O TOQUE DE LUCAS
CAPÍTULO 7
- Olá, Lucas - O homem diante dele apenas ajeita os ôculos. Quando soube que seu sobrinho estava ali, veio o mais rápido que pode, chegou a abandonar as pesquisas que estava fazendo no Egito. Poderia ter chegado bem mais cedo, mas um problema em seu projetor de hologramas lhe causou grandes problemas - não vai me convidar para entrar?
- Espera, você... o que houve com... - Lance olhava Hank como se uma segunda cabeça tivesse surgido em seu pescoço - mas você era todo... peludo?
- Olá, Lance - e o observava - não tem aprontado, não é mesmo?
- Ora, quem o senhor pensa que... - e se silenciava, dando-se conta da situação - Luc, depois eu dô uma passada aqui, tá bom?
- Certo... - e continuava ainda de olhos arregalados - a gente se vê por ai. Tio... tio Henry, o senhor...
- Perdoe os meus modos, Lucas - e entrava rapidamente na casa, fechando a porta em seguida - mas não é seguro permanecer muito tempo do lado de fora - e dava uma batida em seu braço, encarando o sobrinho - e você? Com tem passado?
- "Como tenho passado"? Estou te procurando desde que cheguei e isso é a única coisa que o senhor tem a me dizer?
Hank para o que fazia, dando-se conta da situação. Foi uma viagem sofrida, mas finalmente conseguiu chegar até Bayville. Estava fazendo importantes pesquisas no Egito e teve que voltar o mais rápido possível quando recebeu a noticia de Xavier. Não que o aparecimento de seu sobrinho por ali não fosse algo realmente importante, mas os assuntos que estava tratando do outro lado do mundo - com a ajuda de alguns velhos amigos - eram de vital importância, tanto que ele só veio por que Charles o colocou a par de toda a situação. Confiava em Xavier e sabia que ele poderia cuidar bem de Lucas, mas o fato de ver Alvers sair da casa de seu único parente vivo abriu seus olhos para a verdadeira natureza da situação.
Claro que também estava um pouco sem jeito, sem saber como agir naquela situação. Quando sua mutação começou a acontecer, ele se afastou de todos em busca de uma cura, de modo que tal coisa acarretou no afastamento de sua família... deixando-o longe de sua irmã quando aquele terrível acidente aconteceu... e o afastou de Lucas durante anos importantes de sua vida.
Mas algumas coisas ele ainda sabia fazer. Dando um passo à frente ele abre os braços, enlaçando o adolescente à sua frente, o qual retribui. Lembranças antes esquecidas fervilhavam em sua mente, frutas de uma época em que as coisas eram bem mais simples do que se podia imaginar.
E, para Lucas, as mesmas memórias retornavam, da época em que a vida era algo simples, do tempo em que era uma criança arteira que aprontava pela rua com seus amigos, e que adorava brincar com seu tio.
Dias de um Passado esquecido. Não, esquecido não, quase.
Passaram um bom tempo daquele jeito, abraçados. Na verdade, perderam a noção do tempo, e nem se importavam com isso. Sabiam que havia muito a ser dito, muito a ser compartilhado.
Muito tempo se passou e, finalmente, haviam se encontrado. Não eram mais a criança peralta, tampouco o jovem visionário. O toque dos anos cuidou para que cada um tivesse sua cota de experiências - boas e desagradáveis - assim como cuidou para que as marcas, as cicatrizes de batalha, ficassem marcadas em seus corpos, mentes e almas.
- Você cresceu - Hank falava enquanto permanecia abraçado a ele - desculpe ter sumido - e perdia a noção da força utilizada.
- O senhor também está diferente - e sentia alguns ossos estalando, junto de outras coisas - o senhor se importa...?
- Oh, desculpe! - e se afastava um pouco - às vezes perco a noção da minha própria força!
- Percebi. O senhor usa esse indutor de imagens a todo instante? - e apontava para sua face.
- Não - Hank dava um tapa em seu braço, nem se dando ao trabalho de questionar como Lucas havia adquirido tal conhecimento - na verdade, não costumo me afastar muito do instituto Xavier.
- Nota-se. O que mais o senhor tem de novo, além de pelos?
- Eu... mudei bastante - e retirava seus ôculos, colocando-os sob a mesa - talvez isso te surpreenda.
- Ultimamente só tenho tido surpresas, tio.
- Não tanto quanto essa - e desligava seu indutor, mostrando sua verdadeira face para o sobrinho, a de um homem-fera, coberto de pelos azuis, presas, orelhas pontiagudas e tudo mais o que acompanhava o "kit de mutação".
- Hmmm... - ele se aproxima e toca no braço de seu tio, observando-o - não compreendo...
- Eu sei o que você vai dizer... mas eu ainda não tenho a resposta.
- Pêlo.. Mas eu não deveria ter também? A propósito, aquele cara, o Kurt, ele...
- O que tem ele?
- Talvez eu esteja errado, mas quando eu conversei com ele hoje de manhã, podia jurar que havia algo mais em seu braço, sabe.
- Ah, você percebeu. Você é muito perspicaz.
- Nem tanto, mas... quer dizer, pensei que ele só tivesse uma pele azul, e não pêlos!
- Não tenho nada a ver com isso - e dava um sorriso maroto - disso você pode ter certeza.
