Autobiografia

5x2

Au - Drama Romantico

GW


Havia passado uma semana desde que Wufei havia encontrado Heero Yui naquele acidente que os tornara amigos. Desde então Yui freqüentava a casa do chinês, ou mesmo se falavam pela Internet.

Naquela manhã Chang sentou-se na praça próxima a sua casa. Era um sábado gostoso e estava combinado que Heero o levaria para sua casa para passarem o dia juntos num divertido churrasco que o japonês ia dar.

-Chang! – Heero parou o carro no acostamento. –Vamos! – Ele chamou.

-Vamos com calma, Yui. Eu estou mancando ainda. – Ele sorriu entrando no carro.

-Vamos! Melhore essa cara. Hoje é sábado. – Heero comentou enquanto dirigia.

-Grandes coisas. Odeio sábados. – O chinês deu de ombros e Heero achou divertida a expressão do amigo. Ele soava divertido com aquele sempre característico mau-humor.

- Você me diverte. – Yui sorriu de lado.

-Ah... Então é apenas para isso que eu sirvo? Divertir você? – Wufei soou um tanto quanto magoado. Não combinava com ele aquele tom sentido.

Heero não respondeu. Na verdade achara estranha a declaração do mais novo amigo. Conhecera Chang Wufei, um chinês estudante de psicologia há uma semana atrás, quando o atropelara, tornaram-se amigos. Não os mais íntimos, porem pessoas que se entendiam, que trocavam conversas relaxantes às tardes. Podiam se tornar grandes amigos um dia, mas Yui não sabia se Chang estava levando o relacionamento deles para aquele lado.

Wufei desceu do carro com certa dificuldade. Sua perna ainda estava com talas. Seus olhos negros percorreram a mansão Yui. Escondida no coração de um bairro residencial de luxo, a mansão mantinha traços orientais, os jardins de um verde intenso se perdia de vista. Alguma coisa no clima daquela casa trazia paz e aconchego.

-Nossa. Você vive muito bem. – Wufei comentou impressionado.

-Hoje eu sei que sim. – Yui comentou.

-E teve momento que imaginou não ser assim? Com uma casa dessas... – Entusiasmado o chinês sorriu.

-Uhum. Teve um tempo que nada disso fazia muito sentido. Acho que nada fazia muito sentido.

-Sei como é. – Chang ficou sério e pensativo. Ele sabia que o que era acordar pela manhã e não ter um motivo. Levantando o rosto ele viu grande número dos amigos de Yui reunidos em torno da piscina. Eles sorriam bastante, conversavam descontraídos. Wufei ficou a observá-los. Será que eram realmente felizes como queriam aparentar? Ele não tinha essa resposta.

-Heero. Finalmente trouxe seu amigo. – Um jovem se aproximou do oriental o abraçando delicadamente.

Wufei achou o cumprimento tão íntimo e aquilo o deixou surpreso e mais ainda por ver que Yui aceitara o abraço de bom grado, e um homem como ele não parecia o tipo de pessoa que aceitasse uma coisa daquelas.

-Esse é Chang Wufei. – Heero apresentou o rapaz mais alto e forte para o chinês.

-Olá. – O chinês respondeu desconfiado.

-Wufei, Esse é Rathy, meu namorado. – Ele apresentou.

Por um momento Wufei se viu sem fala. Sua voz parecia ter morrido rouca dentro de sua garganta. Podia ter imaginado tantas coisas a respeito de Heero Yui, mas jamais que ele fosse gay assumido.

-Não se preocupe. É normal o espanto. – Rathy estendeu a mão para Wufei. Ele era alto e robusto. Sua pele um tanto quanto bronzeada, até mais que a de Heero, os olhos cor de mel eram grandes e vivos e o sorriso puxado de canto, os cabelos lisos num marrom claro.

-Não estou espantado pelo fato de serem dois homens. É que Yui nunca comentou nada. – Wufei aceitou o cumprimento sem jeito.

