A Filha do Mal
Capítulo 5
Tomando Rumos
"Eu espero que você realmente tenha consciência do caminho que escolheu, Virgínia."
"Eu tenho, Draco. Sabes muito bem que eu sempre quis isso."
"Tudo bem. A escolha foi sua." – ele concluiu e levantou-se da poltrona e andou lentamente pelo Salão Comunal. Não sei se foi só uma impressão minha, mas a nova experiência deixara Draco diferente de alguma forma. Não sei explicar. Mais sério, mais polido, não sei ao certo.
Estávamos sozinhos. Aquela era a manhã após o grande acontecimento da minha vida. Manhã de Natal. Nenhum presente na minha cama. Quer dizer, havia um suéter Weasley e um presente de Draco. Um pingente de prata com um "Gin" gravado graciosamente. Era a maneira como ele me chamava. De todos que eu conhecia apenas Draco me chamava de "Gin". Eu estava excitada ainda. Acontecera tudo o que eu sempre sonhara em poucas horas. Eu estava tão abobalhada que ficava admirando a minha nova tatuagem, tão viva e com traços precisos, ali, desenhada no meu antebraço esquerdo. Num desses meus momentos de deslumbração que Draco virou-se para mim e me fitou incrédulo.
"Gin, esconda isso! E se alguém entrar aqui?"
"Ah, tudo bem." – voltei a manga do meu agasalho no lugar. Eu ficava pensando em como seria a minha vida dali para frente. Oh! Adeus camiseta manga curta! O lema era: "Esconda se quiser ser aceito". Tudo bem, não me importava. Enquanto eu pensava nisso Draco sentou-se a minha frente no divã.
"Conte-me tudo o que você fez."
Olhei para ele meio assustada.
"O que eu fiz?"
"Eu que te pergunto isso? Como você fez pra me fazer de idiota e ir junto ao encontro do Lorde?" – apesar do "me fazer de idiota" ele não estava bravo, pelo contrário, tinha um sorriso sarcástico nos lábios. Até me atrevo a dizer que ele estava orgulhoso de mim. Contei a ele tudo, a capa do Potter, eu o seguindo pelos corredores, minha corrida até a cabine da carruagem. No final, Draco batia palmas com um grande sorriso.
"Sinceramente, você me surpreendeu! Diga-me, do que você não é capaz?"
"Eu não sei, acho que eu seria capaz de tudo" – e eu era mesmo. Merlin! Tantas coisas absurdas que eu já fiz em vida... Estava perdida nestes pensamentos quando vi as mãos de Draco sinalizando para que eu chegasse mais perto, para um abraço. Abracei-o e ficamos ali vários minutos, eu deitada no peito dele e ele acariciando a minha mão. E eu tive um estalo nas idéias, assim, bem de repente. Pensei em todo o carinho que Draco me dera desde que nos conhecemos. Desde que eu entrara em Hogwarts até aquele momento já foram seis anos. Se Draco queria afogar meu sonho de servir ao Lorde era porque temia pela minha vida, queria me proteger. Merlin! O que eu estava esperando?
"Draco."
"Hum?"
"Aquela proposta que você me fez na sua casa aquele dia..."
"O que tem ela?" – havia um tímido excitamento na sua voz.
"Quer me fazê-la novamente?"
Ele levantou-se um pouco e me olhou aturdido.
"Fala sério?"
"Claro que sim. Se não quiser fazê-la de novo eu vou entender e..." – fingi-me triste. Ele me interrompeu.
"Não, não. Eu vou fazer. Gin, vamos tentar?" – ele tinha um brilho nos olhos que eu jamais esquecerei.
"Tentar o que?" – um pouco de inocência fingida não faz mal a ninguém.
Ele suspirou e ergueu uma sobrancelha. Passou a mão pelos cabelos e me puxou pela cintura diminuindo a distancia entre nós. Ele meneou a cabeça para o lado e chegou bem perto do meu ouvido murmurando.
"Vamos tentar ficar juntos... você sabe..." – ele passou os dedos pelos meus cabelos e beijou levemente a minha orelha. – "Namorar."
"Hum, parece que finalmente o herdeiro Malfoy conquistou a sua grande amiga." – eu falei baixinho, também perto do ouvido dele.
"Vai me dizer que ela já não estava conquistada faz tempo." – ele brincou.
"É. Estava."
"Mas agora ela é minha."
"Só sua."
Pronto. Finalmente eu tinha tido coragem de assumir que amava Draco. Mas eu ainda iria demorar a dizer isso a ele. Se eu soubesse do que o destino me reservaria eu teria dito antes, aliás, eu teria ficado sério com ele muito antes, ou melhor, não teria feito certas coisas.
Depois de alguns bons minutos curtindo a nossa nova condição de "namorados" Draco me advertiu que era melhor descermos para o café. E assim o fizemos, atravessando os corredores abraçados, ignorando os olhares tortos e os queixos caídos. Quando adentramos o Salão Principal o trio estava lá comendo sossegadamente quando nos viram. Pois bem, reações em cadeia. Granger engasgou, Potter meneou a cabeça negativamente e meu irmão ficou vermelho. Ignoramos. Eles já deviam imaginar que mais cedo ou mais tarde aquilo aconteceria. Agora eu era namorada de Draco Malfoy e isso estava me deixando muito feliz.
Nós nos sentamos e já estávamos na metade do café quando uma voz atrás de nós nos assustou.
"Já de volta Draco!" – era Dumbledore. Draco engasgou.
"Er... já, professor."
"Eu imaginava que pelo estado de saúde da sua mãe ela gostaria que você passasse o Natal com ela." – ele disse calmamente. Eu tenho que admitir: ele era um velhinho muito esperto.
"Ah, houve mudanças de planos, professor. Eu não queria deixar a Virgínia sozinha no Natal." – como ele foi rápido para dar a desculpa. E cara de pau! Nem ficou vermelho.
"Hum... prefere a senhorita Weasley a sua mãe jovem Malfoy? Vejo que gosta muito dela."
Draco passou o braço na minha cintura.
"Sim, gosto."
Eu estava ficando vermelha. O trio tinha fumacinha saindo pelas orelhas. Granger nem tanto. O Testa-Rachada não tinha nenhuma expressão no rosto e meu irmão estava tão vermelho quanto eu jamais o vira. Essa história ainda daria muito pano pra manga, isso sem contar na minha nova "tatoo". Eu não queria nem pensar quando todos lá em casa descobrissem. Ia virar um pandemônio e provavelmente eu explodiria metade d'A Toca.
Deprimia-me saber que eu só poderia prestar plenos serviços ao Lorde quando saísse da escola. Para Draco faltava um ano, mas para mim seriam dois intermináveis anos. Isso sem contar que eu estaria sem o Draco no meu último ano. Draco tinha tido a idéia de bisbilhotarmos a vida do Potter e contar para o pai dele, que contaria para o Lorde, enfim... alguma informação poderia ser útil. Pena que nem toda a idéia foi inteligente. Draco teve a cara de pau de sugerir que eu me reaproximasse do fracassado do meu irmão para conseguir espionar melhor.
"Repita isso mais uma vez, só mais uma vez e eu espatifo aquele vaso na sua cabeça."
Ele me olhou com uma sobrancelha levantada e disse arrastadamente.
"Ok. Foi só uma sugestão."
"Ah tudo bem, talvez eu possa sugerir que você fique amiguinho do Testa-Rachada ou então que jogue um charminho na Cabeluda."
"Posso usar o mesmo vaso?"
Os meses foram transcorrendo sem que nada de muito importante acontecesse. Meu irmão me perseguia pelos corredores me xingando de maluca só porque eu e Draco estávamos namorando. Depois um ou outro feitiço ricocheteava pra cima dele e ele não sabia porquê. Estúpido. Por que eu saí de um antro de fracassados? Que mal eu fiz na outra vida? Sim, porque deve haver outra vida onde as pessoas cometem atos bons e maus e por isso são "escaladas" para a próxima vida de acordo com seus atos. Ninguém pode ter sido escolhido para ser rico ou pobre assim, do nada. Então eu devo ter sido uma criatura muito má na outra vida. E daí, fui má nessa vida também.
