O CHAKRA

EPISODIO DOIS: "Conhecendo um amigo, Conhecendo um inimigo"

É sexta-feira no Chakra, está um dia muito agradável, o sol despontou, o céu é azul e límpido. No primeiro horário de aulas, tivemos Química, Ciências Biológicas e da Natureza (essa aula tem um nome enorme!), e Religiões Comparadas. No segundo horário de aulas, Mitologia e Estética de Artes, com o prior Kinome – é a primeira aula mais teórica que temos com ele; também ele foi assessorado por um outro rapaz magrinho, de longos cabelos negros, muito bonito; gostei muito das aulas, embora, na minha opinião, o Mestre Kyuubi as tornaria bem mais empolgantes – ah sim, a aula foi ministrada na Torre de Andrônico, o Kinome falou para mim que ela é um reconstituição, não muito fiel, da original grega, a Torre que justifica o acordo entre os gregos e os Ventos, deuses que ajudavam nas grandes navegações! Sou mesmo um nerd, oras!...

"Boa tarde, tudo bem? que faz aqui?" – Anju cumprimentava, de maneira cortês, Huyu. Huyu ficou rubro de pudor, e também muito bonito; Anju, em seu receio, jamais havia notado quanto Huyu é bonito, com sua expressão fechada e séria, perde muito pouco para Luke... a diferença é que Luke tem um ar mais descontraído, mais experimentado e malicioso...

"B-Boa tarde! Você, por acaso, não viu o Ibuki, meu amigo?"

"Ibuki? Não, desculpe, não o vi"... Huyu não quis sair... "Você deseja mais alguma coisa?" – não obtendo resposta, Anju insistiu: "quer falar alguma coisa?"

"Sim!" – Anju se impressionou, que será que ele quer? Anju julgava ser odiado por o outro. "Você quer vir comigo e com Ibuki ao parque florestal? Somente os membros do Chakra têm acesso ao local. Ibuki falou que gostaria que você fosse, ele simpatiza com você...". É isso então? Anju não escondeu satisfação, está se tornando sociável, admirado até... "Eu quero, claro! Poxa, obrigado!... oh sim, quando vai ser?" – "Hoje mesmo, depois que eu encontrar Ibuki. Vou procurá-lo, não saia daqui, daqui a pouco viremos, eu e Ibuki, então a gente pode ir..."

"Certo! Obrigado!"

Poxa, que legal, e ao mesmo tempo, que estranho. Ser convidado a algum estímulo social, por Huyu, o menino que, julgava eu, me odiava!

Ele é tão estranho, mas falando com toda aquela timidez, ele chega ao cumulo de ser bonitinho. Que droga, acho que virei mesmo um gay! Já começo a admirar a beleza nos rapazes!... o Huyu e o Luke, parece, penteiam o cabelo do mesmo jeito. O cabelo brilha bem escuro, meio bagunçado, escorrendo por a testa... Mas o Huyu impõe todo aquele respeito; Luke, o tocador de oboé, não, ele é lindo, não dá pra negar – droga! – todo largado, a barba por fazer, eu quero muito falar com ele, algo, mas eu jamais saberia me aproximar dele, jamais – droga!

Vou passear com o Ibuki e com o Huyu, estou curioso para conhecer a cidade de Chakra.

"Acho que você precisa de autorização para sair" – Ibuki comentou com Anju. "Vem, eu vou com você até a sala de Kyuubi..." – disse Huyu.

Quem estava na sala, na verdade, era o prior Kinome. Foi Huyu quem falou: "Gostaríamos de pedir autorização para sair do Templo e passarmos a tarde fora". "Vão vocês dois? Posso saber que vão fazer, onde vão?" – perguntou o prior. "Nós dois, mais Ibuki". Depois de explicar que iam ao parque florestal, Anju e Huyu assinaram um caderno, deveriam voltar antes das seis e meia da tarde.

No caminho Anju perguntava a Ibuki apenas coisas relativas às aulas. "Você parece que está gostando do Chakra, então..." – Huyu cortou com sua voz feita grossa, ele parecia ser muito comedido, apenas por falar se envergonhava. Anju também não negava o pudor, parece que o receio do outro lhe afetava: "é... um pouco..." – "Fala sério! o Chakra é um inferno!" – disse Ibuki.

E inda insistiu: "É horrível! sabe, a maior besteira essa historia de voto de castidade... detesto isso" – "Ibuki..."; não adiantou Huyu chamar, Ibuki continuou exclamando, e gesticulava enquanto falava, o que lhe dava uma contrária aparência engraçada. Foi interessante que, no caminho, Ibuki citasse o tal juramento, Anju pôde lembrar nas palavras que anotara em sua agendinha, que, sim, cumpriria os votos e se manteria abstinente! – agora, ele via a seriedade desse juramento, afinal, por que escrevera aquilo?... enfim, se escrevera, o melhor é cumprir!

"Você é virgem?" – perguntou Ibuki. Anju se encolheu. "Olha é aqui, nós chegamos! essa é a reserva florestal". Ibuki e Huyu passaram na frente por o vigia, ele cumprimentou-os e deixou que passassem. Ibuki saiu correndo. "Espera!" – os outros dois correram em seguida.

"Esse Ibuki, ele é mesmo..." – "Engraçado?... ele é realmente alguém muito... diferente"... – foi o que concluiu Huyu, seu tom era grave e baixo, sereno; depois que falava, parecia, sempre restavam reticências. Parece misterioso e frio, mas, de uma maneira superior, também não deixa de ser belo; e os dois coravam se olhando, por isso desviavam logo a vista. Ibuki encontrou então uma garrafa em um buraco: "Ainda bem que tá aqui! Hei, Huyu, já faz um tempão que a gente não vinha aqui, né?" – Huyu respondeu com um tranqüilo sorriso. Anju estava admirado da beleza máscula de Huyu, mas ainda preferia Luke, é claro – Huyu era apenas alguém para se contemplar. "Anju – posso te chamar de Anju? – segura!" – e Ibuki arremessou a corpulenta garrafa de vinho; Anju se atrapalhou, mas conseguiu capturá-la, pesada, no ar... "Ele é igualzinho você, Huyu, tem medo até de pegar a garrafa. Bebe primeiro, Anju, você que é mais novo". É verdade que Anju, nunca antes, havia experimentado o álcool, mas, como era esperado, prontamente virou o gargalo da garrafa. Ele pensava se devia, ou não, fazer isso, afinal a garrafa estivera ali, mal tampada e exposta, durante indeterminado tempo; o fato é que bebeu.

"Isso é muito bom! Mas, pô, deixa um pouco pra gente! Huyu, até nisso ele é igual a você"...

Compartilhando do vinho com os outros, Anju sequer percebeu o momento em que a vista já turvava, meio embaçando. Sua euforia, sim, era visível. Já pouco importavam – aliás, antes também não – as coisas que Ibuki falava, – posto que não ficava calado por nem um segundo, – podia-se rir dele apenas por seu jeito descomedido e suas expressões.

