Título: Ivy - ano 2948
Personagens: Estel, Elladan Elrohir, OCS originais.
Retratações: Os personagens não são meus, nenhum lucro é pretendido, só existe o desejo de contar uma história e demonstrar meu amor aos personagens do Professor Tolkien.
Sumário: Estel segue em sua recém-descoberta capacidade de ser um herói ao mesmo tempo em que, um encontro inesperado mudo os rumos de sua jornada.
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Ivy – ano 2948
A viagem para fora das fronteiras de Mirkwood, iniciada no dia seguinte foi serena e monótona. O caminho que tomariam para Valle margeava a extremidade norte da floresta. Eles subiram por várias colinas, se pondo mais próximos aos cumes nevoentos da Montanha Solitária, mas ainda fora de seu campo de visão.
A única população ao redor era de Esgaroth e da própria Valle, com alguns humanos raramente se aventurando fora delas, portanto não esperavam encontrar grande quantidade de viajantes pelo caminho, a não ser aqueles que também se dirigissem para a festa do reinado.
De sua parte, Estel estava contente em montar tranquilamente a despeito da veemência com que se dirigira aos irmãos no reino da floresta. Apesar do repouso em Mirkwood, ainda sentia os efeitos da febre prolongada.
Tharlian havia lhe emprestado um cavalo e embora fosse um excelente animal, sentia dolorosamente a falta da presença sólida de Thargon.
Eles montaram toda à tarde, o clima crescentemente frio quanto mais se aproximavam do rio da montanha. Estel procurava embrulhar-se em sua capa, tentando manter longe as garras afiadas do ar gélido, quando seus ouvidos sensíveis captaram sons confusos partindo de trás da pequena colina que se estendia no caminho. Freou o cavalo bruscamente.
Rosnados e uivos misturados a gritos atemorizados. Incitaram os cavalos e poucos metros à frente foram surpreendidos com a cena violenta que se desenrolava.
Uma matilha de lobos selvagens atacando um pequeno grupo de viajantes.
"Pelo menos não são wargs." Resmungava para si mesmo, percebendo a presença de uma jovem menina entre os viajantes. Ela fora acuada contra a carroça e permanecia imóvel, se arriscando ser pisoteada, pois o cavalo ameaçava entrar em pânico.
Cavalgou em sua direção num reflexo, tirando a espada da bainha só a tempo de colocar-se entre ela e o lobo que avançava com os dentes à mostra. O cavalo relinchou ao receber o impacto, enquanto Estel era violentamente lançado ao chão, sem conseguir manter a espada consigo.
Se as coisas continuassem nesse ritmo, logo não haveria um músculo em seu corpo que não estivesse dolorido, pensou com ironia, enquanto se erguia para colocar-se à frente da menina.
Mas como aparentemente estava tornando-se habito, um dos irmãos veio em seu auxílio e Elladan aproximou-se, acertando o gume da espada no pescoço do lobo, impedindo que atacasse os jovens indefesos.
"Você está bem?" Ele perguntou ao irmão menor, que acenou com a cabeça enquanto procurava pela menina. Mesmo enquanto se aproximou para passar os braços ao redor dela, sua mente estava de olho na batalha.
Enlouquecidos pelo cheiro de sangue, mais dois animais tentaram se lançar aos três perto da carroça, entretanto Elladan se moveu rapidamente para golpear um na cabeça. O animal, ainda que ferido, passou suas garras pelo braço do elfo, antes de ser derrubado por uma flecha de Berdel.
No instante em que Elladan era atacado, o segundo lobo avançou na direção de Estel, que se jogou no chão, cobrindo a menina com o corpo. Quase imediatamente o animal foi interceptado por Tharlian, que num golpe rápido, pôs fim a seu ataque.
Quando Estel se ergueu, a batalha havia chegado ao fim. Suspirou aliviado e voltando-se para a menina, perguntou se ela estava bem, mas parecia aterrorizada demais para falar, assim após examiná-la superficialmente, concluiu que não parecia ferida. Fazendo com que se recostasse contra a carroça, correu até Elladan.
"Elladan!" Gritou apreensivo ao ver o sangue que escorria das feridas do irmão. "Você foi ferido!"
