Experiências

PARTE 5

O dia já havia amanhecido, tudo parecia... bem, quer dizer, na medida do possível. Shura e Aioria não se falavam, parece que o incidente do dia anterior não tinha passado em branco para os colegas de quarto, o que não passou despercebido pelos mestres, afinal, os mais espevitados do santuário não abriam a boca nem para um singelo "Bom dia". Preferiram deixar como estava, qualquer intrometimento poderia piorar tudo.

Mesmo assim, eles não eram os únicos que se encontravam diferentes.

Parece que o santuário todo estava um tanto quanto estranho.

MM havia se afastado do amigo, Afrodite, o que era muito suspeito. Parece que seus dias de bondade haviam acabado, diante das circunstâncias. Ninguém, nem mesmo o próprio MM entendera o que havia se passado com ele desde o dia que Afrodite importunou Kamus, segurando-o. Sentiu algo no peito, cujo resultado foi simplesmente de que não conseguia tratar a criança mal, ou grosseiramente, como de costume. Mas parece que finalmente havia caído em si, voltando a se distanciar do grupo, como fazia. Mas será que tudo havia voltado a ser REALMENTE como era?

Afrodite nem havia reparado na "volta" do amigo de Câncer, estava ocupado demais criando "planos" para conquistar seu amado Kamus. E se tem alguma coisa que a criança faz bem, definitivamente, é arrumar confusão.

Shaka e Mu continuavam calados. Shaka morria de vergonha, já Mu respeitava a situação do amigo.

Kamus e Milo estavam, comparado aos outros, até que muito bem. Pelo menos o necessário para uma convivência saudável entre os dois.

Saga e Aioros ainda estavam constrangidos, mesmo que levemente, pelo momento que passaram no dia anterior, o qual só não virou um constrangimento maior devido ao jovem de cabelos claros, Afrodite.

Todos estavam no Jardim, compenetrados em seus problemas e pensamentos, praticamente não se falavam, com exceção de dois cavaleiros.

- Kanon! Você roubou! Não vale olhar para o meu lado! - Aldebaram revoltou-se em uma "empolgante" partida de batalha naval, sendo muito "bem recebido" por um festival de gritos e reclamações igualmente carregadas de uma boa dose de "nada pra fazer".

- Pelo menos eu fiz alguma coisa! E esse bando de mortos vivos que encaram um a cabeça do outro? O que aconteceu com esse santuário!

- Não sei! E isso não é desculpa! - partiu pra cima do garoto, puxando seu cabelo, rolando pela grama enquanto o outro tentava dar leves tapas em sua cara. Realmente, como se já não bastasse todos os outros aprendizes, se esses dois virassem "mortos vivos" também, Atena estava perdida.

Conseguindo soltar-se dos braços de Kanon, Aldebaram levanta-se, correndo pelo trajeto onde estavam todos os aprendizes, dando tapas sucessivos em seus rostos. Após "acordar" todos, voltou para o lugar onde jogava com Kanon, esperando por alguma reação.

- Aldebaram! Que idéia é essa de bater na minha cara? Quem você pensa que é! - MM foi o primeiro a se manifestar, fazendo Aldebaram suspirar aliviado. Se este não reclamasse, era bem capaz de que estivesse morto mesmo.

- Aldebaram! Você ficou maluco! - Shura levanta-se, furioso, partindo para cima do aprendiz de touro, erguendo seus punhos, os quais foram segurados pelos do outro. Os outros já tinham entendido o que se passava, tentando arrumar algo para fazer e esquecer daqueles dois.

Após receber o tapa, perceber onde estava e o que acontecia, Aioria levantou-se, encarando por poucos instantes a cena da briga, logo depois correndo em direção a casa de capricórnio. Poucos, mas o suficiente para que Shura percebesse e se soltasse de Aldebaram, indo atrás de Aioria.

Foi a vez de Aioros reclamar. Levantou-se, indo em direção ao aprendiz de touro.

- Aldebaran! Você não devia bater nos mais velhos e bláblábláblá... - já estavam acostumados com os sermões de Aioros, o qual nunca se cansava de ser um "modelo" de perfeição para os outros. Quer dizer, isso é o que ele achava.

Saga, percebendo onde tudo isso ia parar, puxou Aioros pelo braço, rumo ao quarto, livrando a pobre criança de 3 horas de bronca.

- Ei! Ele precisa ouvir umas coisas! Me solta Saga!

- Já cansei desses seus sermões! Até eu durmo! Imagina as crianças, coitadas! - continuou puxando Aioros, o qual já estava explodindo de raiva.

Se tinha uma coisa que odiava era ser tratado como criança.

Já entravam pela Casa de Gêmeos quando Aioros revoltou-se seriamente.

- SAGA! CHEGA! NÃO ME TRATE ASSIM!

Saga assustou-se, dando um pulo. Aquilo veio tão... de repente. Soltou a mão do garoto, virando-se de costas, fazendo-o entender que pretendia sair.

