Rsumo da história até aqui:

Há muito tempo, num reino distante existia uma jóia que dava um infinito poder a quem a possuía. Seu nome era: jóia quatro almas. Um dia, o rei mais poderoso da região - dono da jóia -pediu para que cuidassem deseu tesouro.Uma miko foi enviada.A sacerdotisa era poderosa, mas acabou morrendo. O cargo foi herdado por sua filha, Kikyou.

Kikyou odiava a jóia, mas lentamente, o rei ensinou-a a ver seu lado humano e conseguiu amá-lo - sendo correspondida. Tiveram um tipo de'envolvimento' por um tempoconsiderável.Porém, isso lhe custava, pois via o futuro em seus sonhos e sabia do que aconteceria inclusive com ela mesma.

Um dia teve que viajar. Deixou a jóia de quatro almas no reino, lá estaria protegida, mas quando voltou encontrou corpos mortos e o rei no quintal rindo, com a jóia na mão.

Havia lutado com muitas pessoas no caminho, manipuladas pela jóia, por isso estava cambaleante. Kikyou viu o rei entrando no palácio calmamente. Então, o alcançou e o viu sentado no trono, ferido. Ele levantou a cabeça para ela e sorriu, com a jóia aos pés. Kikyou pegou seu arco e atirou no objeto, dividindo-o em fragmentos que voaram pelo mundo afora e disse: -Um dia, juro! Meu clã se vingará de você, estou prestes a morrer só consegui dividir essa jóia... assim menos mal acontecerá! Mas, um dia, meu clã se vingará de você, mesmo continuando a servi-lo!

Uma voz respondeu: - E todas as herdeiras de sua família se apaixonarão por um herdeiro, até que o seu poder reapareça...

E assim foi, até Kagome – a reencarnação de Kikyou, ou seja, o poder que iria reaparecer - nascer. Todas as mulheres da família de Kagome se apaixonavam por membros da família do rei pelo feitiço.

Para continuar seu ofício, Kikyou dividiu sua essência em oito, os guardiões, oito no total, um para cada arma que usava.

Tudo estava mais ou menos tranqüilo até aparecer Naraku,a essência maligna que havia feito a maldição e que absorvera um dos guardiões, Onigumo, que amou secretamente Kikyou.

Naraku reunia todos os fragmentos da jóia. Kagome se encontrava em treinamento quando um de seus subordinados a atacou. Isso causou grande confusão. Foi ao reino de Tai, e conhece Inu-Yasha, herdeiro do grande rei do passado, amante de Kikyou.

Tai é um guardião e tem sua relíquia roubada. Essa relíquia está sendo corrompida, e com isso, ele pode morrer. Ainda mais com a ajuda da pedra da lua, que pode sugar a alma de Tai aos poucos.

Inu-Yasha descobre que é um guardião. Kagome inicialmente pensa ser uma guardiã também. Com a ajuda de Kaede, começam a buscar os fragmentos da jóia e a relíquia de Tai. Começa a corrida contra o tempo.

Nesse ínterim, Kagome descobre que sua mãe teve um caso com o irmão de Inu-yasha, – Sesshoumaru - tudo pela maldição. Encontra os outros guardiões: Miroku (monge que busca solução para sua própria maldição, o buraco do vento), Shippou (adotou Kagome como 'mãe'), Sango (ex-prisioneira dos ladrões da montanha, que mataram sua família), Kouga (que está sendo em parte controlado por Naraku, tanto que no início, quando ainda não havia recuperado sua consciência, ataca Inu-Yasha e Kagome) e Sesshoumaru.

Inu-Yasha está sob o feitiço de uma obake, precisa terminar o ritual de beltaine – ritual de união com conotação sexual, geralmente voltado à reprodução. Kagome e Inu-Yasha já descobriram seus sentimentos, estão 'juntos' depois de muitas intrigas.

