CAPÍTULO VII
"Muito bem" disse Lois, cruzando os braços, de pé, ao lado do sofá, enquanto encarava Clark. "O quê foi que descobriu?"
"Como?" indagou ele, que não havia ainda pensando numa forma de como não dizer a Lois o que conseguiu descobrir com Chloe sobre Falcone e Mannheim.
Lois sorriu.
"Qual é, Smallville? Por onde andou a tarde toda?"
"Bem, eu... fui dar uma voltar" respondeu ele, calmamente.
De fato, Clark não queria mais envolvê-la no que ele finalmente descobria se tratar de algo muito sério e, acima de tudo, muito mais perigoso do que imaginava.
"Você definitivamente está me escondendo alguma coisa" insistiu ela. "Acha mesmo que eu acreditei naquela estória de fazer turismo por Gotham? Eu vi sua cara de ânimo quando atravessamos de carro a cidade hoje mais cedo -"
"Lois, eu não sei do que você está falando"
"Tudo bem" disse ela, tirando o celular do bolso do casaco. "Eu simplesmente vou ligar pra Chloe e ela vai ter que me contar tudo"
Ao ver que era exatamente o que ela estava fazendo, Clark disse:
"Ele nem mesmo vai mais à audiência, Lois"
Ela sorriu.
"Estava ouvindo nossa conversa, Smallville?"
"Não, não... de forma alguma -" disse ele, embaraçado.
"Lógico que ele vai" disse ela, encarando-o com o telefone encostado da orelha, esperando Chloe atender. "Bruce mente tanto quanto você, Smallville... E nenhum dos dois consegue me enganar"
Clark sorriu um sorriso nervoso.
A persistência de Lois o surpreendia cada vez mais.
"Alô?" disse ela, quando alguém atendeu o telefone celular de Chloe. "Ah, ela já saiu, é? E esqueceu o celular? Hum. Tudo bem, então. Obrigada. Boa noite"
"O quê houve?" indagou ele.
"Não, o que houve é que você e a Chloe estão juntos nisso e não querem me contar o que está acontecendo. Só isso" respondeu Lois, conformada, procurando na agenda eletrônica do celular o número do dormitório da prima.
Clark suspirou.
"Falcone tem um inimigo em Metropolis" respondeu ele, dando-se por vencido.
Lois o encarou, enquanto parava de mexer no celular.
E ele continuou:
"Parece que os dois vêm sabotando os negócios de um e outro já há algum tempo"
"Mannheim?" indagou ela.
Clark a encarou, surpreso.
Ao perceber, pela reação dele, que havia adivinhado, Lois disse:
"Também me mantenho informada, Smallville"
"Bom, parece que Chill entrou em contato com esse sujeito de Metrópolis através do advogado dele, um tal de Maxwell Jensen -"
"E Chill concordou entregar Falcone se Mannheim mandasse alguém matar Bruce" completou Lois.
Clark arqueou as sobrancelhas, perplexo. Afinal, nem mesmo ele ou Chloe haviam ainda chegado àquela conclusão.
"Como foi que -"
"Faz sentido, não acha?" indagou ela, caminhando pela sala.
E Clark a ouvia com atenção:
"Se Joe Chill tem medo de alguém, e parece não ser do Falcone pois vai até mesmo entregá-lo, com certeza é do único sobrevivente da família Wayne, provavelmente temendo a idéia de vingança ou coisa do gênero" continuou ela. "Como qualquer pessoa, ele quer liberdade, então, como não é esperto o bastante, o que deve ter acontecido foi que Mannheim, com interesse em tirar Falcone do caminho, descobriu que Chill dividiu a cela com ele, e os dois começaram a se falar. Se duvidar, o próprio Mannheim embutiu na cabeça fraca do Chill que o Bruce poderia querer se vingar dele só para ele entregar o Falcone -"
"Chill ligou duas vezes da prisão para Metrópolis -" comentou Clark.
"Como sabe disso?" indagou ela, surpresa.
"Bom, eu -" balbucionou ele, que não sabia como dizer a ela ter passado aquele final de tarde invadindo o Gabinete do Promotor-Chefe do caso Chill.
"Tudo bem. Não importa" interrompeu Lois, que pretendia continuar seu raciocínio. "O fato é que, temendo uma represália do único sobrevivente do crime que o colocou atrás das grades, Chill decidiu fazer o que Mannheim lhe pediu, e aceitou o acordo com a Promotoria para entregar Falcone -"
"Em troca disso, Mannheim contatou alguém para tirar Bruce do caminho de Chill" completou Clark.
"Isso mesmo" disse ela, encarando-o.
"Como foi que -"
"Por dedução, Smallville. Por dedução" disse Lois. "Com certeza vai acontecer amanhã na audiência, senão, que outro lugar perfeito para matar um bilionário que não debaixo dos holofotes? E Mannheim mostraria todo seu poder até mesmo em Gotham -"
"Lois, agora acho que definitivamente temos que ir à polícia" disse ele, com sinceridade, preocupado com a proporção do problema que tinham em mãos.
"Não adianta. Não temos provas disso. E mesmo presos, os Lucchesi nunca vão abrir o bico. Nem sabemos onde o assassino vai estar" disse ela. "A única coisa que podemos fazer é impedir que Bruce vá a essa audiência"
Com o olhar perdido, Clark ficou pensativo.
"Algum problema?" perguntou ela.
"Não" respondeu ele.