Nada na vida do Potter parecia ser bom o bastante para passar a informação para frente. Garotinho mala! Não sei porque o mundo todo idolatra esse babaca. Pelo menos a babaquice dele rende boas risadas a Draco e eu. Tem coisa melhor que pegar o Potter numa situação embaraçosa? Como o dia em que ele quase foi agarrado pela Loony Lovegood? Outro comentário inútil, nunca tinha dito que a Loony gostava do Potter, mas e daí? Hogwarts inteira amava-o.
O ano estava se esvaindo e meu tempo quase que integral com Draco também. Só que ao invés de aproveitarmos nós brigávamos constantemente. Se os motivos fossem plausíveis, tudo bem, mas só discutíamos por coisas idiotas e isso foi desgastando a relação. Até que chegou o dia do fim. Acho que isso tudo foi praga, só podia. Meia Hogwarts feminina gostava de Draco isso sem contar o trio que não gostava da idéia, juntaram suas energias negativas e pronto! Tchau tchau namoro de Draco e Ginny. Mas como Draco tinha me prometido, nós iríamos continuar a amizade da mesma forma. Mesmo porque nós já éramos parte um do outro. Mesmo se não estivéssemos mais namorando, pertenceríamos sempre um ao outro.
Foi feita a formatura do sétimo ano e estava acabada a carreira escolar de Draco em Hogwarts. Eu agora estaria sozinha. Ta certo que não teria mais o trio, mas eu havia perdido Draco também. E lógico que ele não poderia chegar n'A Toca com um buquê de flores do campo para Molly e dizer "Olá, vim visitar a Gin." Draco me fez mil promessas de que não se afastaria de mim, que faria de tudo para nos encontrarmos com freqüência, mas não devíamos nos preocupar. Eu passaria esse ultimo ano sozinha, mas depois estaríamos juntos novamente a serviço do Lorde.
Mas eu tive problemas. Grandes problemas.
Estava eu n'A Toca curtindo minhas insuportáveis férias naquele muquifo. Nem saía do quarto. Quando saía era pra dar longos passeios, bem longe da "Família". Estava fazendo um calor insuportável e eu tinha que ficar de mangas longas por causa da marca. Pelo menos nas refeições eu tinha de sentar-me à mesa com eles e todos me perguntavam se eu estava doente ou coisa assim.
Mas um dia eu estava no meu quarto lendo velhas cartas e mexendo em coisas velhas. Havia subido a manga da blusa para refrescar um pouco e não havia ninguém em casa. Finalmente estava à vontade, ou quase. Eu não ouvi quando eles chegaram, todos ao mesmo tempo. Incrível, parece até que foi premeditado, eles sempre chegam fazendo tanto escândalo. E Molly foi direto ao meu quarto e entrou sem bater. Tive um sobressalto e abaixei a manga da blusa rapidamente, mas no meu desespero tive dificuldades para fazer esse movimento tão simples e Molly pescou no ar.
"O que você tem aí no braço?" – ela estava apontando para um risco preto que ainda estava aparecendo. Abaixei a manga completamente e respondi dura.
"Nada, só um risco de tinta... me risquei com a pena sem querer enquanto escrevia uma carta."
"Isso não me parece um risco de tinta. Deixe-me ver." – veio pra cima de mim tentando pegar meu braço. Eu me esquivei, pulei da cama e saí correndo para o outro lado do quarto.
"Virgínia Weasley, deixe-me ver seu braço!"
"Não tem nada no meu braço!" – eu estava tão nervosa que aquela minha habilidade de fazer mágica espontaneamente sem varinha fez o vidro da janela explodir. Molly estava vermelha de raiva. Veio pra cima de mim e antes que eu conseguisse fugir ela segurou-me firme. Eu tentei me debater, tão descontrolada que estava que ela precisou acertar-me um tapa na cara para que eu me acalmasse. Erguer minha blusa ela não conseguiu, mas conseguiu rasgar-me a manga. Vislumbrou a marca negra em meu braço horrorizada. Largou-me e olhava para mim quase que petrificada. Num gesto mecânico eu pus a mão sobre a marca como se ainda quisesse escondê-la.
"Como... como você pôde? É mentira, não é?" – ela disse embargadamente.
Respirei fundo. A coisa toda já estava feita.
"Não é mentira."
Ela continuou me olhando estagnada, mas de repente teve outro acesso de raiva. Pegou-me pelos cabelos e foi arrastando-me escada a baixo me estapeando aonde sua mão livre podia alcançar. O restante da Família estava na sala conversando animadamente e se assustaram ao ver Molly praticamente me espancando e me arrastando pelos cabelos.
"Mãe! O que é isso? Solte ela." – bradou Carlinhos. Estava de férias, foi pro muquifo também.
"Molly, por favor, o que está acontecendo aqui?" – agora era Arthur.
"O que está acontecendo? O que está acontecendo?" – a cada vez que ela repetia isso ela puxava mais forte os meus cabelos. Admira-me ela não ter saído com mechas dos meus cabelos entre os dedos. Todos os presentes olhavam-nos sem expressão no rosto.
"Me solta! Está doendo!" – eu tentava me desvencilhar enquanto alguns objetos explodiam ao nosso redor tamanho o meu nervosismo. Era sempre assim (é, até hoje), quando eu ficava muito nervosa minha magia saía de controle.
"Doendo? E o que eu tenho a ver com isso? E a dor que você está me causando?" – e ela puxava cada vez mais forte. Até que meu pai se levantou.
"Chega Molly! Solte a menina!"
"Eu vou soltar! Eu solto..." – ela não soltou, mas me jogou em cima do meu pai. – "E aproveite e dê uma olhadinha no antebraço esquerdo dela." – meu pai segurou-me a tempo para que eu não caísse.
"O que tem de errado no braço dela?"
"Olhe." – minha mãe gesticulou em minha direção nervosa.
Ao contrário dela, Arthur não me forçou a nada. Soltou-me e me olhou ternamente.
"Virgínia, por favor. Mostre seu braço."
Eu ainda tinha a mão sobre a marca e não tinha nada a fazer senão mostrá-la. Tirei a mão da marca vagarosamente e não tive coragem de encarar meu pai nos olhos. Ele segurou meu braço levemente e passou o dedo por sobre a marca. Por trás de mim eu senti a movimentação dos meus irmãos se esquivando para espiar o que eu tinha no braço. Meu pai soltou meu braço, deu-me as costas e caminhou ate a janela num silêncio aterrador. Atrás de mim eu podia ouvir Molly soluçar. A tristeza tinha tomado o lugar da raiva. Eu abaixei o braço e pus a mão sobre a marca novamente. Lágrimas começaram a escorrer pelo meu rosto e pingar debilmente no carpete.
"Por que, Virgínia?" – foi a única coisa que meu pai conseguiu dizer. Tudo bem, agora minha Família sabia exatamente quem eu era e a quem servia. Não iria adiantar fazer ceninha.
"Porque isso foi o que eu sempre quis." – neste momento meus irmãos começaram a falar todos ao mesmo tempo. Eu não consegui distinguir muita coisa, pois falavam rápido e todos juntos, mas eu consegui entender direitinho quando o Ron disse que iria me dar umas bofetadas.
"Pois tente fazer isso, Ronald! Eu espatifo esse lustre na sua cabeça, seu fracassado!"
Minha mãe deu um soluço mais alto. Meu pai se virou para mim e meus irmãos calaram a boca. Ok, eu estava com cem por cento da atenção deles.
"Fracassado, não!" – Ron ainda tentou dizer.
"Fracassado sim! Fra-cas-sa-do! Isso o que você é! Antes sempre viveu a sombra dos irmãos mais velhos, sabendo que sua obrigação era ser igual a eles. Dae chegou o queridinho Potter e pronto: você tornou-se uma pessoa pior ainda! Não sabe andar com as próprias pernas!" – eu falava isso muito rápido e gesticulando.
"Pode ter certeza de que o Harry é bem melhor que você, traidora! Traidora do próprio sangue!" – agora era Fred quem berrava. Mas eu não me intimidei com isso.
"Eu nunca gostei de vocês. Essa família é uma bagunça, um verdadeiro criame de coelhos!"
"Virgínia. Chega." – era a voz do meu pai. O silêncio assolou a sala. Somente se podiam ouvir os soluços de Molly e as rajadas de vento que balançavam as árvores no jardim. Meu pai passou a mão na cabeça, suspirou uma, duas, três vezes. Sabe Merlin o que estava se passando na cabeça dele naquele momento. Certamente era algo como "Onde foi que eu errei?"