"Não se preocupe, eu estou bem." Garantiu-lhe o elfo, disfarçando uma careta de dor. "São apenas arranhões."
"Eu não tenho certeza disso. É melhor que Elrohir lhe faça um curativo."
A expressão dele era determinada e o gêmeo mais velho riu, passando o braço incólume pelos ombros dele.
"Como queira irmãozinho, mas acho que devia dar uma olhada em sua protegida..."
Estel se virou e com um suspiro aflito viu que a menina estava meio desfalecida e apressando-se, gritou por Eruónel.
O elfo veio rapidamente e juntos apoiaram-na na carroça, insistindo com que bebesse água do cantil de Estel.
"Ela vai ficar bem Estel, só está muito assustada." O elfo assegurou, examinando-a melhor. "Fique com ela até que se recupere."
Também se recostou na carroça observando a cena da luta. Seus amigos estavam bem, mas dois dos viajantes haviam sido mortos e achou bom que a menina não pudesse ver os corpos mutilados.
Ouviu Elladan que conversava com Elrohir e Eruónel.
"Não sabia que lobos selvagens estavam se aventurando tão longe do Limiar do Ermo em busca de comida..." Assobiou por entre dentes quando o elfo da floresta passou unguento no arranhão em seu braço.
"Essas criaturas estão se tornando cada vez mais semelhantes aos wargs." Contou Eruónel com desgosto, enquanto Elrohir se aproximava de Estel e da menina que se mantinha em aparente choque.
"Vocês são elfos!" As palavras repentinas assustaram-nos, quando dois enormes pares de olhos negros fitaram Elrohir com assombro. "Você é real?" Perguntou ao elfo moreno, acrescentando em seguida. "Você é a criatura mais bonita que eu já vi..."
Estel teria se divertido bastante às custas do irmão, que se ruborizou até a raiz dos cabelos, se a menina não continuasse de olhos arregalados. Talvez batera a cabeça e estivesse confusa? "Está se sentindo bem?" Sacudiu-a levemente, tentando tirá-la de seu transe.
Elrohir terminou de se aproximar, examinando-a com igual curiosidade e preocupação.
"Eu lhe garanto que sou real, jovem senhora... todos nós somos." Disse ele cortês.
Ao som da voz do elfo, ela deu um pequeno suspiro, como se acordasse de um sonho e se desvencilhando bruscamente das mãos de Estel, levantou-se de um pulo, correndo em direção ao homem idoso que conversava com Tharlian.
"Papai, papai." Atirou-se nos braços dele entre soluços.
"Sinto muito minha querida, mas Jon e Lomar..." Ele olhou para as formas inertes no chão e desviou novamente os olhos. "Mas felizmente estes corajosos guerreiros apareceram para nos salvar. Eu sou Rolf e agradeço a todos vocês."
"Estávamos seguindo por esta estrada quando vimos o ataque." Explicou Tharlian. "Também estão indo para Valle?"
"Isso mesmo." Confirmou o homem, olhando entristecido para os amigos mortos. "Somos moradores de lá e estávamos voltando, após comercializar nossas mercadorias com os homens da borda da floresta. Está é minha filha, Ivy, e aqueles dois eram meus empregados. Fomos surpreendidos e pudemos oferecer pouca resistência."
"Sentimos muito por seu infortúnio, mas se desejarem podem descansar enquanto providenciamos uma sepultura para seus companheiros. Depois, já que temos o mesmo destino, se for de seu agrado podemos seguir viagem juntos." Tharlian ofereceu gentilmente.
O velho sorriu-lhe grato. "Seria uma honra e um alívio, agora que somos apenas eu e minha filha."
Quando tudo estava terminado e os pobres viajantes receberam um túmulo perto da colina, já era noite e resolveram procurar um local adequado para acamparem.
Encontraram uma pequena clareira de abetos escuros e logo as fogueiras do acampamento foram acesas e a refeição da noite começou a ser preparada. Os irmãos estavam conversando com o velho Rolf e Estel notou que Elladan mancava ligeiramente. Lembrou-se que o elfo também fora ferido no braço ao defendê-lo e a menina, que continuava olhando tudo com olhos arregalados.