O irmão de Sango morreu, mas virou marionete de Naraku.

Temos oito guardiões então: Miroku, Shippou, Sango, Kouga, Sesshoumaru, Tai, Inu-Yasha e o corrompido, Onigumo.

Kagome também vai de encontro a seu noivo, que tem um fragmento da jóia: Bankotsu. Ele é amaldiçoado e não pode morrer até que aprenda o significado de proteger junto com seus irmãos.

Seu irmão, Jakotsu, tem uma afinidade com uma serva, Rin, e a considera uma irmã. A cidade de Bankotsu pega fogo e Jakotsu protege Rin e morre. Rin encontra Sesshoumaru, que passa a cuidar dela.

Kagome tem visões e confronta Kikyou. Parece ter descoberto boa parte de seu destino. Kouga vai até eles e diz que Naraku sabe de tudo, e que está planejando atacar o reino de Tai. Kagome planeja ir para lá primeiro.

Naraku cita várias vezes que ele não é o vilão, e que o principal guardião virou ying e yang.

Agora, falta muito pouco... Tudo está para explodir. A maldição do obake. A morte de Tai. O ataque ao reino.

Um resumo de vinte e três capítulos em duas páginas! Faltam os detalhes, mas é isso que precisa saber pra entender mais ou menos a história... Como eu passei muito tempo sem atualizar, provavelmente não se lembram de maiores fatos... Nem eu lembrava xP.

Agora... Here we go! Vamos ao capítulo!

Cap 24 – Pedaço de si

- Então... Ela morreu. –Falou a garota olhando para o corpo deitado na cama.

As duas servas no canto abaixaram mais as cabeças, fazendo uma longa mesura. Tremiam ao sentir o nervosismo infiltrar-se até o último fio de cabelo. A mais nova umedeceu os lábios e arriscou um diálogo.

- Sentimos muito, senhorita Kikyou. Sabemos o quanto sua mãe é importante para você.

A miko mirou o pôr do sol com os olhos vazios e semicerrados. Naquele dia, as cores que tanto gostava não tinham vida. Aos seus orbes, o entardecer nas montanhas nada mais lhe parecia além de um punhado de cores ruças, uma descrição incabível para o lugar. Suspirou, seus olhos não mostravam emoções ou resquícios de choro, eram simplesmente... opacos. Por mais que seu peito doesse, os sentimentos não se externavam. Quem a visse naquele momento, em frente ao cadáver de sua própria mãe, sem esboçar qualquer reação, a chamaria de desalmada.

Mesmo que sua mãe nunca tivesse lhe dado a atenção que almejava, a amava de forma confusa que se fundia à mágoa profunda de ter sido deixada sozinha. Poderia recordar-se perfeitamente das ocasionais visitas da mulher imponente. As vestes balançando junto ao embalo do vento, o cabelo longo e trançado repousando em seu ombro, os olhos gentis e mãos com dedos finos, dedos que afagavam com carinho. Ela vinha lhe ver no início na primavera e outono, no meio do verão e nunca aparecia no inverno. Quando menor, a alegria da filha era ver que a neve derreteria logo e sua mãe chegaria.

No entanto, aquela espera e carência foram substituídas por um sentimento de raiva. Julgava que se sua mãe a amasse de verdade, não cuidaria daquela jóia estúpida, não teria a abandonado. Era um pensamento infantil, porém que outra razão sua mente pueril poderia encontrar para a ausência da presença materna? Então, certa vez que a mulher aparecera, falara que a odiava.

Contudo, ela somente sorriu enquanto lágrimas caiam dos orbes plácidos. Agachou-se na frente da garota e pousou a mão no rosto dominado pela fúria.

-Eu fico feliz que tenha todo esse ódio por mim, Kikyou... – Enlaçou os seus dedos com os dela – O meu maior medo não é você não me amar, eu sei que não mereço esse tipo de sentimento, por mais que eu sonhe que um dia você o terá. O meu maior medo é... ter nada.