- Sim, claro... mas algumas características só podem ser adquiridas dentro de um grupo, concorda? Se ele tem pêlos, então alguém da família dele também os tem. E se o senhor tem, eu também deveria ter, não concorda?
- Sim, sua lógica procede, mas... - ele estava tentando arrumar algum argumento - o que houve com o garoto peralta que eu colocava na carcunda e ficava me assistindo durante o treino de futebol? Ele ficaria surpreso ao ver o quão peludo o tio ficou.
- Sim, ele ficaria... se ainda fosse inocente. - e fitava seriamente a face de Hank, como se aguardasse uma resposta.
- Eu entendi o que você quer dizer.
Na verdade, entendeu bem até demais. A questào era: o que fazer?
- Não faça essa cara, tio - ele sorria - tá certo que eu cresci, mas... ainda sou o mesmo de sempre! - e se aproximava, dando-lhe outro caloroso abraço.
Tão caloroso que até ele ficou confuso. Como alguém tão afetuoso e amável poderia ter causado tantos problemas para os X-men?
- A gente tem muito o que conversar, rapaz. Muito!
- Eu sei, tio. Mas agora que o senhor está aqui, sei que tudo vai dar certo. Foi por sua causa que eu vim até aqui... a única razão de eu ter voltado.
- Eu sei, desculpe não estar aqui, mas quando te chamei, aconteceram tantos problemas e...
- Não tem problema - e o encarava seriamente - não tem problema, mesmo. Mas... o senhor vai me ajudar não vai? - e o fitava com uma expressão de dar dó, capaz de amolecer até mesmo o coração rabugento de Logan.
- Claro - e, intimamente, sentia um aperto no coração ao sentir que iria se arrepender - não se preocupe, vai dar tudo certo, Lucas. Prometo.
- Eu sei, tio - e, naquele momento, todas as luzes da casa se acenderam - eu sei.
- E você, como tem se virado? – ele perguntava, se afastando um pouco e olhando o local.
- Estou vivo – e ajeitava a roupa cheia de pelos.
- Não dá muito trabalho cuidar sozinho de uma casa?
- Meu pai me manda uma ajuda mensal, tio.
- Sim, mas existem outros problemas, como a luz, o gás e...
- Não há problemas – ele estala os dedos e as luzes de toda a casa, menos do aposento aonde estavam, se apagam – por hora consegui uma bateria que usarei para juntar a energia necessária, mas... – ele vai até a estante e puxa um pequeno papel – tenho alguns projetos – e abre o papel para seu tio ver.
- Hmmm... Interessante, vejo que esteve bastante ocupado...
- Quando eu terminar com isso, terei toda a energia da qual preciso.
- E para que precisa de tanta energia? – ele o olhava de lado. – pelo que estou vendo aqui, você irá gerar mais energia do que uma casa usando tal modelo iria precisar.
- Não é apenas para a casa, tio. Usarei mais para o laboratório.
- Laboratório? – ele estava surpreso – mas... para que um laboratório, Lucas?
- Há muito o que ser feito – ele fechava o papel, devolvendo o olhar – e eu preciso da sua ajuda para tanto, tio. Seu intelecto, sua pesquisa... preciso disso para me ajudar.
- E para que? – Hank caminhava pela sala, como se tentasse reunir todas as pontas soltas, as informações que lhe foram dados por Xavier e essa conversa com seu sobrinho, tentando encontrar uma resposta – com qual propósito?
- Ora, tio – ele maneava a cabeça, sorrindo de forma divertida – não lhe é óbvio?
Não, realmente não era óbvio, mas as palavras dele ecoando pela sala foram mais do que suficientes para esclarecer toda a situação.
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- Eí Lance, viu o Lucas por ai? – Thabita perguntava assim que via o rapaz de cabelos castanhos entrar no alojamento.
- Em casa – e abria a porta da geladeira, pegando a caixa de suco e bebendo de um gole só o pouco que restava.
- Em casa? – ela olhava para trás, vendo Blob estirado no sofá – Fred, você não disse que ele não estava em casa?
- Hã... puxa, quer dizer... eu não tinha procurado ele lá e... – ele se joga pra trás do sofá quando a vê formar uma de suas esferas explosivas – ei, vai com calma!
- O que aconteceu, Lance? Vocês sumiram!
- Mas heim? Desde quando você se preocupa comigo?
- Quem disse que eu me preocupo com você? Estou preocupado com o McCoy, oras! Ele cozinha bem demais pra morrer!
- E eu ainda te dou bola – ele maneava a cabeça – ele ta lá na casa dele conversando com o tio.
- O tio? – ela erguia uma sobrancelha.
- Tio? – Fred, erguendo a cabeça por detrás do sofá, ouvindo o comentário de Lance.
- É, o McCoy, lembram?
- O bicho peludo? – Thabita se lembrava do ex-professor da BayVille. – Putz! Há, é agora que ele entra para os X-men – e sorria debochadamente para Lance.
- Eu não acho.
- Desde quando você o conhece tão bem assim?
- Bem... – ele dá uma batida em sua jaqueta, limpando a poeira que havia nela – digamos que eu o conheço melhor do que você...
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Ele caminhava pela sala, como se tal ato pudesse espairar melhor sua mente, como se pudesse trazer as respostas de que tanto precisava.
Sim, pois era isso que ele necessitava, de respostas!
Nunca fora pai e, ao longo dos anos em que passou no exílio, questionou se um dia chegaria a ser, ainda mais devido a sua condição mutagenêtica, pois não queria passar adiante o que, um dia, considerou uma "maldição".
