Meu corpo queima de dor. Eu empurrei Mirania para fora da minha mente e agora finalmente estou sozinha. Sinto meu corpo flutuar na escuridão. A dor lateja por cada músculo, mas eu não me mexo. Eu sei exatamente o que está acontecendo. Entreguei meu corpo ao instinto de sobrevivência dentro de mim. Fiz a única coisa que meus pais sempre me imploraram para não fazer. Estou usando meus poderes de vampiro na minha forma humana. A única vez que fiz isso foi quando tinha apenas alguns anos de vida. Um menino da vizinhança tentou roubar meus brinquedos e eu, com raiva, joguei um balde de areia com toda a força por cima da cabeça. O balde parou a mais de cinquenta metros de mim. Meus braços quebraram na mesma hora. Eu ainda lembro da dor que senti. Quando eu gritei, meu pai veio até mim e desmaiou no momento em que me tocou. Minha mãe ficou desesperada e nos levou para dentro da casa. Meus braços se curaram e eu tinha a aparência de um vampiro por alguns momentos. Meu pai ficou desacordado por alguns minutos até finalmente levantar, assustado e um pouco dolorido.
Quando ele acordou eu contei para eles. Que eu vi as memórias do meu pai. Eles se olharam por um momento tentando entender o que aconteceu até que eu finalmente voltei ao normal. Eu tentei usar meus poderes mais uma vez, mas eu quebrei meu pé no processo. Depois de mais uma vez absorver os poderes do meu pai e me curar minha mãe pareceu entender o que estava acontecendo e me fez jurar nunca usar meus poderes sozinha.
Depois daquele dia eu jurei que nunca ia usar meus poderes. Que iria me manter saudável e longe de problemas, mas aqui estou eu. A raiva me move mais uma vez e eu estou quebrando meu corpo pelo desejo de vingança. Mirania roubou minha vida inteira de mim e mentiu na minha cara que iria me ajudar. Cada fibra do meu corpo quer arrancar a cabeça dela repetidamente.
Eu posso sentir os meus ossos se quebrando e me pergunto o que está acontecendo lá fora, fora da minha mente. Esse é o problema de entregar-se para o ódio. Ele te cega, te imobiliza. Nada mais importa, só a vingança.
Anne… eu posso ouvir alguém chamando meu nome. Abro os olhos mais ainda está tudo escuro. Anne… é a voz de Seth. Provavelmente uma ilusão. Ele não poderia estar ali, mas eu quero vê-lo.
Uma luz vermelha brilhante me cega. Mirania. Meu corpo reconhece a presença dela. Ela está bem ali, ao alcance da minha mão. Minha perna queima de dor. Eu quero gritar. Eu quero que a dor passe. Meu corpo esquenta e é como se Seth estivesse do meu lado novamente. Eu quero abrir os olhos. Eu quero ver ele. Meus dedos estão quentes e molhados. Sangue. O cheiro metálico é inconfundível. Meu sangue? Me pergunto até onde estou empurrando minha sorte deixando meu corpo assumir o controle. Eu sinto um cheiro familiar. Fresco e suave, como sabonete. É o cheiro do quarto de Seth. Eu finalmente sei o que é. Loção pós-barba. Ah… como eu quero ver o rosto dele. Sinto meu corpo me puxar de volta. Eu posso sentir minha consciência voltando.
Quando consigo enxergar novamente vejo a Mirania, ou pelo menos um esqueleto que parece com ela, deitado em uma cama de hospital. Eu encaro a figura esquelética dele e sinto a raiva borbulhar em mim. Ela não tem o direito de me fazer sentir pena do estado em que ela está. Agarro ela pelos cabelos e a dor na mão é tão intensa que sinto que vou gritar.
Encaro o vermelho dos olhos dela. Agora não tão brilhantes e quase sem vida. Ficar tanto tempo na minha mente esvaiu a força do corpo dela. Ele deveria ser capaz de controlar uma pessoa por no máximo dez minutos, mas ela ficou dormente na minha cabeça por mais de um mês. É claro que ela estava debilitada. Ela nem podia revidar se eu quisesse matar ela ali.
—Não desista agora molenga. Ela fala calmamente. O sorriso dela me irrita. Ela falou as mesmas palavras para mim quando entrou na minha mente. Ela fala como se estivesse me ajudando. Como se ela quisesse que eu sorrisse de volta para ela, mas como eu poderia? O foco dos meus olhos é perfeito agora. Eu volto completamente para o meu corpo e consigo sentir a extensão do dano que causei a mim mesma.