"Não tem lugar pra você aqui." – os gêmeos em uníssono. Que mania chata essa de falar em uníssono. Certo, eu estava sendo enxotada. Suspirei, tirei uma mecha de cabelo da frente dos olhos e olhei para todos eles com a minha melhor cara de desprezo.
"Querem saber de uma coisa? Eu não via a hora de ir embora daqui!" – eu era mesmo uma desmiolada. Eu nem sabia o que estava dizendo porque afinal de contas, para onde eu iria? Subi as escadas batendo o pé. Entrei no meu quarto, peguei uma mochila e fui enfiando alguns pertences dentro. Coisas mais urgentes. Sai do quarto e ao passar pela porta do quarto dos meus pais tive um sobressalto. Não tive escolha. Entrei e fui direto à terceira gaveta da cômoda, onde embaixo das vestes, bem lá fundo havia uns míseros caraminguás (dinheiro). Coisa muito pouca, mas daria para pegar um Noitibus para qualquer lugar. Foi um ato vândalo pegar dinheiro de uma família que quase não o tem, mas eles me expulsaram de casa, não expulsaram?
Desci as escadas correndo e passei pela sala onde todos ainda estavam com os nervos à flor da pele. Minha mãe ainda soluçava e meu pai já não estava mais lá. Parei e olhei para eles analisando cada rosto. Suspirei e disse meu "adeus" com a seguinte frase:
"Vocês ainda vão ouvir falar de mim. A maior seguidora de Lorde Voldemort." – senti o estremecimento que o nome do Lorde causou. Sorri satisfeita, apenas com um canto dos lábios (aprendi com o Draco) e saí.
Quando pus os pés pra fora pude ver que meu pai estava parado na varanda, meio encolhido. Meus pés me traíram, ao invés de eu ir embora, eu fui até ele.
"Arthur..." – ele não me olhou, apenas fungou. Foi então que eu vi que... – "Está chorando?"
"O que você esperava? Minha única filha é seguidora de Você-Sabe-Quem, tem uma marca negra reluzente no antebraço. Queria que eu estivesse dando saltos de alegria?" – meu pai não costumava ser irônico, mas a situação pedia, eu acho.
"Er... era algo que não se podia evitar... Só não diga que é porque eu fui pra Sonserina e..."
"Não vou dizer. Se a pessoa não quiser ela não se deixa influenciar. Você queria. Disse isso na sala."
"Bom... é... eu queria."
"Então não havia nada a fazer." – ele suspirou. Em nenhum momento desse pequeno diálogo ele olhou para mim.
"Bom... eu estou indo embora."
"Vai pra onde?"
"Não sei."
"Peça guarida na casa dos Malfoy's."
"Ainda não pensei nisso." – eu estava envergonhada. Não por ser uma Comensal, isso jamais. Mas pela mágoa que havia causado no meu pai. Mas eu também não esperava que ele me pedisse para ficar.
"Er... tchau." – eu não sabia o que fazer. Nesse momento ele olhou para mim, deu um passo para frente. Considerou a idéia de me dar um abraço, mas parou o gesto no meio e após um breve silencio disse:
"Tchau. Cuide-se."
Ok. Ali estava terminando qualquer laço que eu tinha com os Weasley's. Mas eu ainda tinha esse nome e faria o diferencial com ele.
Virei-me e fui andando com a pesada mochila das costas. No meu último ano na escola eu tinha aprendido a aparatar sem ter ânsias de vomito, mas eu não estava querendo aparatar. Minha cabeça estava fervilhando. Eu havia esquecido de trocar de blusa quando subi para pegar a mochila, então estava com a marca negra a mostra com a manga rasgada. Precisava trocar aquilo antes de entrar em algum lugar público. Ou não. Eu às vezes esquecia-me que era uma bruxa. Puxei a varinha e... "reparo!", lá estava a manga novamente.
Mas, aonde iria agora? Não fazia a mínima idéia. Eu não era tão cara-de-pau assim para bater na Mansão Malfoy. Resolvi aparatar. Fui parar no Caldeirão Furado. Não sei porque fui lá, o dinheiro que eu tinha não daria para me hospedar. Bom, pelo menos deu para tomar um refrigerante. Eu estava cozinhando naquela manga longa.
Enquanto eu estava no balcão eu tentei organizar as idéias. Se eu não tinha dinheiro nem para passar uma noite no Caldeirão Furado, quiçá para voltar pra Hogwarts. Então eu poderia dizer adeus ao meu sétimo ano. Por um momento pensei em procurar o Lorde, mas como? Onde? Não poderia. Eu não teria alternativa. Só me restava a casa de Draco. Paguei a conta e desaparatei.
Agora eu estava em frente o portão dos Malfoy's, bem de frente para aquele jardim lindo onde eu estive um ano antes. Do portão até a porta principal tinha um longo caminho. Eu fiquei procurando algo no portão que me fizesse ser anunciada, uma campainha, um sino, qualquer coisa assim. Foi quando vi uma figurinha conhecida se aproximar do portão.
"A senhorita deseja algo aqui?" – era Charles, o cocheiro. Ele devia estar cuidando dos cavalos em algum lugar próximo e me viu chegar. Ele parecia não se lembrar de mim.
"Eu queria falar com o Draco. Pode avisá-lo, por favor?"
"A senhorita é..." – perguntou friamente.
"Weasley, Virgínia Weasley."
"Oh sim. Acompanhe-me senhorita Weasley." – ele balançou afirmativamente a cabeça como se tivesse se lembrado. Abriu o gigantesco portão e eu entrei. Segui-o pelo longo jardim até a porta. Ele abriu-a para mim e eu passei ao hall de entrada que eu já conhecia, mas naquele momento, sem festa e convidados parecia extremamente sombrio e deserto.
"A senhorita espere aqui, eu irei anunciá-la." – disse e se afastou quando eu meneei a cabeça positivamente. Desapareceu por um longo corredor. A mochila nas minhas costas já estava bem pesada, mas eu não quis descansá-la no chão, poderia parecer muito acomodada.
Eu não sei dizer quanto tempo demorou, o lugar da Mansão em que Draco estava devia ser muito longe do hall. Mas ele apareceu surgindo do mesmo corredor pelo qual Charles havia sumido. De camiseta e calça pretas. Veio desdobrando a manga da camiseta pelo caminho. Senti um tiquinho de inveja. Ele não precisava esconder dentro de casa que era um seguidor do Lorde. Quando finalmente ergueu os olhos falou comigo num to preocupado.
"Pequena, o que houve?"
"Acabou Draco. Meus pais descobriram." – eu disse simplesmente. Ele me olhou longamente e me ofereceu um abraço. Voei em seus braços e ele me apertou confortantemente enquanto eu chorava aos soluços.
"Calma Pequena, está tudo bem."
"Não está, Draco. Não está." – eu nem sei bem porque eu estava chorando.
"Vamos." – ele soltou-me do abraço, pegou na minha mão e com a outra mão pegou a minha mochila. Foi me guiando até chegarmos numa sala íntima. Era uma sala linda. Espaçosa, porém aconchegante. Tinha um teto muito alto, com um belíssimo lustre que pendia do centro do teto. As paredes eram decoradas com um papel de parede verde escuro e estava apinhada de quadros. Havia uma estante com livros e um divã no centro. Ao canto, um pequeno bar. Draco sentou-se no divã e convidou-me a sentar-me com ele.
"Conte-me, como foi."
Narrei o caso todo a ele. Ele não era do tipo que fazia grandes caras e bocas no decorrer do assunto. O máximo que ele fez foi levantar a sobrancelha direita quando eu falei da parte que minha mãe me arrastou pelos cabelos. Quando eu terminei ele estava inexpressivo. Passou a mão pelos cabelos louros e suspirou. Ao invés de falar comigo ele chamou um elfo doméstico. Quando num estalido o elfo apareceu Draco pediu-lhe que nos trouxesse algo para beber. Quando o elfo se foi Draco finalmente voltou sua atenção para mim.
"Gin, o que pretende agora?"
"Boa pergunta Draco, boa pergunta..." – eu disse com os olhos fixos em qualquer ponto do chão, como se eu estivesse falando comigo mesma.
"Sem casa, sem família, sem dinheiro..." – ele foi enumerando as minhas desgraças. Eu não pude fazer nada senão rir.