E, parado no mesmo lugar, aquele adolescente apenas fitava o ser peludo que dava voltas, quase fazendo um buraco no chão.
O que dizer? Era simples dar lições, castigar estudantes rebeldes, repreender pessoas com problemas e autoridade, esclarecer dúvidas e(tentar) solucionar problemas gerados por crises hormonais, mas... como proceder diante daquilo?
Não era uma mera neura, uma idéia repentina, nada disso. Justamente por isso ele acabara de perceber o quanto Lucas era parecido com ele. Na verdade, parecido demais para o seu gosto.
- Por que você precisa de mim? – ele tentava não encara-lo, ainda andando – eu não obtive sucesso, por que eu?
- Eu preciso fazer isso, tio.
- Mas não vai dar certo, Lucas. Não funcionou comigo, por que funcionaria contigo?
- Eu tenho que tentar.
- Perda de tempo. Se me acompanha há tanto tempo, sabe que o que eu digo é verdade.
- Será mesmo? Muitos tiveram sucesso aonde outros falharam.
- Isso é impossível, Lucas. É a ordem natural das coisas, não pode fugir disso.
- Não comece a falar de destino, por favor.
- Você me entendeu, não tem nada a ver com destino.
- O senhor também me entendeu. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Se o homem tivesse um medo eterno de tentar, de se aventurar pelo desconhecido, ainda estaria vivendo em cavernas.
- Isso é ambição, não confunda as coisas. O meu problema era que eu não queria aceitar minha situação e... – Hank pisca os olhos rapidamente quando se dá conta que Lucas, o qual estava do outro lado da sala, no instante seguinte estava bem na sua frente, cara a cara com ele.
- Importa-se de parar de andar e me encarar? Não é uma situação nova para o senhor agir dessa forma.
- O que te aflige tanto? Não é tão ruim assim, sabia?
- Me admirar o senhor dizer tal coisa, já que também tentou durante anos e anos.
- Acredite, não é. E ainda não consigo compreender qual é o seu problema.
- Tio... o senhor irá me ajudar?
- É o que tanto me pergunto, Lucas. Temo por você.
- Não estou perdendo meu tempo, se é o que tanto te preocupa.
- Tenho medo pela sua dedicação para tal coisa, e pela decepção que poderá ter.
- Mesmo? – ele dá a volta, sentando-se em uma cadeira – por algum acaso o que te assusta tanto não seria a possibilidade de eu realmente ter sucesso? – e o olhava de maneira bastante... desafiadora.
Na verdade, podia jurar que era sua falecida irmã o encarando.
- Você se tornou um bom rapaz, tem muito da personalidade de sua mãe. Na verdade, ela teria dito exatamente o mesmo que você.
- É o sangue McCoy em minhas veias. E então? Vai me ajudar ou não?
- O que acha de vir comigo até o Instituto Xavier? Se faz tanta questão de um laboratório, tenho certeza de que o professor irá deixa-lo usar as dependências dele com o maior prazer e...
- Eu já expliquei isso para ele, tio. Não quero me sentir em débito com o professor Xavier, simplesmente por que não compartilho dos mesmos ideais que ele. O professor Xavier é uma grande pessoa – ele olha pela janela, admirando o entardecer – mas eu não sou tão... bom, eu não sou como ele. Não compartilho dos sonhos dele – e abaixava a cabeça – ao menos, não agora.
- Como disse?
- Nada. Tome, vai precisar disso para sair – e lhe joga um pequeno aparelho que lembrava uma espécie de relógio, só que...
- Meu projetor holográfico?
- O senhor deixou cair, eu apenas o peguei.
- Não adianta muito. Quebrado ele não tem muita utilidade. Seu telefone funciona? Vou telefonar para Xavier e...
- Acho que está funcionando seu aparelho.
- Duvido muito, já que... – ele aperta o botão puramente por reflexo, e no mesmo momento uma luz toma conta de seu corpo, desfazendo-se em seguida e revelando a forma "normal" de Henry McCoy.
Hank, por sua vez, estava paralisado de puro espanto, simplesmente por que não conseguia acreditar naquilo. Ao seu ver, era inconcebível que aquele garoto tenha concertado o aparelho.
- Eu te acompanho - abria a porta, sinalizando para seu tio – vamos, o que foi? Seu queixo vai cair se ficar assim, desse jeito - e fechava a boca de Hank, embora não seja capaz de desfazer o olhar dele.
Simplesmente... estupefato.
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- Tem certeza de que não quer vir conosco, Vampira? – Kitty a fitava com um olhar deveras infantil – por favor...
- Eu não... não estou me sentindo bem, Kitty – e virava o rosto, observando o Sol se pondo. – vão sem mim.
- Ah, mas não vai ser a mesma coisa sem você, por favor! – e tentava animá-la, falhando do mesmo jeito – vamos, assim você aproveita e se anima!
- Não estou a fim de sair, e os rapazes estão infantis demais para o meu gosto.
- Quem disse que eles vão? Só as garotas que vão, não eles.
- Desculpe, mas não estou a fim. Vão sem mim, alguém tem que fazer companhia para a Jean – e continuava olhando pela janela – eu não serei uma boa companhia e... o que foi, Rahne?