"Ibuki, é verdade que você é necromante?".

"Necrófilo?" – e gargalhou. "Vem, vamos nadar e pegar peixe com as mãos e... sei lá, ver revista de mulher pelada!"...

Bem menos pudorados, Anju e Huyu já se encaravam melhor, trocavam um pouco mais de palavras. "Que ele tá fazendo?"; "Tá procurando as revistas que ele escondeu". Como Ibuki não encontrou as tais revistas, próximo à árvore, xingou um palavrão com o vigia, crendo que ele as levara; depois, Ibuki, segurando a garrafa de vinho ainda, começou a despir-se, olhando para Huyu e Anju. "Vocês não querem entrar na água?... bem melhor que aquele chuveiro maldito do Chakra!".

Há em cada quarto de dormir do Chakra um banheiro com chuveiro. Alguns dos chuveiros estão quebrados.

Ibuki, completamente nu e excitado, deixou a garrafa e saltou na água. Anju sentou-se encostado a uma árvore e começou a rir, era esta a primeira vez que bebia, a primeira vez que se embriagava, talvez a primeira vez que visse outro garoto sem roupas. Huyu pegou a garrafa de vinho e foi se sentar perto de Anju.

"Vocês tem quanto tempo no Chakra?"; "Um ano, mais ou menos, não sei direito. Mas a gente se conhece desde sempre" – "Desde sempre?" – "É!" – respondeu Huyu virando mais um gole da garrafa de vinho. Anju parecia querer dormitar.

Coincidência ou não, na aula de R.C. foi falado sobre uma seita grega da Idade Antiga, o orfismo. E na aula de Mitologia, o garoto de cabelos compridos leu o mito de Orfeu – suposto fundador da seita – que teria ido ao inferno e voltado, em busca de Eurídice, sua amada... Como não conseguira trazê-la de volta, entristeceu-se e renunciou à companhia de mulheres. Fundaria depois essa religião, predominantemente masculina, de adoração a Dioniso, o deus do vinho... mênades bacantes, as sacerdotisas do culto dionisíaco original, ébrias e enfurecidas, – por, talvez, terem sido rejeitadas por ele – rufando seus tambores, atacaram-no, mutilaram seu corpo...

"Dioniso Baco..." – exclamou Anju, reabrindo os olhos, e Huyu sorriu – O sorriso dele é maravilhoso, uma pena seja tão raro... "Dizem que ele era muito bonito..."; "Baco?"... "Sim" – afirmou Huyu, com gravidade, passando a garrafa a Anju, que já estava vermelho, e quase dormindo.

"Ele devia..." – Huyu encolheu o rosto, engolindo ainda o suco; depois reabriu bem a vista, falava pausadamente: "Ele devia ser bonito como você..."

Anju estava desarmado, assim preferiu se desculpar sob o pretexto de estar ébrio: Huyu tomou-lhe seus lábios, e acariciava seu rosto, os dois tinham os corpos muito quentes. Os pensamentos de Anju mentalmente se estapeavam, foi quando lhe ocorreu que, talvez, o Ibuki os estivesse vendo; por acaso, nesse mesmo momento, Huyu soltou dele.

Ficaram um pouco sem jeito, mas durou pouco. Viram que Ibuki estava, de quatro pés, tentando colher peixes com as mãos nuas, obviamente não conseguia. Anju então rompeu o silencio: "É verdade o que dizem... sobre ele ser necromante?"... Huyu pareceu estranhar a questão, mas sem perder sua usual temperança: "Necromante?...ah, sei lá, acho que todo mundo no Chakra é isso... A religião do Ibuki é diferente, mas, se ele acredita...".

Anju sentiu-se desconfortável, a opinião que formara sobre necromancia era das piores. "Então... você também pratica?"; "Eu?" – Huyu sorriu desajeitado: "se ele precisa de minha ajuda, eu faço... mas... eu não acredito em nada não"

Ouvir isso dessa maneira despertava toda a lucidez de Anju sob a bebida. E, por alguma razão, preferiu não julgar Huyu e Ibuki ainda em seus velhos conceitos... Huyu pareceu se expressar com tanta certeza, ele é incrível... "Hatsukoi, eu... posso...?"; Huyu entendeu e mais uma vez se beijaram, depois, tranqüilamente Huyu afirmou-o sob seus braços, deitou-se no chão e Anju, com o corpo em diagonal, permaneceu com a cabeça recostada sobre seu tórax. Adormeceram.

"Acorda! Acorda! Vai dar seis horas, a gente tem que correr pro Chakra! Não vai dar tempo!" – Ibuki, já vestido, desesperava-se. Anju, se recompondo, não negava o sorriso. No caminho, Anju foi o percurso todo se apoiando por sobre o ombro de Huyu, por sobre o outro ombro do rapaz também se apoiava Ibuki. E quem abriu o portão do Chakra foi Luke. Anju nada disse, emudeceu; abaixou a cabeça e entrou na Escola. Ele e Huyu rumaram, direto, à sala de Kyuubi, assinaram mais uma vez o caderno, e apesar de estarem doze minutos atrasados, nada lhes foi dito. Kinome – o homem que não dorme – esperava tranqüilamente sobre a mesa formulando suas contas.

"Hatsukoi, cuidou bem do jovem Namidatou? Espero que sim, heim?". Huyu trazia o cenho fechado, novamente tornou-se inacessível e racional, um juiz, condenou o comentário do prior, Kinome então emendou: "Tenho certeza que Huyu é um bom garoto". Vocês dois, afinal, podem, se quiser – e nesse momento olhou para Anju –, podem ter um grande futuro aqui, dentro do Chakra. Basta querer...

Anju olhava para Huyu, que mantinha a reprovação e o desgosto contra Kinome; então, Anju consignou um rosto aflito em resposta: já não entendia mais ninguém! que fazer?

Ainda sem ter sete dias vivido no Chakra, já parece que faz tanto tempo! Não está, afinal, tão ruim. Hoje foi a primeira vez que eu fui beijado por um garoto... foi o Huyu... mas, ainda sinto que prefiro Luke; além das contas, Huyu deve sentir algo por Ibuki – estão sempre juntos. O que eu senti? Foi maravilhoso!

Huyu é um garoto tão... não sei defini-lo com uma palavra... porque ele é o contraste de muitas idéias que eu tenho. Mas ele passa uma sensação muito confortável, talvez a melhor maneira para eu defini-lo seja imaginar a conduta de um anjo. Sim, Huyu, como um anjo. Sério e justo, ao mesmo tempo, cordial e quente. Ele me abraçou de uma maneira tão afetuosa, Felicidade é o que eu senti, pela primeira vez, será?

