Capítulo I

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Nem bem a execução de Raul tinha acontecido e o Cardeal e o capitão Rochefort estavam reunidos, discutindo os próximos passos a serem dados. E o mais urgente deles era se livrarem dos mosqueteiros, a guarda de elite do rei. Bom, para ser mais exato, eliminar quatro desses homens.

-Não será difícil convencer o rei a dispor de seus mosqueteiros, ele é um fraco e facilmente influenciável... O problema será calar aqueles quatro que defenderam abertamente ao traidor.

-Eu não me preocupo tanto com eles, meu caro capitão... O que é deles já está arranjado, hoje mesmo eles serão pegos.

-O que tem em mente, Vossa Iminência?

-Você verá...

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Na sede dos mosqueteiros, tudo era silêncio. Não se ouvia um único ruído, fosse de passos, palavras ou mesmo a respiração dos presentes. Sentados em um canto mais escuro do salão de reuniões, os quatro mosqueteiros que de todos eram os mais próximos de Raul, estavam quietos, dezenas de garrafas de vinho à mesa, cabisbaixos.

-Essa vida é muito injusta... Por que justo o Raul, ele era tão... Tão... Como é que é mesmo?

-Bêbado desse jeito, você não vai conseguir terminar essa frase nunca, Miro. Aliás, não vai conseguir nem acabar com a raça do Rochefort, como quer tanto.

-Me deixa em paz, Camus... Eu vou... Vou...

-Vai parar de beber, antes que caia dessa cadeira. - disse calmamente Aioros, tirando da mesa todas as garrafas e copos, sob os protestos do mosqueteiro que, com isso, realmente despencou da cadeira, estatelando-se no chão de pedra. Porém, nem a cena insólita tirou o último deles de seu mundo particular.

-Um tostão por seus pensamentos, Shura... - disse-lhe Aioros, indiferente às tentativas de Camus de fazer Miro levantar-se do chão.

-Hum, não valem tão pouco assim...

Enquanto os dois conversavam e os outros discutiam, um homem saiu do salão e foi para a ala onde ficavam os aposentos dos mosqueteiros. Sem ser visto, ele ficou por lá um tempo e, da mesma maneira sorrateira que entrou, saiu. E ninguém notou que, ao invés de voltar ao salão, ele saiu da sede.

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Nesse meio tempo, o Cardeal estava em reunião com o rei Luís XIV, que parecia muito abalado pela recente execução de um de seus homens de confiança.

-O que devo fazer, Cardeal? Raul de Montparnasse era um de meus melhores mosqueteiros e me apunhalou pelas costas!

-Sei o quanto isso deve ter sido duro para Vossa Majestade... No entanto, devo preveni-lo de que Raul não era o único.

-O quê?

-Há sérias suspeitas sobre outros dos mosqueteiros... Principalmente sobre aqueles que estavam sempre junto do traidor.

-Não é possível, Cardeal! Shura e os demais são fiéis a mim, jamais fariam algo que pudesse colocar minha vida e a França em risco!

-Me desculpe, Majestade, mas o senhor dizia a mesma coisa sobre o traidor...

Desolado, o rei recostou-se em sua poltrona, sem saber que direção tomar. A oportunidade perfeita para que Richilieu colocasse seus planos em prática.

-Se sente que não tem direção a tomar, Majestade... Eu acho que posso ajudá-lo.

-De que maneira, Cardeal?

-Afaste os mosqueteiros de suas funções, pelo menos até investigarmos todas as suspeitas... Meus homens cuidarão de sua proteção pessoal e da Rainha.

O rei encarou o Cardeal e ficou pensativo por alguns minutos, depois, munido de papel oficial timbrado e sua pena, rascunhou e assinou um novo decreto. Satisfeito, o Cardeal saiu da sala com o documento e encontrou o capitão Rochefort esperando-o no corredor.

-Aqui está, vá com seus homens e acabe com aquela sede... E não se esqueça do servicinho extra...

-Pode deixar, Cardeal.

Ajeitando seu chapéu, o capitão saiu do palácio e, reunido com seus homens, rumou para a sede dos mosqueteiros.

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Em outro ponto de Paris, na ala do cemitério da cidade destinada aos condenados à morte, o túmulo de Raul estava coberto de flores e uma pessoa ajoelhada diante dele fazia uma prece.

-Eu juro que vou descobrir o verdadeiro traidor e limpar a sua honra como mosqueteiro... Eu juro!

Encarando a sepultura fria, sem identificação de nome, apenas número, a pessoa ajeitou o capuz da capa que usava e saiu, pisando duro e firme em sua decisão.

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Com o decreto em mãos, Rochefort invadiu a sede dos mosqueteiros, dando ordens e espalhando seus homens pelos corredores, tomando conta de tudo. Shura, vendo a cena, saltou de sua cadeira e foi tirar satisfações com o capitão.

-Quem pensa que é para chegar assim, dando ordens e expulsando a guarda real?

