Retratação: Saint Seiya e seus personagens não me pertencem. Mas a Liz e o Luc sim. Sukhi é o alter ego da minha adorada amiguinha Dark Faye e a estou usando em forma de homenagem com o consentimento dela, claro! E mais créditos: o nomezinho do Luc foi uma idéia mais que sugestiva da Calíope Amphora em uma conversa pelo MSN, então, créditos pra ela também!

Recadinhos: nem sei por onde começar, gente! Sério mesmo. Meses e meses sem atualização, e só o que posso dizer e pedir é desculpas. Um bloqueio de idéias e várias outras coisinhas me impediram de seguir em frente, mas eu não desisti. Aqui está um capítulo para vocês, meu presente de Natal. Prometo que no próximo, mais coisas legais vão acontecer. Deveriam estar inseridas nesse capítulo, mas ele iria ficar enorme, por isso, achei melhor cortá-lo. Mas acredito que para as fãs de Máscara da Morte e Afrodite, vai ser um prato quase cheio, não é mesmo? Um beijo especial a todas que deixaram reviews durante esses meses e que me apoiaram pelo MSN, especialmente Pipe, Faye, Litha, Ju e Arsínoe. As reviews de Ophiuchus No Shaina, Chibiusa, Kitsuna Lina, Mila, Anne, Litha, Athenas de Áries, Musha, Arsínoe, Faye, Gizinha, Marcela (minha xará!), Ju, Ia-chan, Patty, Perséfone-san, Ladymasoch e Alfa Epsilon que me ajudaram a seguir e seguir. Vocês são demais! Tem mais recadinho lá no final, tá? Beijão em todas, Feliz Natal, um 2006 maravilhoso!

Resumo: depois de sete anos longe do Santuário, Shaka volta à Grécia, onde pretende retomar a vida, mesmo que tudo tenha mudado à sua volta. Yaoi com flashback, lemon, um pouquinho de violência. Casais: Shaka/Mu; Miro/Kamus; Máscara da Morte/Afrodite.

Capítulo 16 – Caminhos de Pedra e Flores

Paris, França

Miro entrou pela porta giratória do hotel, sendo seguro por Luc. O grego parecia um pouco fora de órbita e sorria descontrolado. O francês apenas tentava colocar o outro de pé, chamando o mínimo de atenção.

Caminharam meio incertos por todo extenso lobby e ao passar pela recepção, foram chamados pela mulher que estava em seu turno de trabalho. Ela conteve o riso ao ver que Miro contava em voz alta quantas lâmpadas tinham em um dos lustres do hotel.

-Senhor Miro, encomenda para o senhor. –ela disse, estendendo uma caixa marrom para o grego, de onde pendia um cartão ao seu lado. Rapidamente ele fixou os olhos ali, reconhecendo instantaneamente a caligrafia de quem havia escrito seu nome. Sentiu na mesma hora o efeito das garrafas de champanhe sumirem de sua corrente sanguínea e a sobriedade lhe alcançou novamente.

-Não quero saber o que é isso. –ele murmurou, passando por Luc, sem olhá-lo, caminhando na direção dos elevadores. O francês apenas o observou andar cambaleante e pegou a caixinha das mãos da recepcionista.

-Deixe comigo. Farei com que seja entregue. –disse, sorrindo, amistosamente, caminhando até o amigo.

Entraram no elevador e Miro parecia perdido em seus pensamentos. Os olhos mantinham-se focados nos números que levavam ao seu andar, mas ele não os via, não saberia o que estava acontecendo. Somente quando Luc tocou-lhe o ombro, indicando que já estavam no andar que o grego estava ocupando, é que ele balançou a cabeça, saindo do elevador.

Abriu a porta mecanicamente e se jogou na cama. Luc estava achando aquilo tudo muito estranho, mas não sabia se deveria tocar no assunto que envolvia aquele presente que fora deixado para Miro. Por fim, concluiu que não havia mal algum em perguntar.

-O quê foi aquilo lá embaixo?

-Não é da sua conta. –Miro respondeu, virando-se, ainda deitado, para a janela, ficando de costas para o francês. Percebeu que a cama cedeu um pouco e pelo perfume próximo de si, soube que Luc havia se sentado ali.

-Seria algo relacionado a isso aqui? –perguntou mais uma vez, colocando a caixa, na frente de Miro.

O grego se sentou na cama, olhando a caixinha como se fosse algo proibido. Em sua cabeça, centenas de perguntas o atormentavam. Estava com medo de abrir o cartão, abrir a caixa, saber o que aquilo tudo estava fazendo ali, bem à sua frente.

-Abra pelo menos, Miro. Não é exatamente a caixa de Pandora. –Luc disse e Miro sorriu amargamente, lembrando-se de sua ida ao inferno de Hades.

Tomou a caixinha nas mãos, soltando o cartão e colocando-o do seu lado, sem dispensar muita atenção. Sorriu mais uma vez ao ver o que se encontrava ali dentro, algumas lágrimas vindo em seus olhos e ele não conseguindo evitá-las de cair. Sentiu-se fraco, derrotado. Levantou-se e caminhou até a janela, deixando Luc admirando o presente.

Um lindo e enorme relógio prateado, com pulseira de couro marrom. Os ponteiros tinham, em suas pontas, pedras azuis, muito parecidas com a cor dos olhos de Miro.

-É um lindo presente. Não vai abrir o cartão para saber quem...

-Eu sei quem mandou. –Miro interrompeu o ruivo, ainda sem o olhar.

-Não vai ler o cartão?

-Não me interessa o que ele tem a dizer.

Luc tomou a liberdade de abrir o cartão e ler seu conteúdo. Seria melhor que Miro realmente não lesse o que estava escrito ali. Mas por outro lado, seria bom que ele soubesse sim, de uma vez por todas, quem sabe o jogo entre ele e Kamus não terminaria de uma vez?

-Ele esteve aqui em Paris, Miro. –Luc disse, e percebeu que o grego virou-se em sua direção no mesmo instante, com uma expressão que mesclava incredulidade e raiva.

-Então ele é mais covarde do que eu pensei. –Miro caminhou até Luc e tomou o cartão das mãos do francês. Ao ver a caligrafia perfeita de Kamus e não entender a mensagem que estava escrita, revoltou-se ainda mais. –O quê está escrito nessa porcaria?