De qualquer maneira, é inevitável, sim, eu virei mesmo um gay! snif

Os meninos de meu quarto falaram comigo, perguntaram se era verdade que eu tinha saído em companhia de Huyu e Ibuki; eu não podia negar! Eles estranharam, um deles comentou que Ibuki poderia estar atrás de meus poderes – eu, como possuidor de um Dom –para a realização de seus torpes sortilégios! – quanta bobagem! Eu sei que não foi assim. Hoje eu enchi a cara, sequer me lembro de algum outro dia ter posto bebida na boca!

O que ainda me perturba é que, na volta, quem abriu os portões do Chakra foi o Luke. Ele estava lindo, com uma roupa mais comum, azul água, seus negros cabelos penteados sobre a testa, imberbe – finalmente havia feito a barba! Ele nos encarou com certa estranheza – eu estava me apoiando sobre o ombro do Huyu; parece que o próprio Huyu ficou tímido ao passar por ele, Luke nos seguiu com a vista até entrarmos na sala do Kinome. Quando saímos, não mais o vi...

O que eu posso dizer ao Luke?... eu acho que sim, sim eu sou correspondido por ele! E tem algo que devemos conversar, eu sei. Mas o que dizer? Se eu não sei o que dizer, e nunca vou saber!... o que dizer, eu um garoto, quando gosto, e sou correspondido? o que dizer, um garoto, a outro garoto?

Eu nunca vou me entender!

Depois de tomar suas lições, Anju banhou-se em seu quarto mesmo. Pois, nessa noite, o frio chegara.

"Shizuka, eu queria saber o que fazer, mas... – eu sempre antes soube o que eu devia fazer; e eu sei o que está errado – eu sei! Porque eu tenho uma maldição. Shizuka, assim como você... eu tenho uma maldição!" – é o que dizia Kyuubi no quarto do Silêncio.

"Amanhã será sábado" – alertou Kinome vendo Anju entrar, em leves passos, no salão. Kinome se levantou e se aproximou da cuba: "E você, pequeno Namidatou, deseja confessar alguma falta, algum segredo?"... "Um pecado... eu confessei. Eu já depositei um pecado meu dentro da cuba!" – respondeu Anju. Anju, ainda de cabelos molhados, vestia um traje de peça única, avermelhado e com mangas; amarrando a cintura um cordão de sisal, realçando a beleza de sua estatura, deixando à mostra boa parte de suas finas pernas compridas, e revelando todo o curvar por sua cintura e quadris.

Kinome também pecava – Anju descobriu, curioso, porque, em seguida, o grão-vizir segundo do Chakra depositou a sua própria cédula de culpa à cuia. "Você pode carregá-la? consegue? se não puder e achar que está pesado, eu o ajudo..."; Kinome vestia-se em um traje oriental, um robe preto com uma abertura na diagonal, também uma peça única.

Tentando, Anju ergueu a cuba e, como não estava tão pesada, levou-a seguindo os passos de Kinome. Com os pés descalços, os dois sentiram o gélido chão do pátio. Kinome seguiu andando, abriu portões largos que fechavam para além da Torre de Andrônico, Anju nunca reparara nessa área. Por o lado de dentro, em uma reserva vegetal lindíssima onde se podiam ouvir noturnos grilos, Kinome continuou caminhando, seguido por Anju e a cuba de crimes. Foi quando os sentidos de Anju novamente despertaram-se para o cheiro de sangue e perfídia. "É aqui, supostamente, o local onde morreu o senhor Kurayoumi, fundador original do Chakra de Magia" – Kinome apontou sete furos no chão, cada um na medida de uma bolinha de gude. "Ele morreu com tiros?"; "Não... com uma espada... foi o próprio Mestre Kyuubi quem encontrou o corpo de seu pai, perfurado por a própria espada, aqui! É um lugar difícil de meditar, e também é difícil realizar qualquer ritual aqui... mas todos nós devemos conseguir..."; "O Mestre Kyuubi... ele realiza rituais aqui? no local onde encontrou o corpo de seu pai?"; "Já não é questão de sua escolha... foi o próprio Kurayoumi-sama que escolheu a maneira e o local para morrer: ele se suicidou!"... Anju sentiu um tremor terrível sobre seu corpo: "Kinome-sama, o demônio existe?"... "Jean Paul Sartre,um filósofo ocidental, uma vez disse que: o inferno são os outros... e são mesmo"... Kinome sorriu levemente com os olhos, ele, mais que ninguém, sabia o risco que o demônio e o inferno – que são os outros – podem trazer... completou: "Você está se sentindo bem, pequeno Namidatou?". Estou! – foi a resposta do jovem.

"Shizuka, eu perco as minhas forças... eu sou mesmo fraco, um idiota". Shizuka encarava Kyuubi com certa admiração, ela, pasma, viu quando ele caiu desmaiado; tinha lágrimas nos olhos, pois pensava que ele estava morto. Aproximou-se de seu corpo e sacudiu-o; tentava fortemente chamar seu nome, sem conseguir. Demorou e ele abriu os olhos: "o Templo de meu pai vai cair! o Templo de meu pai, Shizuka, deve cair!"... Shizuka ainda chorava sob a falsa ameaça da morte de Kyuubi, ele então, respirando ainda fraco, pediu que ela se acalmasse. Ele levantou-se, avisou que precisava fazer algo, e saiu, depois de jogar um cobertor e desejar a Shizuka uma boa noite...

O Ritual que Kinome Anoyo preparava era simples. Próxima a uma árvore se encontrava uma pá, com ela, ele cavou um raso buraco na terra fofa; pediu que Anju despejasse os bilhetes sobre o buraco; Anju se curvou para ajeitar os bilhetes comodamente dentro do lugar marcado. Kinome também se abaixou para ajudá-lo, depois, tomou as mãos de Anju nas suas e pediu que ele se afastasse um pouco. Anju levantou e tomou pequena distância; estalando os dedos, magnificamente, Kinome pareceu ter criado o fogo. E as chamas consumiram todos os crimes da cidade, todo o desrespeito e injúrias, tudo aquilo que jamais deve ser dito! Sim, Kinome criou as chamas com um toque – e Anju, atento e sem dizer nada, apenas assistia: a magia existe, mas ela é terrível! – Anju temia...

"Podemos ficar próximos ao fogo, esta noite será bem fria, pelo visto. Já se sente melhor?" – perguntou o prior com uma voz quase metálica; "Sim..." – disse meio incerto seu acólito, que, ao menos, estando próximo às chamas – cria ele – não mais ia sentir esses espasmos de arrepio, causados por aquele local, e aquele terror nos sentidos...

Sentaram-se os dois, o fogo iluminava brandamente o rosto de Kinome, um tom magenta dançava com as sombras de seu contraste: "ontem você dormia com os lábios entreabertos, sabia que, quando se dorme assim, seu espírito pode sair por a boca?"; meio embaraçado, Anju não soube o que responder. Os dois fecharam seus olhos, Anju, ainda uma vez escutou a voz, grossa e mecânica, do grão-vizir dizendo: "peça que os pecados dessas pessoas sejam perdoados, Anju... peça com força, para que eles deixem de existir e padeçam!"...