-Ele é extremamente reservado. Já eu faço às vezes do falante na relação. Eu não fui sempre um simpático nato, mas tive que aprender a ser por causa do Hee, afinal dois caladões juntos não dá certo. – O jovem sorriu arrastando Wufei para sentarem em uma das mesas.

-Chang... Vou ver umas coisas lá dentro. – Heero sorriu. – Mas, lamento por ter deixar com Rathy, ele vai bisbilhotar sua vida em poucos segundos. – Yui saiu os deixando.

-Então? O que faz? – Rathy o olhou com seus olhos grandes de mel.

-Sou estudante.

-Heero me disse que você é chinês e vive aqui sozinho. Seu pai está na Austrália e é diplomata. Seu avô vive em Chinatown, em Nova York.

-É isso.

-Eu tenho profunda admiração pela cultura chinesa. Hee disse que um dia iremos à China. – Ele comentou.

-Você não é americano. –Wufei observou não se sentindo incomodado com o interrogatório nem com o jeito intenso que o jovem moreno lhe olhava.

-Sou indiano. – Ele sorriu. –Ahhh... A mesma história de sempre. Meus pais vieram da Índia para a América em busca de dias melhores.

-Conseguiram? – Chang o olhou estando agora envolvido na conversa.

-Não sei. Acho que ainda estamos conseguindo.

-O que você faz? – Perguntou ao indiano.

-Sou professor de história, uma família de professores humildes. – Ele sorriu.

Wufei também sorriu. Era incrível, mas o namorado de Yui era muito interessante. Era bonito, mas algo nele era extremamente interessante. Será que pela primeira vez na vida estava Wufei aberto a novas amizades? Eles conversaram bastante e o chinês se divertiu aos bocados.

Sentado agora sozinho tomando uma bebida Wufei olhava as pessoas em sua volta. Elas sorriam, conversavam, mas poucos estavam realmente felizes...

-Parece um homem muito observador. – Rathy sorriu se aproximando. – O que está chamando tanto a sua atenção? – O indiano quis saber.

-Os olhos. – Wufei respondeu de pronto. – Os olhos dessas pessoas escondem uma tristeza que não sei de onde vem...

-Ahhh... Todos nós temos dores e feridas que na maior parte do tempo preferimos que fiquem bem guardadas. – Ele comentou.

-Como se conheceram? Você e Heero.

-Eu... Tive uma crise nervosa quando perdi meus pais num acidente de carro. Acabei surtando. – Indiano abaixou os olhos.

-Sim.

-Fui internado quando tentei cortar os pulsos. Daí quando achei que estava no fundo do poço conheci o Yui. O coitado estava assustado. Havia tido uma discussão de trânsito e acabara obrigado a passar uma semana numa clínica de repouso. Um erro nas fichas o trocou de quarto. Daí ele veio parar no meu quarto, por isso estava assustado. Ele era apenas um cara nervoso e veio parar ao lado de um suicida. – Rathy parou para tomar ar. Ele falava demais.

-Nossa... –Wufei sorriu achando estranho o modo como aquilo começara.

-Não foi muito romântico. Mas acho que conseguimos superar. – Ele comentou. –Wufei. Por mais difícil que seja, apenas saiba que tudo na vida passa. Eu consegui deixar a fase ruim para trás quando descobri que ela podia ser deixada para trás. – Ele sorriu deixando o chinês sozinho.


Naquela tarde após um animado churrasco Wufei voltara para casa sozinho, embora Heero tivesse insistido horrores para trazê-lo em casa. Mas quando Chang Wufei cismava com algo ninguém no mundo conseguia convencê-lo do contrário, e ele, naquela tarde cismara que voltaria para casa sozinho.

Estava precisando desse momento para si mesmo. Ele havia experimentado uma reunião gostosa, mas agora caminhava vazio, como se o sorridente Wufei no churrasco de Yui tivesse sido apenas um personagem, um oco boneco sorridente.