- O senhor McCoy está por perto – Rahne Sinclair, vulgo Lupina, se aproxima da janela, como se tentasse enxergar algo. Seus sentidos não eram tão apurados como quando tomava a forma de lobo, mas ainda assim eram mais aguçados que os das pessoas comuns. – sinto o cheiro da loção dele e... – ela se metamorfosea, assumindo a forma que era um híbrido de mulher-lobo – oh-oh!
- "Oh-Oh"...? – Kitty e Vampira falavam em uníssono – como assim, "Oh-oh"?
- Ele está acompanhado... na verdade – ela retorna a sua forma humana – eu não sei por que estou surpresa.
Enquanto isso, no Hall do instituto, Charles permanecia próximo a escada, analisando toda a situação. Podia sentir a mente de ambos mas, por motivos éticos, não as acessava.
Pois sabia que aquele era um momento só deles, um momento único, intimo e pessoal, e era esse o preço a ser pago por ser um telepata. Poderia ler mentes e desbravar segredos, mas sua consciência era a barreira que lhe impedia de usufruir livremente do que tinha.
No entanto, ser a mente mutante mais poderosa do planeta não o tornava imune a outros males.
Como o receio e a preocupação extrema, por exemplo. Acreditava totalmente no livre arbítrio das pessoas – tanto que, embora o Instituto sempre tenha estado livre para qualquer mutante que desejasse adentrar nele, nunca obrigou ninguém a assim faze-lo – mas era justamente por isso, por todas as coisas que já teve o prazer – e desprazer – de presenciar, que temia tanto.
Seus alunos, tão cheios de vida e sonhos, foram os que mais se assustaram nas vezes em que descobriram que a vida era muito mais do que estava diante deles. Como podiam imaginar que seu professor estava mais ligado aos assuntos mutantes do que uma mera instituição, que sua ligação era maior, a nível governamental?
Como poderiam imaginar que haviam outros seres neste mundo dotados de capacidades além da compreensão humana, e que não eram como eles, mutantes?
Seu irmão era uma prova disso.
O mundo era um lugar muito perigoso, no fim das contas. Não que esperasse protegê-los para sempre. Não era essa sua função, e sim dar-lhes o entendimento, a noção do que realmente eram e sua função neste mundo.
Como eles agiriam, dependeria única e exclusivamente deles mas, em seu íntimo, acreditava estar instruindo-os corretamente.
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- A gente se vê por ai, tio – e tinha um sorriso de um lado ao outro da face.
- Sim – ele abraçava Lucas pela última vez, dando um passo para trás – então, o que eu posso dizer – e cruzava os braços – céus, eu realmente não levo jeito para bancar seus pais... vivo dando conselhos para os outros alunos, mas para você...
- O que foi? – ele sorria, divertido. Na verdade, estava muito mais alegre do que aparentava.
- Eu não sei o que dizer para você, lamento.
- O senhor não precisa dizer nada, tio Hank. Sua presença já me faz mais feliz!
- Então venha comigo! – e, pela primeira vez, demonstrava seu descontrole – por que tem que fazer isso? Escute, Lucas... eu sei como são essas coisas! – e o segurava pelos ombros – eu perdi muito tempo da minha vida reprimindo meus instintos, quando na verdade descobri que isso não era possível. Você não pode negar o que há dentro de você, compreende? Fui omisso por muito tempo, não me acho no direito de estar te dizendo isso, mas...
- Não tem nada a ver com o senhor, tio Henry – ele mantinha a mesma expressão.
- Então... o que é? Você disse estar feliz com a minha presença, mas como espera que eu fique em paz com o que você pretende fazer?
- Apenas me dê uma chance, tudo bem?
- Mas...
- "Somos cientistas, tio" – ele sorria, mas de maneira séria – queremos descobrir por que a Terra é redonda, o céu é azul e o pão sempre cai com a parte da manteiga virada para baixo, não é mesmo?
- Não pode lutar contra isso, é o ciclo natural das coisas, Lucas. Mudanças ocorrem desde o principio dos tempos, você não pode simplesmente...
- Negá-las? – ele afastava os braços de Hank – por que não? Não estamos sempre desbravando o desconhecido a procura de nossos limites? Não somos muito diferentes, tio.
- A diferença principal entre você e eu, é que eu já passei por tudo o que você quer passar, meu caro. E é justamente por isso que temo pelo seu estado.
- Meu estado? – ele erguia uma sobrancelha – ah, quanto a isso não se preocupe. Pior do que estou, não tem como ficar.
- Hmmm? – Hank erguia uma sobrancelha depois desse último comentário. – espere um pouco, o que você quer...
- Ora, tio... mesmo que sejam as mesmas situações... as mesmas dores... os mesmos tormentos... serei eu, e não o senhor. E isso é algo do qual o senhor não pode me privar, da experiência em si. Tem coisas pelas quais todos nós passamos, não é mesmo?
- Mesmo sabendo dos resultados?
- Quem sabe? A vida é cheia de incertezas, pois o amanhã não nos pertence, não é mesmo?
- Não precisa ser assim, e você sabe disso. Charles, ele...
- Eu estudei o professor Xavier, seus livros... também assisti algumas de suas palestras. Sempre o imaginei como uma pessoa com um grande envolvimento com a causa mutante, mas... é melhor assim, tio Henry. Por favor, respeite minha decisão.
Hank fica mudo. Não teria muito o que dizer depois das últimas palavras dele, não por hora. Mas não demorou para perceber que a falha no argumento do sobrinho estava justamente na essência do argumento.