—Você deveria ter me matado também. Sinto meu rosto molhado de lágrimas e tenho raiva de mim mesma por não conseguir deixar de chorar. Talvez seja a dor sem tamanho, talvez seja a tristeza ou talvez seja o fato de que eu sei que Mirania não é a pessoa diretamente responsável por isso, mas ela é a única pessoa a quem eu quero culpar. Ela estendeu a mão para mim e me enganou, pelo menos os outros tiveram decência de me tratar como o inimigo.
—Desculpa. Eu queria, pelo menos, salvar você. Mirania me observou crescer por toda a minha vida. Nas sombras ela continuou a me observar e me ver evoluir e amadurecer. Ela estava lá em todos os momentos. Eu sinto meu coração se partir em dois ao ver o olhar de amor dela para mim. Um olhar tão parecido com a da minha mãe que dói mais que meus ossos quebrados.
—Eu quero de matar. Eu respiro fundo e seguro as lágrimas. Eu posso ouvir a hesitação na minha voz e me pergunto se ela percebe que eu não confio na minha própria língua.
—Você é melhor que isso. Emily te ensinou melhor que isso. Eu não vou pedir perdão. Se você quiser minha vida, ela é sua. Os olhos dela me desarmam. Ela não hesita nem por um momento. Se eu quiser matar ela ali, naquele momento ela não vai resistir. Eu sei que não tenho coragem de fazê-lo. Meu cérebro inútil não consegue dar as ordens ao meu corpo para matá-la. Eu nem sei como o faria. Eu a torturei na minha mente tantas vezes, mas agora que ela está disposta a deixar que eu o faça de livre e espontânea vontade eu não consigo reunir a coragem.
Meu corpo finalmente desiste. A vontade se desfalece de dentro de mim e eu caio no chão. Minha perna pega fogo e meus dedos não se movem.
—Anne! A voz de Seth faz meu corpo reagir. Eu sinto as mãos dele no meu rosto, me virando delicadamente para encarar os olhos dele. —Anne, você pode me ouvir? O toque da pele dele é quente e reconfortante. Não era uma ilusão. Ele estava chamando meu nome. As memórias voltam devagar. Tudo que eu fiz enquanto estava inconsciente vai voltando aos poucos.
Olho para o lado e lá está Edward. Ele me olha de sobrancelhas juntas, provavelmente ouvindo meus pensamentos mórbidos sobre o que aconteceu comigo.
—Seth… Edward. Vocês realmente vieram. Seth suspira de alívio quando ouve minha voz. Ele me abraça e eu posso sentir as lágrimas voltarem para meus olhos.
—Viemos te buscar. Edward fala —Todos nós.
O chão começa a tremer violentamente mais uma vez. As máquinas perto da cama em que Mirania estavam chacoalham violentamente.
—Mirania… Giannini fala olhando preocupado para o corpo frágil de Mirania.
—Eu sei. Temos que sair daqui… agora. Ela responde tentando se sentar na cama. Eu me sinto estranha vendo ela claramente sentindo dor para se mexer.
—Não podemos sair ainda. Aquele homem, ahm… Padrone? Ele levou o disk com as informações da Renesmee. Edward já estava a par da situação. Ele sabia muito mais do que eu imaginava. O disk que Padrone levou continha o código genético de Renesmee e como ela se desenvolveu como um meio-vampiro.
—Não se preocupe. Mirania responde se apoiando no braço de Giannini e finalmente sentando na cama. —Eu corrompi o disco antes dele sair. Ele não tem nada.
As palavras dela me surpreendem. Não me lembro de ter notado ela modificar as informações no disco.
O chão se mexe mais uma vez e as máquinas começam a cair no chão. Giannini vai apressado até a máquina onde Padrone estava e começa a digitar alguma coisa.
—É um protocolo de auto-destruição. Padrone deve ter acionado antes de fugir. Eu não consigo cancelar. Giannini continua digitando alguma coisa mas a máquina faz sons altos de erro.
—Desligue os experimentos e avise Sette. Nós temos que correr pela saída de emergência. Mirania está claramente debilitada demais para andar, mas ela ainda dá ordens como se fosse a pessoa encarregada. Eu não consigo olhar para ela sem sentir uma mistura de raiva e tristeza.