Anju, ao certo, não sabia se cria em Deus, e talvez por isso perguntara a Kinome sobre a existência do diabo. Fechou seus olhos, mas seus sentidos – ele possuía o Dom – ainda viam o perigo, estava alerta, e era ele mesmo quem quase já sentia a garganta degolada por a Espada Sagrada... Sobre o crime que aconteceu há quatrocentos anos, quantos outros crimes acontecerão neste solo maldito? Isso é o Chakra! – concluiu Anju, não mais agüentando, ao abrir os olhos:

Kinome, que havia se sentado com o joelho bem próximo do seu, também matinha os olhos abertos, em sua direção, ele percebeu. "Você ainda sente-se mal?"... hesitando, Anju meneou com a cabeça, negou, mas veio uma terrível brisa muito fria, fazendo com que ele quase caísse no chão; foi amparado por Kinome, que sentou-o novamente. Anju bem tentou fechar os olhos e meditar, mas enquanto, pesadamente, abria e fechava os olhos – sentia-se observado como uma presa noturna – em uma dessas piscadas, viu bem o momento em que Kinome abriu o robe por sobre o ombro, descobrindo metade de seu corpo. Anju respirava fundo, não piscava, foi levado imediatamente a ver o falo de Kinome estimulado. O olhar de Kinome já não era mais como o de uma coruja caçadora, sim como um sábio e cruel felídeo, uma pérfida serpente: "Venha... venha até aqui", disse grave e baixo; o que Anju poderia fazer? como ele poderá reagir porque está sozinho com Kinome, e não é isso o que ele quer! "Vem" – Kinome virou o seu corpo de frente, revelando mais ainda a visão túrgida que Anju devia evitar... Ele, levemente, tomou Anju por os braços... Anju simplesmente não sabia que fazer; e agora? – seu rosto, rapidamente tornou-se corado e ardia, era ele todo uma dúvida e um medo.

"Eu, desde que eu te vi, quando você tava na sua casa... eu estou sentindo isso por você... Eu quero você!" – Kinome arfava; com violência grudou nos lábios de Anju, que gemia alto, estava desesperado, e assim, mais ainda Kinome degustava seu desejo. Suas furtivas mãos e pernas, e seu corpo parcialmente descoberto, prendiam e capturavam, se exaltavam com a pele de Anju; Kinome desmanchava o traje ritual de Anju, procurando mais e mais de seu corpo... Anju apenas soluçava e apertava os olhos – é esta a sensação de ser devorado.

Arranhando e abraçando loucamente as coxas do jovem, Kinome abriu passagem entre as pernas de Anju. Kinome de um golpe lento começou a introduzir seu órgão copulador, tão tenso e rude, no garoto. Anju ainda não sentia dor, mas sua respiração não parava, seu pulmão, dentro, parecia explodir; abriu os olhos cheios de lágrimas, viu sobrevoarem vaga-lumes piscando... havia cerca de cinco daquelas lanternas de alegria, Anju estava consternado. Não, por não se conhecer, não sabia como reagir... de repente, Anju franziu as sobrancelhas, com certa piedade assistiu a, um por um, cada vaga-lume se apagar e tombar morto... Kinome induzia, indolor mas sensível, seu corpo entre as pernas de Anju, quando tocou o máximo, quando se preparava para se mover, abriu de repente a vista, assustado: "Kyuubi-sama!"

Com efeito, foi apenas necessário o tempo para Kinome abotoar lateralmente seu robe: "Aperte o cordão de sua roupa, pequeno" – disse ele, baixinho, com um sorriso no rosto. Anju obedeceu. Kyuubi chegou em firmes passos de velho: "Estão de pé? Não estão meditando." – rispidamente, foi o que ele conferiu, olhando para Kinome. "É que o pequeno não estava se sentindo bem, senhor. O senhor sabe como é difícil manter a concentração neste tipo de solo, quando se é iniciante..."; "Sob as chamas, todos os pecados vão desaparecer... não é mesmo? Os pedidos que queimam neste ritual são para impedir o pecado, e para purgá-lo... todas as pessoas, que escreveram aquilo que tinham de indesejado, sentir-se-ão enormemente satisfeitas ao verem perecer todas as falhas... porque elas pereceram, sob a chama, agora, todas as falhas pereceram!"...

Ainda suspirando fundo, Kinome sentou-se no chão e abaixou a cabeça, como quem concorda resignado. Anju não deixava de fitar o chão. "Sente-se mal, não é verdade, pequeno Namidatou? Vá, volte para seu quarto, vá dormir por hoje..." – continuou Kyuubi, de voz rouca e áspera. "Não, Mestre. Ou o Ritual não vai dar certo" – rapidamente o prior interpelou...

Entendo – disse o velho – também eu ficarei aqui; hoje não é noite de descansar...

Eu pude perceber, Kinome ergueu o rosto com tanto ódio contra o Mestre Kyuubi; parecia que ele queria destruí-lo com seu olhar...

Bem em frente ao posto, no chão, onde Kinome se sentou, um dos vaga-lumes piscou sua lanterna e tentou se levantar, eu vi: o vaga-lume não conseguiu, parou, estático para sempre. Isso tirou a atenção do Kinome, que pegou o vaga-lume na palma da mão, com uma expressão meio triste. Eu não sei o que aconteceu ontem, e estou seguro – a salvo – enquanto digo que não sei.

Eu quero chorar!

E nem isso eu consigo, tão maldito que sou. Hoje não tem aula no Chakra, são agora exatamente seis horas, alguns meninos dormem, outros saíram do quarto para tomar café da manhã; aqui eu não comerei mais nada. Estou esperando chegar dez horas, é, provavelmente, quando o Mestre Kyuubi abrirá sua sala. Vou deixar o Chakra. Sim. Vou deixar o Chakra!

Quando o Sol nasceu àquele dia, Anju fora o primeiro a ser dispensado da meditação por o Mestre Kyuubi. Kinome olhou-lhe cada passo, desconsolado, não havia terminado o que começara, queria mais, o assunto estava pendente. Mas Kyuubi não deixou que Kinome saísse, disse que ele apagasse as chamas – as cinzas seriam jogadas no lago –, Kyuubi disse ainda mais: certamente, precisavam conversar.

Kyuubi sabe e por isso me aflijo mais!

Sou uma vergonha!

Namidatou Anju não descobriu ainda a maneira de chorar. Ele descia a escadaria dos dormitórios e rumava para a sala prometida. Foi quando viu: o portão do Chakra estava aberto, lá vinha aquele garoto de cabelos compridos conduzindo um senhor vestido formalmente, com uma bolsa lateral, quem será?

Parece que é telegrama! – alguns dos garotos já comentavam. Mas pra quem, queriam saber. Kinome passou, "bom dia, garotos!". Todos responderam, exceto Anju que, em resposta, devolveu apenas um olhar dolorido, de quem exige clemência, e em seguida abaixou sua vista.