"Dinheiro eu nunca tive." – ele riu com um canto da boca.
"Vai voltar pra Hogwarts?"
"Com que? A pé? Sem livros? Sem uniforme? Esqueça."
"Vai ficar aqui." – ele disse calmamente quando o elfo apareceu com os copos. Draco pegou um e deu o outro pra mim. O elfo se foi.
"Hum?" – como se eu não estivesse justamente procurando guarida.
"Aqui, oras. Meus pais não farão nenhuma objeção. Você vai ficar aqui o tempo que for necessário."
"Mas Draco... eu não poderia pagar..." – eu não precisava me fazer de vítima com o Draco, mas eu me fiz. Ele me olhou com um olhar mortífero.
"Ta achando minha casa com cara de hotel? Quem falou que você vai pagar alguma coisa aqui? Faça me o favor Virgínia..." – tenho motivos para achar que ele ficou mal-humorado.
"Ah, mas e seus pais?"
"Já disse, eles não farão objeções. Gostaram de você e, além do mais... você é uma das nossas." – piscou pra mim seriamente. Entendi o que ele quis dizer. – "Eu vou mandar preparar o seu quarto. Você fica aqui e está acabado. Aliás, no final das férias você volta pra Hogwarts." – meu estômago afundou.
"Jura? Não quero."
"Como não? Tem que terminar a escola."
"Draco, não quero."
"Gin, só falta mais um ano."
"Não importa." – eu me inclinei na poltrona, mais perto dele. – "Eu quero... ser útil."
Ele suspirou.
"Veremos isso, veremos."
O corredor que levava até o "meu quarto" era tão longo, tão cheio de curvas que eu parecia estar correndo uma maratona. A Mansão era tão grande que eu poderia ficar meses lá sem trombar com nenhum dos Malfoy's. Seria bom, assim eles não saberiam que eu estava ali. Mas souberam, já que Draco fez questão absoluta de dizer.
Meu quarto era, no mínimo, luxuoso. Teto muito alto também (todos os cômodos da casa tinham tetos altos). O papel de parede era vermelho queimado, meio bordô. Parecia até que era aveludado e a luz do lustre dava um ar elegante àquelas paredes. A cama era de solteiro, mas era um tamanho maior que o normal. Havia também uma poltrona, uma escrivaninha com uma pequena luminária. Havia ao lado da cama um criado mudo que também tinha uma luminária. Eu estava boquiaberta com o aposento. Nunca em minha vida eu havia esperado passar uma temporada num quarto daqueles. Nem nos meus mais ambiciosos sonhos.
"Gostou, Pequena? Achei que as paredes vermelhas fossem combinar com os seus cabelos." – Draco tirou-me do meu devaneio.
"É lindo Draco, obrigada." – corri até ele e dei-lhe um abraço bem apertado. Mesmo depois de termos tentado namorar e não ter dado certo eu ainda sentia calafrios na espinha quando o momento tornava-se constrangedor. Ele soltou-me do abraço e apontou-me uma porta.
"Ali é o banheiro e o closet. Sua grande, imensa e pesada mala de roupas com todos os seus pertences possíveis quase não coube no nosso tão humilde closet." – ele debochou de mim. Dei-lhe um beliscão.
"Eu trouxe o que deu. Enfiei qualquer coisa na mochila, aliás, nem sei direito o que eu coloquei lá."
"Veremos isso." – ele disse simplesmente.
"Veremos o que?"
"Sua situação. Agora pode ficar à vontade Pequena. O jantar é sempre às sete."
"Er... jantar?" – perguntei nervosa. Estava meio envergonhada por causa dos Malfoy's.
"Sim, jantar. Comemore. Você vai comer algo que preste." – típico do Draco. Se nós não fossemos tão amigos eu diria que ele estava tirando onda com a minha cara.
Saiu deixando-me sozinha antes que eu pudesse perguntar em qual corredor eu devia seguir para chegar a Sala de Jantar. Certo, agora eu estava sozinha naquela coisa maravilhosa de quarto que era só meu. O que mais eu poderia fazer? Joguei-me na cama pulando feito uma louca, curtindo aquilo tudo fingindo que eu não estava ali de favor. Fingindo que era tudo meu mesmo. Sempre tive uma "invejinha" do Draco pela condição de vida dele. Levantei-me e abri a porta que dava para o banheiro e o closet. Era tudo muito lindo. O banheiro era todo revestido de azulejos creme com detalhes em vermelho, como o vermelho das paredes do quarto. A pia, vaso e tudo o mais eram também na cor creme e tinham as torneiras e acessórios em prata. Pelo menos no banheiro apagava-se um pouco aquela aparência de escuridão que toda a Mansão tinha com paredes escuras e cortinas fechadas. A banheira era enorme e eu não hesitei antes de abrir as torneiras e deixá-la quase transbordar de água e sais perfumados. Quando na minha vida eu tomei um banho daqueles? Tirei a roupa e deixei-a no chão do banheiro mesmo. Entrei naquela banheira vagarosamente, sentindo a água morna molhando todo o meu corpo. Finalmente eu iria relaxar naquele dia tão tenso. Acho que eu merecia, ou não. Mergulhei completamente na banheira emergindo logo depois. Deitei a cabeça no beiral da banheira e acabei adormecendo. Não sei quanto tempo se passou. Acordei quando a água estava parcialmente fria e conseqüentemente eu estava com frio também. Foi quando percebi que havia um relógio sobre a pia. Seis e meia. Atrasada! Até me trocar e achar a Sala de Jantar sabe Merlin quanto tempo eu levaria. Saí da banheira e vi que havia um roupão pendurado ao lado da banheira. Vesti-o (nunca tive um roupão!) e fui até o closet pegar minha humilde mochila. Tudo que eu tinha trazido já estava organizado minuciosamente dentro do closet. Eu havia levado algumas coisas sem nexo, como um agasalho de lã Weasley (sendo que estava muito quente), uma saia e uma blusa que definitivamente jamais deveriam ser usadas juntas, enfim. Só se salvou uma peça íntima (que ninguém veria, mas era a única coisa que eu levara certo), um jeans e uma blusinha manga longa, de tecido fino. Olhei desanimada em busca de um calçado. Eu só tinha o tênis velho com o qual eu viera. Pensei no que os Malfoy's pensariam de mim. Na primeira vez que me viram eu estava deslumbrante naquele vestido de cetim preto e agora...
Certo, sem depressão por causa disso. Vamos lá Virgínia Weasley, penteie essa coisa vermelha, busque dignidade sabe Merlin onde e desça!
E lá fui eu em busca da tal Sala de Jantar. E após várias curvas, várias bifurcações de corredores (aquilo não era uma Mansão, era um labirinto.) eu cheguei no hall de entrada. Um belo progresso, não? E se a Sala de Jantar fosse do outro lado? Continuei andando. Passei por algumas salas muito bonitas até que esbarrei com Draco.
"Onde está indo, Pequena?" – ele perguntou-me com uma sobrancelha erguida em estranheza.
"Jantar." – eu respondi simplesmente até com medo do que ele iria me responder.
"Mas Pequena, a Sala de Jantar é para lá." – e apontou para a direção da qual eu estava vindo. Ótimo!
"Talvez, se você tivesse me dito onde ficava a Sala de Jantar..." – ele riu.
"Venha, meus pais já devem estar à mesa."
Bom, isso seria bom. Eu não chegaria atrasada sozinha, chegaria com Draco. Tomamos o caminho de volta e eu tomei o devido cuidado de prestar completa atenção àquele caminho. Quando chegamos à também luxuosa Sala de Jantar (deixemos a descrição dela de lado.) de fato os Malfoy's já estavam à mesa. A senhora Malfoy estava impecável, num vestido azul claro que combinava absurdamente com seus olhos azuis, os cabelos louros presos parcialmente por uma presilha cravejada de pedrinhas da cor do vestido. Sorriu-me elegantemente e indicou-me uma cadeira ao seu lado.
"Sente-se, Virgínia." – Hum, ela lembrava-se do meu nome. Ou Draco havia lhe dito minutos antes?
Lucius Malfoy estava vestido de verde escuro. Uma roupa simples, porém por demais elegante. Os cabelos louros presos para trás. E mais uma vez eu digo: incrível como Draco se parece com ele.