Para ser sincero, ela já começava a irritá-lo, movendo-se ao redor da fogueira toda solicita com os elfos, embora sequer houvesse agradecido a ele. E afinal havia arriscado seu pescoço por ela!
Agora lá estava, oferecendo a Elladan uma caneca de chá e recebendo um sorriso de volta. "Será que todas as meninas humanas possuem comportamento tão lamentável?" Nunca vira uma elfa agindo com tamanha leviandade.
Era bastante jovem, mais ou menos de sua idade e possuía longos cabelos negros. Tinha as bochechas coradas e seus olhos brilhavam, parecendo levianamente esquecida do terrível ataque e dos amigos mortos.
"Elladan." Chamou ao irmão, ignorando-a completamente. Tinha certeza que a antipatia havia sido mútua. "Parece que a roda da carroça que eles usam para transporte está danificada."
"Mestre Rolf tentará consertá-la pela manhã, mas se não for possível teremos que dar outro jeito." Buscou com os olhos a confirmação de Elrohir.
"Talvez tenhamos que dividir as montarias com nossos amigos." Elrohir concordou, sorrindo ao caçula. "Tenho certeza que não se importará de levar sua jovem amiga."
Os dois meninos arregalaram os olhos e Elrohir foi obrigado a morder os lábios para não rir.
"Mas... meu cavalo..."
"Por que eu tenho que ir com ele..."
Elrohir interveio.
"Você lhe salvou a vida irmãozinho e agora é responsável por ela."
Estel o fitou sem palavras, e ela se adiantou.
"Como ele pode ser responsável por mim se é apenas um menino? E além do mais foi você quem enfrentou o lobo e salvou a nos dois!"
Ele a fitou indignado, desejando que o lobo tivesse feito um bela refeição da ingrata, antes que pudesse ter saltado em sua frente.
"Eu não sou um menino e foi Elladan que nós ajudou, não Elrohir e eu havia perdido minha espada e..."
"Isso não vem ao caso agora." Interrompeu Elladan, começando a se cansar da implicância infantil deles. "Mas o fato é que teremos que partir o mais cedo que pudermos e tenho certeza que meu irmãozinho será cortês o suficiente para permitir que a dama monte com ele se necessário."
Estel teve vontade de dizer que preferia montar com um orc, mas engoliu as palavras ao deparar-se com o olhar de advertência de Elladan. De repente a viagem pareceu perder todo seu atrativo se fosse ter que suportar essa menina irritante até Valle.
Num olhar rápido, percebeu que ela também não estava nada contente com o arranjo, o que lhe deu certa satisfação cruel. Se ela ia estragar sua viagem, pelo menos a dela também não seria tão prazerosa.
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No alvorecer frio da manhã seguinte, todos estavam de pé, fazendo os preparativos para seguirem viajem. Mestre Rolf estava trabalhando havia muito na pequena carroça, tentando consertar a roda danificada.
Estel sentia impaciência para partir, sumamente irritado com o atraso que enfrentavam. De repente ouviu uma risadinha e viu a garota sorridente conversando com Elrohir, enquanto lhe oferecia uma caneca. Fitava carrancudo, quando percebeu que o irmão apontava para ele.
Para seu desagrado ela veio se aproximando e imediatamente tentou ignorar sua presença, fingindo estar entretido com o cavalo.
"Você devia beber isso. Está muito bom e bastante quente também." Esperou, com um sorriso hesitante, que ele se virasse para continuar. "Eu soube que você esteve doente..."
"Eu estou ótimo!" Manteve a voz fria. "Não necessito que você traga nada para mim... menina." Tentou ignorar o cheiro que exalava da bebida quente, junto com o vapor convidativo.
Quando observou seu rosto, os olhos dela chispavam e achou que fosse jogar o chá nele.
"Para dizer a verdade só vim até aqui por que seu irmão tão agradável me pediu. Aliás, você não se parece em nada com ele. Com nenhum dos dois. E eu tenho um nome. Ivy!"
"Claro que eu não me pareço com eles!" Sentiu o sangue esquentar. "Nem mesmo sou um elfo. E como alguém pode se chamar Ivy?"