Mas também não era um bom momento para tocar naquilo, não ali, nem agora. Teria tempo para isso, e ainda teria que pensar melhor no que dizer, para não dar margem alguma para contra-argumentações.
Não que fosse o fim, mas sentia que, no "primeiro round", fora derrotado, vencido, simplesmente por que achou que seu sobrinho fosse apenas um adolescente passando por uma crise de hormônios, as quais estavam afetando diretamente suas decisões.
Não eram.
Bem, talvez fossem, mas médico algum seria capaz de resolver os problemas pelos quais um adolescente mutante passava, não do modo convencional.
- Eí! – uma voz terrivelmente familiar para ambos era ouvida – você de novo!
Ambos se viram, observando o carro que estava parado diante do portão do instituto.
O carro de Scott e, pra variar, acompanhados dos rapazes.
- Isso que é usar todo o espaço disponível – falava Lucas, percebendo que eles estavam um tanto quanto apertados ali.
Independente do comentário, ambos se dão conta de que estavam bloqueando a passagem, e saem do caminho, apesar do carro continuar parado.
Não demorou para Hank perceber um certo ar de animosidade entre os rapazes. E a julgar pela forma como todos encaravam seu sobrinho – além de seus ferimentos – seria um "desafio" resolver essa situação.
- Como a Jean está? – ele quebra o silêncio auto-imposto por todos – Melhor?
Ciclope vira o rosto para Lucas, encarando-o. Não era possível ver a cor dos seus olhos devido aos óculos, mas não era preciso ser um gênio para saber o jeito como ele o olhava.
Scott, por outro lado, se mantinha o mais calmo e sério possível. Tentava de todas as formas conseguir respostas, mas não as obtinha. Usou de todos os seus recursos, mas nada lhe vinha a mente.
Ele não era como Forge que, apesar de ter recusado o convite para ficar no instituto, ainda assim sempre estava presente.
Não era exatamente algo pessoal, mas até então, aquele novo mutante demonstrou ser um perigo para todos, e o estado de Jamie – o qual estava no banco de trás do carro – era uma prova disso.
Não sabia direito o que o professor Xavier viu na mente dele, mas independente do que fosse, não servia de consolo.
Aquele sujeito, ele... ele lhes deu uma senhora surra na noite anterior... como ficar tranqüilo, como se nada tivesse acontecido?
Ele não era como Lance ou os demais membros da irmandade dos mutantes, que eles, mutantes ainda aprendendo sobre si mesmos, podiam deter, em caso de necessidade.
Na verdade, teve a leve impressão de estar enfrentando Magneto, algo que faziam constantemente em suas simulações.
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- Ai meu pai do céu... Kitty fechava o rosto – eu nem quero ver no que isso vai dar – e disputava a janela com as demais garotas, as quais estavam assistindo tudo aquilo de camarote.
- O que foi? – Amanda também se aproximava, assim como Jubileu, de forma que todas as garotas, com exceção de Jean, que descansava na enfermaria, e Ororo, que cuidava dela, estavam na janela – ei, é o professor McCoy! Ele voltou!
- E ai, quem é que vence? – Rahne só não pulava de emoção por causa da falta de espaço – será que o Berserker vai levar a melhor agora? – a jovem apontava para o amigo, um dos rapazes no carro que não pareciam estar nem um pouco contentes por terem encontrado com Lucas tão cedo.
- Cês tão malucos? Ele deu uma surra em todo mundo da última vez! – Kitty esbravejava, mas não escondia que realmente estava com vontade de assistir aquilo.
- Eu vou até lá! – Vampira corria até a porta e já estava ultrapassando o corredor.
- Ué, ela Não estava desanimada? – todas menos Kitty exclamavam, não entendendo aquilo.
Pensando bem, estavam entendendo sim, e bem demais.
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Por ser um homem-fera, Hank McCoy possui algumas características não tão evidentes, mas igualmente proveitosas.
Uma delas eram os seus sentidos apurados, os quais ele utilizava para avaliar melhor a situação.
Como o cheio, por exemplo. Podia ser algo estranho de se explicar, mas podia sentir o estado emocional das pessoas pelo cheiro que exalavam.
E não nutriam a melhor das intenções para com seu sobrinho, disso tinha certeza. Na verdade, estavam muito furiosos.
No entanto, seu olfato não era a única coisa apurada que ele dispunha no momento. Sua audição também era captar freqüências que, em geral, as demais pessoas não conseguiam. Como passos vindo de dentro da propriedade do instituto, ou o batimento cardíaco dos rapazes.
Acelerado, por sinal. E a julgar pelos últimos acontecimentos, diria que eles estavam assustados de estar ali. Um constraste de ódio e medo, por assim dizer.
- Lucas? – uma voz um tanto quanto assustada interrompe seus pensamentos, e ele agrade aos céus por isso.
- Hmmm? – ele olha para dentro da propriedade do portão, avistando a dona da voz – Vampira?
- Oi – ela toca no portão, aproximando sua face – veio nos visitar? – sua voz estava bem baixa, mas incrivelmente calma.
- Não, dessa vez não. Só vim acompanhar o meu tio até o portão.
- Pena – e isso deixou tanto Hank quanto Ciclope de orelhas em pé – não quer mesmo entrar para tomar uma xícara de chá?
- Até queria, mas fica pra próxima – ele se aproxima do portão de ferro, tocando nele – tenho que resolver algumas coisas agora.
