Margarida, já recuperada, mas ainda enlevada, conversa com Sorento enquanto o marina prepara um suco para os dois.

Margarida: O que você fez com o Yo, Sorento?

Sorento: Não se preocupe, não foi nada demais. Eu o levei para o seu quarto e o deixei por lá.

Margarida: Fazendo o quê no meu quarto?

Sorento: Cuidando do Ernest, ora! É que a Ágatha precisou sair e eu fiquei sozinho com o menino, mas como eu vi que você precisava de ajuda...

Yo: Mas o Yo vai saber cuidar de uma criança de dois anos?

Sorento: Não, mas o Ernest vai saber muito bem o que fazer com o Yo. Esqueceu-se de que ele tem parentesco com o Miro de Escorpião?

Margarida: Pobre Yo...

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Capítulo IV

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What I have become

My sweetest friend?

Everyone I know

Goes away in the end

O que eu me tornei

Meu doce amigo?

Todos que conheço

Vão embora no final

And you could have it all:

My empire of dirt

I will let you down

I will make you hurt

E você poderia ter tudo isso

Meu império de sujeira

Eu vou deixar você para baixo

Eu vou fazer você sofrer

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Naquela manhã, o sol mal conseguia se impor no céu da ilha. Nuvens cobriam seus raios, o mar estava mais agitado e até as pessoas da vila aparentavam desânimo. Mas Yo não viu nada disso, estranhamente ainda dormia. E novamente sonhava...

Ele caminhava por uma caverna, tentando enxergar alguma coisa na penumbra. Tudo era silêncio, apenas o barulho das ondas que batiam no rochedo. Não sabia o porquê de estar ali, sabia apenas que tinha de estar ali.

Andou por um tempo, até encontra um corredor sem saída. E nele, ajoelhada no chão, uma bela garota mantinha os olhos fechados e uma postura serena. Seus cabelos azuis claros caíam por suas costas, lisos e soltos. Quem seria? Aproximou-se lentamente, até ficar poucos passos de distância. Foi então que...

A garota abriu os olhos e lhe sorriu, enquanto sua voz podia ser ouvida.

-Acorde, Yo... Acorde e venha até mim... Venha e encontre seu verdadeiro destino...

-Yo!

Uma outra voz feminina se sobrepôs a da garota, que voltou a fechar os olhos. Quem seria? E por que deveria encontrá-la? Ou melhor, onde deveria ir para encontrá-la?

-Yo! Está em casa?

A voz de Cecília, que gritava chamando por ele, acabou despertando o rapaz. Yo acordou em um pulo e se sentou na cama, atordoado pelo sonho.

-Ah, você está aí! Por que ainda não se levantou, Yo? Está doente? – perguntou a garota, encostada junto à porta.

O rapaz negou com um aceno, resmungando alguma coisa que a garota não entendeu. Levantando o olhar, Yo viu o dia meio nublado e estranho e, ao fundo, o rochedo do Estreito se erguer em meio às águas. Foi então que sentiu que, talvez, as respostas para tantas perguntas estivessem por lá...

-Yo!

-Que foi, Cecília? Eu já acordei, não está vendo?

-Desculpe, eu só estava preocupada com você, nunca demora tanto para se levantar... Eu vou... Vou voltar para o bar, então.

Cecília saiu depressa da cabana, estranhando o mau humor do amigo. Talvez não tivesse tido uma boa noite de sono e por isso estava tão estranho. O melhor a fazer era ficar quieta e trabalhar, depois quando ele estivesse mais calmo perguntaria o que houve.

Yo ainda demorou um tempo para se levantar de vez e sair da cabana, não estava muito a fim de fazer nada, nem ver ninguém. Tomou seu café, vestiu uma calça de tecido cru, amarrou os cabelos em um rabo de cavalo baixo e saiu, meio se rumo e sem destino. Queria apenas caminhar, sentia uma necessidade sem nexo de repensar sua vida e seus planos para o futuro.

Enquanto caminhava, observava as pessoas à sua volta. Sabia que muitos ali eram gente simples, de vida sofrida e muito trabalho. Gente que era explorada pelos comerciantes marítimos, obrigadas muitas vezes a aceitar um dinheiro miserável para não morrer de fome ou ter problemas. Mas havia também aqueles que não valiam nada, que eram explorados e exploravam também, sem escrúpulos, sem medo de serem desobedecidos ou ignorados.

Era esse tipo de gente que não merecia viver sobre aquela terra, pensava o rapaz. E subitamente, percebeu que não sentia mais pena de nenhum deles, ou raiva. Parecia até que esses sentimentos não importavam mais, apenas o desejo de se ver livre de tudo e todos.

Todos? Não, nem todos... Não poderia colocar o capitão Martin, homem tão justo e honrado, no mesmo balaio dessa gentalha. E nem Cecília. Assim como ele próprio, a garota era uma menina de vida difícil, seu único consolo nos momentos de angústia e motivo para seguir em frente. Mas estaria ela em seu destino, como tanto desejava?

