Retratação: Saint Seiya e seus personagens, infelizmente e como sempre, não me pertencem e sim ao maluco do Kurumada. As situações descritas nessa fic não têm o propósito de nada mais do que entreter. Os nomes Dunstan e Kyriacos não são meus, obviamente, mas eu os busquei, portanto, vamos dizer que eles tenham sido "emprestados" de seus donos e origem verdadeiros.

Agradecimentos: a todos que esperaram ao longo desses meses pela atualização. Aqueles que me pediram atualização pelo MSN, desculpa decepcionar e demorar tanto. Mas finalmente, ele está aqui, só espero que vocês gostem. Meus muitos beijos, abraços, suspiros, brigadeiros, tortinhas de morango vão para: Arsínoe, Litha-chan, Shakinha, Chibiusa-chan, Srta. Nina, Nakisuki-chan Ophiuchus no Shaina, Athena Sagara, Anne, Giselle, Patty, Filhotinha Ju, Kate Scorpio, Uotani, Prudence-chan, Faye, Blanche, Perséfone-san, Ayame-chan, Tah, Umi. Ah sim, não posso esquecer dos amores da net, que também passaram por aqui, mesmo sem deixar review: Lien-Li e Pipe, amo vocês! Aproveitem o capítulo e eu vou responder às reviews de vocês ok?

Dedicatória: a todos os fãs de Miro e Kamus, claro! E o Spike é em homenagem ao personagem de Cowboy Bebop, ou seja, total e descaradamente um presente pra minha linda vaquinha de plantão, Faye. Te amo, mulher!

Título: Um Fio De Suspeita

Sumário: Kamus e Miro estão em lados opostos. O francês é o melhor promotor da cidade de Nova York, enquanto o grego é um advogado de defesa que nunca perdeu um caso. Entre os dois, existe apenas uma coisa: um assassinato. Yaoi, suspense, romance

Capítulo 3

Três semanas depois...

Miro gostava de sua rotineira normalidade. Acordava cedo, se arrumava com o cuidado digno de um modelo e seguia para o fórum, seu santuário particular. Porém, toda aquela normalidade havia ganho ares mais sérios, havia perdido toda a diversão desde que resolvera aceitar o caso do promotor Kamus Dunstan, já conhecido como "o caso do ano" no meio jurídico. Era bem verdade que toda aquela atenção centralizada em uma só pessoa, havia partido da Promotoria, que transformara a audiência preliminar em um grande circo, digno de julgamentos de celebridades, com direito a câmeras de TV e repórteres por toda a parte.

O loiro olhava-se mais uma vez no espelho, ajeitando os últimos fios de cabelo em uma trança estrategicamente desalinhada. "Imagem é tudo no nosso ramo e não estamos falando apenas para as mulheres.", sua professora de Metodologia uma vez lhe dissera. Porém, mesmo sabendo de sua beleza e confiança, não era exatamente assim que se sentia.

Desde que começara naquela carreira e, se parasse para pensar, desde que estivera na faculdade, todos o subestimavam, colocando sua impressionante beleza grega à frente de seu talento e inteligência. Acreditavam que ele não necessitava de um cérebro para progredir e, por algum tempo, ele mesmo acreditou naquilo, aproveitando-se como podia, sem se esforçar muito. Os resultados logo surgiam; ele entrava e saía de relacionamentos sem se preocupar, procurando subir vários degraus de uma só vez.

Era um círculo vicioso, que só terminou quando ele se apaixonou. O grego nunca acreditara naquela baboseira de que "o amor incondicional poderia fazer uma pessoa desistir de tudo e mudar", então surpreendeu-se ao encontrar nos olhos vibrantes e violetas de Mu, o primeiro vizinho que se propusera a falar com ele quando havia se mudado para NY, um caminhão de perguntas sem respostas e, quando respondidas, deparava-se sempre com o mesmo "porque eu estou apaixonado". Porém, como se as forças do destino conspirassem contra ele, o rapaz havia se mudado tão logo começaram a sair como bons amigos, e Miro encontrou-se novamente sozinho, praguejando contra sua própria falta de sorte e jurando nunca mais se deixar levar por aquele tipo de sentimento. Usar e somente usar. É nisso que eu sou bom.