"É óbvio que não é um elfo." Observou-o com desdém. "E nunca poderia ser confundido com um. E que espécie de nome é Estel?"
Quando pareceu que a briga ia crescer, Elrohir interveio.
"Sinto muito interromper, mas creio que seu pai esteja te procurando Ivy."
Ela ainda estava furiosa, jogando fora o chá. Mas antes de ir agradeceu educadamente ao elfo, ignorando Estel.
Ele ficou observando-a partir sentindo-se muito irritado, até que percebeu o olhar do irmão sobre ele, então voltou a se ocupar do cavalo.
"Ivy é uma menina encantadora, e tenho certeza que se parasse de implicar com ela perceberia isso."
Deu um suspiro aborrecido, antes de retirar a caneca das mãos do irmão e tomar um longo gole do chá quente.
"Embora o encantamento de vocês, eu acho que ela é a menina mais irritante e... e... leviana que eu já conheci."
"Considerando a quantidade de meninas humanas que você conhece." O irmão ria abertamente, aborrecendo Estel ainda mais. "Espanta-me seu comportamento... nunca o vi tratar qualquer pessoa assim..."
"Que ela guarde suas gentilezas para vocês, elfos de quem tanto gosta. E além do mais eu não preciso que tragam nada para mim, pois eu mesmo posso pegar."
"Se você assim o diz." Concordou Elrohir, retirando sua caneca das mãos do menino com um olhar pontudo. "Eu vim aqui lhe dizer que a carroça foi parcialmente consertada. Mestre Rolf continuará conduzindo, e afinal Ivy não precisará montar com você, já que o cavalo de um dos viajantes mortos foi recuperado por Berdel."
"Essa é uma ótima notícia." Disse ele com azedume.
"Você pode acreditar que sim, mas afinal, talvez ainda seja jovem demais para apreciar a companhia de uma dama tão encantadora quanto ela." Dizendo isso ele passou o braço por seus ombros, fazendo um sorriso finalmente surgir nas feições do irmão caçula. "Venha, vamos fazer isso logo e partir daqui o quanto antes."
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Eles foram obrigados a seguir um ritmo mais lento devido à pequena carroça de mestre Rolf, embora o bom homem se desculpasse constantemente pelo incomodo que estava causando. Sua jovem filha, no entanto, continuava apreciando grandemente a companhia de seus salvadores.
Ela e Estel se evitavam cuidadosamente. Ele permaneceu calado desde que levantaram acampamento, o som de sua voz substituído pelo falar constante dela. O riso de Elrohir também parecia ser uma constante, e Estel pensou com rancor que o irmão parecia tão leviano quanto sua nova amiga.
Depois de quase um dia inteiro de marcha, finalmente enxergaram ao longe os declives da Montanha Solitária, com seus cumes cobertos de neve. Calcularam que se tudo continuasse correndo bem, estariam em Valle pelo anoitecer, dali a dois dias.
Mas à medida que o dia foi avançando e a tarde chegava ao fim, uma grande escuridão cobriu o céu, e logo uma tempestade violenta desabou sobre eles, obrigando-os a procurar abrigo debaixo de um pequeno grupo de árvores no caminho.
Quando, depois do que pareceram horas, a potência da chuva começou a diminuir e cedeu por completo, estavam todos um pouco congelados. Ivy quase não podia controlar o bater dos dentes e Estel não parecia em melhor estado, embora corajosamente procurasse disfarçar o frio enregelante que sentia.
Berdel e Calion tentaram por um longo tempo acender uma fogueira e felizmente havia roupas secas no interior da carroça, onde colocaram seus alforjes logo que a tempestade caiu, entretanto acharam que teriam de desfrutar de uma refeição fria, até que finalmente os elfos conseguiram produzir uma chama fraca, que pouco a pouco se tornou um fogo acolhedor.
Muito tempo depois, em seu turno da guarda, Estel não pode se impedir de imaginar que outros contratempos ainda encontrariam em sua agitada jornada.