-Algo como "Cheguei tarde demais, mas feliz aniversário assim mesmo."

-Covarde, idiota. –Miro disse, entre os dentes.

-Miro, se me permite, ele pode ser qualquer coisa, menos covarde.

O grego fitou o francês, os olhos azuis cheios de raiva. Não entendia como o outro podia ficar do lado de Kamus, mesmo sem o conhecer? Será que aquele outro tinha tanto poder assim sobre todos? Ele era a vítima, não o maldito francês que nem ao menos aparecia para falar com ele em seu próprio aniversário!

-Deveria saber que você iria ficar ao lado dele, todos ficam. Eu sempre sou o vilão dessa história mesmo.

Luc balançou a cabeça, os fios ruivos soltando-se do rabo de cavalo baixo que os prendiam Miro era um amor de pessoa, mas às vezes era cabeça dura demais, simplesmente não conseguia enxergar as coisas que estavam tão óbvias à sua frente.

-Agora, você está sendo patético. –quando o grego protestou, ele apenas levantou uma das mãos, pedindo que ele esperasse a conclusão de seu raciocínio. –Ele pode ser tudo, Miro, mas veio até aqui para te procurar, no dia do seu aniversário.

-E foi embora, sem me esperar. Isso é covardia. Não é digno de um cavaleiro.

-Você não sabe o que aconteceu nesse meio tempo. E acredito que se fazer de vítima não seja digno de um cavaleiro também. –quando Miro sentou-se novamente na cama, Luc acompanhou-o. –Miro, mon cher, preste atenção. Ele está te dando todas as chances. Agora depende de você, apenas de você.

-O quê quer dizer com isso?

Luc levantou-se, bagunçando os cabelos de Miro, que ainda o olhava, esperando por uma resposta, ou pelo menos por uma luz, uma idéia. Qualquer coisa que lhe tirasse daquele estado de dúvida e raiva.

-Depende de você ser uma vítima ou não. Depende de você ser infantil ao ponto de ignorar que isso aqui não é apenas um presente e esse bilhete não é apenas uma provocação ou prova de covardia. É um sinal de que ele te quer de volta. E pra mim, isso é a maior prova de coragem de um homem.

Luc caminhou em direção à porta, não esperando o que Miro tinha a lhe dizer. Sabia que havia pelo menos colocado uma sementinha de dúvida na cabeça do grego, só esperava que o outro não lhe entendesse mal.

-Mas eu ainda tenho muito o que fazer aqui. Pelo menos mais uma semana. Ninguém me esperaria por tanto tempo. –Miro queria parecer prático, mas sua cabeça estava lhe bombardeando com imagens de Kamus e com coisas que o francês poderia ter visto. Será que ele o vira com Luc? Será que realmente havia ido até lá para que se reconciliassem? Estava a ponto de enlouquecer, quando a voz macia do amigo o acalmou.

-Algo me diz, cherie, que você nunca foi muito adepto a seguir regras. Estou certo?

Miro olhou-o com um sorriso cheio de malícia e Luc devolveu o gesto, em aceitação e comprovação de que estava certo.

-Joyeux anniversaire, Miro.

O grego observou Luc sair do quarto e sentiu-se renovado de algo que não sentia há algum tempo. Algo que havia deixado para trás, desde que terminara seu relacionamento com Kamus: o sentimento da caça, de perseguição.

Segurou o relógio em um dos dedos, observando os ponteiros azuis e prateados, refletindo em seus olhos. Kamus estava certo. Havia chegado a hora.

A hora de recuperar o que era seu.

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Hospital Central, Grécia

Máscara da Morte entrou pelo corredor da emergência do hospital ignorando todas as macas e médicos que o olhavam, não entendendo o porquê de ele estar passando por ali. Olhava na direção dos leitos, mas algo lhe dizia que Afrodite não estaria ali.

Seu peito apertava cada vez que pensava no sueco e no estado em que ele poderia se encontrar. O homem ao telefone havia sido tão vago ao informar o que acontecera, que ele logo imaginou que o pior poderia ter acontecido: um acidente, um atropelamento. Eram coisas tão comuns, mas mesmo eles, cavaleiros de ouro, não estavam imunes aqueles tipos de coisa.

Finalmente encontrou a recepção. Como acreditava, não encontrara Afrodite na emergência, o que era um bom sinal. Ele deveria estar em um quarto particular. Lembrou-se vagamente que Saori sempre dissera que quando precisassem ir ao hospital, poderiam ficar em quartos particulares. A mulher que estava sentada atrás da bancada branca se assustou com a chegada do italiano, que praticamente se debruçou, chamando sua atenção.

-Preciso de informação sobre um paciente. O nome dele é Afrodite.

-O senhor quem é parente dele?

-Parceiro. –disse e percebeu que a mulher franziu a testa ligeiramente, um ato que ele entendeu como sendo de desaprovação. Naquele instante, teve vontade de enforcá-la e colocar sua cabeça decorando seu templo.

A mulher virou-se para Máscara da Morte e procurou dados no computador. Alguns minutos depois, o que para o italiano pareceu décadas, ela voltou-se para ele novamente e informou em que quarto o sueco se encontrava. O cavaleiro nem se deu ao trabalho de agradecer a informação, estava mais interessado em encontrar seu peixinho.

O elevador o deixou no terceiro andar rapidamente e ele seguiu pelo corredor iluminado até a última porta. Suspirou profundamente, se controlando, pensando no que ia dizer. Poderia muito bem também apenas se jogar em cima do outro e beija-lo, mostrar com ações e não palavras o que sentia. Mas Afrodite não precisava daquilo naquele momento, não precisava se agressividade e sentimento de posse. Precisava apenas de alguém do seu lado, alguém que se importasse com ele. E Máscara da Morte estava, finalmente, disposto a ser aquela pessoa.

Abriu a porta devagar, odiando o barulho arranhado que ela fez. O sueco, deitado na cama, rapidamente se virou em sua direção e Máscara da Morte sentiu-se corar ao ver os olhos que tanto admirava passarem por seu rosto, como se o estivesse vendo pela primeira vez.