— No que diabos eu estou pensando? –perguntou-se, olhando para o espelho novamente, não entendendo de onde aqueles pensamentos saíram.

Deixou o apartamento rapidamente, ignorando a moto que estava na garagem e tomando um táxi. Impaciente com o trânsito àquela manhã, ele já culpava sua má sorte, quando finalmente conseguiu relaxar, os carros movimentando-se novamente, lhe dando uma sensação de alívio.

Desde que se aprofundara nas evidências do caso do ex-Promotor, Milo estava em seu limite psicológico. A pressão no escritório começara quando ele decidira enfrentar os sócios majoritários, afirmando que aquele processo poderia ser de grande valor para ele quando ele ganhasse. Não se, mas quando. Nem ele mesmo sabia de onde vinha tanta confiança, não apenas em seu talento, mas, como seu assistente Randy lhe dissera, na inocência de Kamus. E aquilo era o que mais lhe inquietava. Estava mesmo acreditando que aquele homem era inocente?

As conversas preliminares que tiveram sempre haviam sido repletas de mistério e sombras, o Promotor sempre avaliando minuciosamente cada pergunta que era feita, para só então responder ambiguamente. Era o tipo de coisa que Miro abominava; sempre fora direto com seus clientes, se eles queriam um bom advogado, deveriam ter uma relação de confiança e o francês não parecia aceitar muito bem aquela proposta.

Você sempre foi meu adversário, não pode simplesmente esperar que eu confie em você facilmente. Haviam sido as palavras de Kamus, uma semana depois de Miro ter tirado o francês da cadeia e levado-o para seu apartamento. Aquele havia sido o primeiro encontro oficial dos dois, como advogado e cliente, ambos sabendo das acusações da Promotoria, ambos com o caso praticamente acertado em seus colos, apenas esperando por uma brecha, a verdade, para completarem a defesa.

Kamus estava certo. Ele e Miro sempre foram adversários, mas de alguma maneira, o grego sentia-se diferente ao ver aquele caso e não apenas pela notoriedade que ele estava recebendo. Parecia que ele, enfim poderia fazer algo de bom, poderia se superar. Claro que ele só admitiria que aquilo era mais uma maneira de vencer o francês, de deixá-lo em débito de alguma maneira, mas, no fundo, o loiro sabia que não era exatamente aquilo.

Suspirou profundamente, resolvendo não pensar mais naqueles sentimentos que estavam enterrados em seu passado. Retirou algumas anotações do que pretendia expor na audiência daquela manhã, revisando cada pequeno detalhe, como o profissional perfeccionista que era. Alguns dos documentos estavam rabiscados e continham a caligrafia de Kamus. Miro balançou a cabeça, sorrindo ligeira e estranhamente ao se lembrar daquela última reunião, duas noites atrás.

Flashback

— Isso não está certo, Miro. Não mesmo. –Kamus murmurou, sentando-se, derrotado em um dos sofás de sua enorme sala de estar. O advogado de defesa apenas virou os olhos, visivelmente contrariado. Um silêncio constrangedor havia se feito no lugar, ambos os homens não se fitando, procurando algo que pudesse quebrar o gelo naquela situação

Estavam ali há mais de duas horas, tentando solidificar uma estratégia de defesa para a audiência, dali a dois dias e os temperamentos de ambos, assim como a capacidade nata que tinham para não aceitar a opinião um do outro, pareciam estar ganhando aquela guerra.

Finalmente, coube ao advogado de defesa dar o primeiro passo. E ele o fez da pior maneira possível: gargalhou abertamente, encarando o francês. Kamus, por sua vez, estreitou os olhos, não sabendo do que aquilo tudo se tratava. Já estava começando a duvidar se havia feito uma boa escolha ao contratar o grego.

— O que foi agora, seu... –começou, mas não conseguiu terminar a frase porque os olhos azuis de Miro já se encontravam sobre si, friamente alertando-o para não prosseguir.

— Não complete essa frase, Dunstan. Ou vou fazer você se arrepender pelo resto da sua vida.

