CASAMENTO GREGO

CAPÍTULO 09 – A CERIMÔNIA, PARTE II

O dia raiou azul e com sol forte. Segundo as tias, bons augúrios. Nem uma nuvem à vista.

Enquanto as primas se vestiam e ajudavam a noiva, Aristhias perguntou a Terpsicore:

-Mas como você não se confunde com seus gêmeos, Pipe? Pra mim, eles parecem iguais...

-Vai ver eles têm alguma marca especial, como uma "ameixa" na bunda, Ti. – riu Tália, irmã de Terpsicore.

-Ah, claro, né? Ela vai ficar abaixando a calça deles toda hora, pra ver "oops, desculpe, você não é meu marido..." – resmungou Calíope. – Tinha que ser minha irmã avoada mesmo.

-Irmã esperta, você quer dizer? – defendeu Clio, a mais velha. – Porque essa é a melhor desculpa de todas pra apalpar esses deuses gregos que Terpsicore está levando pra casa...

As mulheres deram aquela gargalhada gostosa, mas insistiram. Pipe bufou e falou:

-É bem mais simples que vocês pensam. Venham até aqui, à janela.

-Não deixe o noivo ver seu vestido! – Terspicore tirou e colocou um roupão. Foi até a janela. Saga conversava com Kanon e Camus.

-Prestem atenção. – Ela apareceu na janela e chamou. Um gêmeo acenou e mandou um beijo, outro rosnou e mostrou o relógio. – Viu como é fácil?

-Nossa, ele é bem apaixonado, não é? – Comentou Aristhias. Calíope engoliu duro.

-Não, Ti. Quem me mandou um beijo sorrindo, foi meu cunhado. Meu marido está furioso porque eu to atrasada. "Eu não posso dizer que os reconheço pelo cosmo. Mas é verdade. Saga sempre olha pra mim com cara de quem vai me esquartejar e comer com azeite e cebola..." Então eu reconheço pela cara feia...

-Será que esse casamento vai dar certo, se vocês já começarem se estranhando?

-É o que você mais queria no momento, não é, Caliope? Inveja mata, sabia?

Calíope reuniu toda sua dignidade ferida e saiu, batendo a porta. Clio olhou brava para Tália que ergueu os ombros.

-Ela que começou. E só falei a verdade. Faz dias, desde que Pipe e o Milucho chegaram que ela está intragável feito azeitona fresca. (1)

-Ser solteirona não é fácil, Tata.

-Ah, que é isso, Aristhias. Ela só tem 26 anos. O mundo não acaba porque uma mulher dessa idade não arrumou marido. Porque ela não vai cuidar da própria vida? Poxa, eu e você estudamos, trabalhamos, casamos, tivemos nossos filhos, terminamos a faculdade depois de casadas... Vai falar que você nunca estudou com um filho na teta ou no colo, berrando de dor de barriga?

-Credo... eu queria me casar com uma visão alegre...

-Mas é verdade, Terpsicore. Eu sou testemunha o quanto essas duas ralaram pra chegar onde estão hoje, desafiando pai e marido e comprando seus lugarzinhos ao sol. Vê se o Yussef reclama hoje de deixar a contabilidade do frigorífico pra Tália e cuidar somente dos barcos e dos pescadores, que é a coisa que ele realmente gosta? A Calíope entrou na conversa do tio Nikos de que mulher é pra ficar em casa, sendo a rainha do lar, mimada e inútil, aí agora.

-Huhu, como diria meu cunhado, outro tesão daquele lugar abençoado que é o Santuário, tut tut, mes belles, vamos mudar de assunto?

-Lugar abençoado mesmo... Não sobrou nenhum desses tesões solteiros por lá?

-Esse casamento ta deixando vocês com as bacurinhas em chamas, hein? Uma só não pula em cima do cunhado porque ele é gay... As outras então, querem colocar chifres nos meus irmãos e nos meus primos... Credoooo, vou embora daqui o quanto antes, senão vocês descarnam meu pobre cunhado.

Gargalhadas. Tia Nina e tia Euterpe entram no quarto.

-Vamos, vamos, que parece um galinheiro em dia de canja. Não tão prontas ainda?

-Gostou do seu vestido, Pipezinha?

-Adorei, tia. To pronta! Minhas daminhas?