—E Esme e os outros? Edward pergunta fazendo um arrepio descer pela minha espinha. Esme estava ali também.
—Já estão do lado de fora. Giannini fala me fazendo suspirar de alívio.
—Tudo bem. Vamos. Edward toma a frente da situação.
Seth ainda está me abraçando e eu sei que ele pode sentir a tensão no meu corpo. Minha perna e minha mão estão me matando e eu posso sentir o suor na minha testa. Eu sei que se tocar um vampiro agora vou me recuperar, a dor vai passar, mas não quero que a dor passe. A dor física me incomoda menos do que as memórias. Mirania me olha de lado e encontra meu olhar de raiva para ela. Ela não desvia o olhar, mas ela não parece arrogante como sempre, mas sim triste. A raiva bate mais forte em mim. Eu não consigo esquecer a imagem dela, a cabeça da minha mãe rolando na grama sobre os pés de Mirania e dos outros vampiros.
—Anne, você consegue se levantar? A voz de Seth me faz desviar o olhar. Ele me olha cheio de preocupação e com o sangue seco sobre o lugar onde eu enfiei o caco de vidro no estômago e na mão dele. Eu me lembrava de tudo agora. Tudo que aconteceu enquanto estava naquele transe. Eu desvio o olhar do sangue para o chão sem responder. Mesmo que eu possa levantar eu não quero.
—Você vai ter que carregar ela. Edward fala. Eu sei que ele pode ler meus pensamentos. Ele me olha de sobrancelhas juntas como se estivesse encarando um problema difícil.
—Tudo bem. Seth fala se arrumando para me pegar no colo, mas eu não me mexo.
—Me deixem aqui. Falo mordendo o lábio. Eu não quero mais lutar para sobreviver. Eu não quero mais sofrer e chorar a morte dos meus pais. Eu traí a memória deles. Eu imaginei ser feliz com outra família, imaginei seguir meus dias felizes sem eles, até desejei não me lembrar. Eu não merecia sair viva dali.
—Não liga para o que ela disse. Mirania fala me fazendo levantar o olhar.
—Cale a boca. Eu não devia ter confiado em você. Respondo entre os dentes.
—Seth, leve ela daqui mesmo que seja a força. O olhar de Mirania coloca fogo na minha alma.
—Anne… Edward fala tentando me convencer, mas ele deveria entender melhor que todos.
—Você leu meus pensamentos. Falo na esperança de que ele me entenda. —Você sabe que eu não deveria estar viva aqui.
—Eu não vou te deixar. Seth tem um olhar bravo e sério para mim.
—Eu posso tentar te matar de novo. Estou segurando meus soluços. Eu deveria estar me desculpando com ele, mas ao invés disso a culpa de deixar a memória dos meus pais para trás me consume e eu quero acabar com tudo.
—Não me importa. Você pode ficar brava comigo depois, lá fora. Nós vamos sair daqui. Seth me pega no colo sem esforço algum e a dor na minha perna me acerta intensamente como um choque elétrico me fazendo gritar.
—Anne! Seth parece arrependido de ter me pego sem minha permissão.
—Eu estou bem. Falo respirando pesado. Ele tenta ser mais delicado, mas a dor já se espalhou por todo o meu corpo. —Eu te disse. Me deixe aqui.
Seth não responde. O chão treme mais uma vez. Giannini pega Mirania no colo e guia o caminho.
A corrida é dolorosa e eu tento segurar os gritos. Agarro o pescoço de Seth com a mão boa e sei que provavelmente estou machucando ele quando aperto as unhas na pele dele toda vez que o chão treme e eu chacoalho mais forte.
—Onde está a saída? Seth pergunta para Giannini. Ele está tremendo. Alivio a pressão das unhas na pele dele.
—Mais alguns metros. Ele responde. O corpo de Mirania nos braços dele, tão pequeno e esquelético que parece um manequim sem vida.
Chegamos até um grande porta de madeira e Giannini sinaliza para Edward abri-lá, já que ele é o único com as mão livres.
Edward puxa a maçaneta da porta mas ela não se mexe. Ele bate com o ombro, mas a porta não se move.
—Está trancada. Ele fala olhando para Giannini.
—Padrone deve ter selado a saída. Miranda responde olhando para a porta enorme. —Acha que consegue derrubá-la?
Giannini coloca Mirania no chão e fica do lado de Edward. —No três. Ele fala se preparando.
