CAPÍTULO 3

O dia não havia nem acabado, e eu recebia mais uma visita no Planeta Diário. Na verdade, não era uma visita inesperada. O celular tocou. Eu atendi. Era Lois, e ela perguntou se podia vir me ver. Eu disse que sim, e quinze minutos depois lá estava ela, entrando pela porta do jornal.

"Oi, Chlo" disse ela, sentando-se à minha frente.

Não lembro de ter respondido, pois estava concentrada fazendo uma pesquisa para a faculdade. Lana estava atolada de provas e eu não queria ficar até tarde usando o computador e atrapalhando o sono dela no dormitório. Por isso, tentava adiantar alguma coisa no jornal.

"Chegou rápido" comentei, sem tirar os olhos do monitor.

"Eu estava aqui por perto" disse ela.

"Como andam as coisas?" perguntei.

Era evidente que Lois estava ali para me dizer alguma coisa. E era fato que ela não me diria nada se eu não lhe desse atenção. Afinal, era Lois.

"Assim que você me der um pouquinho de atenção, eu digo" respondeu ela, sarcástica.

Levantei os olhos para encará-la e sorri. Parei então o que estava fazendo, pois, de qualquer forma, não conseguiria mais terminar, e perguntei:

"Algum problema?"

"Bom, agora que tenho a sua atenção total, posso falar" disse ela, irônica.

Eu sorri, cruzei os braços e esperei que ela começasse a falar.

Lois puxou a cadeira para mais perto da minha mesa, e me encarou:

"Acho que fiz uma besteira"

"E quando é que você não fez?" indaguei.

"É sério, Chlo" disse ela.

"Tem a ver com um sujeito loiro alto, exímio nadador e sorriso contagiante?" arrisquei. Não podia ser outra coisa.

"O próprio" respondeu ela.

"Ok. O quê foi que houve?" perguntei.

"Eu acho que acabou" disse ela, finalmente.

"Como assim?" indaguei. Na verdade, eu não sabia como me sentia a respeito.

"Ele não estava se sentindo feliz, Chlo" respondeu ela.

"O quê foi que você fez?"

"Na verdade, eu ainda não fiz nada"

E eu sorri.

"Então não acha que está sendo meio precipitada?"

"Não. Não acho" disse ela, com firmeza. "Ele não estava se sentindo feliz aqui, Chlo. Em Metrópolis"

"Sei" foi o que eu disse, o menos debochado possível. "Ele deve estar sentindo falta do mar"

Lois me encarou. Ela não sabia que eu já conhecia o segredo de A.C. através de Clark. Aliás, isso nem passava pela cabeça dela.

"E o quê você fez?" perguntei.

"Bom, aí é que está" disse ela.

"Hum... a grande besteira" completei.

"Não sei o quê houve comigo, Chlo" disse ela, encostando-se na cadeira.

"Bom, se você me disser, talvez eu consiga ajudar"

Lois suspirou.

"Eu gosto dele" disse ela. "Gosto muito. Mas eu vi que ele não estava feliz. Outro dia vimos um noticiário sobre uns barcos baleeiros e ele queria estar lá. Eu senti isso. Perguntei, mas ele fugiu do assunto"

"E o quê ele poderia fazer para impedir?" perguntei, certa de que Lois jamais diria qualquer coisa sobre as habilidades de A.C.

"Você sabe, Chlo. Ele tem essa coisa de ativista. Provavelmente se uniria ao Greenpeace e afundaria os barcos" respondeu ela, evasivamente. "Mas isso ainda não foi nada"

"O quê foi que aconteceu?"

"Eu sinto que o lugar dele não é aqui" respondeu ela, olhando à volta, menos para mim. "É como se ele pertencesse ao mundo. Sabe, ele não é o tipo de cara que pode sair para fazer as coisas dele e voltar rapidinho para os braços da namorada"

Enquanto ouvia as palavras de Lois, fiquei pensando o quanto era irônica toda aquela situação.

"Ele está destinado a algo maior" continuou ela. "Mas não pode estar em vários lugares em poucos segundos"

De fato, eu sabia o que ela estava dizendo. O problema é que ela não sabia que eu sabia. Bom, enfim, ela estava tentando me dizer, sem revelar, que o lugar de A.C. era nos oceanos, usando seus poderes em prol da vida marinha, e que ele não poderia estar em terra firme com ela o tempo todo.

"Então o quê você está tentando dizer é que não poderia dividi-lo com o resto do mundo?" arrisquei, muito embora soubesse que falar aquilo era exatamente como se eu estivesse me referindo a qualquer outra pessoa, menos Lois. Ela era a pessoa menos egoísta que eu conhecia. Aliás, Lois não tinha um pingo de egoismo.

"Não, Chlo" disse ela, gentilmente. "Você não está entendendo"

Talvez se você me dissesse que ele é um super-herói com poderes marinhos, capaz de nadar mais rápido do que o Clark pode correr, eu pudesse entender, foi exatamente o que eu quis dizer.

"Eu amo isso nele" continuou ela. "E eu jamais diria a ele para não fazer o que gosta. Seria o mesmo que eu pedisse a ele para escolher entre eu e seus... hum, eu e essa sua coisa de salvar o mundo"

"Mas não é exatamente o que você está fazendo agora?"

"Não" respondeu ela. "Eu sinto que ele não é feliz com a idéia de ter que se dividir entre eu e sua paixão pelo mar"

"E você acha que não pode competir com isso?"

"Eu poderia conviver com isso. É diferente. Mas ele não pode fazer o que gosta quando está comigo. Ele não quer me deixar e fazer aquilo que acha que precisa fazer" corrigiu ela.

"Então você resolveu facilitar as coisas?"

Lois assentiu com a cabeça.

"E deu o fora nele?"

Lois suspirou.

"Pior" respondeu ela. "Eu disse a ele que não queria mais saber dele"

"E qual a diferença?"

"Ele não acreditou" continuou ela. "Disse que eu estava me preocupando com coisas que não devia, e que hoje à noite conversaríamos melhor"

"Então vai tudo depender dessa conversa"

"Exatamente" concordou ela.

"E o quê você vai fazer?" perguntei.

"Terminar, lógico" respondeu ela.

E eu não conseguia esconder a surpresa.

"Mas você não gosta dele?"

"Por isso mesmo" disse ela. "Porque eu gosto dele, não posso amarrá-lo. Não posso pedir a ele que fique comigo quando o destino dele é maior do que isso"

"E como você se sente em relação a tudo isso?"

"Por isso estou aqui" respondeu ela. "Estou triste. Arrasada. Eu gosto muito dele. Vou sentir saudades dele. Nunca conheci alguém tão... tão especial. Precisava que alguém me dissesse que tudo vai ficar bem"

Eu sorri um sorriso amargo, solidária ao sofrimento de Lois. Por outro lado, não conseguia deixar de pensar na ironia do destino e no quanto minha prima era sortuda. Havia alguém muito mais especial esperando por ela, alguém que ela nem imaginava e que estava muito mais próximo do que um dia ela podia esperar.

"Tudo vai ficar bem, Lois" foi o que eu disse.

Continua...