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Quase ao romper do dia uma chuva fina e intermitente começou a cair, criando uma cortina cinzenta e úmida em torno do acampamento, que foi desfeito rapidamente para que pudessem partir antes que o nevoeiro se adensasse. Os contratempos dos últimos dias já haviam atrasado em muito a chegada em Valle.
Felizmente a chuva não durou muito e puderam fazer um bom tempo de cavalgada, entretanto quando se aproximaram das margens do rio, o pequeno grupo se deteve para examinar aquele que era o último obstáculo de sua jornada.
O pequeno rio que geralmente descia tranquilo da Montanha Solitária para desaguar no Lago Comprido tinha alargado suas margens e agora se estendia turbulento, as águas escuras descendo ruidosas da montanha. Para não mencionar a névoa que pairava sobre as águas, dificultando a visão da outra margem.
"Pelos Valar!" Elrohir exclamou assombrado, apeando do cavalo para se aproximar da margem barrenta. "O Rio da Montanha cresceu!"
"Infelizmente." Respondeu Eruónel preocupado. "Isso geralmente ocorre apenas no inverno, quando as tempestades na montanha se tornam frequentes. Obviamente o aguaceiro de ontem contribuiu para essa turbulência incomum, além da névoa..."
"Quando viemos a Esgaroth ele ainda não passava de um rio tranquilo e pudemos atravessar sem qualquer dificuldade." Rolf disse, olhando nervosamente para os elfos.
"Há qualquer outro lugar em que possamos atravessar, mais adiante ou para cima talvez?" Perguntou Berdel ao comerciante.
"Existe uma travessia que pode ser feita de balsa, mas receio que tenhamos que percorrer um longo caminho até lá, pois está em Esgaroth. Levaríamos pelo menos um dia e meio de viagem. Essa passagem aqui mais ao sul é a única empregada usualmente pelos viajantes fora de Esgaroth, já que é a mais segura..."
"O que faremos então?" Estel perguntou ao irmão mais velho.
Elladan balançou a cabeça.
"A travessia de balsa vai nos atrasar em demasia..."
"O rio será muito arriscado?" Elrohir perguntou, ainda observando as águas ruidosas. "Mesmo turbulento, ainda me parece raso o bastante..."
"O rio neste ponto é bastante seguro, sem buracos, mas preocupa-me a carroça..." Tharlian avaliava o veículo precário.
"O quão raso era este rio aqui, neste ponto?" Elrohir virou-se para Ivy.
"O suficiente para que uma pessoa pudesse atravessar a cavalo ou nadar de um lado a outro com facilidade. Eu mesma já o fiz várias vezes e uma carroça podia atravessar facilmente..."
O gêmeo continuava pensativo.
"A carroça de seu pai não me parece forte o suficiente para aguentar uma travessia agora..."
"Mas você se engana meu amigo." Respondeu o velho apressadamente. "Tenho certeza que se tentarmos a travessia, minha velha carroça poderá resistir muito bem." O que o homem não disse, era que temia ter que deixar seus bens para trás, embora todos pudessem adivinhar seus motivos.
Elrohir examinou a carroça com descrença e virou-se para os irmãos e os outros.
"Precisamos tomar uma decisão de qualquer maneira..."
"Podíamos atravessar, conduzindo nossos cavalos e quem sabe usar uma corda na outra margem para ancorar a carroça... Teremos uma de tamanho suficiente?" Berdel olhava a correnteza.
"Eu concordo." Estel disse. "Na margem oposta, poderemos usar a força dos cavalos para puxar a carroça."
"Parece uma boa solução." Disse Tharlian, retirando a aljava e o arco das costas e removendo o peso extra de seu cavalo, para colocar na carroça.
"Muito bem." Disse Elladan. "Metade de nós deve estar do outro lado, para que possamos içar a carroça com a ajuda dos que ficarem deste lado."
Os outros começaram a atravessar depois de se prepararem, então ele olhou para Ivy e para Estel, deixando o irmão apreensivo com o que fosse dizer.
"O que nos deixa com Ivy." Ela pareceu não entender, então ele explicou gentilmente. "Devido à força da correnteza, um de nós deverá te acompanhar..."
"Eu atravesso este rio desde que era criança e nunca precisei da ajuda de ninguém." Disse ela, irritada.