Nada.

E essa palavra a assombrou durante anos e anos. Desde o momento em que as servas cobriram o rosto de sua mãe com a manta branca, o nada dominou seu coração. Seus olhos não tinham expressão, seus movimentos eram frios e suas ações eram desprovidas de emoção. Era um sopro de gelo.

Mas ser um nada machucava. Tinha trancafiado a criança pedinte por afeição. Aquele eu frágil. Jurara para si que nunca iria libertá-lo. No entanto, o destino parecia brincar, e cada vez que usava a palavra nunca, o contrário se provava possível.

Cuidava da jóia, a tarefa que mais abominava. Entretanto, nunca reclamava, cumpria os deveres de miko de forma exemplar. Mesmo que aquele objeto no pescoço a machucasse por dentro, ignorava simplemente.

As palavras de sua mãe tinham sido esquecidas e quanto sonhava com ela, sempre ouvia a pergunta.

"Até quando fingirá que é uma marionete, querida?".

O rei de Tai.

Tinha o sorriso caloroso e gentil, não se ofendia com suas atitudes um tanto rudes. Ao contrário, estava sempre de braços abertos.

Aquilo a quebrara, ele a desarmara e pegara sua mão delicadamente, num singelo convite para amar.

"Você ainda quer fingir que é uma marionete, minha filha?". Podia ouvir a mãe sussurrando-lhe enquanto enfeitava seu cabelo com as flores da primavera.

E a garota respondera que não, jogando todas as responsabilidades para o alto.

Era uma troca. Ela não amava a pessoa Tai, e sim a devoção que ele lhe cedia. Não era uma paixão que faria tudo por ele mesmo se a chutasse.

Ela fora tão cruel... Com o tempo, podia dizer que passara a amar Tai, já que sua pessoa resumia-se apenas àquela devoção.

Egoísmo, era por isso que fora a primeira traidora.


Ela tinha confirmado. Depois de falar mais uma vez "nós vamos", em tom firme, mesmo com todos os olhares tão intensos que quase poderia sentir a pele queimar – riu do próprio pensamento. Que coisa romântica, um olhar que queima a pele.

E então, como uma verdadeira sacerdotisa faria, levantou-se, com um semblante sereno e deu às costas a todos. Andava com postura aristocrata, o queixo erguido e os olhos suaves, pelo menos era assim que tinham visto sua face no momento em que se virara. Assim que tivera a certeza de que todos aqueles olhos flamejantes não a espreitavam, deixou com que os olhos se cerrassem em dor e espremeu os lábios.

"Eu tinha que fazer isso... Eu tinha..." Divagou. "E tinha que fazer isso logo... Antes que me faltasse coragem."

Coragem para deixar de ser egoísta. Coragem que Kikyou, aquela maldita, não tivera.

-E eu me pergunto... – Começou Kagome enquanto entrava no quarto – Se você sabia de tudo assim como eu, por que deixou a jóia aos cuidados de Tai?

Nenhuma resposta.

Quando era menor, nunca entendia o porquê das sacerdotisas que tinham o poder da visão ficarem isoladas num canto remoto do templo. Também costumava achar muito cruel o fato de que elas quase nunca podiam falar ou entrar em contato com as outras. Era injusto que as sacerdotisas normais tivessem medo de se aproximar das videntes. Contudo, agora concordava com as videntes e sua própria opção de se esconder.

Saber do futuro era mais do que assustador. Ninguém devia ter o direito de possuir esse 'dom'.

Andou rapidamente até a bacia cheia d'água e viu Kikyou a fitando com seus olhos estreitos. Cuspiu com raiva na superfície e jogou o recipiente para o lado, fazendo com se espatifasse no chão.

- Nunca odiei alguém tanto quanto estou te odiando Kikyou... – Sibilou.

"É mesmo?" Respondeu a voz desinteressada em sua cabeça.