Quando me sentei ao lado da mãe de Draco Lucius me dirigiu um sorriso quase que imperceptível.
"Seja bem vinda, menina. Espero que aprecie a estadia."
Eu não tinha onde enfiar a cara. Não sei porque, estava envergonhada. Acho que era mediante a minha situação. Mas eles sabiam que eu não era qualquer uma. Pela maneira como o Lorde havia me tratado naquele dia eu me senti no direito de imaginar que eu era uma das preferidas e me senti também no direito de acreditar que o Lorde dissera isso a Lucius. O senhor Malfoy estava com as mangas levemente dobradas e eu pude ver parte da sua negra tatuagem, igual a minha, igual à de Draco. Procurei o mesmo desenho discretamente no antebraço da senhora Malfoy, mas não o encontrei. Certamente Lucius Malfoy quisera privar sua esposa. Bem fez ele.
O jantar foi servido e... foi um banquete! Imaginei se eles comiam daquele jeito todos os dias. Jantamos em silêncio até o meio do jantar quando Lucius tomou um gole da sua taça de vinho e olhou para mim com aqueles frios olhos cinzentos.
"Então, menina Weasley, pode nos contar como veio parar aqui?" – eu estava mesmo achando que essa pergunta estava demorando. Não me restava alternativa senão respirar fundo e contar tudo. Pensei duas vezes se deveria dizer a eles aquela cena linda da minha mãe me arrastando pelos cabelos, mas eu estava com raiva de todos eles, então resolvi dizer como eles foram cruéis comigo. E até me irritei um pouco com a maneira que o Senhor Malfoy ia escutando a história: da mesma maneira de Draco, inexpressivo e com uma levantadinha de sobrancelha da parte do puxão de cabelo. Já a Senhora Malfoy demonstrava mais interesse exclamando algumas vezes algo como "Oh!", "Merlin!", "Lucius, olha o que fizeram com ela!". Bom, eu estava meio que protegida ali então? Pelo menos Narcisa Malfoy se condoeu da minha situação. Ou não. Os Malfoy's eram um mistério para mim.
"E você, tem certeza absoluta da sua vida?" – Lucius Malfoy referia-se a minha escolha pelo Lorde. Não hesitei em responder.
"Nunca tive tanta certeza de alguma coisa em toda a minha vida, senhor Malfoy."
À minha frente eu pude ver Draco me lançando um olhar de reprovação. Eu sabia que mesmo depois de seis meses daquela noite no cemitério Draco ainda não tinha engolido o fato de eu ter realmente me tornado uma Comensal. Já Lucius Malfoy sorriu de canto e balançou a cabeça positivamente. Mas eu estava esperando ele dizer abertamente num grande sorriso "Considere-se adotada e de agora em diante você se chamará Virgínia Malfoy!". Seria lindo, não seria? Mas ele não disse isso. Continuamos o jantar falando de coisas sem muita importância.
Após o jantar os três Malfoy's foram para uma ampla sala, confortável. Eu deveria voltar ao meu quarto, mas do que eles falariam que eu não poderia ouvir? Fiquei atrás da porta. Aliás, eu sou especialista nisso. E adivinha de quem eles falavam?
"Draco, eles podem procurar por ela aqui." – era Narcisa Malfoy.
"Não irão. Eu, melhor do que qualquer pessoa conheço a história da Virgínia. Ela foi expulsa de casa, não está foragida. Eles não a procurarão em lugar nenhum." – Draco tinha o dom de me fazer sentir-me uma pessoa querida e amada. Tudo bem. Ele não estava errado.
"Eu acho estranho uma garota que vem de uma família como aquela querer seguir o Lorde com tanta convicção." – agora era Lucius Malfoy quem falava.
"Eu confesso que não queria deixar. Acho perigoso para ela. Mas ela bateu o pé, é teimosa, não quis me ouvir." – Draquinho querido mostrando seu senso de proteção.
"Mas ela fez bem em não te ouvir." – senti um leve tom de repreensão da parte de Lucius Malfoy. – "Eu sei o quanto o Lorde preza esta garota. Ela é um verdadeiro achado. O próprio Lorde me disse isso." – Eu disse anteriormente que podia ter o direito de me achar a preferida do Lorde. Eu era. Ele disse isso a Lucius Malfoy. Eu me senti extremamente orgulhosa naquele momento.
"Tudo bem que seja, mas eu temo por ela."
"Não seja tolo Draco. Ela me pareceu ser uma garota que sabe muito bem se cuidar sozinha." – Narcisa em minha defesa. Sabe, eu estava começando a gostar dela.
"Se sabe se cuidar sozinha porque veio?" – a primeira impressão foi que Draco talvez não me quisesse ali, mas depois eu entendi o que ele quis dizer.
"Isso não significa que ela seja incapaz de se cuidar sozinha. Significa que ela é esperta. Precisava de guarida e foi procurar justamente onde? Na Mansão dos Malfoy's que além de ser a moradia do seu melhor amigo ainda é a morada dos maiores seguidores do Lorde das Trevas." – Agora era Lucius Malfoy. Sério, eu estava me sentindo a oitava maravilha do mundo.
"Ao contrário do que você pensa Draco, ela sabe muito bem como se cuidar sozinha." – Narcisa completou.
"Não se preocupe com ela, pois ela ainda lhe dará muito orgulho." – pobre Lucius, estava enganado. – "Nós teremos um gosto muito grande em recebê-la aqui. Aliás, Narcisa querida, providencie que ela seja melhor hospedada. Pelo que me consta ela só trouxe consigo uma mochila com meia dúzia de peças." – Oh! Sim, sim! Eu seria presenteada com um banho de loja? Era o que parecia.
Resolvi sair dali antes que alguém abrisse a porta de repente e pá! Desse de cara comigo ali bisbilhotando logo na minha primeira noite do que parecia ser uma longa estadia. Dedicando o maior cuidado ao caminho, voltei ao meu quarto sem me perder nenhuma vez. Quando abri a porta do quarto dei de cara com uma peça de roupa branca sobre a minha cama. Dona Narcisa Malfoy e seus elfos adestrados eram eficientes! A peça era um delicado pijama de seda branca. Fui para o banheiro, troquei o meu jeans surrado pelo belo pijama e lavei o rosto, enfim, me preparei para dormir. Quando voltei ao quarto Draco estava sentado na cama.
"Você ficou sexy nesse pijama." – disse maldosamente. Eu achei uma almofada sobre a poltrona e joguei na cara dele. Ele defendeu-se e abraçou a almofada.
"Diga a sua mãe que eu agradeço."
"Não agradeça a ela, agradeça a mim." – deu uma piscada marota. Draco estava me saindo pior que a encomenda. Foi então que eu notei que o short do pijama estava curto demais (pelo menos enquanto Draco estivesse ali).
"Está tarde para visitinhas noturnas, não acha?"
"Nem tão tarde, ainda são onze horas." – ele parecia não estar muito disposto a deixar o quarto tão cedo. Caminhei até ele e sentei-me ao seu lado.
"Queria te agradecer, Draco."
"Ah tudo bem, eu sei que você gostou do pijama." – ele disse brincalhão. Dei-lhe um beliscão nas costelas, ele fez uma careta de dor e riu.
"Não estou me referindo ao pijama. Estou me referindo à hospitalidade. Eu não tinha pra onde ir." – juro que não me fiz de vítima. Eu estava sendo sincera. Ele ficou sério.
"Não tem o que agradecer Gin. Sabes que eu te ajudaria, não importam as circunstancias." – passou a mão pelos meus cabelos e beliscou minha orelha, me fez rir. – "Venha." – me estendeu os braços oferecendo um abraço. Abracei-o e senti vontade de chorar.
"Draco, como vai ser agora?" – eu me referia ao meu futuro em geral. Estava sozinha no mundo, exceto pela proteção de Draco e minha obsessão pelo Lorde.
"Vai ser melhor Gin. Pense bem, agora você é livre. Tem plena liberdade para fazer o que bem entende sem precisar se esconder de ninguém."
"Estou me sentindo insegura."
"Não precisa. Estarei com você, sempre e sempre. Nunca me afastarei de você." – eu levei a sério essa promessa de Draco, mas não fiz por merecer.
"Draco?"
"Hum?" – ainda estávamos abraçados.
"Depois daquele dia que recebemos a marca, você tornou a ver o Lorde?"