-Também estão... Minha netinha Tessa ta tão lindinha... Parece um repolhinho rosa...

-Não deixa ela ouvir senão traumatiza... Daí ela nunca mais vai usar um vestidinho daqueles...

Os homens foram na frente, menos Adrian, que ia levar a noiva. Com somente meia hora de atraso, Terpsicore e Saga se uniram novamente, pelas mãos e bênçãos de um padre ortodoxo grego, na frente de toda família da noiva e alguns convidados. A noiva fez questão de ir para o restaurante alugado para a festa a pé, para mostrar a cinturinha justa do vestido e calar qualquer fofoca que estava casando à força. Apenas um prato foi quebrado, pra simbolizar a união do casal, mas as danças e a cantoria no restaurante foram iguais ou maiores do que Santuário. Ao contrário do que Terpsicore temia, os parentes se comportaram. Três anos depois, todo mundo, senão aceitava, já tinha se acostumado com a idéia de que Camus fazia parte da família e que Milo era "mãe". O fato dos gêmeos serem lindos e cordatos ajudava muito. Alguns primos foram brincar na praia ao lado do restaurante.

Milo dançava com Tália e Camus com Aristhias sob as vaias dos outros parentes e gritos de "Vocês não são chegados! Parem de enganar a mulherada! Coisa feia..." Risos, dedos médios erguidos em resposta e eles trocavam de pares, entre as tias, primas, Nina ficou muito corada de satisfação em dançar com seu genrinho favorito. De repente, Anima, a filha de Aristhias, entrou correndo e puxou Camus pelo braço.

-Tio Camus, acode aqui.

-Que foi, Anima? – todo mundo parou pra acompanhar, porque a menina tava desesperada.

-A gente tava brincando lá na praia, todo mundo, né? Nossa, nós tava todo mundo juntinho... nem sei como foi que...

-Calma, Anima. Bebe um copo d'água.

Mas a tranqüilidade de Camus não passou pra mãe da menina, que puxou esta pelo braço e exigiu:

-Pára de enrolação e diz logo o que aconteceu, criatura!

-Mãe, não é culpa minha! –a garota começou a soluçar. – Não foi culpa minha...

Milo olhou para Camus, angustiado. Alguma criança se feriu lá na praia. Podia até ser um de seus gêmeos. Ele virou a cabeça. Constantine tinha reunido todos os filhotes de Andropoulos que estavam lá. E só trazia Tessa.

-Dumas sumiu. – informou o irmão, assustado. Milo só olhou para o marido, que tirou Anima do aperto da mãe, antes que ela batesse na menina.

-Vamos, petite. Vamos encontrar seu primo fujão.

Milo deixou o ar que estava prendendo sair. Dumas tinha mania de sair andando, às vezes. No Santuário, tinham os guardas, as servas, os aprendizes, alguém sempre de olho... Bem, se ele não tivesse resolvido andar diretamente para o mar, Camus o encontraria. Tratou de tranqüilizar os parentes.

Vinte minutos angustiantes se passaram, até que Camus trouxesse um adormecido Dumas e uma soluçante Anima de volta. Ele não permitiu que ficassem mais bravos com a garota. Ela não teve culpa. Afinal, como uma menina de dez anos vai saber que seu priminho de três tem mania de sair andando, sem rumo, só pra ver onde o caminho vai dar? Dumas ficou encantado com alguns barcos atracados e quis subir em um pra ficar olhando o mar, sonhando com pescarias arriscadas, iguais às que seus tios contam.

Pipe e Saga desde o começo, e sem combinarem, estão de olho nas reações do seu tio Nikos. Percebem que o velho ficou preocupado com o sumiço do neto caçula e que agora sorri, ao vê-lo adormecido no colo do pai. Entreolham-se, sorriem e se beijam.

-Talvez um dia... – sussurra Saga.

-Quando os gêmeos quiserem... – murmura Pipe. – quando os gêmeos quiserem, ele não terá escapatória.

N/A: No próximo, a terceira e última cerimônia. Porque eles se uniram perante a Deusa Athena, por Saga. Perante um padre ortodoxo, pela família. E agora, diante da Deusa Mãe, pela raça antiga. (1) Pra quem não sabe, não se tira azeitona do pé e come. Pra ser consumida, ela precisa ser curtida. 13/01/06.