Kagome apertou as pálpebras e uniu os dedos polegares. Em alguns segundos, os pedaços da bacia estavam ardendo em uma chama azul.

"Ora, estimada Kagome... Tudo depende do ponto de vista. Eu fui sim, a primeira traidora. Eu fui sim, egoísta. Eu não quis sacrificar meu amor por Tai, como deveria ser. Mas eu também fui a primeira libertadora, a quebra da corrente. Fiz tudo ao contrário do que esperariam de mim. Se não fosse por mim, você ainda estaria presa. O que eu fiz foi traição, mas também mudança."

- Cale a boca.

"Sempre quando há mudança, há traição, Kagome. Esse é o único modo..."

Então por que aquelas palavras não pareciam certas?


Inu-Yasha não gostava de preocupar. Ele era um idiota quando ficava preocupado. Passava a derrubar coisas, se perder entre as palavras, era simplesmente insuportável. Tentava pensar em trinta coisas ao mesmo tempo, sem o mínimo sucesso. Nada dava certo, definitivamente.

Todavia, era melhor nutrir uma preocupação quando podia fazer alguma coisa para acabar com ela. Ficar sentado, olhando para as caras de outras pessoas e não ter opções de ação era uma das piores coisas que poderiam acontecer. E de praxe, era exatamente isso que ocorria. Ele, Miroku, Sango e o filhote de raposa na mesma sala sem emitir som algum ou trocar qualquer espécie de olhar. Praticamente impossível, certo? Errado.

Kagome havia saído. Decidia e fria, como nunca vira. Lembrava mais as mikos que faziam a benzedura do templo perto do castelo – e ele, obviamente, assistia escondido. Sua mãe gritava, dizendo que era por isso que as moças precisavam ficar mais tempo do que necessário lá, recitando um punhado de orações para afastar os maus espíritos e possibilitar a entrada de boas energias. Mas Kagome era Kagome e há muito tempo parara de vê-la como a toda imaculada sacerdotisa. Na verdade, aquilo tinha virado um detalhe totalmente sem importância.

Há quanto tempo tudo isso tinha acontecido?

Era engraçado. Ele não era de parar para pensar, como seu pai gostaria que fizesse. Era mais como se pulasse de cabeça em cada coisa que fazia. Sem dúvidas que com os anos havia aprendido certas sutilezas. Mas eram poucas, sinceramente. Ser impulsivo fazia parte de sua natureza exótica e rebelde. A do meio-irmão que queria ser tão mais forte quanto o permitido. Amava seu pai, sua mãe. Mas às vezes pensava que se ela fosse uma youkai, não teria que ter passado por tanta coisa...

E depois voltava tudo atrás porque ele não seria mais ele. Poderia até se chamar Inu-Yasha, no entanto, seria só o nome do novo completo estranho.

Ele poderia até ser mais fraco, mas um youkai completo não buscava tanta força quanto certos hanyous.

E então estava lá, contradizendo-se, pensando em tudo que tinha acontecido e em tudo que tinha mudado sem ele perceber. Era verdade, sentia-se um pouco perdido, entretanto, já havia se passado. Por Kami... Estava tão distante da pessoa que era quando saíra de casa. As coisas haviam se mudado por elas mesmas, do jeito que sua mãe sempre repetia que ocorreria. E não se importava nem um pouco.

Não tinha idéia do que Kagome queria ao tomar todas aquelas decisões um pouco suicidas. Também não interessava mais. Faria o que tivesse que fazer. O que no começo era algo somente para salvar seu pai, crescera de forma quase impossível. Finalmente tinha achado... Muito mais que um objetivo.

Foi com esse pensamento que Inu-Yasha andou vagarosamente até o quarto onde Kagome devia estar e deu três batidas leves na porta.

- Entre. – Foi a resposta.