Em casa ele se largou na cama, olhou para a tela do micro sempre ligado, mas não viu sinal de chamadas no CW. Na verdade esperava por Duo. Há uma semana o garoto não entrava no programa e por algum motivo Chang sentia falta da conversa.

-Duo Maxwell. – Ele suspirou sem entender direito o que estava sentindo.

Sempre fora tão sozinho, de repente encontrara um amigo diferente como Heero Yui, durante a maravilhosa semana que se encontraram para sentar em mesas e tomarem bebidas conversando sobre seus problemas, o chinês chegou a achar que Yui era um homem pela qual poderia se apaixonar, mas hoje vira que o novo amigo já tinha alguém e um certo ciúme se instalou em seu peito. Talvez não fosse ciúme, quem sabe não era somente inveja?

-Inveja. É terrível dizer isso, mas eu tive inveja do relacionamento deles. Será que algum dia vou conseguir sentir isso? – Ele se perguntou em voz alta. Levou a mão ao bolso direito da calça jeans e retirou um cartão, que lhe fora entregue por Rathy. – Grupo de terapia Distímica.- Ele leu em voz alta.


Enquanto isso nas ruelas de um bairro decadente Duo caminhava apressado. Estava quase chegando à lanchonete quando foi puxado por mãos fortes para um dos becos.

-Até que fim. Eu te achei. – Um homem sorriu o jogando contra outros que sorriram. Duo parecia tão pequenino e frágil nas mãos daqueles homens.

-O que? – Duo se equilibrou vendo o homem que lhe puxara.

-Quer dizer que tem a mente fraca? Eu mudei tanto assim? – O homem se aproximou expondo seus dentes amarelos e maltratados. Os olhos eram escuros e sem brilho.

-Você? – Duo gemeu trêmulo.

-Ahhh... Sou eu mesmo. – O homem sustentou um sorriso doentio fazendo seu rosto macilento se curvar de forma horrenda. –Brad. – Ele se apresentou.

-O que quer? – Duo se encolheu.

Brad era um ex-morador do orfanato. Havia sido expulso pouco antes de completar os 18 anos. O garoto era considerado um caso perdido pelos responsáveis da instituição, afinal sua infância havia sido manchada por furtos e crimes.

Após a expulsão do orfanato o jovem delinqüente ganhara as ruas. Vivendo pela própria sorte do destino.

-Estou tendo que me esconder por ai. Fui pego ano passado, fiquei na jaula um tempo, mas subornei uns guardas, e aqui estou eu.

-O que quer? – Duo o olhou assustado.

-É o seguinte, eu to precisando de uma grana e você vai me ajudar. – O homem o encurralou ajudado pelos outros que totalizam quatro. – Eu quero aquele castiçal de ouro. Aquele lá da igreja. – Ele sorriu com escárnio.

-Não... – Duo gemeu sendo prensado contra o corpo daqueles homens que se aproveitavam para lhe tocar o corpo de forma nojenta.

-Não tem escolha. Soube que está com uma bolsa patrocinada pela igreja na faculdade. Você acha que continuarão a sustentar seu sonho de se formar se soubesse quem você é? Sei lá. Um prostituto infante que corrompeu um sacristão. – Brad sorriu vitorioso. –Seu passado te condena, gracinha.

Maxwell ficou em choque. De novo aquela maldita lembrança. Como era terrível.

Sua beleza era algo bem incomum e isso o levava a muitas confusões.

Certa vez, quando ainda era bem jovem acabara caindo na proteção de um sacristão. O homem lhe agradava com doces e enfeites, Duo era tão inocente com apenas 7 anos que nunca desconfiou de nada.

Uma noite, acabara na cama desse homem, forçado a fazer uma coisa que não queria.

Graças a Deus aquelas lembranças haviam se escondido dentro de si, e embora a dor que sentia, não tinha uma visão nítida do que aconteceu. Lembrava apenas de ser molestado por aquele homem muitas vezes. Não tivera culpa. Era jovem demais, e quando dera por si estava sendo usado pelo sacristão. Envergonhado demais, ele tentara suicídio cortando os próprios pulsos numa noite de chuva quando tinha 8 anos.