-Afrodite! O quê aconteceu com você? Por quê não avisou a ninguém que estava aqui? –perguntou, caminhando lentamente até o sueco, que simplesmente desviou o olhar, prestando atenção na programação da TV que estava ligada bem à sua frente.

-Não preciso de ninguém, Máscara da Morte. Estou bem, como pode ver. –disse, ainda prestando atenção no aparelho.

O italiano bufou, mas ainda hesitante se aproximou da cama mais ainda. Parado ali ao lado de Afrodite, ele reparou que os lábios do outro não estavam tão vermelhos como era de costume e que sua pele, naturalmente alva, estava em um tom pálido. Preocupou-se ainda mais.

-Não, não está. –disse, firme. –Está numa cama de hospital, sozinho. Deveria ter chamado alguém. Deveria ter me chamado.

Afrodite, que até aquele momento não olhava e fingia não prestar a atenção nas palavras do italiano, finalmente fitou-o. Com um pontada de culpa antecipada pelo que diria a seguir, reparou nos olhos azuis de Máscara da Morte uma preocupação genuína. Mas não podia deixar-se levar, senão, o italiano sempre ganharia.

-Você é solteiro, Máscara da Morte, ou já se esqueceu? Não deveria preocupar sua cabeça comigo. –completou, sorrindo ligeiramente, voltando a dispensar atenção à TV, perdendo o olhar de decepção do italiano.

Talvez tivesse vindo rápido demais, mas quando percebeu, Afrodite estava sendo apertado de encontro ao colchão incômodo da cama de hospital. Em cima de si, um Máscara da Morte irreconhecível atraía sua atenção, com aqueles olhos azuis faiscantes. Quando queria, o italiano conseguia conquistar qualquer um. E o sueco não parecia ser exceção. Engoliu em seco quando percebeu os lábios do outro virem em sua direção e tentou desviar-se deles, mas sua força de vontade, aliada aos medicamentos que tomara, pareciam não colaborar.

Teve os lábios beijados de maneira calma, o que o surpreendeu, já que conhecia aquele italiano pela impetuosidade e não por sua gentileza. Máscara da Morte procurou passagem por ali com sua língua e Afrodite deixou-se ser invadido, completamente entregue. As mãos viajaram para os cabelos do italiano, odiando como elas pareciam ter vida própria, por mais que ele imaginasse que não deveria aceitar aquilo tudo.

Beijaram-se por incontáveis segundos, até que o italiano foi o primeiro a separar-se do sueco, que ainda se manteve de olhos fechados, como se não quisesse esquecer o que estava acontecendo, como se ainda estivesse perdido naquele momento que se passara tão brevemente.

-Você é tão tolo... –Máscara da Morte disse, tocando os cabelos azuis de Afrodite, afastando uma das mechas que caía por cima de seus olhos, assim que o sueco os abriu.

-O quê quer dizer com isso? –Afrodite tomou uma postura mais séria, mais contida, forçando-se a ficar sentado na cama. Observou atentamente cada movimento do italiano, que distanciou-se um pouco, mas manteve-se sentado na cama.

-Tolo. Você o é. Mas ainda assim não consigo deixá-lo. E fique sabendo que tentei, se todas as formas possíveis. Mas quem consegue simplesmente abandonar o irresistível cavaleiro de Peixes?

Afrodite estreitou os olhos, como se não acreditasse em nenhuma daquelas palavras. Aliás, se parasse para pensar, nada daquilo fazia muito sentido, desde o início de sua noite.

-Eu que ganho um boa noite Cinderela de presente e você quem fica fora de órbita? –perguntou, irônico, reparando que Máscara da Morte sorrira com aquele comentário.

-Então foi isso o que aconteceu. Sempre achei que você sabia se cuidar nesses lugares, Dite. Mais um motivo pelo qual não devo deixar você sozinho.

-Não sou uma criança e não preciso da sua proteção. Aliás, acho que estou muito melhor sem você ao meu lado. –cruzou os braços e o italiano continuava a sorrir.

Mais uma vez foi surpreendido pela aproximação de Máscara da Morte, que daquela vez não se jogou sobre ele, apenas manteve uma distância considerável dele, observando cada pequeno detalhe do rosto bonito e perfeito que conhecia tão bem.

-Sinto muito, mas dessa vez, sua opinião não vai ser levada em consideração. Estou preso a você, Dite. Você querendo ou não. –disse e quando percebeu que o sueco pretendia protestar, ele adiantou-se. –Não adianta falar nada. Você sabe que será inevitável. Estamos fadados a estarmos eternamente juntos.

-De onde saiu tudo isso? –Afrodite perguntou, ainda sem demonstrar nenhuma reação. Por dentro, seu coração batia acelerado e sua garganta estava fechada, seca. Tinha quase certeza de que haviam colocado alguma coisa no remédio que ele tomou. Era algum tipo de alucinação ou brincadeira de mau gosto, ouvir tudo que sempre quis. Era tão horrível, que chegava a ser cruel.

-A gente só percebe as besteiras que faz, quando uma maior aparece e não temos como fazer nada. Já ouviu isso antes?

-Então, seu súbito interesse e vontade de ser um bom samaritano é por pena? Porque eu estou aqui nessa cama? Olha, Máscara da Morte...

-Por Zeus, será que você não pode simplesmente aceitar que eu errei e que quero ficar com você? Por quê é tão difícil aceitar isso? Ou será que devo achar que você se cansou de mim?

Afrodite levantou uma das sobrancelhas, subitamente interessado naquele italiano à sua frente. Imprevisível, ele pensou, enquanto abria um pequeno sorriso.

-Não coloque a culpa em mim pela sua cegueira. Ninguém pediu que viesse até aqui. –disse, cruzando os braços, em visível birra.

-Você é realmente um tolo. Deus do céu, vem cá... –Máscara da Morte completou, puxando Afrodite para perto de si. O sueco já havia fechado os olhos, esperando pelo beijo que não veio. Sentindo-se um bobo, abriu os olhos e encontrou-se hipnotizado pelas orbes azuis escuras do italiano, que balançava a cabeça e mantinha um sorriso pequeno nos lábios cheios. –Até quando vai negar que isso é certo?