Giannini faz a contagem regressiva e eles acertam a porta uma vez. Ela treme e racha, mas não abre. Atrás da gente o corredor começa a desmoronar e a poeira vai ficando mais densa. É difícil respirar naquele espaço apertado.
—Mais uma vez. Ele acertam a porta com um baque alto e ela racha mais uma vez. Eles se concentram em chutar a rachadura até que um buraco grande o suficiente de abre.
Posso ver a rachadura se espalhando por nossas cabeças. —Seth… eu falo olhando para cima. Ele segue meu olhar e vai para mais perto da porta.
Giannini pega Mirania no colo e passa primeiro, seguido por Seth e eu. Edward é o último a sair seguido por uma onda de poeira pesada.
Estamos dentro de uma casa enorme e velha. As paredes estão cheias de toalhas brancas e moldo. A estrutura treme e as paredes começam a cair. Seguimos correndo procurando uma saída. Uma fresta de onde a luz do sol passa chama a atenção de Giannini e ele derruba a parede com um chute. A luz do sol é intensa e faz a pele dele brilhar. Passamos pelo buraco e finalmente estamos do lado de fora. Os tremores param e a casa atrás de nós está praticamente destruída. Apenas algumas paredes restaram em pé.
—Eu posso ouvi-los. Edward fala olhando para os lados. —Esme! Ele grita o nome da mãe.
Esme aparece pulando sobre os destroços da casa ao nosso encontro. Atrás dela, Alice, Carlisle, Jasper, Alice, Embry, Rosalie, Emmett, Quil, Jake, Renesmee e Bella.
Edward vai ao encontro de todos e abraça Bella e Renesmee primeiro. Esme vem na minha direção e eu me encolho. Não quero que ela me toque. Tenho medo de que meu corpo vai agir sozinho e absorver os poderes dela para que eu consiga me curar. Edward é mais rápido que eu.
—Esme! Espera. Ele fala entrando na frente dela. —Primeiro, vamos sair do sol. Edward aponta para uma árvore alta que sobreviveu ao tremores. Todos eles ali debaixo do sol quente parecem um holofote. A cidade está vazia, mas melhor evitar outros problemas.
Debaixo da sombra Seth me coloca sobre a grama devagar. Posso ver onde minhas unhas ficaram o pescoço dele.
—Se você tocá-la agora o que aconteceu com Renesmee pode se repetir. Não é mesmo? Edward quer que eu fale com Esme, mas eu não consigo olhar nos olhos dela quando respondo.
—Não seria a mesma coisa. Eu estou…consciente, mas sim, eu estaria… absorvendo parte do seu poder e da suas memórias para curar meu corpo.
Eu não esperava a reação que recebi. Achei que ela ia hesitar e falar comigo e discutir sobre o que eu falei, mas ela não esperou nem um segundo. Ela agarrou e colocou as costas da minha mão boa sobre a testa dela. Ela fechou os olhos e eu podia sentir as memórias dela fluindo em mim. Minha mão e minha perna se curando. Os ossos se remendando. Soltei a mão dela quando os ossos estavam curados. As manchas roxas e verdes ainda estavam ali, mas, sem ossos quebrados, a dor era suportável.
Esme me olha preocupada observando as manchas na minha perna e braços.
—Não foi o suficiente? Ela pergunta olhando triste para mim.
—Não, eu… já me sinto melhor. São só alguns hematomas. Vai ficar tudo bem agora. Eu já estava curada o suficiente para não absorver os poderes dela inconscientemente, mas na verdade eu soltei a mão dela de propósito. Eu não queria drenar as memórias dela por medo do que eu ia ver, mas ela… tudo que vi nos pensamentos dela foi meu rosto sorrindo. Ela lembrava dos momentos felizes. Do nosso tempo juntas. Dentro das memórias de Mirania eu entendi porque eles me mandaram até os Cullens. Também entendi o porque deles terem me prendido por dois anos naquele tanque. Achei que ia ver Esme me comparando com o filho que perdeu dentro das memórias. Procurando semelhanças e diferenças e finalmente ficando desapontada porque não somos a mesma pessoa. Padrone me modificou para que eu lembrasse a criança que ela perdeu. Não foi difícil convencer ela. Algumas sardas aqui e ali e lábios arredondados foi o suficiente, mas na mente de Esme eu era eu mesma.