O caso fora abafado pelo padre atual que acabara descobrindo o envolvimento do sacristão com um dos menores do orfanato. Duo passara alguns meses no hospital se recuperando quando voltou descobrira que o sacristão, sofrendo pressões da igreja acabara sendo encontrado morto com um tiro na cabeça em seu quarto, se suicidara.

Assim o caso fora terminantemente abafado, apenas os amigos mais próximos sabiam e Brad, acabara dividindo o quarto com Duo, quando o mais jovem voltara do hospital, por isso sabia dessa história sórdida e agora estava usando essa informação para chantagiar o menino.

-Não me olhe assim. – Brad sorriu vendo Duo nas mãos de seus comparsas. – Você não vai fazer nada demais. Apenas vai abrir a porta da igreja na calada da noite, vai certificar que ninguém estará por lá quando entrarmos. – Ele completou.

-Eu não vou fazer isso. – Duo gemeu.

-Vai sim. Agora o soltem! – Brad mandou.

-Mas... Nem uma casquinha? – Um dos amigos se decepcionou.

-Ahhh... Ruy. Olhe para esse menino com carinha de anjo. Ele não é para seu bico. – Brad informou. –Duo. Agora você vai ficar de bico calado, até receber novas ordens minhas. – O rapaz falou o empurrando no chão. –Vamos! – Comandou seus amigos que saíram jogando beijos arraigados e chupões para o jovem no chão.

Agora sozinho no beco o jovem estudante se via perdido e confuso. Literalmente num beco sem saída. Não podia trair a confiança de quem lhe dera uma segunda chance na vida, mas também não podia arriscar ter aquela história de seu passado humilhante sendo exposta e pondo por terra tudo que já havia conseguido até tal momento. Sem alternativas sensatas ele se pos a chorar largado ao chão.


Nos dias que seguiram Wufei esteve procurando Duo na Internet, mas não era nunca surpresa o colega não estar. Agora fazia quase duas semanas que o chinês não ia a aula, sua perna ainda estava dolorida, mas nessa manhã era hora de retornar.

Ele se arrumou de forma morosa e cansativa.

Quando finalmente chegou à faculdade teve o desprazer de saber que havia perdido simplesmente todas as matérias durante duas semanas.

-Chang. Achei que tinha desistido. – Um colega o chamou.

-Você tem as matérias? – Wufei perguntou do fundo da sala.

-Esqueça. Os cdfs nunca lhe emprestarão a matéria, e eu nunca copio nada mesmo. – O amigo deu de ombros.

Mas ele parecia ter dado a solução para o déficit de duas semanas de matérias que Wufei estava tendo. Ele tinha apenas que se aproximar de algum cdf e ele sabia muito bem quem seria sua vítima. Duo Maxwell, o melhor aluno do curso, embora fossem de turmas diferentes, tinham os mesmo professores, até dividiam algumas aulas.

-Aposto como consigo as matérias do trançadinho. – Chang sorriu falando baixo para o amigo a seu lado.

-Tá brincando? Aquele que senta lá na frente na aula do Hardy? O que vai fazer? Roubar o caderno dele?

-Idiota. Você não acredita mesmo que eu possa ser amigo de um cdf? – Wufei falou em tom de desafio.

-Claro que não? E no mais ele tem um jeitinho... – O colega de Wufei sorriu de forma irônica. –Tirando aqueles óculos, vestindo umas roupinhas mais na moda, ele bem que podia dar um caldo.

-Você é um doente. O que quer dizer? – O chinês sabia que aquele seu colega levava tudo para aquele lado.

-Tá. Eu duvido que você consiga fazer um cdf se interessar por você? – O jovem sorriu.

-O que? Quer que eu me aproveite do coitado? – Wufei falou com revolta.