"Ótimo" disse ela, olhando para o relógio. "Porque é melhor dormirmos logo porque amanhã vai ser um dia cheio -"
Lois atravessou a sala e caminhou em direção à porta:
"Ah, você sabe onde fica o quarto onde vai dormir, não é mesmo?"
"Sim" respondeu ele, sem se mover. "O Alfred me disse"
"Que bom, porque não quero você entrando 'por acidente' no meu"
Clark nada disse, e quando Lois já estava saindo, ele a chamou:
"Lois, espera!"
"Algum problema?" perguntou ela, virando-se para vê-lo.
"Eu queria saber uma coisa -"
"E o quê é?"
"Bem, eu... er -"
"Fala logo, Smallville!" pediu ela, impaciente.
"Bom, depois que isso tudo acabar -" disse ele, sem saber como terminar a frase.
"Algum problema?"
"Parece que você e Bruce têm algo a resolver entre vocês" completou, não muito certo do que estava fazendo. "Não quero atrapalhar, então -"
"Smallville!" exclamou Lois, sorrindo, e aproximando-se dele.
E Clark sorriu um sorriso amargo.
Não devia ter dito aquilo.
Certamente ela viria com mais algum dos seus comentários sarcásticos.
"Não existe mais nada entre eu e Bruce" disse ela, não muito certa de dar satisfação a Clark.
E aquela afirmativa, de certa forma, apaziguou Clark, que ainda não entendia o que estava acontecendo com ele. Como se já não bastasse a complexidade do problema que tinha em mãos, envolvendo mafiosos e tramas de assassinato, havia também aquele sentimento crescente por Lois que estava simplesmente tirando o chão sob seus pés.
"Não que eu lhe deva explicações" continuou ela.
E Clark sorriu, meio que se sentindo aliviado. Aquela era a Lois de sempre.
"Afinal, não é da sua conta" disse ela.
Lois o fitou, e o silêncio começava a se tornar um tanto quanto constrangedor, até que, por mais que soubesse que seu passado com Bruce não era do interesse de mais ninguém a não ser deles dois, achando que, de certa forma, devia explicações a Clark, mesmo sem entender o porquê, continuou:
"O fato é que tivemos uma infância em comum quando nos conhecemos numa viagem a Londres há alguns anos atrás quando meu pai trabalhava numa base em Marseille, na França. Foram tempos difíceis. Eu fui praticamente 'forçada' a passar uns dias na Inglaterra. Bruce passava uma temporada por lá e ficamos amigos. Éramos crianças e mantivemos contato por vários anos, e... bem, o resto é estória. Hoje somos apenas amigos -"
Subitamente, Clark fez algo que nem mesmo ele entendeu. Enquanto Lois falava incessantemente, ele se aproximou e se inclinou sobre ela, que, surpresa, parou de falar e se inclinou para trás.
E Clark apenas elevou a mão até seu rosto e, quase tocando na sua face, desviou lentamente para seus cabelos, de onde tirou uma folhinha de árvore que devia estar ali desde que voltaram do jardim.
Lois viu a folhinha entre os dedos de Clark e o encarou com surpresa. Por um momento, achou que ele faria outra coisa. Mas sorriu pensando na possibilidade, que, de tão absurda era quase insana.
"É isso, Smallville" disse ela então, com um sorriso no canto dos lábios, ainda incrédula acerca da sua imaginação fértil. "É melhor eu deitar ou não consigo acordar cedo"
E Lois simplesmente lhe deu as costas e o deixou sozinho com seus pensamentos.
----------------------------------------------------
Instantes depois...
Após alguns minutos de reflexão, Clark decidiu que mesmo ele precisava descansar. Havia sido um dia desgastante para todos e ainda havia muito a acontecer.
Enquanto subia as escadas em direção aos aposentos preparados para ele, conforme Alfred indicou, ouviu um barulho do outro lado do corredor. Lentamente, aproximou-se da porta, e usou sua visão de raio-x.
Clark viu, então, Bruce abrindo uma mala com roupas e tirando entre camisas e suéteres, um revólver, o qual ele ficou olhando por um tempo, e depois colocou dentro de um casaco comprido que estava sobre uma cadeira.
----------------------------------------------------
Na manhã seguinte...
Clark estava sentado numa cadeira ao lado da cama de Lois e a observava dormir enquanto a luz do dia iluminava o quarto.
Seria mais um dia cinzento em Gotham City, pensou ele.
Na mesinha ao lado da cama, o celular de Lois estava desligado por falta de bateria.
E Clark, que havia passado quase a noite toda ali, ao seu lado, observando-a, tentando entender o que acontecia com ele, o que o fazia sentir-se tão impotente diante de Lois Lane.
E muitos eram os seus pensamentos.
Sabia ele que, de certa forma, ela ainda amava Bruce, e não queria que ela soubesse o que estava para acontecer. Imaginou o quanto ela poderia vir a sofrer se descobrisse que Bruce estava mesmo pensando em vingar a morte dos pais, e que Joe Chill realmente tinha motivos para temê-lo.
Ele então se levantou, e ainda enquanto a observava, ouviu, com sua super-audição, um carro saindo da garagem.
Cautelosamente, abriu um pouco a cortina, e viu que Bruce estava de saída, provavelmente a caminho da audiência.
Suspirou e se virou novamente para ver Lois.
Não deixaria que nada acontecesse de ruim a Bruce.
Não deixaria que nada e ninguém magoasse Lois.
Continua...