-Tudo bem, eu já entendi a mensagem. –murmurou, afastando-se do italiano e encostando-se novamente nos travesseiros. Máscara da Morte apenas o observou.

-É só isso o que tem a dizer?

-O quê queria que eu dissesse? Que eu te amo por toda a minha vida, que quero passar o resto dos meus dias com você? –o sarcasmo na voz de Afrodite fez com que Máscara da Morte recuasse um pouco. Seus olhos ficaram um pouco tristonhos e o sueco logo percebeu que havia ido longe. –Bem, você sabe que isso é verdade, não podemos negar. Por mais que eu tente. –finalizou, divertido, logo recebendo um sorriso maroto por parte do italiano.

-Sempre me surpreendendo...você merece um presente por isso...

-O quê quer dizer...

Não pôde continuar, pois seus lábios foram tomados mais uma vez, com a impetuosidade que já estava acostumado. Enroscou-se no pescoço de Máscara da Morte, as unhas rascunhando indefinições pela nuca do italiano. Sentiu-o suspirar dentro de seus lábios, as mãos firmes e bem talhadas do outro correndo por suas costas, querendo procurar passagem por baixo da blusa preta que usava. Naquele instante, Afrodite afastou-se do italiano, lambendo os lábios, agora inchados pelo delicioso contato com os do outro.

-Está pensando em fazer o que eu estou pensando aqui?

-Por quê não? –Máscara da Morte perguntou, com um sorriso malicioso. Afrodite devolveu-o na mesma medida, mas balançando a cabeça em desaprovação.

-Você é maluco.

-Sim, e qual a novidade? Eu coleciono cabeças.

-Realmente. Aquilo é de muito mau gosto. –observou, prontamente.

-Não mude de assunto. O quê acha?

-De transar no hospital? Que você perdeu a sua cabeça.

-Não me culpe se não consigo resistir a você.

-Grande desculpa. Culpe o Afrodite, como sempre.

-Shh...fica quietinho... –Máscara da Morte pediu, aproximando-se novamente, mas daquela vez não deixou que Afrodite protestasse. Partiu rapidamente com as mãos para a blusa do outro, retirando-a de uma só vez.

Deitou-se desajeitadamente sobre o corpo já seminu de Afrodite, que tentava encontrar uma posição confortável para ambos em cima da incômoda cama do hospital. Porém, quando os lábios de Câncer e Peixes se tocaram, como em um passe de mágica, todos aqueles pequenos detalhes foram esquecidos. As bocas, ávidas, só procuravam por seu complemento uma na outra, as línguas se enroscavam como serpentes ao encontrar suas presas. Mãos voavam pelos cabelos, emaranhando-os, afagando e percorriam caminhos tão conhecidos, mas que ofereciam as mesmas reações, como se tivessem sendo tocados pela primeira vez.

-Eu te quero tanto... –Máscara da Morte afirmou aos ouvidos de Afrodite, a voz nublada de desejo, quase um pequeno sussurro. O sueco apenas fechou os olhos e sorriu ligeiramente, orgulhoso de si mesmo, satisfeito por arrancar uma confissão tão espontânea do italiano.

-Bom saber disso agora. –replicou, matreiro, não deixando que o canceriano falasse nada, apenas sentisse seus lábios, seus toques. Não havia passado muito tempo desde que estiveram naquela mesma posição confortável e conhecida, mas somente distante naqueles momentos, é que puderam perceber o quanto queriam e precisavam um do outro.

Máscara da Morte aproveitou uma pequena displicência de Afrodite e pegou os braços do sueco, prendendo-os firmemente, pelos pulsos, ao lado de sua cabeça. O pisciano levantou uma das sobrancelhas, mantendo um sorriso que podia ser traduzido facilmente como entendimento. Já haviam feito aquele tipo de joguinho de sedução várias vezes, onde ele sempre se mostrava fraco demais para resistir ou fugir aos ataques do italiano.

Mas se esperava os beijos ávidos e mordidas por seu peito, Afrodite foi pego de surpresa quando o canceriano simplesmente permaneceu naquela posição, observando seu rosto, perdendo-se momentaneamente nos olhos azuis claros. O sueco sentiu-se corar rapidamente diante daquela análise e tentou desviar os olhos, mas percebeu estar preso a eles. Um sorriso formou-se nos lábios do italiano, que só então fez sua descida, traçando um caminho de beijos molhados, que começara no meio do pescoço do outro e continuava, perdendo alguns minutos preciosos em carícias em ambos os mamilos do pisciano. O gemido já esperado excitou-o ainda mais, fazendo com que continuasse os mesmos gestos pelo abdômen definido, que poucas pessoas sabiam que se escondia por debaixo das belas roupas de marca que Afrodite fazia questão de usar.

Subiu mais os pulsos presos, dessa vez para cima da cabeça de Afrodite, onde pôde segurá-los com apenas uma das mãos. A outra, livre, partiu para dentro das calças do pisciano, procurando desabotoá-las, tocá-lo, fazer qualquer coisa que sua mente pedisse primeiro. O que importava era estar ali como sempre quis, reunir-se sem questionamentos ou medos tolos. Afrodite era o único que queria e nada o impediria de tê-lo, nem que fosse ali, naquela cama de hospital.

-Afrodite, não acredito ter... –o médico abriu a porta do quarto abruptamente, deixando a prancheta cair no chão ao reparar na cena diante de seus olhos.

O sueco corava da cabeça aos pés, os pulsos ainda seguros por Máscara da Morte, que, quase deitado sobre si, era o único no recinto que parecia não se importar com aquela flagra.

-Boa noite, doutor. Que hora, hein? –disse, saindo de cima do pisciano, mas sentando-se próximo a ele, na ponta da cama.

-Sinto muito interromper.

-Imagina! Sabe como somos. E quem resiste ao Dite aqui? –o italiano continuou, subitamente sentindo-se bem por colocar o sueco em uma situação constrangedora.

-Bem... –o médico começou, voltando a olhar a prancheta que nem sabia como havia voltado para suas mãos. –São os resultados dos exames, Afrodite. Você está bem, removemos completamente as drogas do seu sistema.

-Isso significa que posso ir? –perguntou, já ansioso. Na verdade, sempre odiara hospitais, mas naquele momento o que mais queria era estar com o italiano e de preferência puni-lo pelo que fizera minutos antes.