-Não seria má idéia. Já pensou um cfd apaixonado por você e lhe ajudando a passar de ano? – Ele sorriu. – Pense nisso, garanhão.

A aula transcorreu sem problemas e na verdade Wufei estava um tanto quanto excitado e ansioso para encontrar o rapaz de trança. Eles nunca haviam travado uma conversa pessoalmente, porém seria interessante.

Assim o chinês praticamente engoliu seu almoço estando livre bem cedo para a próxima aula, era a aula do professor Hardy. Porém o destino pareceu conspirar contra aquele encontro, o professou não havia ido naquele dia e o único tempo que compartilharia com Duo estava cancelado.

Desanimado Chang caminhou para fora do campus. Nem sabia ao certo o motivo, mas estava cabisbaixo, talvez estivesse loucamente fantasiando alguma coisa entre ele e Duo. E como aquele encanto feliz que acontece quando estar pensando muito em uma pessoa, Maxwell estava a sua frente. E Chang o achou lindo. Ali largado de forma distraída sob a sombra de uma arvore. Os óculos de forte grau, a franja escondendo o rosto debruçado sobre um grosso livro em seu colo.

-Olá. – Chang se aproximou sorrindo.

Duo não esperava. Ele estava ali tão entretido com sua leitura.

-Oi. – Sua resposta foi automática, mas quando encarou a pessoa que lhe cumprimentava sua voz sumiu na garganta. Ficou pálido e nervoso. Seu coração parecia ter caído num tornado. Como um sentimento podia brincar dessa forma com os humanos?

-Eu sei que te dei um baita bolo. Mas estava com a perna quebrada. Desculpe. – Ele completou.

Duo o ficou olhando, talvez a mente processando a nova informação. Estava aos poucos eliminando de dentro de si a mágoa que sentiu ao pensar que fora solenemente ignorado pelo colega de classe, mas parecia que tinha um bom motivo para aquilo. E no mais Wufei era aquele tipo de pessoa que Duo não conseguia ficar com raiva durante muito tempo. Aqueles olhos negros e expressivos, os traços delicados do chinês, o sorriso misterioso. Sem dúvidas nunca conseguiria ficar por muito tempo magoado com aquele homem.

-Nossa. – Duo exclamou.

-Fui atropelado.

Wufei tinha um tanto de coisas para a explicar a Duo. Estava devendo há duas semanas por aquela conversa. Nunca haviam se falado pessoalmente. Gastaram a parte da tarde sentados à sombra daquela árvore.

-Então. Temos só uma semana para o trabalho e eu acho esse é um tempo muito curto. – Duo comentou reavaliando a possibilidade de terminarem aquele trabalho.

-Bem... Seria uma boa desculpa para eu te conhecer melhor. – Wufei falou baixo, porem sua voz carregou em algum tipo de perversão.

Duo não teve palavras, ele podia jurar que havia acabado de receber uma cantada.

Chang sentiu Duo corar e ele mesmo ficou sem jeito, não fora bem sua intenção atacar de canalha aproveitar que só pensa em sexo, mas sem saber os motivos de estar com Duo despertava em si uma vontade imensa de agir de forma menos contida.

-Desculpe. Eu estava mesmo interessado no trabalho... – Ele completou.

-Eu sei, não se preocupe. – Duo lhe deu um sorriso confiante.

-Como podia saber?

-Eu fiquei chateado, mas não consigo ficar muito tempo chateado com você. – Ele quase corou desviando os olhos para um ponto longe dos olhos do chinês.

Wufei apenas sorriu. Duo era meigo, o sorriso e simplicidade dele faziam o chinês imaginar o que no mundo havia feito aquele rapaz de trança lhe procurar no programa de conversas?

-Como eu não o havia notado antes? – Wufei pensou olhando os olhos de Duo. Ainda não havia o olhado com cuidado, mas agora o fizera. –Os olhos dele são... Violetas?- Ele conclui estupefato. O jovem a sua frente era por traz daqueles óculos de grau forte, e aquelas roupas largas e sempre escuras, um rapaz muito belo. Duo tinha a pele clara e delicada, os olhos eram grandes em um tom estranho de quase roxo, os lábios delineados sempre em um sorriso vivo.