Esme me abraça com força e eu não consigo deixar de abraçar ela de volta. O cheiro dela me trouxe de volta para os dias de paz, quando tudo era complicado, mas não doloroso. Se não fosse por ela eu teria morrido naquela floresta. Eu percebo agora o porque dela me afetar daquele jeito. Ela tem os mesmo olhos da minha mãe. Ela me olha como que se desculpando pelo meu sofrimento, como se fosse culpa dela. Como se fosse responsabilidade dela ter certeza de que eu nunca chore.
—Anne… a voz de Mirania me tira da bolha de felicidade em que estava e eu solto Esme. Eu tento me levantar sem muito sucesso e Seth me ajuda. Ele me segura pela cintura enquanto encaro Mirania. Ela também está de pé com a ajuda de Giannini.
—Nós vamos embora. Ela fala calma, como se fosse o final da festa e ela tinha que voltar para casa. —Padrone vai nos procurar quando descobrir que o disk foi corrompido.
Eu não respondo. Não quero desejar boa sorte. Não quero me despedir dela. Eu sei que ela não matou meus pais com as próprias mãos mas a traição dela foi mais profunda do que posso explicar.
—Eu vi você crescer até aqui. O dia em que você nasceu, a primeira vez que você falou, quando descobriu que tinha poderes, quando chorou no seu quarto por ter que abandonar seus amigos por não ser humana. Eu observei você evoluir e se tornar quem você é hoje. Seus pais ficariam orgulhosos de quem você se tornou. Você é a imagem deles nesse mundo. Não se culpe por querer ser feliz. Não se afunde na culpa. Eu sei que é hipocrisia da minha parte, mas eu quero que você seja feliz. As palavras de Mirania apertam meu coração. Os olhos dela perfuram minha pele. Eu odeio ela e… eu sinto algo mais por ela.
—Você sabe que eu não posso te perdoar. Falo sincera.
—Eu sei. Ela abaixa os olhos e segura o braço de Giannini. —Tomem cuidado. Padrone vai procurar vingança. Vamos Giannini.
Giannini pega Mirania no colo e se vira rumo as ruas vazias. Ela nunca falou adeus, nem eu. Observo as costas largas de Giannini se afastarem até ele sumir por algum beco e tenho impressão de que não acabou.
—O que aconteceu lá embaixo? Esme pergunta para Edward depois que Giannini desaparece.
—Eu me lembrei, de tudo. Respondo olhando para Esme. Ela tem um olhar hesitante e preocupado. —Eu posso finalmente responder a sua pergunta.
Esme me olha confusa —Pergunta?
—Quando eu acordei. Você me perguntou qual o meu nome. Eu posso te responder agora.
Esme parece segurar a respiração esperando que eu continue.
—Meu nome é Jullianne. Eu falo sorrindo um pouco e olho para Alice. —Mas pode me chamar de Anne. É o apelido perfeito. Alice sorri de volta para mim.
Eu decidi que não iria falar meu nome verdadeiro para eles, porque sinceramente eu não era mais aquela pessoa. Me parece muito mais natural responder a pessoa que sou agora. Você não chamaria uma borboleta de lagarta depois que ela mudou.
—Claro Anne. Alice responde, —mas primeiro vamos sair daqui. Alice fala mostrando algo no celular. —Eu arrumei um Airbnb para gente não muito longe daqui, mas com o sol alto, Jake e os outros vão primeiro. Por favor me diga que alguém trouxe uma calça.
Alice encara os lobos apenas de shorts colados um do lado do outro. Eles se olham e dão de ombros.
—Acho que tenho alguma roupa no avião. Embry aponta para algum lugar no horizonte.
Avião? Penso sem entender.
—Nós viemos de avião até aqui claro. Edward responde aos meus pensamentos.—Mas a aterrissagem não foi exatamente perfeita.
—Tanto faz. Alice fala. —Arrume alguma roupa. —O lugar é menos movimentado, mas ainda tem humanos por perto. Entre na casa e abra a porta do fundos. Vamos entrar um por um o mais rápido que conseguirmos. E feche todas as cortinas!
Nos esgueiramos por dentro de um mato alto atrás de residências com aparência de vazias. A cena seria hilária se fosse nossa situação.
Alice vai andando na frente e sinalizando todo mundo para passar pelos jardins de alguma casa aleatória sem serem vistos. Uma fila indiana de vampiros e Seth ainda insistindo em me carregar. Alice sinaliza com os dedos e vamos pulando de quintal em quintal até finalmente entrar no Airbnb que Alice falou.