Anju estava consternado, seu olhar acusava-o: um menino que não entendia o mundo, é isso! Passava das onze horas da manhã, finalmente teve coragem de entrar na sala de Kyuubi. Certificou-se antes, olhou os dois lados, ninguém ameaçador o notava: "Mestre Kyuubi, podemos falar?"... O Mestre piedosamente lhe ergueu os olhos, teve, então, o aspecto mais velho que alguém já viu, e diriam-lhe, não quatrocentos, mas mil anos: "Eu... por favor, jovem Namidatou, sente-se!".

Anju obedeceu, parece que Kyuubi também tinha algo a lhe dizer: Talvez agora... bem, eu imagino que... você veio me dizer que quer deixar o Chakra, não é isso?... Anju, cabisbaixo, quase chorando – premeditando –, confirmou em um gesto sem levantar a vista. "Jovem Namidatou, esse telegrama veio da Cidade Joana D'arc... eu... me dói avisá-lo isto, mas: sua mãe faleceu"...

Imediatamente toda a desgraça de Anju rebentou em seus globos oculares. Suspirava alucinadamente, não sabia que fazer, sua tristeza foi o terremoto a seu corpo, suas lágrimas foram a destruição a seus olhos. Kyuubi deixou de encarar-lhe, levantou-se sobriamente, evitando lhe olhar, à porta pediu a um garoto que trouxesse água rápido.

Eu só lembro que mais tarde eu acordei e eu estava aqui chorando. Mas que droga, mas que droga! Esse lugar é insuportável, é uma maldição! Estou no inferno!... e não, não posso sair!

Minha mãe! Mas por quê? Mas... eu lembro que enquanto estive aqui no Chakra eu pouco me lembrava dela, agora estou pagando por isso... NÃO PODE SER VERDADE!

Eu não consigo, eu não entendo... Minha mãe...

Eram já três da tarde, Anju, de vez em quando, acordava pensativo, depois novamente voltava a chorar, até dormir. De manhã, ele desmaiara à sala de Kyuubi.

É a pior sensação que eu poderia ter! já não compreendo mais nada, porque muitas vozes na minha cabeça falam ao mesmo tempo.

Eu devia ter pensado mais nela, e eu devia pensar nela e saber que ela está em algum lugar, física. Eu devia pensar e saber que ela existe, como existiu por perto durante toda a minha vida. É horrível demais suportar...

E novamente desmaiava Anju, ora em ora acordava, pensava, gemia um pouco e desmaiava. Entrar no inferno foi sua perdição.

Sábado no Chakra – aberto aos visitantes, o templo lotado perde metade de sua tranqüilidade usual. Ninguém, entre tantas pessoas por ali, teria razão de se preocupar com a tristeza de Anju.

Kinome representou o Templo frente aos visitantes, guiou-lhes todos a sala de armas e contou a pequena lenda que embala a Cidade Chakra:

"O sr Kurayoumi, fundador da Cidade e do Templo Chakra, viveu aqui, dentro destas paredes, sua história de amor com a misteriosa srta Gakushi. Não é uma história que termina bem.

De convenção, essa espada é enterrada e resguardada nesta sala, onde, criam os mais antigos membros do Templo, o poder de lacre é maior. Pouco se sabe quanto ao que aconteceu, na verdade, àquela noite. Mas Kurayoumi havia avisado que aquele que encontrasse seu corpo morto seria o próximo a viver por este templo. É lógico que ele também esperava que fosse seu inigualável filho, o sr Kurayoumi Kyuubi, que vocês todos devem conhecer, na época era já uma criança muito hábil e notável.

Enfim, o que sabemos é que, certa noite, a srta Gakushi fora encontrada morta... por esta espada: 'Sete-luas'... esta era a espada do próprio Kurayoumi-sama! Ele, na noite seguinte, se suicidou, atirando-se contra o gume de Sete-luas. Seu filho, o grande Mestre Kyuubi, encontrou-o já morto na área restrita do Templo, que vai terminar na reserva florestal."

Os visitantes perguntavam quem matara a srta Gakushi. E ninguém sabe, ao certo, responder sobre tal lenda... é bem possível também que nada disso tenha acontecido – é o que o prior Kinome explicava, acalmando os turistas, pois os moradores da cidade já conhecem bem a tal historia.

Ibuki e seu companheiro Huyu voltavam às três da tarde, haviam ido à cidade. Os pais de Ibuki lhe remetiam algum valor, Huyu somente foi para fazer companhia. Entrava também no Templo Chakra, junto com os dois garotos, uma jovem de cabelos curtos, castanhos, um par de óculos sobre a vista... ela foi diretamente recebida por o Mestre Kyuubi, que gesticulou um cumprimento aos meninos e guiou a moça até sua sala.

Acontece que Ibuki e Huyu perceberam que, pouco depois, Kyuubi, carregando uma tela de vidro, adentrava a Sala de Silencio seguido por a tal moça. "Quem será ela? E por que ela pode entrar aí?", os garotos se demoraram a contemplar aquilo que a porta, entreaberta, inda revelava. Principalmente porque Ibuki ficou curiosíssimo.

Passado algum tempo, os dois subiam – Ibuki, como sempre, entusiasmado –, entraram no quarto de Anju e lhe notaram apático e pálido sobre a cama, os olhos derramados demais. Imediatamente tomaram, cada um, um dos lados do garoto. "Anju!" – admirado, exclamava Huyu, corrigindo-se em seguida: "Namidatou!"... Anju abraçou Huyu com muita força, contraindo todo o seu corpo, espremendo bem os olhos; Ibuki, ainda pouco entendendo, apenas acariciou as costas do menino desconsolado.

"Shizuka, essa é a sua irmã... o nome dela é Ruise Naoko!" – apresentava a rouca voz de Kyuubi... "Srta Naoko, esta é Shizuka, sua irmã!"... Naoko começou a chorar por se deparar com Shizuka, mas podia tê-la apenas através de um vidro, sobre o qual espalhou bem sua mão. "Shizuka!..."

"Imagino que haja bastante tempo que vocês não se encontrem, não é mesmo?". "Na verdade, Kyuubi-sama, eu e minha irmã, nós nunca havíamos nos encontrado"... na personagem em que Shizuka se vestira ainda não deixou de representar; a menina continuava alheia, mas Naoko tinha certeza que ela estava mais contente por ter alguém ali perto; "Shizuka, você fica muito sozinha, não é?"; Shizuka olhou para o mestre do Templo antes de responder, depois, simplesmente não respondeu. "Shizuka" – chamou Kyuubi: sua irmã está noiva do jovem Yuzuki – Kyuubi afirmou em um ritmo um tanto estóico, pausando sua fala, até recuar completamente.

"Yu...zu...ki!" – imediatamente Shizuka notou todos ali. Kyuubi esboçou quase um sorriso, caso fosse capaz de tanto. "Shizuka, mostre a Naoko os quadros que você faz... Naoko, Shizuka pinta lindas obras, tenho certeza que você vai apreciar vê-las..."; "Você também pinta, Shizuka? Eu... eu... eu amo artes, e estou começando ainda na pintura, mas acho que não levo jeito".