Não era o fato daquela conversa parecer animada que o deixava de orelhas em pé.
Também não era a animação na voz de Vampira, a qual era deveras perceptível. Até mesmo suas amigas do outro lado do muro, assim como os rapazes no carro perceberam.
E nem mesmo a expressão descontraída, o brilho de seus olhos.
O que realmente lhe chamava atenção, era o fato de Vampira não estar usando luvas e... estar tocando na grade do portão, quase encostando na mão de Lucas.
Quase. Por diversas vezes teve vontade de segurar no braço do sobrinho e afasta-lo, mas... não o fez, por que... a expressão, o jeito que ela o olhava, o impedia.
- Eu venho te visitar um dia desses, tudo bem? By, by! – e saia andando – até mais, tio!
- Até – e se despedia, puxando-o para um longo e caloroso abraço – cuide-se, ok? – e o apertava ainda mais.
- Assim o senhor me machuca – e realmente estava machucando.
- Fazer o que? Minha vontade é não te deixar ir.
- Quem sabe? – e sorria, afastando-se – o amanhã não nos pertence, sabe-se lá o que pode acontecer, não acha?
- Verdade – e o observava atentamente partir, enquanto o portão se abria, apesar dos rapazes continuarem observando seu sobrinho se afastar, até que ele some por completo do seu raio de visão.
Adolescentes – ele observa o olhar sonhador de Vampira. Não precisava usar seu olfato para sentir o estado emocional dela. Não parecia existir uma explicação exata para tanto mas, de alguma maneira que ele não compreendia até o presente momento, algo deve ter acontecido entre ambos, algo que, de certa forma, os aproximou – sempre os mesmos.
A diferença era que agora tinham poderes. Mas os hormônios continuavam fazendo os estragos de sempre.
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- Aposto essa fatia de pizza que você erra, Lance! – Thabita zombava dele.
- Errar, eu? – e lançava a bola de boliche contra os pinos, conseguindo a façanha de não acertar um sequer – Droga!
- Ah, seu tonto! – e espetava o garfo no último pedaço de pizza que estava sob a mesma – mais uma pra mim!!!
Fred estava literalmente babando. Quem mandou aceitarem o desafio dela? Até agora não tinham conseguido acertar um pino sequer – mas que diabos de azar era aquele? – e Thabita estava comendo a pizza sozinha!
Todd vez ou outra capturava alguma mosca sem que ninguém visse, enquanto que Pietro estava sentado, com os cotovelos na mesa, pensativo.
- Eí, Maximoff! – Thabita mexia no seu cabelo – se não vai comer a pizza, eu fico com o teu pedaço, falou? Se não vai apostar, então não fica admirando ela a noite toda! – ele não respondeu – Ih, que ta havendo contigo, heim?
- Que foi, Pietro? – Fred se aproximava – está se sentindo mal? Dor de barriga?
- Ele deve tá com fome! – Todd reclamava – essa doida aqui comeu toda a nossa pizza!
- Será que vocês não conseguem ficar quietos? – e esbravejava, erguendo-se e indo até outra mesa, ficando distante deles.
- Ih, lá vai o revoltado! – Thabita falava enquanto mastigava – Menos mal, sobre mais pizza! O Lance, essa bola sai da sua mão ou não sai, heim?
- Dá pra fazer silêncio? Isso aqui exige silêncio e concentração, e não...
- E ai, demorei muito? – Lucas dá um tapa no ombro dele, fazendo-o largar a bola de boliche antes da hora e repetir, mais uma vez, o milagre anterior – xiii...
- Grrr!!! Olha só o que você fez!!!
- Eí, vai com calma! – ele dava um passo pra trás – foi sem querer!
- Isso Não importa! E já viu que horas são? Por onde andou?
- Você disse que iria estar no boliche, Lance. Mas você não me disse em QUAL deles, lembra? Sabe quantos boliches existem na cidade? Primeiro pensei que era o mais perto da escola, mas quebrei a cara. Daí para o resto...
- Demais, finalmente meu escravo chegou! – Thabita falava em tom alto e claro para todos ouvirem – escuta, cê Não vai falar com a sua dona não, é?
- Escravo? – ambos se olhavam de forma peculiar, não entendendo aqui.
- Você mesmo, anda!
- Que papo é esse de escravo?
- Não se faça de desentendido, McCoy! – ela dava um puxão de orelha nele, obrigando-o a se sentar – Ontem eu vi uma estrela cadente e desejei um escravo que cuidasse do alojamento, daí você caiu na nossa casa.
- Ei, espera um pouco, aquilo foi um acidente! – e se erguia bruscamente, surpreso.
- Sem discussão, você é meu escravo! – e o puxava de volta para a cadeira – Você vai me servir e fazer tudo o que eu mandar, entendeu bem?!?!?
- E se eu me recusar?
- Não recusaria o pedido de uma moça, não é mesmo? – e mexia as sobrancelhas de forma rápida e sedutora – Por favor... você tem que me ajudar, esses idiotas não limpam o chão que pisam! – e agarrava seu braço.
- Eí, vai com calma ai! – e tentava se afastar – Fred, me ajuda!
- Desculpe, mas ela já me joga bombas sem motivo – e se erguia, indo para perto de Lance, o qual estava rindo da situação.
- Droga... Todd!
- Acho que vou caçar umas moscas.