-Guarda real? Não é o que me diz este decreto assinado por Vossa Majestade... -Rochefort quase esfregou o documento na cara de Shura. Aioros veio por trás, bem na hora que o amigo jogou o papel na cara do capitão, em uma provocação escancarada.

-Isso é uma afronta!

-Acalme-se, Shura!

-Diga o que quiser, mosqueteiro, a lei está ao meu lado! Ponha-se daqui para fora e seus amiguinhos sujos também!

-Seu mer...!

Miro, milagrosamente curado dos efeitos da bebida, quis partir para cima de Rochefort, mas Camus o deteve. E, no mesmo instante, dois guardas do capitão vinham da ala de aposentos, trazendo papéis nas mãos.

-Senhor! Encontramos isso em dois dos quartos que revistamos!

-Deixe-me ver... - Rochefort analisou um por um, encarando os quatro mosqueteiros à sua frente - Ora essa, parece-me que o traidor Raul fez escola por aqui... Cartas endereçadas ao Duque de Bunkinghan, propostas de uma aliança para derrubar Vossa Majestade... Em que quartos encontraram isso?

-Nos de número seis e sete, senhor.

-Que interessante... Por um acaso conhecem os ocupantes deste quartos? - perguntou Rochefort, encarando Shura e os demais, que se entreolharam - Homens! Prendam estes mosqueteiros!

-Sob que acusação, seu pulha?

-Crime de traição contra a França... Eu já deveria saber que os amigos de Raul não eram boa coisa...

Os homens de Rochefort formaram uma pequena roda em torno dos quatro e outra maior que bloqueava qualquer mosqueteiro que tentasse interferir. Acuados no meio, os amigos desembainharam seus floretes e colocaram-se em posição de ataque.

-Alguma idéia de como saímos dessa, Camus? – Miro questionou, encarando os homens à sua frente.

-Por que eu tenho de responder?

-Bom, pelo que eu saiba você é o líder, certo?

-Ai, ai...

-Ou nós atacamos ou somos presos... - Aioros interferiu, na sua calma de sempre - O que preferem?

-Se ninguém aqui tem medo de altura, eu sugiro atacar. - disse Shura, olhando de um por um os amigos. Camus e Aioros concordaram com um aceno, Miro ficou feito besta, sem entender nada.

-Então, amigos, é um por todos... - Camus invocou o grito de honra dos mosqueteiros.

-E todos por um!

-Peraí, eu não entendi a parte da altura! - gritou Miro, esquivando-se de um guarda.

-Olha para trás, seu lerdo!

-Isso não vai dar certo... - o mosqueteiro chiou, ao se deparar com a enorme janela atrás de si, que beirava um pequeno precipício.

-Tem uma idéia melhor? - perguntou Camus, despachando dois de uma vez.

-Será que dá para falar menos e agir mais? - Aioros acertou um - Deus acompanhe sua alma...

-Eu não gosto disso...

-Então fique aqui e resolva do seu jeito!

Foi a última coisa que Shura disse, antes de saltar e sair deslizando pelo barranco.

-Resolver?

-Você quem sabe!- foi a vez de Aioros saltar, não sem antes fazer o sinal da cruz.

-Peguem eles, não os deixem fugir!

Rochefort partiu com tudo para cima de Camus e Miro, ainda lutando e já próximos à janela.

-Não tem outro jeito mesmo?

-Quer saber? Já que sou o líder, como me disse, eu tomo a iniciativa no seu lugar!

Camus agarrou o amigo pelo colarinho e o jogou pela janela, Miro rolou pelo barranco aos gritos. Depois, saltando para o parapeito, o mosqueteiro tirou seu chapéu em reverência à Rochefort e também saltou.

-Idiotas! Vão pagar por isso!

Saindo da sede, o capitão deixou alguns de seus homens supervisionando a saída dos demais mosqueteiros e foi atrás dos quatro amigos que sempre o faziam de bobo.

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Pronto, esse foi o primeiro capítulo! E, como prometi anteriormente, uma breve explicação dos motivos das escolhas destes cavaleiros de ouro e quem seria quem.

Bem, eu escolhi o Camus para o lugar do Athos porque sempre achei que ele tinha jeito de líder, racional e objetivo, mas sem deixar de se preocupar com os amigos. O Miro tinha de estar no posto do Phortos, o cara piadista, fanfarrão, cheio de querer contar vantagem, mas nem por isso menos honrado que seus colegas. O Aioros eu achei a cara do Aramis, a calma em pessoa, paciência e que só abre a boca quando tem algo de útil para dizer. E finalmente o Shura, o D'artagnan da fic, o herói cujo forte senso de justiça o faz enfrentar qualquer barreira. E fora que eu queria há muito escrever um romance com ele (Ai, tô babando de novo... Desse jeito, o computador morre afogado!).

Ah, já que agora as identidades dos mosqueteiros foram reveladas, uma pequena observação: eu descrevi o Shura com os olhos negros porque eu acho que eles são dessa cor, embora às vezes pareçam castanhos e na saga de Hades estejam mais puxados para o azul. E eu assumo: olhos negros me hipnotizam!

Espero que gostem e logo vem aí o segundo capítulo!