"Yuzuki"...

"Parece que Shizuka quer saber de Yuzuki. Eu vou lhes deixar a sós; um de meus meninos está passando por momentos difíceis... sua mãe faleceu!" – Kyuubi se escusou recuando, e deixou a sala.

Mestre Kyuubi, a caminho dos dormitórios, cochichava consigo que: "Shizuka sente um afeto por Yuzuki, é muito interessante... até mesmo uma criança como Shizuka"... quando ele abriu o quarto, Anju ainda se abraçava fortemente com Huyu. "Meninos... Anju, já se sente um pouco mais disposto?" – não, Kyuubi não teria toda a sabedoria que precisasse dispor, não quando era testemunha dos sentimentos que lhe faltavam... Anju sentia uma pontada, como uma mágoa, contra Kyuubi-sama, sentia mesmo, e não sabia bem por quê, precisava culpá-lo, somente isso. "Jovem Namidatou, você precisa comer algo, se alimentar...";

"Mestre Kyuubi, acaso..." – Anju, sem soltar de Huyu, que era protetor e morno, e sem tampouco encarar o mestre do Chakra, continuou: "acaso... o sr se apieda de seus alunos? o sr se importaria se eu morresse também? por acaso?" – no fim, já houvera engolido toda sua agressão, queria apenas um pouco de compaixão.

Os olhos do velho Kyuubi se acinzentavam mais e mais, não era um homem que sentia, todos sabem. "Eu não... eu não desejo que você sofra, jovem Namidatou... mas... não há uma maneira de eu mudar seu fado ou de assumi-lo pra mim... se houvesse eu o faria, e não por piedade... me perdoe"; todos os três jovens viraram-se para notar Kyuubi. "Coma alguma coisa, eu lhe peço", insistiu Kyuubi. Anju recusou em um gesto cabisbaixo. "Você deseja alguma providencia de minha parte, pequeno Namidatou? se você desejar, posso conseguir que você durma fora do templo. Posso mandar-lhe também a Joana D'arc, se desejar, para visitar a sepultura dela..."

"O sr pode me tirar do Chakra?"

"A única parente que lhe resta é uma tia e a avó, não é?... serei sincero, ela..."

"Elas não podem me criar, é lógico que não!"

Kyuubi suspirou em resposta, depois seguiu: "mas, podemos telefonar para elas, depois, se você quiser conversar com elas... me perdoe, você terá todo o tempo que precisar... eu só gostaria que você comesse algo"

"Obrigado. Eu não vou comer. Obrigado" – respondeu ele, já havia soltado de Huyu enquanto isso.

"Eu voltarei mais tarde. Jovem Hatsukoi, cuide dele!".

Domingo no Chakra, há uma semana completa que Anju estava ali. Nesse dia, os meninos podem acordar mais tarde, Huyu e Ibuki dividiram o quarto com Anju, os outros garotos dali foram espalhados por Kyuubi a outros dormitórios. Durante a noite de sábado, o prior Kinome se aproximou do dormitório de Anju; a porta estava trancada e um fino colar dourado de contas embrulhava a maçaneta; Kinome depositou uma rosa branca sob a porta.

"Bom dia, Namidatou! Você, como está? sente-se ainda indisposto?"

"Bom dia, Ibuki" – Anju podia já forçar um sorriso, levantou-se da cama: "Huyu ainda está dormindo..."

"Ele ficou acordado um tempão. Ele cuidou de você..."

"Me desculpem, por aborrecê-los tanto!"

Ibuki virou o rosto, nem discordava nem concordava. Depois, também ele se pôs de pé, ele e Anju se aproximaram de Huyu, adormecido. Sorrindo, Ibuki soprou, levemente, contra a orelha de Huyu. Huyu acordou apertando os olhos, cerrando o cenho, evitando a luz. Anju pôde sorrir mais abertamente. "Você está sorrindo!" – constatou Huyu, foi sua primeira frase no domingo, e insistiu: você dormiu bem?

"Sim, dormi bastante". "Isso é bom...". Ibuki forçou a porta e disse, "vamos nos escovar, senhor Hatsukoi, aposto que você tá com bafinho, blergh que nojo!... Uma flor!" – notou Ibuki: "uma rosa! Deixa o Kyuubi ver isso..."

"Ibuki, essa rosa deve ser pro Anju. Alguém deve ter deixado aí!" – respondeu Huyu, já sentado na cama, com uma voz mais grave e séria.

"É, mas logo uma rosa... o Mestre Kyuubi não vai gostar..."

Por quê isso? – Anju quis saber. Ibuki explicou: "as rosas não são permitidas no Templo Chakra... eu não sei explicar direito..."

Tem a ver com o voto de castidade? – perguntou, de palpite, Anju.

Exatamente! Você já ouviu algo a respeito? Aliás, provavelmente, se alguém te mandou uma rosa, estando dentro do Chakra...

"Algo a respeito, não... mas... tem algum bilhete junto à rosa?"

"Nenhum! Mas o Huyu consegue dizer quem mandou!" – Ibuki fez um gesto bem orgulhoso com relação ao amigo.

"Ibuki!" – Huyu repreendeu, um tanto constrangido. É verdade, insistiu Ibuki: ele é capaz de fazer isso, é verdade! – e Ibuki sorria como uma criança. "Anda, Huyu, fala quem deixou essa rosa aqui...".

Anju sentou-se, cabisbaixo, já pôde prever quem era o autor do presente.

Depois, Huyu afirmou com uma voz dura: Ibuki! Você não tem jeito, mas que coisa. Me deixe, por um instante, a sós com o Anju, por favor!

"Não!"..." Não?"... "Por que vai falar algo que eu não posso ouvir?"... Ibuki deu as costas e saiu.

Huyu tomou a rosa entre os dedos, "o que houve?"; "Não... eu não quero que até você saiba... mas que droga... não!".

"Foi o Kinome-sama" – suspirou Huyu: "não se aflija tanto... se contarmos sobre essa flor para o Kyuubi-sama, ele será repreendido. Este tipo de flor não é permitido aqui!"

Anju soprou o ar entre os dentes, mal levantara-se da cama, uma completa exaustão lhe doeu, estava cansado como se não tivesse dormido durante um ano... e de fato, ele apenas completava sete dias dentro do templo...

Ele se levantou da cama e tirou a rosa dos dedos de Huyu. "Por favor, não quero que você saiba... se você já souber tudo de mim... por favor, minta que não é capaz de me adivinhar: sobre a rosa...!"; Anju fez que ia espetar seu dedo contra a flor, mas, imediatamente, ela toda se despedaçou no chão... "sobre a rosa"... e Anju ainda suspirou vendo sua queda...

Huyu inclinou a cabeça, apertava os olhos, não queria ver nada, e aquilo que viu tentava esquecer como quem força outros pensamentos. "Vem, vamos sair daqui. Eu não sei o que você vai fazer hoje, mas no domingo, nós podemos sair e ficar bem longe deste Templo... se você quiser..."