Ele ficou em silêncio por alguns momentos e depois respondeu.
"Sim, fui à presença dele dizer-lhe que agora poderia prestar-lhe plenos serviços."
Um arrepio percorreu toda a minha espinha.
"Draco, eu quero fazer o mesmo."
Ele soltou-se do abraço e olhou-me preocupado.
"Mas você tem de voltar a Hogwarts."
"Draco, por favor. Eu não quero. De nada vai me servir aquele último ano."
"Você precisa terminar. E depois? Quem vai dar emprego a uma bruxa que nem terminou Hogwarts?"
"E quem precisa de emprego? Eu viverei para servir o Lorde e mais nada." – mente pequena. Muito pequena.
Draco soltou um muxoxo de desagrado. Afastou-me para que pudesse se levantar e começou a caminhar pelo quarto, nervoso.
"O que eu faço com você, Virgínia?" – ele parecia perdido. No mínimo ele estava achando que porque eu estava hospedada em sua casa ele deveria "cuidar" de mim. Não era bem assim.
"Draco, apenas faça o que estou pedindo. Vai me garantir bons momentos de felicidade."
"E quem falou que eu estou preocupado com a sua felicidade?" – ele disse levantando uma sobrancelha. – "Estou preocupado com a sua segurança."
"Deixe que da minha segurança eu mesma cuido. Sei o que estou fazendo."
"Não sabe! Não sabe!" – ele agora gesticulava largamente. – "Você é uma pirralha de dezesseis anos que não sabe nada da vida." – Incrível como Draco ficava chato quando tentava dar lição de moral.
"Ah! E você sabe muita coisa da vida!" – Aí eu já me alterei também. Fiquei de pé na cama, pra ficar da altura dele. É, realmente eu era uma pirralha sem precedentes.
Draco aproximou-se perigosamente de mim e disse baixo e arrastadamente:
"Posso não saber muita coisa, mas mais do que você eu sei. E eu tenho algo que você nem sabe o que é."
"É? O que?" – Eu tinha as mãos na cintura ou "nas ancas", como Draco tirou sarro de mim depois.
Ele suspirou e se aproximou mais ainda. A sua voz saiu quase como um murmúrio.
"Juízo." – Bom, eu não tive resposta. Eu nem mesmo sabia se tinha juízo ou não.
Ele virou-se para sair. Quando estava na porta virou-se e disse simplesmente.
"Amanhã de manhã minha mãe quer te levar pra fazer umas comprinhas. Ela estava mesmo ansiosa por uma companhia feminina para esse tipo de programa." – revirou os olhos achando o "programinha" um saco. Bateu a porta atrás de si e me deixou sozinha, pensando. O que Narcisa Malfoy queria comigo? Nem me conhecia direito, como poderia querer minha companhia para umas comprinhas? Vai entender...
Acabei adormecendo.
Tive um sonho estranho. Eu estava vestida com um vestido de veludo vermelho queimado (como as paredes do meu quarto). Era um vestido de princesa e eu tinha uma tiara brilhante na cabeça. Estava sentada numa espécie de trono e algumas pessoas estavam prostradas no chão, aos meus pés. Duas delas ergueram a cabeça e eu as reconheci como meus pais. Eles choravam. E eu ria. De repente uma criança ruiva passou correndo pela sala, por trás dos meus pais e das outras pessoas que estavam com eles. Era uma linda menina. Ela vinha correndo em minha direção e logo atrás dela vinha Draco. Antes que ela pudesse me alcançar Draco tomou-a nos braços e sumiu no ar. Nesse momento meu lindo vestido se rasgou de alto a baixo e minha tiara brilhante espatifou-se espalhando suas contas brilhantes por todo o carpete também vermelho. Nesse momento minha mãe se levantou (meu pai havia sumido) e as pessoas que estavam com ela também (meus irmãos, Potter, Granger e outros que eu não conhecia). Eles viraram-me as costas e foram embora enquanto eu estava sentada no chão segurando o vestido rasgado e chorando berrando o nome de Draco. Tudo isso como um cinema mudo. Não havia som. E então eu não me lembrava de mais nada.
Na manhã seguinte acordei com uma tímida luz solar adentrando minhas cortinas. Ventava levemente e as cortinas balançavam-se projetando bonitos desenhos com a luz na parede. Olhei bem em volta a procura de algum vestígio de que eu estava sonhando, mas não encontrei. Eu continuava hospedada na casa dos Malfoy. Então me lembrei que Narcisa Malfoy queria minha companhia para um passeio, pensei se já estaria atrasada. Se estivesse, seria de muito mau tom. E onde eu encontraria um relógio na droga do quarto? Depois de coçar a cabeça sonolenta tentando me localizar lembrei que havia um no banheiro.
Era tarde. Dez horas. N'A Toca jamais acordávamos naquele horário. Molly fazia questão de passar de porta em porta berrando feito uma desvairada no máximo às oito da manhã. Tive de correr. O que Narcisa Malfoy pensaria de mim acerca do meu atraso? Vesti aquela mesma roupa que eu estava no jantar, prendi os cabelos e desci correndo. Seria de mau tom descer correndo também, mas eu precisava chegar à mesa do café. Quando cheguei até tomei um susto. Narcisa tomava o desjejum tranqüilamente, sem nenhum sinal de pressa ou irritação. Pedi licença e sentei-me à mesa. Narcisa olhou-me amigavelmente e sorriu antes de tomar um gole de suco num bonito copo de cristal.
"Teve uma boa noite, Virgínia?" – educada, não?
"Ah sim, como há muito tempo não tinha." – eu sorri envergonhada. Neste momento ela apontou-me os alimentos que compunham a mesa.
"Por favor, sirva-se a vontade. Draco deve ter avisado-lhe que pretendo te levar para um passeio."
"Sim, ele me disse. Fiquei com medo de estar atrasada."
"Oh não. De maneira nenhuma." – Narcisa deu um sorriso que beirava a diversão. – "Eu vi mesmo que você chegou aqui ofegante. Deve ter corrido uma maratona por todos esses corredores compridos."
Senti minhas orelhas queimarem.
"Sim, corri um pouco." – tentei disfarçar me servindo de um copo de suco.
"Mas não se preocupe. Como pode ver ainda estou tomando o desjejum e normalmente o faço nesse horário. Draco ainda está dormindo e Lucius saiu bem cedo."
Ah claro! Eu deveria ter imaginado. A madame Malfoy não faz nada o dia inteiro, não tem casa para limpar, almoço para fazer, um criame de coelhos para berrar com eles. Eu deveria ter me situado antes que estava num ambiente diferente. Mas eu ainda não fazia idéia de onde Narcisa Malfoy queria me levar. Achei até mesmo estranho o esforço dela em me tratar bem. Sempre tive uma idéia errada dos Malfoy's. A idéia que minha "família" passara-me.
Tomamos o café conversando amigavelmente. A senhora Malfoy não me dera nenhuma dica de onde iríamos, nem mesmo tocou no assunto. Pensei se veria Draco naquela manhã ainda e se ele ainda estava irritado comigo pela discussão da noite anterior. Por que era tão difícil para ele entender a minha fixação em seguir o Lorde das Trevas? Por que eu não poderia ser uma serva de Voldemort assim como ele o era? Mas talvez, se eu tivesse dado ouvidos ao Draco, talvez... eu não tivesse ido tão longe.
E qual não foi a minha surpresa quando, mais tarde, Narcisa Malfoy me enfiou numa loja de "moda jovem bruxa"! Eu não quis acreditar de início, mas a verdade era que eu estava ganhando um banho de loja. Será que os Malfoy's tinham vergonha de hospedar alguém tão maltrapilho como eu? Que se danassem essas minhas idéias malucas. Eu fiz aquela cena do "Imagina Senhora Malfoy, não precisa!" com a minha melhor cara de coitada e aproveitei aquela manhã tão perfeita. E não foram duas ou três peças. A quantidade me fez pensar que eu passaria uma imensa temporada naquela mansão. Enquanto experimentava um suéter de lã escocesa eu logo me lembrei dos suéteres laranjas com a enorme e chamativa letra G bordada. Eu o jogaria fora assim que chegasse na mansão.