Yo olhou para céu e, embora mal visse o sol, deduziu pela posição de seus raios que já devia passar do meio-dia. Voltando a caminhar, decidiu ir até o bar para comer alguma coisa.

-Me solta!

Chegando próximo ao bar, Yo pôde ouvir claramente o grito de Cecília vindo da varanda e uma gargalhada masculina. Contornando depressa a pequena cerca, ele viu o homem da noite anterior de pé próximo aos amigos, segurando-a pelos pulsos, já pronto para agarrá-la. A raiva tomou conta do rapaz e ele não parou para medir as conseqüências de seus atos, pulando a cerca para a varanda.

-Desgraçado, eu vou te ensinar a respeitar uma garota!

O aviso foi acompanhado de um soco certeiro no rosto, seguido por um chute e outros socos. Em questão de minutos, o bar inteiro estava envolvido na briga de Yo e até Cecília contribuiu com uma garrafada na cabeça do homem que quis atacá-la.

Puxando o cara pela camisa com violência, Yo o lançou por cima da cerca, o cara foi cair na areia. Mesmo destino de seus amigos.

O dono do bar, vermelho de raiva e muito nervoso, veio até a varanda e encontrou a garota parada junto à porta. Imediatamente a segurou pelos cabelos.

-Ai!

-Idiota! Viu o que fez com o meu bar? Vai ter que me pagar todos os prejuízos, sua retardada!

Mandando às favas o que restava de seu bom senso, Yo virou-se na direção do dono do bar e deu-lhe um soco que o homem foi ao chão. Puxando Cecília pelo braço, o rapaz a tirou dali e a levou para a cabana.

-Desgraçado! Para o inferno, os dois! – gritava o homem, levantando-se meio cambaleante – E você, sua imbecil, nunca mais apareça na minha frente!

Somente quando entrou em sua cabana e se sentou, a garota se deu conta do que tinha acontecido. E começou a chorar. Yo, de pé ao lado dela, a abraçou.

-Não fique assim, Cecília. Foi melhor assim, aquele velho maldito não merecia o seu trabalho! Ele te tratava quase que como uma escrava!

-E dái, Yo? Era o único emprego que eu tinha, como é que vou fazer agora?

-Não vai fazer nada... Eu estou aqui, com você. E não te prometi que ficaríamos juntos, que eu te levaria embora daqui?

"Mas por que sinto que essa condição não faz parte de meu destino?", o rapaz pensou, abraçado à garota até que ela parasse de chorar. Mais calma, Cecília levantou os olhos e viu que o amigo parecia distante.

-Yo?

-Hã... Ah, está melhor.. Venha, eu acho que seria bom você descansar um pouco.

Yo levou a amiga para o quarto, deitando-a na cama e cobrindo-a com um lençol. Beijando sua testa, o rapaz se sentou ao seu lado, na cabeceira.

-Me dê a sua mão...

Sorrindo por conta do pedido, Yo segurou a mão de Cecília. Em pouco tempo, a garota dormia, o rapaz fazendo-lhe carinho no rosto.

-Será que poderei cumprir minha promessa, Cecília?

Suspirando, Yo levantou os olhos para fora da cabana e ficou observando o mar, as ondas quebrando na praia. Dali, tinha também a visão do Estreito e seu rochedo. Apertando os olhos, o rapaz de repente teve a impressão de vê-lo brilhar. Um brilho tão intenso que o fez virar o rosto, de olhos fechados.

Um flash lhe veio à mente. Via-se no meio do mar, pilotando o barco do capitão Martin. Entrava com o barco pelo Estreito, até parar próximo ao rochedo. E, sem pensar duas vezes, mergulhava nas águas, desaparecendo de uma vez por todas...

Por que aquela visão? Teria alguma coisa a ver com seu sonho? Só havia um meio de saber... Beijando mais uma vez a testa de Cecília, Yo despediu-se silenciosamente e saiu do quarto, ganhou a praia facilmente e foi em direção ao ancoradouro. "Eu preciso saber o que está acontecendo... Me perdoe por te deixar aqui, minha pequena...".

Nem bem Yo saiu, a garota acabou despertando. Procurando pelo amigo, ela olhou pela janela e o viu andando pela praia, na direção dos barcos. Nada demais, se não fosse uma vozinha teimosa que lhe dizia para ir atrás dele.

Calçando as sandálias, Cecília saiu correndo atrás de Yo.

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No Templo Submarino, o homem de cabelos azuis observava as quatro escamas que ainda restavam sobre os pedestais, apenas aguardando o momento que seus portadores chegariam.

- General Dragão Marinho?

O homem virou-se vagarosamente para a entrada do salão e viu um rapaz de cabelos cinza e olhos violeta o chamando. Ele trazia uma flauta na mão direita e caminhava com passos firmes até o general.