Kamus engoliu em seco, quebrando o contato visual com o grego. Não sabia o porquê, mas não conseguia ficar por muito tempo olhando para aquelas duas piscinas azuis. Elas eram por demais perturbadoras e misteriosas. Mas o que ele estava pensando? Aquele advogado não podia simplesmente falar daquele jeito com ele, especialmente estando em sua casa!

— Qual o motivo das risadas? E não se faça de tolo, fale logo! –ordenou, mais uma vez tragado a admirar as feições de Milo.

Miro se ajeitou no sofá, ficando sério novamente, mas foi só a idéia inicial passar por sua cabeça que um pequeno sorriso surgiu novamente em seu rosto. Na verdade, não era nada de realmente divertido, mas, por outro lado, era sim. Era ridiculamente divertido. Kamus era pateticamente divertido.

— Por que vocês promotores têm essa vontade enorme de fazer justiça?Deus, isso é ridículo.

— Do que está falando?

— Já ficou provado que Rachel era uma vagabunda. Ela dormia com qualquer coisa que usasse calças e se mexesse. Por que diabos não usa isso na sua defesa? Não é como se você tivesse algum motivo para não fazer isso.

— Já disse que não vamos usar essa linha de raciocínio. Isso é ridículo! –Kamus falou em um tom mais alto, já cansado de sempre terem que voltar aquele tipo de discussão.

— Ela está morta! –Miro replicou, levantando-se, por fim, caminhando na direção do francês, que também havia se levantado.

— Não me importa! É horrível acusar alguém que não pode se defender somente para exaurir a culpa do réu.

— Claro, porque se ela estivesse viva, esse caso nem existiria em primeiro lugar! –Miro retrucou, deixando propositalmente a última frase de Kamus pender no ar. No que diabos o francês estava pensando?

— Isso é patético, Kyriacos. –Kamus fez menção de se abaixar para pegar o copo de whisky que estava em cima da mesa e Miro escolheu aquele exato momento para segurar o francês pelo pulso.

Trocaram olhares cheios de sentimentos misturados, confusão, desafio, ódio, até que Miro, sem soltar o pulso de Kamus, se aproximou. O par de olhos azuis continuava analisando os olhos cereja, e o grego finalmente pareceu encontrar o que estava procurando em cima da mesa. Colocou-se de pé, seriamente, antes de jogar uma pilha de arquivos em cima do francês, que só então percebeu se tratar das fotos da autópsia de Rachel.

— Isso é que é patético, Dunstan. –Miro começou, não se importando em ver as fotos, desorganizadas, caírem no chão. — Você quer salvar alguém que não pode ser salva. Ela está morta e você também vai estar se não me deixar fazer o que tenho que fazer, o que faço de melhor...

— Eu...

— Não me importa o que você pensa. Você acha que a Promotoria vai ser complacente com o que aconteceu? Eles vão pedir a pena máxima, prisão perpétua, isso se não forem mais longe e pedirem sua execução. Então você será apenas um corpo, assim como ela. Já pensou nisso? Gostaria de morrer, Kamus? Eu não me importo se você tem desejos suicidas, então me deixe em paz, não me peça para te defender se vai colocar obstáculos no meu caminho.

— Eu nunca...

— Deixe sua moral de lado por um minuto. Pare de agir como um maldito promotor. Eles viraram as costas para você. Eles vão tentar te afundar de qualquer maneira. E eu... –Miro suspirou profundamente. — Eu não gostaria que você desistisse. –completou, em tom baixo, soltando o pulso de Kamus, finalmente.

— Por que não, Miro? Por que se importa? –a voz do francês soava desesperada e o grego decidiu que aquela conversa estava indo longe demais. Nunca havia falado aquelas coisas para um cliente. Aliás, nunca havia se envolvido tanto em um caso, se importando tanto.

— Porque eu não quero perder a competição. Eu já sou o melhor advogado dessa cidade, mas admito que você é um bom jogador. Se você morrer, quem vai competir comigo? Ganhar sem competição não é muito interessante. –admitiu, divertido, mas Kamus percebeu que havia algo a mais escondido por trás dos olhos azuis vibrantes. Será que era... não, não poderia ser.