Não vou me estender a detalhes sobre o meu (proveitosíssimo) passeio com a Senhora Malfoy. Mas ela me perguntou se eu não gostaria de sair da loja já usando uma das peças novas. Concordei. Não estava a fim de continuar usando aquele jeans detonado com o tênis sujo. Escolhi uma saia até os joelhos com grandes axadrezados verdes e roxos, meia três quartos preta e uma blusa verde escura (Incrível! Quando se é sonserino tudo ao seu redor parece ser verde!). Senti-me uma verdadeira madame. Narcisa disse que eu estava muito bem. Desenvolvemos uma amizade até saudável naquela manhã. É certo que Narcisa era uma mulher muito polida, falava pouco e não desperdiçava sorrisos por qualquer coisa, mas ela parecia se simpatizar comigo.
Quando voltamos Draco estava jogado em uma poltrona passando os olhos cinzentos distraidamente por uma revista e comendo uma maçã. Sua mãe lançou-lhe um olhar orgulhoso. Admirando a beleza familiar que foi passada ao rapaz, de certo. Saiu da sala sem pronunciar uma palavra, tanto que Draco ainda nem tinha notado a nossa chegada. Só percebeu quando o estalido de um elfo doméstico surgiu para levar-me as sacolas. Foi aí que Draco olhou para mim. Deu um longo assovio.
"Muito bem senhorita Weasley! Vestindo algo decente!" – e voltou a olhar a revista. Ainda estava chateado pela briga da noite anterior. Achei que era hora do meu poder de sedução. Nada que um bico manhoso não o fizesse sorrir pra mim daquela maneira sincera que ele só sorria pra mim. Caminhei até onde ele estava e sentei-me no braço da poltrona.
"Gostou?"
"Uhum." – foi o máximo que ele murmurou.
"Draco?"
"Hum?"
"Dá pra olhar pra mim?" – cruzei os braços.
Ele olhou-me longamente com olhos prateados profundos e nada felizes.
"Estou olhando, e agora?"
"Agora você me pergunta: E então Gin, dormiu bem à noite? Gostou de passear com a minha mãe?"
Ele rolou os olhos e suspirou resignado. Não disse nada. Eu estava perdendo a paciência.
"Ok Draco. Diz qual é o teu problema! Eu sei que a gente discutiu ontem, mas nossas discussões sempre acabam em nada."
"Acabam comigo fazendo a tua vontade, sempre."
Na hora não entendi. Olhei pra ele com cara de interrogação. Ele jogou a revista de lado e falou fixando os olhos na lareira.
"Eu falei com o meu pai ontem a noite."
"Que horas?"
"Depois que eu saí do seu quarto."
"E...?" – eu ainda não tinha visto onde a conversa dele com o pai poderia me interessar.
"E eu falei que você queria ver o Lorde."
Meu coração disparou na hora. Não sabia se ria, pulava no pescoço de Draco, o beijava, se saía pulando!
"E...?" – a essas alturas eu já estava com as duas mãos agarradas ao colarinho da camisa preta de Draco.
"Ele disse que vai providenciar isso a você. Mas ouça Gin, tem certeza?" – nem respondi. Puxei-o para um abraço murmurando excitados "obrigada, obrigada!". Mas não contava que minha excitação fosse tanta. Acabei puxando Draco para um beijo. Não me pergunte porque eu era tão indecisa em relação a meus sentimentos por ele. Nem eu mesma sei. Mas sei que foi aí que a irritação dele comigo passou. Eu ainda estava sentada no braço do sofá, mas ele enlaçou minha cintura e eu caí sentada no colo dele. O beijo foi longo e carinhoso, como todos que eu tinha com ele. Ele acariciava meus cabelos e com a outra mão segurava a minha cintura enquanto eu ainda estava agarrada ao colarinho da sua camisa.
Ao fim de tudo nossos lábios se descolaram, mas mantivemos os rostos colados. Foi aí que Draco murmurou, sem abrir os olhos:
"Gin, por que você me provoca?"
Eu não tive palavras. Beijei-o novamente. Dessa vez mais rapidamente, pois ele interrompeu irritado.
"Eu não vou perguntar de novo." – eu sabia o que ele queria dizer.
Afastei-me um pouco, visivelmente desconfortável.
"Por que precisa de uma definição?"
"Porque eu quero você, e eu vou te ter." – a convicção dele até me assustou, mas não tive tempo para pensar sobre ela visto que a língua dele já havia tomado toda a minha boca novamente num beijo tão bom quanto o primeiro. Se eu estivesse de pé, teria caído. Quando consegui tomar fôlego eu perguntei sofregamente.
"Mas... e seus pais?"
"Que importam eles?" – Draco também estava sem fôlego, mas beijava meu pescoço incansavelmente.
"Sei lá, eu sou hóspede."
Draco suspirou e olhou para mim afastando os cabelos do rosto. Pensou por um momento e deu de ombros.
"Eles não precisam saber, por enquanto."
Então, estávamos juntos novamente? Não estávamos?
Só sei que ao fim daquela tarde Lucius Malfoy chamou-me para conversar. Meu nível sanguíneo de adrenalina estava nas alturas e eu podia sentir o sangue latejando na minha carótida. Sabia qual era o assunto: meu encontro com o Lorde.
"Sente-se, Weasley." – ele disse polidamente quando eu entrei. Draco estava de pé, ao lado da cadeira em que eu deveria sentar. Quando me sentei ele prosseguiu.
"Draco me disse que você deseja apresentar-se como serva útil agora que saiu de casa."
"Sim, eu gostaria."
"Pois saiba que a idéia agradou muito ao Lorde."
Não imaginava que ele fosse tão rápido. Isso me fez pensar no contato direto que Lucius Malfoy tinha com Voldemort. Isso me causou arrepios na espinha.
"Ele deseja me ver?" – perguntei tentando disfarçar meu êxtase.
"Muito." – se limitou a responder.
"E quando eu poderia..."
"Esta noite. Suba ao seu quarto, ordenei que fosse posta sobre sua cama uma capa e a máscara. Encontre-nos no hall de entrada em dez minutos."
Eu sempre tive pele pálida, herdei a branquelice dos Weasley's, mas naquele momento acho que até as sardas do meu rosto perderam a cor. Fiquei paralisada, segurando firme os braços da cadeira, olhando em direção a Lucius Malfoy, mas sem enxergá-lo na verdade. Até que ele acordou-me dos meus devaneios.
"Algum problema, Weasley?"
"Hã? Ah... não. Eu... eu já estou subindo." – apontei para a porta debilmente e levantei-me tropeçando. Ridículo. Onde estava a Virgínia Weasley forte e determinada? Eu estava nervosa. Quando saí percebi Draco atrás de mim.
"Tudo bem Gin?"
"Ah... por que não estaria?" – continuei caminhando apressada enquanto ele caminhava ao meu lado com as mãos enfiadas nos bolsos.
"Achei-a meio nervosa."
"Ah não. Apenas fiquei... surpresa." – alcancei a porta do meu quarto e abri-a sem fechá-la ao passar, pois eu sabia que Draco iria querer continuar o assunto.
"Draco, seu pai disse 'encontre-nos'. Você também vai?"
"Claro que sim. Não vou te deixar sozinha." – ele sentara em minha cama enquanto me via vestir a capa.
"Mas eu só vou e já volto."
"Mas eu vou junto. Sem contar que meu pai fez questão da minha presença."
"Draco?"
"Hum?"
"Como é?"
"Como é o que?"
"Se encontrar sozinho com o Lorde? Afinal e contas é diferente da última vez onde ele estava lá para falar com todos. Hoje ele falará só comigo."
Draco suspirou e recostou-se à cabeceira da cama. Eu sentei-me ao seu lado.
"Digamos que é tenso. Mas ele é o Lorde e nós somos seguidores." – entendi o que ele quis dizer apesar de não ser exatamente esta a resposta que eu esperava. E por falar em esperar Lucius esperava por mim e eu achei que era hora de ir.
"Draco, não vai se arrumar?"
"Ah, sim... claro." – respondeu distraidamente. Enfiou a mão no bolso puxando a varinha e estendeu-a para a porta. – "Accio!" – e em questão de segundos a capa e a máscara de Draco adentraram meu quarto. Ele ergueu uma sobrancelha olhando para mim com cara de "Você nem precisava ter subido até seu quarto!".