Entrou com cautela, não sabendo se a encarava nos olhos ou começava a falar logo de uma vez. Respirou profundamente e andou até a cama.

A sacerdotisa estava deitada na cama olhando a janela. Não havia se virado, suas costas era tudo que o Hanyou podia ver. A respiração era tão lenta, se não tivesse respondido momentos antes, poderia jurar que estava dormindo calmamente.

Deu os ombros enquanto subia no leito, deitando-se ao lado da garota. Nenhuma reação. Ergueu a mão hesitante para tocar os cabelos escuros. Sorriu timidamente ao sentir a textura de seda. Enrolou os fios entre os dedos e se aproximou mais até que sua respiração estivesse aquecendo a nuca da outra.

- Eu estou com medo... – Ela disse de supetão – Estou com medo, Inu-Yasha.

Preguiçosamente, a garota virou-se de frente a ele, de modo que pudesse encará-lo. Segurou a mão dele com incerteza.

- Eu não sei o que vai acontecer, apesar de saber o que tenho que fazer... Mas e se... E se não der certo? E se tudo que eu fiz... Tudo que eu vou sacrificar... For em vão?

- Vai dar certo.

Inu-Yasha passou seus braços pelos ombros dela.

- Eu acredito em você.

Kagome riu, o encarando nos olhos e balançando a cabeça, como se estivesse falando com uma criança menor. Num gesto um tanto desleixado, entrelaçou os seus dedos com o do hanyou. Sorriu ao levantar as mãos para poder ver as mãos juntas.

- E se acreditar não for o suficiente?

O príncipe esgueirou-se até que ficasse por cima da garota, os cotovelos o sustentando. Deixou com que as pálpebras pesassem um pouco e tirou os fios revoltos da face tristonha.

- Se der tudo errado, eu vou te ajudar a consertar.

A miko sorriu de leve e trouxe o corpo junto a si. Os lábios se tocaram de leve, apenas para se separarem por alguns segundos.

- Acho que é... a segunda vez que a gente faz isso.

- Você fica contando? – Ela riu e o beijou novamente, dessa vez um pouco mais profundamente.

Não queria se importar, e não iria. Era de certo modo cruel, o destino impor desafios tão terríveis e depois lhe mostrar esse tipo de felicidade cálida, que gostaria de provar sem pressa ou receio de que em poucos minutos fosse acabar. Respirou fundo. Não queria se importar e não iria.

- Kagome?

- Hm? – Resmungou, enterrando a cabeça no peito dele.

- Você sabe... Que isso não acaba aqui, certo? Mesmo se não for agora, com certeza, as coisas vão dar certo depois.

O pescoço pálido pendeu para o lado, questionador.

- Por que?

- Eu acredito, já disse.

Seus ouvidos captaram um som cristalino, quando inspirou o ar ao seu redor, ele parecia perfumado. Sua visão ficou turva por um mero segundo até a incerteza ser preenchida por determinação. Beijou-o novamente e o som cristalino se repetiu até tornar-se a única coisa possível de se escutar. Decidiu que não era desagradável e não precisava escutar qualquer outro som. Era perfeito.

Inu-Yasha a olhou com estranheza. Ela apenas concordou com a cabeça. Sorriu outra vez. Era o gesto mais natural do mundo, sorrir, principalmente quando estava tão certa. Enterrou a cabeça nos cabelos prateados.

- Você cheira a menta... Tão gostoso... – Murmurou e o som cristalino se misturou ao da risada do outro.

Seus dedos traçaram uma trilha desde o pescoço moreno até os ombros. Se era algum tipo de presente... De aviso, que fosse, só queria aproveitar o momento para que pudesse ter algo para lutar. Seus motivos haviam mudado. No começo era apenas uma obrigação, tarefa de miko que incluía ajudar um jovem mimado a curar seu pai. Algo para se fazer por consideração e dever.