- Ai... era só o que me faltava... tá bom, você venceu! Serei seu escravo, mas só de vez em quando, ok?
- Iupi!!! Pois bem, meu escravo. Como primeira ordem, eu, sua amada, idolatrada e benevolente dona... ordeno que se alimente! – e pegava uma fatia de pizza, dando em sua boca.
- Hmmm!!! Acho que vou gostar dessa escravidão – e percebia o quão distante Pietro estava – o que houve? Ele parece triste...
- Ah, deixa o revoltado pra lá. Lance, aposto que essa você perde!!!
- Você vai ter que devolver toda a pizza que comeu, Thabita! – e falava, segundos antes de errar novamente – ai, droga!
- Eu pago essa pra você, Lance – Lucas maneava a cabeça enquanto fazia o pedido – eu mereço. Eí, cadê o Todd?
- Deve ter ido ao banheiro.
- Sério? – e se lembrava do que aconteceu mais cedo – ele foi mesmo fazer o que penso que foi fazer?
- Aham, ele adora comer moscas.
- Bleargh! Mas essas coisas devem estar sujas e... ah, deixa pra lá. A gente espera ele voltar pra comer a pizza.
- Precisamos mesmo? – e sorria maliciosamente.
- Ah, deixa disso, Não é seu amigo? – ela fazia uma careta – vou fingir que não vi isso, ok? Chega mais, Pietro – ele não lhe dá a menor atenção – o que foi que houve?
- Ih, longa história – e lambia os beiços imaginando a pizza fresquinha que viria e os pedaços que ganharia apostando com Lance – mas e você, McCoy? Como foi seu dia?
- Bom... – ele jogava o corpo para trás, espreguiçando-se um pouco – foi bem – ele pensava em tudo o que aconteceu, em todas as coisas pelas quais passou desde que os primeiros raios do sol tocaram em sua face, todas as surpresas, alegrias, tristezas... tudo – agradável... – e fechava os olhos.
Estava feliz, estava muito feliz. Seu tio, o maior geneticista que já teve o prazer de conhecer, estava de volta.
Lembrou-se de Lance, de sua infância e, agora, estava pela primeira vez desfrutando um momento de pura paz, o primeiro que tinha desde que chegara naquela cidade.
- Está sorridente. Aconteceu algo novo? – ela apoiava a cabeça no cotovelo.
- Sim – e acenava com a cabeça – digamos que... sim.
- E ai, vai me contar ou vai me deixar na curiosidade?
- Bem... – e sorria marotamente – acho que dessa vez, vai ficar na vontade.
- Você é mal!!!
- Eu sei! – e não agüentava, dando uma risada.
- Definitivamente você está diferente, McCoy. Aconteceu algo?
- Sim – ele sorria – sim, aconteceu. Algo muito bom, Thabita.
- Fico feliz por você, então – e não resistia a olhar para Pietro.
- Eu vou falar com ele.
- Boa sorte – e mastigava o último pedaço de Pizza, o qual já estava quase frio. – she va pricida!
- Oi. – ele se senta em uma cadeira próxima de Pietro – legal esse lugar aqui, não é mesmo?
- Não vem ninguém pra encher a gente – Ele fala sem olhar nos olhos de Lucas.
- É... – ele fica levemente mudo depois da "cortada" – e ai, Pietro... como você veio parar aqui? Pegou o ônibus?
- Eu não preciso dessa droga, venho correndo se quiser – outra cortada, mais do que suficiente para tirar os ânimos de qualquer pessoa.
Menos, é claro, de um McCoy.
- Seu nome é Pietro Maximoff, certo? É um nome bastante incomum. Seus pais não são da América, não é mesmo? – aquilo realmente conseguiu chamar a atenção de Pietro, tanto que ele ergue uma sobrancelha e fita de forma estranha a Lucas.
- Não... e você, de onde vem? O Lance falou que você morava aqui e foi morar em um tal de purgatório...
- Eí!!! – ele o olhava fingindo um olhar de indignado – essa piada é velha! Moro em Nova York, no Bairro conhecido como "Cozinha do Inferno", se quer saber. Bem, minha família mora lá.
- Sua... família? – Ele parecia levemente interessado no rumo que aquela conversa estava tomando.
- Sim. Meu Pai, Tânia, a minha madrasta, e Alison, minha irmãzinha. E você? Algum parente por aqui?
- Já - ele respondia e na mesma hora Lucas se dá conta do quanto triste ele ficou ao tocar no assunto. Ainda mais quando ele disse "Já".
- Hmmm – ele para alguns segundos antes de formular a pergunta – escuta – novamente ele para, quase perguntou algo que não devia perguntar – você – e mais uma vez.
Diabos, McCoy! Pense! Coloque esse cérebro pra funcionar!
- Hmmm... tem uma moeda?
- Essa serve? – ele abre a palma da mão mostrando uma.
- De onde surgiu isso?
- Achei no seu bolso.
- Espera, como você tirou isso do meu bolso sem eu ter percebido? – Pietro ergue as sobrancelhas e dá um sorriso debochado – Esquece. Onde tem uma máquina de refrigerante?
- Lá – Pietro aponta para uma máquina no fim do corredor – quer que eu vá buscar pra você?
- Pra que? – ele sorria e, fitado a máquina, joga a moeda. Pietro apenas observa enquanto que, com um arremesso certeiro, a moeda vai seguindo em direção a máquina, atingindo em cheio a entrada de moedas.