-Normalmente pediria que ficasse essa noite em observação aqui no hospital, mas acredito que sei amigo manterá os olhos sobre você a noite inteira. Ou estou errado?

-Não apenas os olhos...­ –Máscara da Morte murmurou baixinho, apenas para Afrodite ouvir e corar instantaneamente e logo olhou para o médico, abrindo um largo sorriso. –Serei o melhor enfermeiro que puder, doutor.

-Então, considere-se liberado, Afrodite. Se tiver algum problema, não hesite em me procurar. Boa noite para vocês dois.

O médico se despediu rapidamente e assim que a porta foi fechada atrás dele, Afrodite lançou uma das mãos no ombro de Máscara da Morte, dando-lhe um sonoro tapa. A reação do italiano foi apenas gargalhar com o gesto do outro.

-Por que fez isso? –perguntou, alisando o local com uma das mãos.

-Ficou maluco de falar aquelas coisas perto do médico? Ele provavelmente pensou que eu...

-Que nós somos um casal apaixonado e insaciável, o que não deixa de ser verdade. –continuou, aproximando-se do pisciano, os dedos começando a traçar formas desconexas pelo braço do outro, que se arrepiou prontamente. –Só que ele poderia ter demorado a dar essa notícia mais um pouquinho.

-Como assim? –Afrodite perguntou, levantando uma das sobrancelhas.

-Não vou poder realizar meu desejo de ficar com você aqui nessa cama de hospital. Você quer ir embora.

Afrodite abriu um largo sorriso, os olhos azuis faiscando de contentamento e desejo. A noite que prometia ser um desastre estava tendo um final apropriado, inesperado e interessante. Pros diabos, ele pensou, passando a língua pelos lábios sedutoramente.

-Sabe, ele disse que eu podia ir embora. Mas isso não quer dizer que tem que ser nesse exato momento. –murmurou, puxando Máscara da Morte pela camisa, grudando ambos os lábios em um beijo voraz, capaz de amolecer o coração mais frio.

-Você então... –o italiano começou, não sabendo bem onde estava. Os beijos de Afrodite sempre lhe deixavam daquela maneira.

-Sempre tive uma certa tara por hospitais, então por que não? –completou, deitando-se na cama, completamente entregue ao italiano, que sorriu, imitando os gestos do amante.

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O sol ainda se precipitava por algumas nuvens quando Liz acordou. A dor causada pelo ferimento de Mu ainda lhe incomodava, não deixando que a mulher tivesse uma noite de sono tranqüila. Sorrateiramente, depois de verificar que o machucado não estava infeccionado, ela saiu do quarto, apenas para constatar que Shaka já estava acordado, concentrado em uma de suas meditações matinais. Sorriu ligeiramente diante da cena, sentindo uma onda de familiaridade lhe tomar. Era como se tudo tivesse voltado ao que era antes, como se ainda estivessem na Índia, mas ainda assim tudo estava diferente. Mu havia acontecido, finalmente e ela não podia deixar de estar um pouco contente pelo virginiano.

Porém, ao mesmo tempo em que sentia aquela súbita felicidade, não conseguia deixar de se preocupar com os acontecimentos da noite anterior. O ariano não era tão normal como deixava aparentar e pelo infindável número de vezes ela questionou-se se aquilo não era um pré-requisito do signo que compartilhavam.

-Seus pensamentos estão tão pesados que interrompem minha meditação, Elizabeth Diana. –Shaka disse, em tom autoritário, porém um pouco divertido, usando o nome completo da mulher, fazendo com que imediatamente ela corasse.

-Sinto muito, Shaka. Não foi minha intenção. Vou sair. Desculpe. –ela murmurou, constrangida, caminhando para a saída do templo. Shaka percebeu no mesmo instante que ela não havia reparado em seu tom de brincadeira.

-Ei, por que tão arredia, Liz? Eu fiz uma brincadeira, não precisa sair. –o loiro comentou, saindo da posição de lótus e caminhando até ela, que baixou a cabeça.

-Não tive uma boa noite de sono, só isso. –respondeu, desviando o olhar. Sabia que Shaka era capaz de desvendar-lhe os pensamentos com apenas uma pequena observação. E não estava preparada para piorar ainda mais a situação entre ele e Mu.

-Mesmo? –Shaka perguntou novamente, sentindo que havia algo que não estava sendo totalmente revelado.

-Absolutamente. Sabe, estive pensando em sair com Eric hoje. Comprar coisas para a escola, alguns outros presentes, o que acha? –ela mudou de assunto, percebendo que era melhor caminharem por um terreno neutro.

-Uma ótima idéia. Aposto que ele vai adorar. –Shaka sorriu finalmente, sabendo como era fácil deixar-se levar quando o assunto era o filho dos dois.

Liz retribuiu o sorriso e resolveu voltar para o quarto, tomando cuidado para não mancar ou dar qualquer indício de que estava ferida. Não podia arriscar-se, não se perdoaria se piorasse a já delicada situação entre o ariano e o pai de Eric.

Para Shaka, o restante do dia, depois das breves palavras passara rápido demais. Era típico, era somente Eric acordar que tudo parecia ganhar velocidade, assim como os passos do menino. O café da manhã foi repleto de risadas e uma infindável lista de apetrechos que o garoto queria comprar. Para quem havia crescido sob uma rígida educação, onde deveriam apenas gastar ou comprar coisas necessárias, o loirinho estava mais do que consumista.

E então os dois resolveram partir. Liz como sempre misteriosa e sorridente, enfeitiçada pelo próprio filho, os cabelos loiros caindo por cima dos ombros, em cachos volumosos, quase cobrindo as costas e o menino pulando à sua frente, andando de costas, contando à mãe tudo o que queria comprar, o que poderiam fazer naquele dia.

Após um silêncio que já não mais estava acostumado, Shaka resolveu não retomar a meditação. Seus pensamentos já buscavam um certo cavaleiro, o morador da primeira casa. Por mais que palavras não fossem trocadas veementemente, ele sentia o cosmo de Mu um pouco distante, indiferente. Não podia negar que os dois, acima de todos os Cavaleiros de Ouro sempre tiveram uma ligação maior, não apenas de amizade. De algo a mais. De almas gêmeas, ele instantaneamente pensou, balançando a cabeça reprovando-se.