O ruivo fechou os olhos por um segundo, como se analisasse seu próximo movimento. Suspirou profundamente, sentindo o cheiro de Miro invadir suas narinas, fazendo-o recordar de tantas coisas de seu passado. Coisas que havia deixado enterradas e não queria mais trazê-las à tona.

Por fim, colocou cada uma de suas mãos em um lado do rosto de Miro, que franziu a testa, não entendendo aquele gesto. O francês aproximou-se lentamente, como se estivesse hipnotizado, como se não soubesse o que estava fazendo.

As testas de ambos se uniram e Kamus perdeu-se por alguns segundos no mar grego que eram os olhos de Miro. O loiro não sabia o que fazer, e, apesar de seu cérebro pedir que ele se afastasse, esperou por mais alguns segundos, querendo ver o que o francês iria fazer. Aquela era a primeira vez que via o Promotor agir tão impulsivamente.

— Seus olhos... –ele começou, hesitante. — Há tanta luz neles, tanta luz e força e impetuosidade. Eu já fui assim um dia. –e, parecendo voltar à realidade, seu rosto congelou-se mais uma vez, os olhos não passando mais nenhuma emoção.

Miro engoliu em seco, não sabendo o que dizer, o que fazer. Aquele era um Kamus totalmente diferente e ele não sabia como reagir. Era como se uma outra personalidade do francês estivesse pedindo para ser libertada e não tivesse forças. Não podia negar, também, que seu coração disparou de maneira infantil, como há muito tempo não fazia. Era aquele tipo de sensação que sentia quando ganhava, quando derrotava, quando era o melhor. Um sentimento tão primitivo e tão relacionado à sua profissão que não podia permitir que chegasse à sua vida pessoal.

— Eu... eu preciso ir embora. Prepare-se para a audiência. Descanse um pouco. Qualquer coisa, me liga, você tem meus números. –disse, apressado, não se importando em fitar por muito tempo o francês, perdendo o olhar decepcionado do outro.

Em um silêncio constrangedor, Miro arrumou seus arquivos e anotações, incluindo as fotos que havia previamente jogado em cima de Kamus, e seguiu para a porta de saída. Somente quando o francês chamou por seu nome, que ele virou-se para fitá-lo, incerto.

— Não use Rachel como a verdadeira culpada por esse crime. É moralmente errado e você sabe disso.

Miro não disse nada, mas a reprovação diante daquele pedido ficara evidente em todas suas ações, culminando com o balançar negativo de sua cabeça.

A vida nunca era realmente fácil, Miro pensou.

Fim do Flashback

— Senhor. Senhor, já chegamos! –o taxista falou pela segunda vez, tirando Miro dos pensamentos estranhos que estava tendo.

O grego balançou a cabeça, deparando-se com a enorme escadaria do Palácio de Justiça já apinhado de repórteres. Suspirou profundamente, procurando qualquer pessoa que pudesse lembrar Kamus, mas não o encontrou em lugar algum. Sentiu um pequeno fio de raiva brotar em seu peito; havia corrido tanto e seu próprio cliente não se encontrava ali.

Pagou a corrida e saiu rapidamente, com a pasta cheia de documentos em punho, em direção à multidão que o esperava. Forçando um sorriso, fitou poucos repórteres conhecidos seus, já esperando a enorme quantidade de perguntas que lhe seriam feitas.

Ao preparar-se para dar as mesmas declarações, que pareciam saídas de um mesmo livro distribuído a todos os advogados de defesa do país, onde ele "iria provar a verdade sobre o que seu cliente estava sendo acusado", Miro surpreendeu-se quando teve seu braço seguro pela mão forte de uma pessoa.

Lindo, fora o primeiro pensamento que passara por sua cabeça ao fitar os perturbadores olhos cereja de Kamus e a maneira como ele estava vestido, totalmente em preto, desde o terno à gravata, passando pela camisa social. Resolveu, novamente, não pensar no que aquela proximidade lhe trazia e assentiu quando o outro perguntou se ele estava bem.

