento da jóia de quatro almas! Que interessante! Eu já tenho outros sete. Três deles estão controlando meu bichinho, mas que sorte a minha...

-Jóia de quatro almas? –Falou a garota com os olhos arregalados.

-Sim! Agora ela será minha! –Disse colocando as mãos na jóia –AHHH! –Gritou levando um choque.

Cambaleando, Yura olhou Kagome com nojo e uma infinita raiva.

-Essa jóia... Está de algum modo enfeitiçada, para ninguém roubá-la de você... A menos que entregue pela própria vontade.

-Mas eu nunca a entregarei a você! Eu prometi!

-Hum... Então você vai morrer garota. –Disse com nenhuma expressão em seu rosto.

-Há! –Deu um sorriso sarcástico –Mas eu já vou morrer mesmo...

-Tem razão! Vou matar você agora! –Disse sorrindo - Mas espere... –Falou pegando cuidadosamente o cabelo de Kagome –Esse seu cabelo... É tão lindo... Eu quero seu cabelo para mim! Vou gostar muito de usá-lo!–Disse satisfeita - Se matar você agora, vou sujar todo esse lindo cabelo de sangue! –Disse tristemente –Mas... Ora! Já sei o que vou fazer... Shibugarasu!

O youkai veio rapidamente ao chamado de Yura.

-O que você vai fazer?! –Perguntou Kagome.

A Oni deu uma risada e montou no pássaro.

-Há uma adaga muito especial no reino de Tai, ela pode matá-la e não sujar esse meu futuro cabelo de sangue... –Disse enquanto colocava Kagome nas costas do pássaro, controlando-a com seus fios de cabelo –VAMOS!

"Socorro... Mas... O Reino de Tai é o lugar onde está Kaede-san..." Pensava Kagome enquanto rumava com Yura até o reino de Tai, mas não pôde continuar a refletir por muito tempo, pois desmaiou pela perda de sangue.



Continua...