Dever que havia brincado o suficiente com sua cabeça. Sabia o que queria, aquela pequena felicidade. Sabia que não a teria e não se importava. Não estava com medo ou qualquer coisa do tipo. Apenas deixaria sua mente virar água. Não seria como sua mãe, fadada à infelicidade e ilusão. Tampouco como Kikyou, presa aos seus próprios desejos e egoísmo.

Seria apenas Kagome.

- Kagome? – A voz dele. Macia. – O que foi?

- Fica comigo, você fica?

Inu-Yasha sorriu, a enlaçando pela cintura. Sua risada se alastrou quando os dedos dele começaram a fazer cócegas. Começou a se debater na cama, com lágrimas escorrendo pelo rosto. Cerrou os pulsos na manga do quimono dele, para se segurar.

Fechou os olhos quando o som distante dos tambores soou em seus ouvidos, seguindo o ritmo descompassado de seu coração. Acariciou as orelhas que gostava tanto... Entrelaçou os dedos novamente, uma alegria infantil a invadindo ao ver tudo aquilo, sentir tudo aquilo.

- Dorme comigo?

- Isso é um convite? – Perguntou o youkai com uma sobrancelha erguida.

- Nada que você esteja pensando! É só para dormir.

- Não está cedo demais para dormir?

- Eu estou tão cansada... – Murmurou enquanto sua visão ficava nublada pelo sono.


- Naraku...

O homem virou-se com um olhar questionador para a moça que escondia sua boca com um leque.

- Eles estão vindo.

O youkai apenas mostrou seus dentes em um sorriso desdenhoso. Levantou-se, deixando com que a água escorresse por seu corpo. Pegou a toalha que repousava na pedra e secou as costas com a tatuagem de aranha. Lentamente foi até sua subordinada.

- Eu sei, Kagura. Sei há séculos, para ser franco...

A youkai torceu o nariz. Não gostava quando Naraku se mostrava conhecedor de tudo e de todos. Há séculos, há milênios... Para ela nada disso interessava. Ela seria sua escrava pelo resto de seus dias. Era covarde demais para ser liberta com a morte.

- Então por que está aqui ainda? Quer ser morto ou coisa parecida?

- De jeito nenhum. – Pegou o quimono branco – Quando eles estiverem chegando, já estarei bem longe daqui.

- Então... Eu posso ir me arruman-

- Você fica, Kagura. – Disse tranqüilo.

A Youkai fechou o leque, batendo-o com impaciência na coxa.

- Como assim, eu fico!

Naraku abriu as portas de madeira que davam para o seu quarto. Rapidamente, retirou uma bola de cristal de dentro de uma caixa e sinalizou para que Kagura se aproximasse.

- Você não terminou seu serviço... Mas vai ter sua chance, ele está vindo direto para cá.

- Meu servi...

Kagura calou-se quando viu a figura de Sesshoumaru em um lugar que não ficava nem há dois quilômetros dali.


- Kikyou... – Começou a velha.

Kikyou estava quase certa de que odiava a senhora de idade em sua frente mais do que odiava a jóia, não pensou que um dia fosse falar isso. Somente a encarou, com os olhos perigosamente estreitos. Provavelmente levaria uma bronca por indisciplina. Sinceramente, sentia absolutamente nada ao ouvir as palavras cortantes. Já se fora o tempo em que ficava se remoendo de culpa...

- Precisamos fazer algo com sua... – Parou para tossir. Depois, respirou fundo e continuou, seu tom sério – sua energia.

A sacerdotisa suspirou e encostou-se na parede, pegando uma de suas flechas para olhar. A girou entre seus dedos, as cores da pena na ponta se misturando no ar.

- Minha energia? Pensei que havia dito que era mais forte do que o suficiente para proteger a... jóia. – Terminou, tentando inutilmente atenuar o desprezo ao pronunciar a última palavra.