A casa é pequena e apertada. Definitivamente não foi feita para quatorze pessoas. Os Cullens se apertam longe das janelas e os lobos tentam se ajeitar no sofá ou mesas disponíveis. Eu estou sentada na mesa da cozinha e Carlisle está analisando meu braço e perna. Alice me deu um short e uma camiseta que roubou de algum varal. Pelo menos agora eu não estava só de maiô.
—Hum… Foi como você disse. Não existem mais ossos quebrados. Os roxos devem melhorar em algumas semanas, mas eu não recomendo andar demais. Carlisle coloca uma tipóia com os panos na cozinha e imobilizou meu braço. Esme e Seth ficaram do meu lado o tempo todo. Não consegui segurar a cara feia quando Carlisle mexeu meu braço e Esme insistiu que eu absorva mais dos poderes dela.
—Não é assim que funciona. Falei respirando fundo por cima da dor. —Eu tenho que estar em uma situação de estresse extremo, como vida ou morte. Eu não tenho controle sobre meus poderes no meu dia a dia.
—Terrivelmente inconveniente. Carlisle brinca ajustando a tipóia.
Depois que Carlisle ajusta as bandagens improvisadas, eu peço para que Seth me sente na sala de estar e reúna todo mundo. Estava na hora de falar para eles tudo que aconteceu.
—Primeiro, obrigado por terem vindo me ajudar. E sinto muito que as coisas chegaram a esse ponto. Eu não queria que ninguém tivesse que passar por algo assim por mim.
Os olhos na sala me encaram curiosos enquanto começo minha história.
—Mirania, a vampira que saiu dos destroços conosco é a vampira que controlou meu corpo e supriu minhas memórias nos últimos dias. Um homem chamado apenas de Padrone realizava experimentos em vampiros e ele queria analisar Renesmee, mas como ela não foi considerada uma ameaça, ele não tinha como ter acesso ao corpo dela. Então, ele me capturou.
Ninguém fala e eu posso sentir a tensão em todos.
—Eu… nasci de uma meio-vampira e um vampiro. Meu pai era um vampiro completo e minha mãe meio-vampira. Ela nasceu em algum lugar da Europa. A mãe dela era humana, mas o pai, um vampiro, abandonou ela a própria sorte e ela morreu quando minha mãe nasceu. O pai dela voltou por curiosidade e quando viu minha mãe ele simplesmente foi embora. Minha mãe cresceu sozinha até encontrar meu pai. Eu não tenho certeza de como meu pai mudou, mas quando ele encontrou minha mãe eles decidiram ficar juntos e viveram viajando por muitos anos.
—Então você é o que? Um quarto vampira? Embry pergunta confuso.
—Matematicamente ela seria três meios vampira. Jasper responde deixando Embry mais confuso ainda.
—A questão é que, eu falo continuando, —Minha mãe não deveria ser capaz de ter filhos, e quando perguntei para ela depois que nasci ela disse que tudo que ela mais queria no mundo era uma família. Ela queria ter uma família do lado dela, uma que não iria abandonar. Depois que eu nasci, naturalmente os Volturi mandaram alguém para investigar. Eu não sabia, mas até agora Mirania estava nas sombras vigiando nossa família a mando de Padrone. Ele estava a par de tudo que estava acontecendo. Quando o vampiro veio até nossa casa e me viu ele recomendou aos meus pais que se livrassem de mim, mas minha mãe se recusou. Eu não era fisicamente parecida com um vampiro. De fato, eu era um bebê humano. Eu nunca bebi sangue na vida. Meu pai teve que roubar leite materno do hospital para me manter viva. Eu não era uma ameaça, eu era menos que um animal para eles então eles não ligaram para o fato da minha mãe não ter me descartado.
—A quanto tempo você está viva? Emmett pergunta.
—Eu sou bem mais nova que vocês. Em idade humana eu cresci até os dezoito anos, mas eu tenho pouco mais de cinquenta anos.
Paul soltou um assobio longo e falou —Você é imortal então?
—Isso. Respondo. —Eu não consumo sangue, mas ainda assim vou viver para sempre. Minha mãe queria uma família, para sempre.
—O que aconteceu? Jasper pergunta. —Depois que você começou a se desenvolver?