"Não duvido disso." Concordou o elfo seriamente. "Mas meu coração se sentiria mais tranquilo se você atravessasse na companhia de um de nós."
A menina fez um muxoxo de contrariedade, mas não discutiu.
Então finalmente Elladan se virou para o irmão caçula, que pensou rodando os olhos: "E lá vamos nós."
"Não há nenhum problema quanto a mim, Elladan, posso atravessar muito bem, tanto quanto qualquer um de vocês."
"Só ia dizer que tomasse cuidado irmãozinho." Respondeu o elfo com um sorriso maroto e isso satisfez Estel, pois Elladan também não sugeriu que ele atravessasse com Ivy.
Por fim, quando estavam Tharlian, Berdel, Arlan e Estel na outra margem aguardando, Elladan e Eruónel se prepararam para ajudar na travessia da carroça, que era guiada por Rolf. Calion e Erudhir haviam soltado os cavalos no rio e os incitavam a atravessar.
A operação parecia estar seguindo seu curso, então Ivy e Elrohir se prepararam para ir.
Ela arregalou os olhos, o observando retirar a aljava com as flechas, o arco, a espada e mais duas facas curtas, uma de dentro da bota.
"Isso é espantoso!" Disse ela, olhando em assombro a pilha crescente de armas.
"Eu sou espantoso?" Ergueu para ela seus olhos azuis, sorrindo divertido.
Ela riu.
"É espantosa a quantidade de armas que cada um de vocês carrega..."
"Eu me acostumei. E pode apostar que tive bastante tempo pra isso." Ele respondeu jovialmente, colocando tudo aquilo na carroça, que já estava no rio e voltando ainda sorrindo, fazendo Ivy admitir que não era ruim afinal, receber ajuda dele para atravessar.
"Já que conhece tão bem o rio, tenho certeza que nossa travessia não será mais que um passeio."
"Verá que eu não darei trabalho." Ela prometeu solenemente. Estava usando as velhas e surradas culatras masculinas que costumava vestir quando viajava com o pai, então não haveria preocupações sobre suas saias se enroscando nas pernas quando nadasse.
"Eu sei." Ele respondeu, a tomando gentilmente pelo braço. "Quando entrarmos procure ficar próxima de mim e não se acanhe em gritar se tiver problemas, está bem?"
Ela concordou e eles foram.
A água estava terrivelmente gelada e quase imediatamente os membros de Ivy ficaram entorpecidos de frio. Quando haviam nadado apenas alguns metros, pensou na sorte que fora Elladan insistir para que um deles lhe acompanhasse.
Com a força da correnteza e sem a presença encorajadora de Elrohir, tinha dúvidas de que conseguisse chegar ao outro lado. Seu companheiro continuava a bater os braços com cadência, o que lhe tranquilizou bastante. De onde estavam lutando contra as ondas, pode ver que a operação com a carroça estava quase terminada, só ela e Elrohir ainda se mantinham no rio.
Satisfeita de que estivessem avançando bem, assustou-se com um barulho súbito e observou horrorizada uma grande onda avançar na direção deles. Em pânico começou a bater os braços a esmo, e quando Elrohir tentou ajudá-la, agarrou-se a seu pescoço, fazendo com que ambos afundassem.
Felizmente ele manteve a calma e passando os braços em volta dela, conseguiu voltar ambos para superfície. Sabendo que isso demandava um grande esforço dele, que também lutava contra o aumento da correnteza, procurou se acalmar, enquanto ele se esforçava para nadar os últimos metros em direção da margem.
Com toda essa manobra exigindo sua atenção, Elrohir não percebeu vários troncos, provavelmente usados para represar o rio em algum ponto de sua extensão, vindo em direção a eles.
Ivy gritou assustada, alertando o elfo do perigo iminente, que se colocou no último instante entre a menina e o pedaço de madeira maciça, que se chocou violentamente contra eles, atingindo em cheio sua cabeça. Perdendo os sentidos, seus braços se desvencilharam dela, tragado num redemoinho de água.
No momento em que todo o drama no lago se desenrolava, seus companheiros haviam terminado de puxar a carroça e a estavam afastando para um ponto seguro, quando ouviram os gritos de Ivy, que havia conseguido chegar à margem.