Escoltados por meia dúzia de policiais, foram levados para o interior do Tribunal. Miro sorriu internamente, percebendo que Kamus podia não mais estar no patamar de grande Promotor do Estado, mas ainda mantinha as mesmas maneiras aristocráticas e possuía os contatos necessários para que não lhe perturbassem quando precisasse entrar em um Tribunal. Aqueles agentes ali claramente provavam sua teoria. E Kamus lhe surpreendia mais uma vez.

— Bom dia, advogado. –o francês disse, sorrindo, quando já se encontravam dentro da sala privativa à defesa.

— Pensei que não apareceria no horário. –Miro respondeu, sentando-se e servindo-se de uma xícara de café.

Kamus sorriu ligeiramente e também sentou-se. Cruzou as pernas, brincando com a ponta dos cabelos por um instante. Sabia que estava sendo observado e não fazia idéia porque gostava tanto daquela sensação de ser analisado pelos olhos de Miro. Desde o último encontro dos dois, havia um clima estranho pairando e ele sabia que era única e exclusiva sua culpa, mas não conseguia evitar. Conhecer um pouco dos hábitos de seu adversário, agora aliado, era por demais fascinante.

— Já estava esperando você chegar. Há um certo tempo, para dizer a verdade, estava dentro do sedã, longe dos olhares dos fotógrafos. Você, aliás, gosta de ser fotografado, não é mesmo?

Miro entendeu o jogo que estava sendo feito e virou os olhos, terminando o café. Era tão típico das pessoas que estavam sob uma atmosfera pesada, ele sabia bem daquilo. A experiência lhe provava que aquele era um daqueles casos.

— Fique tranqüilo. Vai dar tudo certo hoje. –assegurou, e, sem pensar, segurou a mão do francês, apertando-a com firmeza. Sentiu uma faísca naquele breve contato, porém não se permitiu pensar muito naquilo, o meirinho logo entrando na sala, anunciando o início da audiência para dali a cinco minutos.

A audiência foi iniciada com ambas as partes tentando não se provocar. Miro resolvera manter uma postura fria, digna de um aprendiz de Kamus, porém, não conseguiu conter seus já costumeiros comentários irônicos ao ver Connor Jackson aproximar-se do Juiz, mostrando suas argumentações iniciais. Para alegria do grego, Shion não parecia muito interessado no Promotor em questão.

O Juiz Shion era conhecido por seu absurdo rigor e pelo amor à Justiça. Porém, todo exagero tinha um preço e ele era temido pelos maiores advogados do país. Quando soube que seria o homem de exóticos cabelos verde-claro, quase esbranquiçado, que iria presidir aquele julgamento, Miro receou pela primeira vez. A única vez que enfrentara aquela corte, saíra derrotado. E era uma coisa que não pretendia vivenciar novamente.

Felizmente para Miro e Kamus, o Juiz parecia estar bem interessado naquele caso e não tanto em pressionar para que ambos os lados fossem os mais claros o possível. O grego não queria mostrar muito seu jogo, sua estratégia e, ao final do dia, quando lhes fora dado um recesso de dois dias, ele agradeceu por ter conseguido manter aspectos que considerava importantes guardados até mesmo do francês.

— O dia foi muito bom. Gostei da sua atitude. –Kamus disse, observando atentamente enquanto Miro guardava as anotações dentro da pasta. O grego apenas sorriu, não retribuindo o olhar do francês.

— Obrigado. Eu disse que tudo daria certo. –retrucou e após tudo estar guardado fitou o ruivo. — Amanhã podemos nos encontrar para terminar a abertura do caso?

Kamus deu de ombros. Por mais que tivesse uma vontade estranha e enorme de querer ver o grego novamente, ponderou se aquela atitude não seria passar uma imagem de desconfiança diante do trabalho que Miro estava fazendo.

— Não creio que será necessário, Kyriacos. Eu fiquei satisfeito com o que fez hoje. Vamos deixar tudo assim, eu... eu confio em você. –ele complementou, desviando o olhar. Miro apenas sorriu.

— Como você quiser. Precisa de carona ou ajuda com a saída?

— Não, meus amigos podem me ajudar. E quanto a você?