Uma mão ampara os movimentos se Saga, era Aioros. Puxou-o em sua direção, pressionando-o contra seu corpo, quase colando os rostos, deixando o outro sem reação.

A essa altura, Aioros já tinha notado o "ponto fraco" do colega, usando tal conhecimento ao seu dispor.

- Desculpa Saga. Mas é que... - diminuiu o espaço entre seus corpos, trazendo-o mais pra perto, provocante - eu não gosto que mandem em mim, entendeu? - disse em um sussurro, próximo ao seu ouvido, em um tom sedutor, parecendo se aproveitar mais ainda do "probleminha" do outro.

- Si... sim... - respondeu engolindo seco, não conseguindo desviar o olhar dos olhos claros e brilhantes de Aioros. - Mas me solta! - largou-se de seus braços com um só movimento, parecendo não ter gostado de terem pisado no seu "calo". Se Aioros achava que ia ser fácil "vencê-lo" estava muuuuito enganado.

Isso sim seria uma "batalha" difícil, TEIMOSO x COMPETITIVO.

Realmente não há como imaginar quem irá vencer, mas é bom que os dois estejam bem preparados... e em todos os sentidos.

Enquanto isso, na Casa de Capricórnio...

Aioria estava em sua cama, jogando jogo da memória sozinho. Qualquer coisa que pudesse tirar Shura de sua mente era bem vinda.

Ao perceber passos ecoando pelos corredores da casa, olhou em direção a porta, que se encontrava aberta, revelando o garoto de cabelos levemente esverdeados, o qual rodeava os seus pensamentos de uma maneira tal que não se concentrava nem mais no que fazia.

Seguiu com os olhos os movimentos do tal garoto, atento. Shura dirigiu-se até sua cama, sentando, encarando os olhos que o fitavam, em uma expressão séria.

- Posso jogar? - perguntou ainda sem mudar a expressão, ou ao menos tirar seu par de olhos do outro a sua frente.

Aioria abaixou a cabeça, rubro, respondendo em um sussurro quase mudo.

- Pode...

Shura levanta-se de sua cama, sentando-se na outra a sua frente. Desviou seu olhar de Aioria para as cartas. Pegando-as para embaralhar e começar um novo jogo.

Aioria acompanhava, cabisbaixo, os movimentos do outro, o qual já distribuía as cartas pela cama, a fim de que começassem logo o jogo, porém, ainda sério.

- Quem... quem começa? - Aioria finalmente falou algo em um tom mais acessível aos ouvidos de Shura, nervoso e ainda de cabeça baixa.

- Pode começar. - Shura segura levemente no queixo da criança, e com um pouco de dificuldade, trazendo-o para cima, fazendo-o encarar seus olhos negros. - Aioria, levanta o rosto, senão você não vai ver direito. - alertou.

- T... tá... - voltou a abaixar a cabeça, mesmo depois do pedido, voltando-se para o jogo, virando uma peça, revelando sua mão visivelmente trêmula. Sim, estava nervoso e não parecia esconder isso.

Shura segurou na mão, aparentemente tentando pará-la, subiu o olhar da mão para Aioria, ainda rubro, agora observando o que fazia à sua mão. Ao perceber ser observado tão fixamente, olhou para os olhos de Shura, parecendo buscar forças de algum lugar.

- Aioria, eu... - foi interrompido pela mão do outro garoto, tapando sua boca. Aioria, insistentemente, continuava de cabeça baixa, tremendo mais no que anteriormente.

- Shura, não... quero mais falar ...disso... - deslizou delicadamente a mão do rosto de Shura, já derramando algumas lágrimas.

- Mas nós temos que conversar! Não quero que fiquemos assim! - levantou, parecendo preocupado, em seguida ajoelhando-se e sacudindo o braço do garoto a sua frente.

- Pára... por favor... Shura... acho melhor a gente... não se falar mais. - 3 lágrimas caíram de seus olhos, entrando como 3 facadas no peito de Shura - Sabe... quando você me trata daquela forma e... quando te vejo com o Milo... tratando ele tão bem... eu... - respirou fundo -... eu sinto uma dor aqui... - aponta para o coração, encarando o amigo, deixando-o ver seus olhos lacrimejantes. - Cansei dessa dor... ela é muito pior do que muitas que já senti... e... você é o culpado dela aparecer. - ainda com uma voz chorosa declarou. Agora quem abaixava a cabeça era Shura, segurando-se para não chorar, fracassando.

- Aioria! Você não... pode fazer isso comigo! - desabou em lágrimas, sacudindo Aioria freneticamente.

Delicadamente Aioria tira as mãos de seus ombros, levantando-se. Vira-se para falar algo, o que parece que seriam suas últimas palavras por um bom tempo.

- Vai... ser... melhor para nós, Shura! - correu, deixando o quarto, rezando para não ser seguido pelo garoto espanhol. Suas preces foram atendidas.