Nem bem soube quanto tempo ficou ali, parado no meio da sala, olhando para um ponto não-fixo, lembrando-se de cada toque, de cada beijo trocado com o ariano, ponderando o que deveria fazer, se deveria jogar tudo para o alto e ficar com Mu. Na verdade, só voltou-se para a realidade quando um certo cavaleiro o chamou, de maneira até estridente.

-Shaka! –a voz de Saga ecoou pelo templo. O geminiano estava com as mãos na cintura, com uma expressão indefinida, beirando o nervosismo, no rosto.

-Credo, Gêmeos! Precisava entrar aqui gritando? –Shaka devolveu, no mesmo tom e altura de voz do outro, fazendo com que logo este começasse a rir e fosse acompanhado prontamente. Dificilmente Gêmeos e Virgem divertiam-se juntos, ou trocavam muitas palavras, mas naquele momento aquela parecia ser uma boa hora para quebrar qualquer tipo de clima.

-Estava te chamando há milênios.

-Não ouvi. –Shaka respondeu, como se aquilo fosse a coisa mais simples do mundo.

-Percebi. –Saga replicou, arrancando mais um sorriso do virginiano. –Parece estar de bom humor. O pensamento era bom?

-Não teste sua sorte, Gêmeos. O que quer?

Saga subitamente fechou a expressão. O motivo que estava ali era óbvio e estranho ao mesmo tempo. Ponderou se deveria seguir adiante, era uma pergunta boba para muitos e séria para ele. Decidiu que sua preocupação era mais válida que qualquer outro tipo de argumento que poderia fazer com que ele desistisse de perguntar.

-Liz está por aí? –perguntou, incerto, procurando qualquer coisa pelo chão, para que não precisasse fitar Shaka.

O virginiano sorriu, discretamente. Era tão óbvio o interesse de Saga na mãe de seu filho que ele nem ao menos conseguia disfarçar. Antes de responder, porém, Shaka ponderou o que estava sentindo. Curiosamente não tinha raiva, nem ao menos ciúmes por ver um outro Cavaleiro de Ouro demonstrar interesse em Liz. Muito pelo contrário, aquilo parecia ser uma coisa certa de acontecer. Era até agradável, imaginou logo os dois juntos, deixando o caminho livre para um certo ariano e ele se entender de vez. Egoísmo? Sim, não posso evitar em querer ser feliz, ele pensou por um segundo, reparando que todas suas ações ultimamente iam de encontro a todos os ensinamentos de Buda.

-Ela e Eric foram saíram há algumas horas para comprar material escolar. Algum recado?

Saga estreitou os olhos diante do tom divertido usado por Shaka. Questionou-se se o virginiano não se importava com seu interesse em Liz, já que esta era, ele nem bem sabia o que os dois eram, mas Saga sentia-se como um intruso.

-Ela está bem? –a pergunta saiu instantaneamente de seus lábios e assim que aquilo aconteceu e reparou na expressão perdida de Shaka, Saga soube que havia feito algo de errado.

-Por que a pergunta? Aconteceu alguma cois...

-Não, nada. Só queria saber. Eu volto mais tarde. –Saga apressou-se em consertar o que havia feito, mas Shaka com um breve aceno fechou a porta do templo, impedindo que o geminiano saísse dali.

-Faço questão que me diga o que aconteceu, Saga de Gêmeos. O que está me escondendo. Aliás, o que vocês dois estão me escondendo?

-Você não vai querer saber. Eu não quero me meter nisso. –Saga continuou caminhando na direção da porta e forçou a maçaneta. Quando a mesma não cedeu, fechou os olhos, sabendo que aquilo não seria uma boa idéia. Comprar briga com um Cavaleiro de Ouro, Shaka ainda por cima. Não era uma boa idéia mesmo. –Você não deveria fazer isso, Shaka.

-Você não deveria me afrontar, Saga. Se há algo relacionado à minha mulher que você sabe e eu não, deveria me contar. E não me desafiar. Afinal, não vai querer uma Guerra dos Mil Dias por nenhum motivo, não é mesmo?

-Pelos Deuses, Shaka! –Saga virou-se imediatamente, encontrando fúria nos olhos azuis do loiro. –Ela é sua mulher, então pergunte a ela.

-Estou perguntando a você, Saga! O que aconteceu?

Saga suspirou profundamente. Aquilo não seria agradável.

-Ela se machucou ontem. Eu quis ajudar. Ela recusou. Fim da história.

Shaka engoliu em seco. Liz estava machucada? Como ele não percebeu? E o que havia acontecido. Saga sabia de mais coisas e não queria lhe contar. Aquilo só funcionava para aumentar sua raiva. Raiva de Liz, raiva do cavaleiro, raiva de ser o último a saber de tudo. No mesmo instante, um vaso que estava em cima da mesa da sala estourou.

-Início da história. Você mente. Posso dizer porque você não me encara. Sempre foi assim, não é mesmo Saga? Se esconde atrás da máscara do Grande Mestre, atrás das Sápuris de Hades e agora simplesmente não me olha. Quando vai aprender que não pode mentir para as pessoas que cresceram contigo, que te conhecem tão bem? Quando vai ver que cada vez que mente, faz com que todos esqueçam que você mudou e que não mais confiem em você?

-Acredite no que quiser. Eu não tenho obrigação de falar nada que você quer ouvir. Não acredita em mim, ótimo. O problema é seu. Você não é a minha mãe, não é meu melhor amigo, não é meu irmão, não é a Deusa a quem devo proteger, por isso, não te devo explicação alguma. E abra essa porta ou sim, teremos uma Guerra de Mil Dias por causa de uma maldita porta. –a voz de Saga era um mero silvo, como uma cobra e Shaka arrepiou-se, um medo estranho apoderando-se dele. Realmente não era bom mexer com Saga. Mas ainda assim, estava se sentindo traído, de alguma maneira.

-Falarei com ela. Apenas me diga uma coisa.

-O que mais quer saber, Shaka? Que inferno, maldita hora em que vim até aqui!