"Depois... depois, eu penso..."

Eles saíram do quarto.

Estão completos dois meses que eu me encontro no Chakra. Faz muito tempo que não escrevo nada neste caderno... talvez eu esteja crescendo, e talvez precise abandonar algumas tolices da infância.

Bem... absolutamente nada aconteceu desde a última vez que eu escrevi aqui... estou há dois meses, mas ainda sou o menino novo do Chakra. Eu não posso sair daqui, porque, as únicas parentes que ainda tenho não podem me sustentar. Não que esteja assim tão ruim, está tudo como nos dois primeiros dias; poucas pessoas falam comigo; os mestres não me tratam mais com diferença, não... nem o Kinome... aliás, ele agora faz o ritual sozinho, por conta própria...

Acabei não indo à cidade de Joana D'arc (evito falar sobre a tragédia que aconteceu a mamãe)... eu ficava pensando, se eu fosse, eu estaria dependendo de um favor do Chakra, e mais, talvez, estando lá, eu não conseguisse voltar, embora não houvesse maneira de ali ficar... Eu sou uma pessoa muito razoável, será que se eu tivesse, uma única vez, agido por impulso, será que eu me arrependeria mesmo assim?

Luke, o musico, às vezes eu o vejo. Tem uma biblioteca, praticamente secreta, dentro da Torre, ele fica lá à noite às vezes... sempre cercado de meninos, todos mais velhos que eu – por exemplo, os garotos mais velhos que se responsabilizam por aulas como E.A. ou Armas Brancas; eu não teria chance competindo contra rapazes tão belos e talentosos...

Será que eu desejo mesmo deixar o Chakra?

As rosas aqui são proibidas...

Kyuubi já explicou, uma vez, sobre as rosas... agora as aulas já pareciam bem mais praticas para Anju. Sobre as rosas, Kyuubi fala que são flores de amor vulgar, que são as mais vulgares entre as flores. Não é permitido ao aprendiz de Chakra se envolver com rosas... Anju formulou uma quase que teoria sobre si mesmo; ele se via como a rosa azul do Chakra... quase sempre, ele mesmo se afirmava que era a rosa dentro do Chakra...

Anju parecia se estar tornando um garoto bem fechado e melancólico, mas ele nunca antes deu sinais de ser mais feliz que isso. Kinome falava com ele apenas o indispensável, embora, por muitas vezes, deitava sobre ele um olhar suplicante ou complacente...

Não era sempre que Anju se aproximava de Ibuki e de Huyu; na verdade, na maioria das vezes, os dois é que tomavam iniciativa. Não saíram mais juntos, e Anju tinha para com eles uma espécie de receio, posto que guardasse um segredo, Anju não queria compartilhar com ninguém seu interior.

Eu sou a rosa venenosa

prefiro ser, sozinho, infeliz; –

Porque Felicidade não faz sentido algum, faz?

Aquele que descobre o meu fel, sim,

que estará perdido –;

Prefiro ser, sozinho, infeliz.

Kinome, subitamente, entrou no quarto de Anju: "Pequeno Namidatou... eu vim lhe comunicar algo"!

Ele não tinha mais a mesma eminência de antes, não, Kinome, ao se dirigir, agora, a Anju, falava com certa pressa, certa agonia visível; ele bem que tentava se conter, mas não adiantava; e somente com Anju agia assim. Em suas aulas, Anju não falava nada, a menos que fosse realmente exigido, como na aula de Musica – na qual, também, pouco encarava o Luke, era assim sua nova condição no Templo. Estava tudo bem até este dia.

"Você vai ser iniciado... iniciado no Chakra, o Kyuubi-sama me comunicou agora há pouco... ele vai vir te falar, mas eu vim antes sem que ele soubesse!"

Anju sentiu um golpe de medo, as palavras de sua mãe lhe voltaram tardiamente aos ouvidos: "tomara que não façam lavagem cerebral".

Pequeno Namidatou, chamou o prior Kinome: "eu posso te ajudar... Eu gosto de você, não sei se você acredita. Mas o que eu sinto por você é algo..." – Kinome engolia em seco, as palavras falhavam pois não expressavam dor suficiente, pensou e completou: "... Tremendo!...":

"Não me rejeite, eu te imploro... Eu quero te ajudar"...

Aconteceu isso na quinta-feira, da semana passada (fiquei todos esses dias sem escrever). Eu fiquei feliz, sabe, porque enquanto o Kinome dizia essas coisas, Huyu entrou de súbito no quarto: ele veio me salvar! E ainda fez mais, ele falou pro Kinome que o Kyuubi estava chegando, o que não era verdade – ele mente muito mal, e ninguém seria capaz de acreditar naquilo. Mas ele já entrou no quarto dizendo que queria falar comigo, e me puxava pelo braço. É lógico que o Kinome foi embora, provavelmente furioso... sabe, é arriscado fazer o que ele fez, porque Kinome manda como bem entender sobre o Chakra... mas eu fiquei muito contente porque ele fez aquilo! (Huyu é um príncipe...) Eu contei a ele que eu seria "iniciado" e que estava com medo. E somente à tarde, veio o próprio Kyuubi me falar a respeito, ele disse como se a iniciação fosse um convite, e somente eu poderia optar por fazê-la ou não... desde a última quinta-feira, os meninos daqui não param de me olhar, é engraçado porque não sinto mais como se eles me estranhassem, me sinto como uma espécie de "ídolo": ganhei um pouco de respeito. O Kyuubi me tranqüilizou, disse que não é nada de mais que vai acontecer, apenas uma espécie de teste...

É uma situação bem esquisita a minha dentro deste Templo. Porque eu cheguei por último, consegui me situar nas matérias, fiz os testes que deveria ter feito (e eu nunca disse que aqui, em termos escolares, seja uma má escola, apesar de tudo...) e, digamos, ainda cheguei à frente da minha turma; Huyu é, notavelmente, um aluno inteligente, mas por alguma razão parece que evita se sair bem nas matérias... na aula de Cabala e Praticas Ocidentais, Kyuubi fez uma experiência pratica, é uma aula de magia realmente, no sentido literal, (além de ter uma aula irmã, Yoga e Praticas Orientais, também de magia), ele posicionou nove velas no chão, e ele era capaz de acendê-las, apenas usando sua "Vontade" (foi a palavra que ele usou). Ele me apresentou aos alunos como quem será iniciado, e disse que, se eu conseguisse repetir a experiência, certamente não terei dificuldades. É estranho ver todo mundo me notando na classe, mas eu estava um pouquinho orgulhoso, é verdade... enfim, eu consegui acender as velas! Eu soergui um pouco minha mão direita, e elas acenderam! não senti nada quando aconteceu, apenas fiquei sem entender, muita coisa já passou por minha cabeça... será que as velas não se acendem sozinhas, por algum tipo de mecanismo enganador?