-O que quer, General de Sirene?

-O mesmo que você, pelo visto... Eu percebi que a escama de Scylla me parece mais agitada.

-Sim... Eu acredito que ainda hoje conheceremos seu portador, o General que protegerá o Pilar do Pacífico Sul.

-E os demais, quando aparecerão? Soube que Hilda de Polaris acabou de enviar um mensageiro até Atena, revelando os planos de Asgard.

-Não se preocupe, logo os demais se juntarão a nós dois, Kraken e Vossa Majestade neste Templo. Os planos de nosso senhor Poseidon estão correndo muito bem, Sirene...

De súbito, o diálogo entre os dois generais foi interrompido pelo tilintar da escama de Scylla. Parecia muito ansiosa.

-O General já está a caminho...

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Não havia ninguém no ancoradouro, o que deixou Yo satisfeito. Pelo menos assim, não teria que dar explicações sobre o que estava fazendo. "Desculpe, capitão Martin, mas vou precisar de seu barco emprestado", ele pensava, enquanto desamarrava as cordas que prendiam o barco no pequeno píer.

Yo estava quase terminando o serviço quando levantou os olhos e viu Cecília vir correndo em sua direção, cansada e ofegante.

-Yo, espere!

Suspirando, o rapaz saltou do píer para a areia, encarando a menina. Cecília aproximou-se com cautela e viu que o barco estava quase solto, pronto para viagem.

-Você pretendia viajar, Yo? Sozinho?

-Cecília... Eu não sei se vai entender, mas...

-Você ia ir embora, me deixar para trás? E o que me prometeu, Yo?

Cecília falava com lágrimas em seus olhos, sentindo-se muito sozinha de repente. O rapaz sentiu um enorme aperto no coração e fez-lhe um carinho no rosto, uma carícia tão leve e intensa quanto uma despedida.

Atirando-se nos braços de Yo, Cecília acabou deixando que suas lágrimas caíssem, molhando o peito forte do amigo.

-Por que está fazendo isso, Yo? Por quê?

-Cecília, eu não sei explicar... Preciso sair dessa ilha, encontrar o meu verdadeiro destino... O nosso destino...

As palavras de Yo não convenciam a garota, que não o largava de jeito nenhum, apertava-o em seu abraço com mais força e ímpeto. Acariciando os cabelos da menina, Yo tentava acalmá-la.

-Eu vou voltar para te buscar, eu prometo. Você pode esperar por mim...

-Eu quero acreditar em você, mas não consigo...

-Por favor, acredite... Eu jamais mentiria para você...

Segurando o belo rosto pelo queixo, Yo fez com que Cecília o encarasse, as lágrimas rolando sem parar por sua face. Ela estava ali, tão perto, tão fragilizada, tão entregue... Não sabia o seu destino, muito menos o que fazer, mas a separação parecia inevitável para ele. Fechando os olhos, Yo sorriu tristemente e beijou a garota.

Um beijo terno, carinhoso e sem pressa. O primeiro beijo da menina, um gesto tão desejado pelo rapaz. Um beijo em que podia se sentir todo o amor que ele tinha por ela, mas também o toque da despedida. Silenciosa, porém triste.

-Me espere, Cecília... – Yo disse, soltando-se do abraço da menina, voltando ao píer.

Desta vez, ela nada fez para impedir o rapaz de ir. Yo soltou a corda, subiu no barco e acionou o motor. Quando ele ganhou o mar, o rapaz olhou uma última vez para a praia, onde Cecília estava parada, observando o barco ir embora.

"Talvez seja um adeus, minha menina...".

Yo acenou tristemente, a garota fez o mesmo. O barco já estava pequeno no mar quando a vozinha insistente apareceu novamente. Sentindo que as lágrimas não cessariam tão cedo e que algo iria acontecer ao rapaz, Cecília saiu correndo. Precisava encontrar o capitão Martin, urgente.

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Ai, que lindo... Primeiro beijo, gente. E talvez o único... Escrever drama não dá certo, eu acabo me emocionando junto com os personagens...

Sorento: Mas eu estou aqui para te consolar.

Margarida: Deixa a Ágatha te ouvir falando isso, deixa...

Sorento: A Ágatha sabe que ela é o amor da minha vida, não se preocupe.

Margarida: Mudando de assunto, você não acha que aqueles dois estão muito quietos no meu quarto?

Sorento: Ah, isso é porque o Ernest amarrou o Yo no pé da cama e o amordaçou.

Margarida: Quê?

Sorento: Normal, eles estão brincando de cowboy e índio...

Margarida: Esse menino tá me surpreendendo!

Sorento: Parente do Miro, você queria o quê?

Nota: Querem saber quem é Ernest? E que parentesco seria esse com Miro de Escorpião? Então leiam a fic "Unforgivable" e sua continuação, "EDELWEISS" e terão todas as respostas que procuram (Aê, propaganda explícita!).