Mas Elrohir já ia sumindo na imensidão daquelas águas escuras. Estel começou a correr imediatamente em direção ao ponto em que o irmão havia desaparecido, seguido pelos companheiros, então Ivy subitamente mergulhou novamente, desaparecendo atrás do elfo.
Sentindo as pernas fraquejarem, Estel ajoelhou-se na terra barrenta, observando com o coração martelando a menina surgir momentos depois, trazendo com ela a figura desacordada de Elrohir.
"Ivy..." Ele sussurrou, observando-a lutar para tentar manter a cabeça de Elrohir fora d'água, mas estava afundando e submergindo, pouco capaz de impedir com que fossem arrastados.
Ela já estava engolindo muita água, pontos pretos surgindo em sua visão, quando foi agarrada e o elfo retirado de seus braços. Começou a chorar de alívio, porque os amigos de Elrohir haviam finalmente chegado até eles.
Agarrou-se em Arlan, enquanto Elladan levava com ele o irmão desacordado. Mal conseguia respirar e assim que foi posta no chão, começou a vomitar o que pareciam litros de água gelada. Expeliu tudo aquilo e no fim seu peito estava em brasas, mas já podia respirar e o pai a abraçou firmemente, enquanto lhe embrulhava num cobertor.
Quanto a Estel, assim que o irmão foi trazido de volta a terra, encontrou forças para se erguer, e ao se aproximar do semicírculo em volta dos gêmeos, percebeu que Elrohir não estava respirando. "Havia se afogado!"
Podia ouvir Elladan chamando pelo gêmeo, o abraçando de encontro ao peito.
"Elrohir... Elrohir..." Sua voz estava tremula, então Berdel fez com que se afastasse, enquanto Eruónel retirava Elrohir de seus braços.
"Elladan!" Berdel gritou enquanto empurrava o amigo, o afastando do irmão ferido. "Nada pode fazer por ele agora. Deixe que eles ajudem seu irmão!"
Elladan ainda resistiu, tentando empurrá-lo, até que os braços caíram do lado do corpo, os ombros afundados em derrota.
Estel se aproximou e fazendo um sinal com a cabeça para Berdel, tocou o ombro do irmão e apertou, tentando transmitir confiança que sequer tinha para dar. E lá eles ficaram, cada minuto de angústia mais longo que o outro.
Ele podia ouvir os esforços feitos por Eruónel e Tharlian para devolver vida ao corpo flácido de Elrohir. Eles bombeavam a água de seus pulmões com gestos vigorosos, para em seguida encher-lhe o peito de ar.
Tão imerso estava em sua angustia, custou a perceber os sons maravilhosos que começavam a chegar até eles. Elrohir estava tossindo. "Tossindo!"
Ele estava tossindo, vomitando água do rio. E Eruónel segurava-lhe a cabeça, escovando o cabelo gotejante para trás do rosto. Ele e Tharlian o mantiveram de bruços, para fazê-lo expelir a água gelada dos pulmões. Gemidos escapavam de seus lábios azulados a cada golfada. Os dedos longos e calmantes de Eruónel massageando suas costas com energia, lhe ajudando a se livrar da água para que pudesse respirar.
"Oh Eru! Obrigado, Obrigado." Estel disse, agarrando-se a Elladan. "Elly, ele está respirando!" Arrastando Elladan consigo, aproximou-se cauteloso, como se temesse que a imagem sumisse de repente. Elladan estava com o corpo rígido, como se também temesse se aproximar.
Elrohir estava tremendo com frio e choque, mas Estel estava atento de Eruónel o embrulhando gentilmente na manta que haviam trazido da carroça.
Os companheiros se afastaram para que os irmãos pudessem se aproximar e ambos se ajoelharam ao lado da figura trêmula, que gemia levemente. Estel lançou para Eruónel um olhar de gratidão. Palavras não eram necessárias.
Ele sorriu em resposta, e abaixando a cabeça agradeceu, enquanto passava Elrohir para os braços de Elladan, que finalmente pôde abraçá-lo.
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Continua...