-Isso tem algo a ver com Mu, não tem? –perguntou, não querendo ouvir a resposta. Simplesmente não queria, porque desconfiava. Porque tinha certeza do que Saga responderia.

-O que aconteceu ontem à noite não me diz respeito, como a sua mulher mesmo disse. –E o geminiano saiu do templo, desta vez sem precisar forçar a porta. Por respeito, Shaka já havia liberado a passagem. Realmente, brigar por causa de uma porta não era uma boa justificativa, por mais que por trás daquilo tudo existissem outros motivos.

Motivos esses que definitivamente deveriam ser esclarecidos quando Liz voltasse.

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Kamus nem bem sentia os degraus das escadarias do Santuário. A viagem de Paris para Atenas havia sido um borrão, literalmente. Algumas lágrimas haviam sido despejadas durante a exibição do filme tradicional na primeira classe e logo após a segunda taça de vinho, ele cochilara, um sono infestado de imagens de Milo, os cabelos azuis do outro, tão familiarmente cheirosos, que poderia descrevê-los precisamente e se fechasse os olhos e inspirasse fundo, juraria que os sentia ali, ainda impregnados em sua pele.

Mas tudo aquilo definitivamente parecia ter ficado no passado. Milo agora era de outro, os cabelos eram tocados, beijados, acariciados por outro que não por suas mãos. Era cruel o fato de o escorpiano ter escolhido justamente um outro francês para lhe dar o que Kamus não pudera: amor, compreensão, perdão. Sempre estivera acostumado a ver Milo ali, tão acessível e agora não mais sabia como seriam as coisas dali para frente.

Será que ele ficaria na França? Sabia que os treinamentos para possíveis substitutos estava, adiantados e que o discípulo de Milo, um grego muito forte chamado Hector era o mais avançado nas tarefas, quase efetuando com perfeição todos os golpes do Cavaleiro de Escorpião. Para Milo seria uma boa desculpa, ele não mais teria ninguém para ficar preso ali. Por um lado, se pensasse, era até bom. Não suportaria ver o grego preso a algo que não podia ter e nem queria imaginar a possibilidade de vê-lo ali com o outro homem. Seria crueldade demais. Mas ainda assim, uma parte de si queria clamar a posse do rapaz de cabelos azuis. Milo era seu, sempre fora. Não podiam existir longe um do outro, por mais separados que estivessem. O que tinham quase que transcendia o tempo, o espaço, as lutas. Não eram meros Cavaleiros de Ouro apaixonados. Eram mais do que aquilo. Eram perfeitos. Éramos perfeitos, pensou, corrigindo-se prontamente.

Entorpecido pelos acontecimentos meteóricos, Kamus só deu-se conta que estava à frente do Templo do Grande Mestre quando foi recepcionado pela própria Deusa, que o observava, visivelmente preocupada.

-O que faz aqui a uma hora dessas? Achei que nesse momento...

-Nunca deveria ter ido à Paris, Athena. Foi um erro. O maior da minha vida. –Kamus murmurou, derrotado, só então fitando a Deusa, que franzia o cenho, não entendendo a razão daquelas palavras.

-Mas Kamus...

-Milo está com outro! Alguém muito melhor que eu, devo dizer, pela expressão feliz no rosto dele. Finalmente encontrou alguém inteligente o bastante para ficar com ele, para não deixá-lo escapar. Eu sempre soube que estava errado. Estive errado desde o momento em que deixei o veneno daquele escorpião me atingir.

Saori balançou a cabeça reprovadoramente e desceu os três degraus que a separavam de seu Cavaleiro. Tocou gentilmente o braço de Kamus, guiando-o para dentro do templo, não deixando nenhuma margem para questionamentos por parte do francês.

Já sentados em uma das salas raramente utilizadas por qualquer um deles, um ambiente decorado elegantemente com sofás espaçosos e de tons claros, Saori fez Kamus lhe contar toda a história de sua breve passagem pela França. Ao final de toda aquela narrativa, a Deusa apenas baixou a cabeça, sentindo-se em parte culpada por ter incentivado o francês a procurar Miro em Paris.

-Não é sua culpa, Athena. Eu tinha que constatar por mim mesmo que isso não deveria ir adiante. Eu devo libertar Miro. Ou talvez ele já tivesse se libertado e eu nunca percebi.

Saori precipitou-se e tomou uma das mãos de Kamus para si. Instantaneamente o cavaleiro se calou. Ela o fitava como uma mãe a ponto de ralhar com o filho pequeno.

-Miro o ama. Não acredito que o que sentem se acabou assim.

-Nenhum amor pode ser unilateral.

-E o de vocês não é, Kamus. Sabe bem disso.

-Começo a duvidar do que está me dizendo, Athena. Com todo o respeito.

Saori sorriu.

-Não duvide. Sou sua Deusa. Conheço meus cavaleiros. Algo me diz que vocês ainda têm muito a conversar, a resolver.

-Não se quero isso para mim. Não sei se isso é o certo, Athena.

-É o certo, Kamus. Confie em mim. –o tom definitivo na voz da Deusa dava a entender que a conversa estava encerrada. O francês levantou-se, acompanhando Saori até a saída do templo. Não trocaram nenhuma palavra depois da declaração da mulher, mas ele sentia-se menos perturbado.

Athena nunca lhe mentiria. Nunca esconderia algo que pudesse lhe magoar, por mais doloroso que fosse. Esboçou um pequeno sorriso, uma pequena luzinha de esperança que poderia significar algo.

Algo que só dependia de Miro.

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Já era final da tarde, uma brisa agradável empurrava ligeiramente Liz e Eric pelas escadarias. Os dois sorriam, conversando animadamente, sorvetes em uma das mãos, nas outras, sacolas. O garoto parecia não conter-se dentro de seu pequeno corpo, as bochechas rosadas e os olhos verdes brilhavam, os lábios pareciam não acompanhar a velocidade das palavras que tentava dizer, explicar. A mãe, apenas sorria de volta, contente em ver o filho tão satisfeito, tão feliz, tão adaptado a um ambiente completamente novo.