Shura estava confuso demais para ir atrás de Aioria. Tinha tomado coragem dessa última vez, e o resultado foi esse.

Mesmo diante das circunstâncias, ainda estava sem saber o que o fazia sofrer mais nas palavras de Aioria. Afinal, o que Shura sentia por ele? E por Miro?

"Aioria... eu... gosto de você... mas... o Miro..." - foi em tudo que conseguiu pensar... andando desanimadamente em direção a sua cama, encolhendo-se na mesma, enxugando as lágrimas. Em vão, pois, logo, mais e mais brotaram de seus olhos.

Shaka estava falando com Shion no templo, queria por que queria mudar de quarto.

A situação que passava com Mu era muito difícil para ele.

Tinha vergonha de sentir-se afetado pela presença do amigo. Mesmo tão pequeno, sentia-se incomodado pelo sentimento, o qual nunca ninguém havia despertado de seu coração. Logo ele, que desde que começara o treinamento era tão dedicado, tinha se deixado afetar por esse tipo de sentimentos que sempre julgou bobo? Não, não podia ser verdade.

- Mas Shaka, você e o Mu foram os únicos que nós não achamos que realmente tinham problemas. O que houve? - espantou-se com o pedido do menino.

- Não é nada, é só que... a casa do Mu fica muito perto da do Aldebaram! É isso!... Não dá pra me concentrar direito nos treinos. - safou-se, com todo o cuidado para não deixar suspeitas.

- Hum... entendo... mas, Shaka, você não poderá sair de lá... a não ser que outro cavaleiro queira abdicar o lugar em uma casa pra você.

Shaka desanimou-se, não achava que alguém deixaria sua casa para ceder-lhe.

- Mas... - nesse exato momento alguém bate a porta, era Aioria.

- Entre. - Shion responde às batidas.

- Mestre, eu queria falar com o senhor. - Aioria parecia nervoso - Queria trocar de quarto.

Shaka estava suficientemente satisfeito com a declaração de Aioria, mas não tanto quanto pensava que ficaria. Seu coração lhe traíra de novo. Sua mente queria afastar-se de Mu o máximo possível, já seu coração sentia falta quando o mesmo não estava por perto.

Mesmo assim, preferiu agir racionalmente, como de costume.

- Mestre, eu podia trocar de quarto com o Aioria, não é? - Shaka apressou-se.

- Sim, Shaka. Não vejo problemas já que os dois querem. Providenciarei que suas coisas sejam levadas para os novos quartos o mais rápido possível. Agora vão para o jardim, todos estão lá.

- Sim mestre. - responderam os dois juntos, retirando-se do aposento.

Aioria andou rapidamente em direção ao lugar imposto pelo mestre, cabisbaixo.

Shaka caminhava atrás, em um ritmo mais lento, refletindo sobre o que acabara de fazer.

Distraído, acabou por esbarrar em Mu, o qual se encontrava próximo ao local de onde Shaka havia saído, juntamente com Aioria.

Shaka já tinha deduzido que Mu devia ter escutado tudo, percebendo o olhar triste, parecia ter chorado.

- Shaka... - Mu pronuncia-se, temendo o pouco caso do virginiano para com seus sentimentos.

- Mu... eu... - Shaka encontrou-se em uma situação delicada. Mu havia o ouvido pedindo para trocar de quarto. No mínimo teria que explicar o porquê... ou talvez algo mais.

- Tudo bem Shaka. - começaram a brotar lágrimas nos olhos de Mu, reiniciando o ciclo - Eu não sei o que fiz... não sei se foi aquele dia que foi ao meu quarto mas, eu entendo.

- Entende... o que? - Shaka encarou-o, surpreso com a "compreensão" do amigo.

- Entendo que você... não gosta de mim... não é isso? - chorava compulsivamente, não se segurando, de cabeça baixa, sendo observado pelos olhos azuis de Shaka, os quais transpareciam sua confusão diante do conflito que sua mente e seu coração declaravam.

Parece que mais uma vez, a mente agiu mais rápido.

- É sim, Mu. - Mu arregala os olhos. Tudo bem que foi ele mesmo que perguntou, mas, não esperava uma resposta tão fria e direta por parte de Shaka. - Eu não gosto de você.

Shaka queria morrer no momento. Por que estava enganando Mu, e pior... SE ENGANANDO? Não sabia. Seu orgulho e lealdade a seu destino falavam mais alto, atropelando o que quer que seu coração pretenda manifestar.

Mu correu, banhando mais seu rosto em lágrimas. Era fato, Shaka não gostava dele. Chegou ao jardim do mesmo jeito, arrancando olhares curiosos de todos que lá se encontravam. Continuou percorrendo o local, acabando por parar em um lugar bem isolado do resto, chorando com todas as suas forças, angustiado.

CONTINUA...

Minakopie