-Porque? Porque você me diz isso? O que afinal eu te fiz para você me tratar como se nos conhecêssemos há anos? – Chang finalmente perguntou.

-Eu sei que é estranho para você alguém que nunca trocou uma palavra, de repente passar horas conversando com você pela Internet, e depois te tratar como se fossem os melhores amigos. – Duo concordou.

-Sim. Você é estranho. Eu agora aqui sentado me sinto que se te conhecesse há mais tempo. – Wufei pensou.

-Eu sei. Mas... Você jamais iria lembrar. – Duo sorriu triste. – Quando cheguei à faculdade e te vi pela primeira vez, nossa. – Ele fez uma pausa ensaiando um olhar sonhador. – Eu soube que era você. Tentei me aproximar de várias formas, mas cdfs não eram bem vindos, e eu preferi apenas ficar te olhando de longe.

-Duo. – Wufei o interrompeu.

-Você não lembra mesmo, né? Em Nova York. – Duo falou sem esperança.

-Os olhos. – Wufei concluiu. –Você era aquele menino... – Ele sorriu.

-Eu tinha que fugir do orfanato para te encontrar e você do seu avô que não gostava que você fosse para a porta da igreja.

-Ele reclama disso até hoje. Achava que estava traindo nossa cultura. Vovô era um fanático. – O chinês sorriu. Como era gostoso resgatar o passado. Um tempo que acreditara estar para sempre esquecido.

-Wufei. Naquelas tardes, eu me divertia muito. Você me fazia muito bem. Era a única alegria na vida de um garoto órfão. – Duo comentou chegando a um tom ferido.

-Eu... Também fui muito feliz naquele tempo, Duo. Na verdade foi o melhor tempo da minha vida. Eu acabara de perder minha mãe e vir morar com meu avô no bairro chinês. Estava bem triste quando te encontrei pela primeira vez brincando sozinho naquela praça. Como me lembro disso. Das suas risadas e seus sorrisos.

Quando se é criança certos sentimentos por mais forte que sejam acabam se confundindo com amizade. As crianças não têm o peso dos sentimentos adultos, tudo para elas é válido e correto.

Wufei esqueceu o menino que foi em algum lugar no passado, trancafiado em algum frio e escuro buraco de seu coração. Hoje se tornara um homem frio, mas aquele garoto que foi um dia, ainda vivia dentro de si e Duo, aquele seu antigo companheiro de brincadeiras parecia capaz de descobrir onde estava aquele menino chinês sorridente.

Eles caminharam conversando animadamente pela calma rua. Havia um tempo largo entre eles para ser posto em dia.

Seguiram animados e esquecidos dos tempos de solidão.


Continua>>


Um poema à Solidão.

Solidão,
Estivesses lá quando não havia mais ninguém.
Quando todos apenas olharam.
Você entrou e tocou.
Sem medo e sem culpa.

Solidão,
De todos foi a única que realmente quis ficar.
Por vezes te mandei embora.
Mas quando o Sol nascia, lá estava.
Você pegou para ver e me assumiu.

Solidão,
Aprendi a sorrir comvocê.
E com os humanos aprendi a não confiar.
Porque quando ninguém mais quis ficar...
Você estava lá.

Solidão,
É sim um vazio.
Mas um vazio que ninguém mais quis preencher.
Por isso você estava lá.
Por todos os outros que fugiram como ratos covardes.

Solidão,
Sempre fiel e escudeira solidão.
Sempre a guardar as almas sozinhas, como a minha.
Estivesses sempre comigo, solidão.

Solidão,
Faz parte de mim, hoje, como faço dela.
Meus olhos te trazem em meu sorriso, solidão.
Para sempre comigo, solidão.

Hina