Ao passarem pelo templo de Leão, Marin estava à porta, organizando alguns vasos de flores. Assim que viu a amazona, Eric correu até ela e começou a contar todas as aventuras daquele dia, o que haviam comprado, o que pretendiam fazer. Liz trocou olhares com a ruiva e, após um breve cumprimento, decidiu deixar o filho com a mulher, que parecia ter ficado mais do que satisfeita. Eric vai ficar bem aqui quando eu precisar partir. Todos o amam, ela pensou, caminhando até o templo de Virgem, carregando todas as sacolas com o material escolar.

Percebeu instantaneamente que o templo de Virgem estava pesado. Algo havia acontecido ali, uma certa tensão pairava no ar e ela não conseguia distinguir o que era. Caminhou lentamente, deixando as sacolas em cima de um dos sofás, chamando por Shaka, até o quarto do virginiano. Quando precipitou-se para abrir a porta, o loiro apareceu por trás dela, chamando-a.

-Deus do céu, você me assustou! –ela disse, colocando uma das mãos sobre o peito. –O que aconteceu aqui? O clima está estranho, não sei...pesado.

-Não sei do que está falando. –Shaka respondeu friamente. –Eric?

-Com Marin. –Liz respondeu, sorrindo. –Precisa ver como ele ficou com todas as compras. Não cabe dentro de si.

-Posso imaginar. Vamos até a sala, fiz chá gelado. Aceita?

-Adivinhou meus pensamentos. Fez um calor absurdo hoje, não acha?

Sentados na sala, conversando banalidades, Shaka cada vez mais distante, como se estivesse pensando em alguma coisa, planejando algo e Liz tentando a todo custo ajeitar a saia que usava, evitando que ela roçasse no ferimento em sua perna, pareciam estar presos à mundos particulares, sem dar muita atenção ao que falavam.

Em um momento, Shaka percebeu o gesto constante de Liz e franziu o cenho, logo lembrando-se das palavras atormentadoras de Saga. Liz havia se ferido. E não havia contado a ele. Segurou o copo com uma certa força desnecessária e quando sentiu-o ceder em seus dedos, refreou aquele impulso. Saiu do lugar onde estava e sentou-se ao lado da mulher.

-Então você e Eric se divertiram bastante, presumo.

-Sim, demais. Se deixasse ele seria capaz de comprar a loja inteira. Acho que essa ansiedade consumista ele herdou de mim. Preciso te mostrar algumas coisas... –ela respondeu, levantando-se do sofá.

Era a oportunidade que Shaka precisava. Segurou a saia de Liz, propositalmente passando a mão por uma de suas pernas, percebendo quando a mulher franziu o cenho, refreando-se de gritar, provavelmente por ter sentido dor. Havia descoberto a verdade, Saga tinha razão.

-Liz. Deixe isso aí. Não quero ver o que comprou para Eric. –a voz decidida e firme de Shaka fez com que a mulher fechasse os olhos, desconfiando o que vinha a seguir.

-Mas...

-Quero saber onde estava ontem à noite. O que fez, com quem estava.

-Shaka, não somos casados para...

-Está no meu templo, é a mãe do meu filho. Tenho todo o direito de saber. Aonde se machucou?

-Machucou? –ela tentou contornar a situação, mas nunca havia visto Shaka daquele jeito, como se pudesse...matar.

-Não me obrigue a mostrar a você o ferimento que está na sua coxa, Elizabeth.

-Não foi nada demais...estava caminhando ontem, sabe como sou descuidada.

-Você mente. Tente me contar a verdade.

-Eu já disse. –respondeu, não querendo encontrar os olhos de Shaka.

-Foi Mu, não foi?

-Não sabe do que está falando. O que Mu poderia ter a ver com isso?

-Me diga você. Saga não quis me contar e agora você também não quer.

Ao ouvir o nome do Cavaleiro de Gêmeos, Liz juntou as peças do pequeno quebra-cabeça que havia se formado em sua mente a partir do momento em que Shaka mencionara seu ferimento. Saga havia ido até o templo de Virgem. Por isso todas aquelas perguntas. Agora era ela que sentia a raiva consumir-lhe. Maldita hora em que deixara Saga ver o que havia acontecido. Não que ela pudesse evitar, mas...de alguma maneira, a culpa era do geminiano.

-Saga vê coisas demais. E você parece que também está vendo.

-Liz, não me provoque. Apenas me diga o que aconteceu. Foi Mu quem fez isso?

Shaka estava segurando a loira pelos ombros, impedindo-a de fugir de suas perguntas, de seus olhos, de qualquer coisa. Ela, por fim, sem saída, o olhou, mordendo o lábio inferior. Baixou a cabeça, derrotada. Esperava que Shaka não a fizesse falar. Não queria.

-Ele não teve culpa.

Shaka fechou os olhos, sentindo mais um pedaço de seu coração ser partido por Mu. Ele agora havia atacado a mãe de seu filho. Aonde aquilo iria parar?

-Eu vou matar aquele desgraçado.

-Shaka, não! A culpa foi minha! –ela ainda tentou argumentar, mas o virginano já havia saído pela porta do templo, como um furacão.

Liz sentou-se por dois segundos em um dos sofás e logo sentiu algo dentro de si fervilhar. Pensou no que estava dentro de sua sacola de viagem, mas acreditou não ser uma boa idéia. Caminhou até o quarto, onde trocou de roupa rapidamente, após um banho, reparando de relance no ferimento em sua perna. A raiva dentro de si cresceu ainda mais.

-Saga, você vai me pagar... –ela murmurou perigosamente, trilhando o mesmo caminho que Shaka fizera anteriormente. Só que ela iria parar alguns templos antes.

No Templo de Gêmeos.

Continua...

Bom, gente. Aqui termina uma pequena parte da minha saga. De agora em diante estou em contagem regressiva para o fim da fic. Os capítulos já estão meio organizados, falta mesmo é disposição para escrever tudo. Mas eu acredito que vocês vão me entender, certo? Mais uma vez muito obrigada a todos que passaram por aqui, que acompanham, que não esquecem dessa fic. Sem vocês, nada disso teria graça, vocês sabem. Um Natal maravilhoso a todas e se não houver mais nenhuma atualização da minha parte ainda esse ano (da Romances Impossíveis não terá não, eu garanto!), um 2006 iluminado para todos nós!

Celly M. em 24/12/2005.