— Algo me diz que eles querem a sua pele e não a minha. –piscou, maroto, reparando uma ligeira tonalidade avermelhada nas bochechas de Kamus. — Até daqui a dois dias então.

— Espere. –o francês interrompeu, segurando a mão de Miro, impedindo-o de sair. Pareceu estar revivendo o mesmo filme de dois dias antes, só que em ordem inversa. O grego pareceu lembrar da mesma coisa pois os olhos azuis estavam ligeiramente mais arregalados. —Eu... eu queria pedir desculpas.

Miro franziu a testa, não entendendo o que havia sido aquele rompante do ex-Promotor. Resolveu não perguntar, esperando pelas ações do francês, que parecia esperar que ele tomasse a atitude.

— Sinto pelo que falei para você no meu apartamento.

O reconhecimento da situação fez com que Miro soltasse sua mão da de Kamus rapidamente, passando-a pelos cabelos. Aquela situação era constrangedora ao ponto de ele não saber o que dizer. Apenas acenou com a cabeça e sorriu ligeiramente, ignorando a quentura em suas faces.

Saiu rapidamente do Tribunal, sem olhar para trás, deixando um frustrado ex-Promotor sem entender bem o que havia sido a amostra do que ele considerava um certo interesse por parte do grego. Subitamente um sorriso veio em seu rosto, sendo apenas apagado quando Connor aproximou-se da mesa onde ainda estava sentado.

— Sorria Kamus, mas por pouco tempo. Não vai conseguir escapar. Eu sei o que você fez.

— Você pode falar o que quiser, ainda assim não será melhor que eu, Jackson. –o sorriso irônico apareceu e Kamus sentiu-se vitorioso ao reparar na característica veia que pulsava na têmpora esquerda do promotor sempre que ele se estressava.

— Não quero ser melhor que você. Mas vou te pegar. Marque minhas palavras. Eu sei que você matou Rachel.

Kamus levantou-se, não querendo ouvir aquelas palavras tolas. Já estava considerando processar o Estado por sentir-se coagido e ameaçado. Droga, Miro deveria estar aqui, ele sairia dessa sem ao menos piscar os olhos., pensou, tentando ignorar o fato de já parecer dependente do grego.

— Terá que passar pelo meu advogado primeiro, Connor. –disse, já se afastando do promotor. — E devo complementar que ele é muito bom no que faz.

— Está sabendo bem sobre Kyriacos, Kamus. Logo você que sempre o odiou. Curioso ver o que o desespero faz com as pessoas. –abusou da ironia e retirou-se, não dando nenhum tipo de brecha para uma réplica por parte do ruivo, que, definitivamente resolveu ignorar aquele comentário. Ele não havia descido, só queria o melhor. Tinha esse direito.

MK MK MK MK MK MK MK

Já passava de onze horas da noite e Miro estava largado na enorme poltrona branca, com Spike aos seus pés, roendo o outro conjunto de sofá. Fazia uma hora que havia deixado de brigar com o cão e agora lutava com a programação da TV a cabo. Depois de percorrer todos os canais de notícias e ouvir tudo o que era relacionado ao julgamento de Kamus, ele procurava filmes ou qualquer outra coisa que lhe pudessem distrair.

Não contava com a campainha tocando aquela hora e involuntariamente pensou que pudesse ser o francês, mais uma vez temendo o assédio dos repórteres, algo bem comum naqueles dias, especialmente em seu caso.

— Ah, é você. –disse, ao abrir a porta, encontrando as feições amigáveis de Randy, que entrou no apartamento sem nenhuma cerimônia.

— Esperando outra pessoa, Miro? –o loiro perguntou maliciosamente, acariciando Spike, que deitou-se em seu colo assim que ele sentou-se no sofá.

— Esperava ficar sozinho. Tenho um dia agitado amanhã. Senti sua falta no tribunal hoje. Achei que iria me ajudar no caso.

— Pensei que você estaria bem acompanhado somente com seu cliente.

— O que isso quer dizer? –Miro perguntou, entre dentes. Não estava gostando do rumo daquela conversa. Desde quando as pessoas começavam a fazer ligações entre ele e Kamus?

— Absolutamente nada. Eu só vim aqui para uma coisa.