—Eu mudei de cidade para cidade com meus pais como deve ser. Sempre nos mantendo escondidos e sem chamar atenção. Eu não podia ir para o hospital quando adoecia, então minha mãe estudou medicina básica para cuidar de mim. Quando eu tinha seis anos em idade humana meus poderes apareceram pela primeira vez. Eu quebrei meus braços atirando um balde de areia cinquenta metros de distância. Quando meu pai me tocou eu absorvi os poderes dele e ele ficou desacordado por alguns minutos enquanto eu consegui usar a força dele. Em um teste de força eu quebrei o tornozelo e desde então jurei quentão ia usar meus poderes antes de absorver as habilidades de um vampiro.
—O que exatamente você absorve quando toca em um vampiro? Alice pergunta curiosa.
—Tudo. Respondo calma. —Força, velocidade, habilidades de cura, talentos, memórias. Eu me torno praticamente uma cópia do vampiro que absorvi. Mas não dura muito tempo. Talvez dez ou quinze minutos. É um mecanismo de defesa. Quando meu corpo humano sofre danos ao ponto de vida ou morte ou quando estou em uma situação de extremo estresse emocional é quando meus poderes se manifestam. Eu não tenho controle sobre eles. Padrone me capturou por isso. Ele não podia analisar Renesmee diretamente então ele criou uma cópia do DNA dela usando meu corpo e extraiu a informação do disk que ele instalou em mim. Assim que absorvi os poderes dela meu instinto de sobrevivência me fez fugir e Mirania, que estava dentro da minha mente, me controlou até voltarmos para o laboratório.
—Essa Mirania pode controlar o corpo de uma vampiro? Rosalie pergunta. Eu sei o que ela quer saber.
—Isso. Mirania pode controlar o corpo de um vampiro por alguns minutos se ele estiver dentro do raio de alcance dela. Padrone conectou ela a uma máquina que a manteve adormecida no meu cérebro. No dia em que você perdeu o controle foi por conta de um problema na conexão. Mirania perdeu o controle por um momento e o estresse no meu corpo fez com que eu tivesse aquela febre alta. O procedimento para estabilizar a conexão foi difícil e Mirania estava no limite dela. Ela te incitou a me atacar para que ela pudesse cortar a conexão e voltar para o corpo dela, mas padrone estabilizou o corpo dela e ela voltou a dormir em mim.
—Eu nunca ouvi falar se um vampiro chamado Padrone entre os Volturi. Jasper fala pensativo.
—Eu não tenho certeza de quem ele é. Só sei que um vampiro chamado Felix apareceu na memória de Mirania dizendo que os Volturi não podiam se envolver em tentativas de atacar Renesmee. Mirania foi quem me disse que Padrone realizava experimentos com a permissão deles. Falo para Jasper tudo que eu sei sobre o vampiro que causou tudo isso. Ele continua pensativo.
—Padrone matou meus pais e me prendeu em um laboratório por dois anos. Olho para Esme hesitante. —Ele… modificou minha aparência. Ele precisava ter certeza de que eu ia entrar na casa de vocês e teria uma desculpa para ficar. Ele se baseou em uma foto do bebê de Esme. Esme tem a cabeça baixa. Ela provavelmente sabia que não era coincidência que eu me pareço com o filho dela depois que toda essa confusão começou.
—Wow… Quil suspira alto. —Acho que entendi, mas também não tem idéia do que tá acontecendo.
—O que importa é que estamos vivos aqui. E que aquele homem não tem as informações de Renesmee. Edward fala abraçando a filha pelos ombros. —O disk foi corrompido. Aquela vampira estava falando a verdade.
—Então o que vamos fazer agora? Rosalie pergunta e todos se viram para ela.
—Voltamos para casa oras. Jake responde como se fosse a resposta óbvia, mas sei que eles tem mais com o que se preocupar do que isso. Eu não sinto que devo estar ali para aquela discussão. Eles vão falar sobre o que fazer comigo. É claro que eles vão voltar para casa, mas a questão é, o que fazer comigo?
Olho para a janela e o sol passa pelas cortinas baratas do lugar. Eu quero sentir aquele sol na minha pele. Não quero pensar mais no que vai acontecer. Minha cabeça lateja e eu preciso de um minuto para descansar.
—Posso ir lá fora por um momento? Pergunto com a voz baixa. Os murmúrios param quando pergunto. Assim que eu sair eles vão poder falar mais livremente.