Já era noite no Chakra, Anju desceu as escadas, muito nervoso e tímido, ao que parece todos os garotos esperavam por esse momento. Ele então subiu correndo pro seu quarto novamente...

Huyu entrou por a porta, "você está bem?". Anju não disse nada, nem precisava. Huyu puxou um de seus braços, aproximando-o de seu corpo. Anju deitou a cabeça sobre o tórax de Huyu, e sussurrou assim: "Eu quero...", e não completou...

"Você quer?..."

Huyu! – disse Anju, procurando os olhos do outro: essa foi a primeira vez que você não me adivinhou... – eles sorriram um ao outro.

Os dois desceram, lá embaixo encontraram com Ibuki, que com poucas palavras, desejou boa-sorte a Anju; Huyu parou junto de Ibuki.

Por coincidência, era Luke quem carregava um vidro quase transparente de uma sala a outra. Anju o acompanhou, observando bem... "Você tem sorte... só os melhores podem ser iniciados no Chakra" – foram suas palavras, meio sem sentido.

Anju suspirou.

"Aquele garoto, Hatsukoi, ele e você... Vocês estão juntos? Digo, vocês são mesmo muito amigos, né"... Anju nunca havia ficado tão vermelho, suas bochechas chegavam a arder; nem teve tempo de responder... Vocês dois, – continuou Luke: são os garotos mais respeitáveis do Chakra, o futuro deste templo... e muito bonitos também – disse enquanto já colocava a tela no chão da sala. Foi então que Kyuubi entrou.

Lá fora estava Kinome, assistindo, indiferente, a tudo.

Mestre Kyuubi, disse o músico Luke: eu estava contando ao Namidatou que ele deve ser mesmo muito especial, ao templo, não é mesmo?

Luke saiu da sala e ficou esperando à porta. Kyuubi anunciou a Anju, – do lado de fora, todos se apertavam para ouvir –, lá dentro, Anju havia de encontrar-se com um amigo e com um inimigo; e poderia decidir o que fazer com eles.

Eu e Kyuubi saímos da sala mais uma vez. Era uma sala bem próxima à sala chamada Morte. O garoto que dá aulas de Armas Brancas veio trazendo, sobre uma bandeja, uma pequena e grossa vela branca, um punhal de cabo esverdeado, e uma pequena tigela de porcelana vermelha com aquele líquido (que é o segredo de todo o processo ritual) que eu me lembre era isso... Então Kinome tocou meus ombros por trás, ele deveria me levar para a troca de roupas – se eu fiquei com medo?...

Kinome e Anju ficaram a sós em um quarto, mas enquanto Kinome separava algumas peças de vestuário, entrou no quarto um senhor – era o cabeleireiro. Anju já estava sobre-avisado que deveria ter cabelos e unhas sacrificados para a cerimônia. Anju pediu que não lhe deixasse o cabelo muito baixo, já que sempre usara-o comprido; foi feito, Anju de cabelos curtos tinha certa beleza entre o masculino e andrógino, ficou muito bonito. Depois disso, Kinome tirou as roupas de Anju.

Ele não precisava encostar em mim para que eu soubesse que ele pensava coisas horríveis. Ele viu meu corpo todo nu. Acho que a minha sorte é que o cabeleireiro estava ali. Todos ficávamos em silencio.

Kinome tinha uma pequenina tigela de porcelana redonda, dentro dela uma tinta aquosa em tom alaranjado. Ele desenhou sete pontos por sobre o corpo de Anju, sendo o primeiro na testa, e o último um pouco acima da região pubiana. Kinome estremecia, – de longe, já não era o mesmo grão-vizir calmo e calculista de antes... Sobre cada ponto, ele repetia, em sua voz metálica: "Chakra".

Depois, Kinome vestiu um kimono sobre o corpo de Anju e acompanhou-o novamente para a sala. Quando saíram já era noite, e Anju estranhou pois devia ser mais ou menos cinco ou seis horas da tarde. Kinome não disse mais uma palavra.

Anju entrou na sala, todos ficaram do lado de fora; apenas procurou localizar cada objeto: a vela apagada no chão, o punhal cravado ao centro da Sala, e o pires do liquido ali, próximo ao local onde ele se sentou em posição meditativa. Do lado de fora, Kyuubi pediu que ele bebesse, foi o que fez, e não disse mais nada. Não havia lua no céu durante essa noite, foi então que Kyuubi pronunciou assim: "Hécate!"; e encerrou a porta, embrulhando com um pequeno colar de contas a maçaneta. Por certo tempo, os meninos ainda ficaram ali, como se esperassem que algo inusitado inda pudesse ocorrer; e como nada acontecia, foram se dispersando mais e mais. "E vocês, acham que ele vai ficar bem?", perguntou Luke indo na direção de Huyu e Ibuki; "Você não fica preocupado?" – insistia o músico, questionando Huyu. Ibuki apenas observava tudo, não parecia estar gostando; Huyu também se mostrou um pouco irritado, apenas negou meneando a cabeça. Ibuki, depois, puxou o amigo por o braço, "Vem, eu quero conversar com você, Huyu... vem, vamos sair daqui"... Kyuubi também se afastou, e Kinome fora o último que ainda contemplava a porta lacrada da sala ritual, exibia uma expressão doída e triste... já passado algum tempo, Kyuubi recostou suas frias mãos sobre os ombros de Kinome, "precisamos conversar, venha comigo". Kinome, ouvindo isto, rebentou em lágrimas, até que entraram na sala de Kyuubi, e nesse dia ninguém mais os viu.

"Foi você que mandou aquela rosa?" – perguntava Ibuki a seu amigo. "Foi você, Huyu? O que você sente por o Namidatou? pode me explicar?", Ibuki perdera toda a sua futilidade costumeira, acusava Huyu com rancor. "Me explica, por favor!"...

CONTINUA...

Hanazaki Sono-san

N.A.: Eba, capítulo dois! Eu fiz isso! Com muito custo e lutando contra mim mesmo! eu fiz!

Bem, Titio Sono-san veio avisar que talvez o capitulo três demore um poquinho v.v... Depende de vários fatores...

E aí, pessoas (se é que tem alguém me lendo), o que estão achando de "O Chakra"?

Devo continuar com isso, ou já posso desistir? E sobre os personagens, o que estão achando? Dêem suas opiniões, até mesmo pra eu saber em que pontos estou sendo repetitivo, previsível, sádico hehehe... Para que eu possa (ou não) me corrigir, seria legal receber comentários de quem leu, por favor...

Mais uma vez, imploro, encarecidamente, que quem gostou e está me lendo agora (novamente obrigado!), recomende, divulgue! Ah, e não perca o próximo capitulo, vai ter mais limão, promessa (este talvez tenha deixado um pouco a desejar), e alguns personagens ganharão mais voz, outros a perderão – sim, já informo, com antecedência: no capítulo três a morte se fará presente...

Arigatou Gozai masu!

Sono-san!