— Cruzou a cidade para me falar uma coisa? Não poderia falar pelo telefone?

— Oh, escorpiano impaciente, impetuoso e insensato. Eu precisava ver nos seus olhos a sua reação diante do que eu ia te falar.

Miro não gostava daquele tipo de conversa, sempre lhe levavam a falar coisas que não gostava. Randy tinha o péssimo hábito de saber quais botões apertar para fazer com que ele não se escondesse. Amizades de longa data tinham aquele privilégio.

— Fale logo. Quero dormir.

— Muito interessante suas alegações iniciais hoje. Achei que iria optar por atacar Rachel. Foi muito... –Randy parecia estar escolhendo as palavras, mas Miro sabia que aquilo era pura encenação. —...digno da sua parte não mencionar nada sobre o passado dela.

O grego abriu a porta novamente, um convite para que Randy se retirasse. Aquilo estava indo longe demais. Já aceitava à contragosto as perguntas e piadas dos outros por ter aceito aquele caso, justamente por Kamus ser seu inimigo mortal. Mas não suportava a idéia de ter seu trabalho questionado por um de seus melhores amigos e assistente, um homem que sabia exatamente o que ele pretendia fazer. Um homem que sabia quão manipulador ele poderia ser se e quando quisesse.

— Vai, deve estar cansado, Randy. Vai antes que eu me irrite com você. Sabe muito bem que não gosto disso.

Randy sorriu, satisfeito por conseguir arrancar a reação que esperava de Miro. Algo totalmente inesperado, ele deveria admitir. Seu amigo nunca lhe expulsaria se não houvesse um resquício de mentira naquela frase de dupla interpretação.

— Boa noite, Miro. Mas não se esqueça. Ele é seu cliente, apenas isso. Quando você o inocentar, tudo volta a ser como antes. Não esqueça do que aprendeu para ganhar um caso, mesmo que isso signifique magoar seu cliente. Ele vai sobreviver, acredite em mim.

O grego bateu a porta em um estrondo, ainda conseguindo ouvir uma sonora risada de Randy ecoar pelo corredor. Caminhou lentamente até o sofá, mas sentou-se no chão, contemplando os olhos pedintes de Spike. Acariciou o cachorro suavemente, sorrindo quando ele deu-lhe a pata, em um gesto de amizade.

Se as palavras de Randy estivessem certas, ele havia ignorado o fato de que Rachel era uma mulher promíscua porque Kamus lhe pedira. Mas aquilo não era verdade; ele simplesmente não usara aquela linha de argumentação inicial porque queria surpreender a todos nas outras audiências, era somente isso. Não tinha nada a ver com o fato de Kamus parecer extremamente traído com ele usar aquela linha de defesa. Não tinha mesmo. Ele sabia o que estava fazendo, tinha o total controle da situação.

Levantou-se novamente. Estava inquieto, o sono demoraria a vir naquela noite. Antes de caminhar para o quarto, porém, reparou que a secretária eletrônica estava piscando, indicando uma ligação que ele não havia reparado ter sido recebida.

A voz do outro lado da linha somente lhe deu mais um motivo para não dormir naquela noite. E, definitivamente a pensar em novas táticas de defesa.

"Oi, Miro,
eu... não pude agradecer hoje por não ter mencionado os relacionamentos de Rachel. Foi muito ético e justo da sua parte, eu realmente agradeço. Você não é em nada parecido com o homem que imaginei. É muito melhor.
Confio na nossa vitória agora. Até daqui a dois dias."

Continua...

N/A: ohhh, sim, eu postei, meninas! Depois de alguns meses, aqui está meu bebê jurídico e mais um capítulo! Estou mantendo minha promessa de atualizar todas minhas fics nos meses de março e abril, então a próxima é a Romances Impossíveis. Fiquem ligados, surpresas virão por aí! Ah, sim...se alguém deixar review e eu não puder responder por falta de email, sempre podem passar no meu livejournal, que vai ter um link com o capítulo por lá: mscellym . livejournal . com . Um super beijo a todos que passarem por aqui e por acompanharem por todo esse tempo! (em 26/03/06)