A ânsia bufou. Deuses, não havia ninguém que ouvisse suas preces e tornasse a menina mais afável? Não haveria um dia que não pudesse terminar sem ter que ouvir o tom rude? Não era adequado para uma miko. Ela era poderosa, sim. Mas estava cheia de raiva, rancor e sentimentos que a impossibilitariam de continuar sua missão. Não entendia como sua superior insistia para que a mantivessem. Obviamente não saberia o verdadeiro significado de sacrifício, sabedoria e dedicação nem que estivessem em sua frente.

Não gostava da garota. Era uma antipatia mútua. Nunca sentira esse tipo de coisa negativa por nenhuma das outras. Indiferença tudo bem, no entanto, antipatia era algo novo. Acreditava fervorosamente que ela só poderia ser algo ruim para despertar sentimentos inferiores tão intensos em uma pessoa como ela, devotada ao sacerdócio por mais de quarenta anos.

Contudo, sua superior não ouvia. Isso a deixava um pouco indignada também. Oras, sua intuição sempre se provara certa. Por anos à fio. Se a velha Hanna dizia que iria chover, chovia. Era respeitada e talvez até temida por isso. Alguns chegavam a admirar a expressão sempre serena no rosto enrugado. Orgulhava-se profundamente de sua vida dedicada inteiramente aos Deuses.

Então, viera sua desgraça.

Primeiro, a mãe da garota. Não era tão pior quanto a filha. Tinha talento, sim. Todavia, desde os movimentos para invocar um espírito até quando dançava em beltaine, havia um certo desespero. No começo, apenas pensou que era uma moça afoita, mas depois se tornou claro. Desespero, pânico. Procurava alguma coisa e nunca achava. Era uma energia confusa. Além do mais, ela possuía um espírito selvagem. Seria inútil reclamar, claro. A mãe da garota, Hotaru, não demorou a se tornar grande.

Morrera misteriosamente, protegendo a jóia. Dizia-se em todo o templo tristemente que não era poderosa o suficiente. Por mais que não fosse muito íntima e não gostasse do aspecto da outra, havia se entristecido. Era uma boa mulher, afinal. Deixara uma filha pequena que se já estava treinando para ser miko há tempos. Sua superior já insinuara várias vezes que a menina seria a próxima guardiã da jóia. Não entendia muito bem por que, mesmo que não perguntasse. Poderia ser qualquer uma, mas, bom... Sua superior era mais sábia que ela.

No entanto, no momento em que colocou os olhos na pequena Kikyou, soube: ela não tinha a disciplina.

Poderia ter talento, poder, mas nunca seria uma miko de verdade. Faltava a capacidade de se entregar de corpo e alma em qualquer tarefa designada pelo templo. Havia a amargura, o coração dela era rodeado de mágoa antes mesmo de sua mãe morrer. Contudo, até o falecimento, era um sentimento quase oculto. Quando terminaram de enterrar Hotaru, temeu aquela onda maligna.

Sutilmente, tentara tirá-la do templo, sem sucesso. A única recompensa foram os olhares raivosos, os esbarrões nada disfarçados... Aquilo a preocupava. Os anos se passaram e sua preocupação somente aumentou gradativamente.

- Sua energia é forte sim, Kikyou. Até demais, mas o problema é que ultimamente ela tem adquirido um caráter extremamente negativo.

Kikyou ergueu uma sobrancelha e aproximou-se da velha.

- O que pretende fazer?

Hanna levantou-se com uma certa dificuldade enquanto Kikyou apenas a observava com o canto do olho, sem mover um músculo. A ânsia deu os ombros, não esperava mais nada mesmo. Poderia até dizer que estava habituada. Uniu as mãos. Rapidamente, todas as tochas do cômodo acenderam. Apertou os olhos até uma chama azul flutuar em cima do altar.

Em cima do altar havia uma grande cesta, ao lado estavam ervas e flores – provavelmente para alguma oferenda. Hanna apoiou-se na parede rapidamente para descansar. Estava velha demais para aquilo tudo...