—Claro. Vamos. Seth me pega no colo novamente, mas eu firmemente falo para ele me descer.
—Eu posso andar sabe.
—Tudo bem. Mas eu vou com você. Ele está com a cara séria, mas não realmente bravo. Eu senti falta daqueles olhos.
—Tudo bem. Eu me levanto e vou andando até a porta. Seth mantém os braços ao meu redor como seu eu fosse cair a qualquer momento. Posso sentir os olhos nas minhas costas até passar pela porta da frente.
—Os vizinhos estão quebrando o pescoço para olhar aqui para dentro. Quil fala apontando para duas pessoas pulando perto da cerca tentando enxergar dentro da casa. Provavelmente, ver Jake e os outros homens grandalhões entrarem na casa atiçou a curiosidade deles.
—Vai ficar tudo bem. Jasper pode mantê-los afastados. Carlisle fala olhando para Jasper. Imagino que ele vai afastar os vizinhos fazendo eles se sentirem amedrontados demais para chegar muito perto.
Passo pela porta da frente com Seth logo atrás de mim. Os vizinhos disfarçam quando nos veem. Eles fingem regar alguma planta perto da cerca para continuar a olhar para a casa. Seth já está vestido então ele não chama tanta atenção como antes, mas eles ainda parecem curiosos.
A casa que Alice arrumou é uma pequena casa de tijolos com dois quartos. O lugar tem um jardim na frente e um quintal também. Ela parece confortável e aconchegante, quando não está cheia até o limite.
Me sento em um dos bancos de madeira sobre a grande oliveira no jardim. A sombra da árvore é refrescante. Eu esperava um clima semelhante ao de Forks, mas o planeta mudou tanto… me lembro das histórias que meu pai me contou, sobre as enchentes inexplicáveis e países onde o inverno era congelante se transformarem em terras tropicais.
Jogo a cabeça para trás tentando relaxar. Seth está do meu lado olhando para a sombras das folhas da árvore.
—Me desculpa. Eu falo sem olhar para ele.
—Pelo quê? Ele responde confuso.
Aponto para a mão dele. A cicatriz do corte que o vidro fez ainda ligeiramente visível.
—Não foi nada. Ele fala balançando a mão e sorrindo. Eu seguro a mão dele e analiso a cicatriz mais de perto, passando os dedos sobre a linha rosa. Posso sentir o calor da mão dele sobre a minha e sinto meu rosto esquentar.
—Se… se eu quisesse ir embora, para algum lugar, você viria comigo? Não olho nos olhos dele quando pergunto. Eu não sei o que fazer. Não sei se posso voltar para a casa dos Cullens com se nada tivesse acontecido. Não sei se ainda existe um lugar para mim lá, mas eu não quero ficar sozinha. Se eles decidirem que não posso mais ficar com eles eu não vou ter absolutamente ninguém. Eu não quero ficar sozinha. Eu faço um pedido egoísta a Seth esperando que ele me convença de que ir embora não é a solução.
—Você sabe que sim. Ele fala me surpreendendo. Penso mais um pouco e respondo.
—Não estou falando sobre o imprinting. Eu quero saber se você viria comigo. Quero saber como você realmente se sente. Seth segura minha mão me fazendo levantar o olhar. Ele coloca minha palma sobre o rosto dele e fecha os olhos.
—Você sabe como eu me sinto. Seth segura meu rosto e me beija. Meu coração parece para por um segundo. Eu puxo o rosto dele para mais perto de mim. A mão dele desse pelos meus ombros até minhas costas.
—Ei! A voz de Esme me faz pular e me separa dele. Ela está na porta com Alice segurando uma toalha sobre ela. —Já chega de ficar no sol! Já vamos embora! Para dentro agora!
Seth olha para ela de cara feia e eu começo a rir. Não lembro da última vez que ri daquele jeito. Alice ainda segura a toalha sobre a cabeça de Esme e Carlisle tenta puxar ela para dentro. Jake, Embry, Quil e Paul se apertam na frente da janela fazendo sinal de joinha.
Mirania tinha razão. Não vou me culpar por querer ser feliz. Não vou me afundar em alto piedade.
Ando de volta para a casa com Seth. A brisa que sopra parecesse sussurra no meu ouvido a voz dos meus pais chamando meu nome. Amelia. Não importa o que vem daqui para frente. Eu vou continuar a sobreviver.