Descemos e de fato o senhor Malfoy já esperava por nós. Ele me olhou com uma expressão que não consegui decifrar e sustentou-a durante todo o caminho, que tanto eu como Draco seguimos em silêncio.
Quando chegamos abri a cortininha da janela da carruagem para ver onde estava. Vislumbrei um casarão velho e escuro, de aparência úmida e suja. Meu coração batia descompassadamente só de imaginar que havia uma distância mínima entre o "Tom" e eu. Eu mal podia esperar para estar à sua frente, ajoelhar-me aos seus pés e oferecer-lhe meus eternos e esforçados serviços.
Quando fomos abrir a grande e grosseira porta de carvalho Draco olhou-me de soslaio por trás da máscara e murmurou:
"Ponha a máscara."
Eu havia esquecido dela, a coloquei e joguei o capuz por cima. Estava nervosa, não tremendo feito vara verde, pois sei me controlar. Lucius entrou primeiro, seguido por Draco que foi seguido por mim. Eu parecia uma diminuta criatura andando atrás de duas pessoas de tão alta estatura. Estava pensando nisso quando ouvi uma voz que mais parecia um guincho.
"Ah, o mestre estava mesmo a espera de vocês." – era Rabicho (ou eu deveria dizer "Perebas"?), o ex-rato inútil do Ron. Lucius apenas acenou com a cabeça e adentrou um pequeno e escuro corredor, ainda comigo e Draco ao seu encalço. Quando ele alcançou uma porta ao fundo do corredor eu pude ouvi-lo dizendo.
"Mestre, estamos aqui."
E eis que, para arrepio completo da minha espinha dorsal, eu ouvi a voz cortante do Lorde das Trevas:
"Trouxe-a?"
"Sim, ela está no corredor."
"Convide-a a entrar."
Lucius então afastou-se da porta indicando-me a entrada. Respirei fundo e entrei, seguida pelos Malfoy's. O Lorde estava sentado numa poltrona, de costas para a porta. Senti que deveria me pronunciar. Procurei as melhores palavras e quando elas saíram de minha boca, ao contrário do que eu esperava, foram firmes e altamente decididas.
"É uma honra para mim estar novamente em tua presença, mestre."
E foi então que a poltrona girou sobre os pés levemente revelando-o como um rei sentado em seu trono. Está certo que seu trono era velho, de um reino diminuto, e o rei estava longe de terá aparência saudável de um rei, mas ainda sim, era um rei. Contemplou-me profundamente com seus olhos vermelhos e contorceu sua boca no esboço de um sorriso. Ao fim do que pareceram longos minutos o Lorde disse aos Malfoy's sem nem olhar para eles:
"Saiam."
Pelo canto dos olhos vi que Draco se movera incomodamente como se quisesse dar um passo à frente para dizer que ficaria, mas seu pai colocou sua habitual bengala sobre a barriga de Draco como que o impedindo discretamente. Draco entendeu e seguiu seu pai contrariado. E então éramos somente eu e ELE!
"Tire a máscara." – a ordem foi cortante. Tirei-a lentamente e abaixei o braço com ela nas mãos. – "O capuz." – tirei o capuz e o vi dar novamente aquele esboço de sorriso.
"Eu sabia que não demoraria muito até que você viesse me ver."
Fiz uma pequena reverência.
"Vim oferecer-te meus serviços, agora válidos."
"Não precisa desse tipo de coisa. Você não precisa." – disse-me a propósito da minha reverencia. Fiquei sem graça, mas... afinal, então ele estava me tratando de igual pra igual? Sim, estava.
"Mas é bom que você tenha vindo se apresentar." – ele se inclinou e me encarou nos olhos. – "Eu sei dos seus poderes, sei do que é capaz. E você me será muito útil."
Senti meu coração dar um solavanco. Esperei aquele momento a minha vida toda e eu podia sentir a minha marca queimando em meu antebraço por estar na presença dele.
"Tenha a certeza de que eu não lhe darei decepções." – foi o que consegui balbuciar.
"Ah claro, eu sei que não." – ele disse num tom despreocupado. – "Fico satisfeito em saber que você não esqueceu a nossa "velha parceria"."
"Jamais me esqueceria."
"Foi quase perfeita, não? Se não fosse o "garoto" estragar tudo, mais uma vez."
"Posso resolver isso para o senhor, mestre." – não sei o que me fez dizer isso. Mas naquele momento eu queria pisar no pescoço do Potter.
"Não! Isso eu ainda terei o prazer de fazer. Diga-me, minha doce Virgínia, seria capaz de machucar qualquer pessoa?"
"Qualquer pessoa." – disse com convicção.
"Amigos? ... parentes?"
Pensei em Ron. Meus outros irmãos. E me assustei com minha resposta.
"Qualquer pessoa."
Ele sorriu satisfeito. Um sorriso cruel e malformado, eu diria.
"Agora, tenho meus motivos para achar que o garoto Malfoy vai tentar te excluir dos trabalhos."
"Eu tenho certeza disso!" – foi o que pensei.
"Mas eu mesmo direi a ele que não se importe com você. E ele não contestaria uma ordem minha."
"Não tenho tanta certeza."
"Eu tenho." – ele sorriu maliciosamente. Tinha usado de legilimencia comigo. Sacana! Fiz uma anotação mental: Cuidado com o que pensa na presença do Lorde (detalhe que me policiei em pensar nisso depois, vai que ele lesse...).
"Já que está aqui, comece já."
Meu coração deu outro solavanco. Minha primeira missão...
"Lorraine Becker. Uma trouxa intrometida que sabe demais. Sabe o que fazer com ela."
Senti um frio na barriga. Claro que eu sabia o que fazer.
"Sem problemas. Pra quando?"
"Já. Elimine-a com urgência. Você saberá onde encontrá-la."
Fiz que "sim" com a cabeça e virei-me para sair pronta para executar minha primeira missão quando senti seus dedos gélidos e esqueléticos pressionando meu pulso, impedindo que eu me fosse. Olhei para trás e ele me encarava, de pé. Passou os dedos longos e nada calorosos pelo meu rosto e me olhava com uma expressão quase que... possessiva. Aquele olhar me gelou.
Ele não disse mais nada. Apenas me soltou e indicou que eu me fosse. Fui sem nem olhar para trás.
Quando cheguei ao hall de entrada Draco e o senhor Malfoy esperavam-me lá. Quando me viu, Draco precipitou-se até mim.
"Como foi?"
"Desculpa Draco, mas não tenho tempo pra falar com você agora. Ele me deu o que fazer."
Draco olhou-me perplexo.
"Mas agora?"
"Sim, agora. E eu estou aparatando pra lá."
"Mas... pra lá onde Gin..." – mas eu já tinha desaparecido no ar.
Estava a caminho da minha primeira missão.
Comentário especial pela primeira pessoa que leu este capítulo assim que ele ficou pronto: minha idolatrada Rafa!
Kah,
Nem tenho palavras pra definir isso aqui, mulher! Fiz caras e bocas, muito engraçado, nem sabia como agir, se escrevia ou tentava decifrar os enigmas. Você me deixa assim com AFM, a fic é toda surpreendente, e em um único capítulo você tem diversas sensações, que chegam a me assustar. Espero que não demores nadinha para escrever o próximo capítulo, eu estou toda arrepiada aqui. Vou poupar minhas palavras, mas te digo uma coisa. QUE CAPÌTULO! Obrigada por me passá-lo, muito obrigada mesmo! Bjinhos, Rafinha.
Pois bem. Capítulo pronto há mais de um mês, mas eu não tinha tempo para formatar tudo certinho e colocar agradecimentos e tal. Peço desculpas pela demora mais uma vez. E mais uma vez também pelas reviews não respondidas por pura FALTA DE TEMPO. Mas eu li todas elas e agradeço do fundo do meu ventrículo esquerdo!
Então, vamos aos nomes fofos e perfeitos que me motivaram a terminar esse capítulo (por ordem de envio da review).
Obrigadão à:
Estrelinha W.M., Kirina Malfoy, Rafinha M. Potter, Miaka, Meliane Snape, Nina, Musa Jesy H. M. K. Malfoy, Carolilina Malfoy, July Slytherin, Mari, Driste, Kanna, Naiara W.M., Lua Malfoy, Lou Malfoy, Gabiii, Mila Malfoy Madden, Srtaª Felton.
Vocês foram tu-do!
.:Pequena Kah:.