- É muito simples, na verdade. Iremos materializar seus sentimentos negativos até formar uma entidade que estará diretamente ligada a você. Uma espécie de 'filho'.

- Não seria perigoso demais fazer uma entidade feita de sentimentos negativos?

Hanna concordou com a cabeça.

- Exatamente, é por isso que usaremos uma mistura de raízes e sementes de flores de sino para seu corpo simular o estado de gravidez. Dessa forma, a entidade terá a energia materna, da Deusa.

A velha esboçou um sorriso e andou até o altar. Rapidamente entraram duas sacerdotisas encapuzadas, cada uma segurando uma bacia. Elas colocaram o recipiente no chão, sem se tardarem para se despirem. Caminharam até Kikyou e tiraram o quimono dela. Com esponjas perfumadas, ensaboaram o corpo da guardiã da jóia.

A mais alta deitou Kikyou no chão, postando-se em cima. Murmurou algumas preces enquanto pegava um punhal ao lado. Com um só golpe, cortou desde o umbigo até onde começavam os pelos pubianos da miko. Kikyou prendeu a respiração com a dor fina e os espasmos.

A outra sacerdotisa encheu seus dedos de uma substância azul e pintou o corpo da guardiã. Fazia símbolos sagrados nos ombros e seios, desenhava kanjis no ventre e braços, escreveu versos sagrados nas pernas. Kikyou tremia violentamente, sentia o sangue quente escorrer e os lugares com a tinta azul começarem a formigar. Um cheiro estranho dominou o ar, incenso de canela com cravos.

Fechou os olhos. Estavam erguendo-a. Escutou a voz da velha a benzendo ao longe enquanto dois braços a seguraram pelo ombro.

Berrou quando a faca foi enfiada em seu ventre. O líquido escarlate se espalhou pelo altar. Hanna não demorou a abrir a cesta. Aranhas dançaram à luz azul em volta do cadáver de um coelho cor de ébano. Cobriu-os com folhas e flores. Recitou as últimas palavras e os berros de Kikyou preencheram o recinto mais uma vez.

Com dificuldade, as duas ajudantes derramaram água purificada em cima do corpo trêmulo, que não demorou a desfalecer.

A próxima coisa da qual se lembrava era uma luz estranha. Depois dois vultos trajando verde a pressionar algo contra sua testa.

Quando acordou definitivamente, estava um pouco desorientada. Hanna estava sentada em uma cadeira, com uma criança ao seu lado que a mirava apreensiva. Forçou a vista. Tinha a pele pálida, cabelos negros e olhos cinzentos. Não a reconhecia. Era um menino... Estranho...

- Kikyou... Essa é a entidade feita com suas energias. – Hanna disse e se levantou, trazendo o menino pela mão.

O menino sorriu, subindo no leito e tocando a bochecha da sacerdotisa. Era estranho, a mãozinha mimosa não chegava a ser gelada, mas não era o mesmo calor humano, não deixando de ser confortável...

- Você é a mamãe? Olá! Meu nome é Naraku!

Continua..

N/a: Sem comentários maiores, sério. Eu sei, demorei muito, mas o tempo apertou, as coisas deram uma volta enorme... E espero que me perdoem, porque estou realmente me esforçando para terminar. A única coisa que posso pedir é DESCULPAS, um monte delas, podem ter certeza :P. Eu sei que o capítulo não está bom, mas eu vou me esforçar mais. Acharam o capítulo digno de comentários? Review. Não acharam? Bom... A gente tenta melhorar.

Agradeço de coração a todos que deixaram review. Com o novo sistema desse site, vou passar a respondê-las... Mas obrigada mesmo, não teria continuado sem vocês!

Sem mais

Beijos,

Kikis

ps. o capítulo não está betado... Vou esperar a Lally terminar e repostar depois. Só dei uma olhada rápida, ok?