- Belo truque. Fanta Uva, por favor.
- É a minha favorita – o botão da máquina afunda e, segundos depois, uma lata de Fanta Uva desce, caindo na entrada. Como se ambos a atraíssem, e lata cai no chão em vem rolando na direção de ambos, percorrendo o imenso corredor e batendo no pé de Pietro, subindo sozinha e parando bem no meio da mesa. Como se uma mão invisível a segurasse, a tampinha é tirada e ambos observam o gás saindo, enquanto Pietro a toma nas mãos e sorve o liquido gelado.
- Magnus – Pietro oferece o refrigerante para Lucas, o qual vai sorvendo a bebida – e Wanda. Meu pai e minha irmã.
- Ahhh! – ele limpa a boca – do jeito que eu gosto. Moram por aqui?
- Não exatamente. Meu pai tem alguns assuntos para resolver e está sempre viajando – e tomava sua dose da bebida. – e minha irmã, ela... – é bem perceptível o quanto ele parece decepcionado em tocar no assunto.
- Alison – ele passa a lata para o velocista – ela é uma menininha. Uma gracinha.
- Ouvi você falar esse nome em seu delírio... ela está bem?
- Sim, sim, sim... – ele olhava de rabo de olho para Lance – uma gracinha...
- Ela é um homo superior? – Pietro olhava ao redor como se procurasse algo, e torna a fitar o rapaz diante dele.
- Depende do que pode ser considerado como "superior", Maximoff.
- Você me entendeu, McCoy.
- Sim. Eu entendi sim. – e balançava a cabeça ao ver que, apesar de tudo, Lance ainda persistia. – Ele nunca desiste?
- Nunca – Pietro sentia um leve incômodo com a tentativa de Lucas em fugir do assunto, mas resolve dançar conforme a música – e então, vai se mudar para o Instituto Xavier?
- Não.
- Não? – ele erguia uma sobrancelha – o que seu tio acha disso?
- Não creio que a opinião dele seja muito diferente da dos pais de Thabita quanto a filha morar em um alojamento masculino – e mandava um sorriso para ela, a qual começava a devorar a pizza quente e fresquinha que havia chegado.
- Você é estranho, sabia?
- Já me disseram isso. O que acha de ajudarmos o Lance?
- Claro! – ele falava de tal forma que ficava claro que não fora uma boa idéia - A gente faz qualquer coisa e aquela doida explode tudo!
- Ora – Lucas maneava a cabeça e a ergue, presenteando Pietro com o sorriso mais malicioso que ele já teve o prazer(ou medo) de presenciar – vai me dizer que nunca aprendeu a ser... discreto?
O velocista ainda se perguntaria a respeito do significado das palavras dele em outra oportunidade. Por hora, seu foco de atenção havia sido atraído para outra direção.
Sujeito curioso – ele o observa atentamente enquanto ambos se levantam e seguem até a pista de boliche – fugia totalmente do padrão de todos os mutantes que já havia conhecido.
O que, por si só, era no mínimo curioso. Até então, todos os mutantes que haviam surgido em Bayville estavam, de certa forma, ligados a Xavier ou ao seu pai. Até mesmo Thabita tinha uma certa ligação com Xavier, tendo em vista que estava ali – no principio – para estudar no Instituto Xavier.
Lucas não. Não parecia ter interesse algum em se matricular no instituto Xavier – aonde teria um teto, uma cama macia e três ótimas refeições por dia – tampouco lembrava os tipos que seu pai "recrutava".
Afinal, qual era a dele? – Pietro observa Lance fazer um último lançamento, dando tudo de si. – O que ele pretendia ali?
Concentrado na bola de boliche, o mutante sísmico fita com muita atenção os pinos. Não era possível ele não conseguir derrubar nenhum, então resolveu apelar de vez. Deu trabalho, realmente deu muito trabalho, mas conseguiu se concentrar o suficiente – apesar da provocação daquela louca – para enviar pequenas vibrações para os pinos. Não eram grande coisa, mas uma vez tendo atingido um dos pinos com a bola, dispersaria pelo chão a energia acumulada, gerando um efeito em cadeia.
A bola segue reta – só precisava atingir um dos pinos, lembrava-se – pronta para atingir seu alvo, e ele deixa escapar um breve sorriso – Thabita não consegue acreditar. Talvez não tivesse sido uma boa idéia ter feito apostas consecutivas e graduais contra ele – o som dela rolando e se aproximando era assustador para Thabita, adorável para Lance – e se ele fosse capaz de derrubar todos os pinos agora, ela teria que lhe pagar em dobro todas as pizzas que comeu.
Nem precisaria usar seus poderes, no fim das contas. Apesar de que a parte mais difícil foi justamente utiliza-lo de forma discreta o suficiente para ninguém perceber.
Poucos centímetros. Quase próxima. Riria até o fim da vida da cara dela, teria o gostinho de lembrar, para todo o sempre, o dia em que...
Mercúrio. Blob. Groxo. Nenhum dos três acreditou naquilo. De todas as coisas que já tiveram a chance de ver, de todas as coisas mais absurdas que já encontraram – como o Fanático, um ser absurdamente forte que só foi vencido após uma união de forças por parte de todos os mutantes presentes – aquela iria entrar para a lista de cenas memoráveis.
A bola de boliche bateu em cheio nos pinos... atingiu o pino do meio... e recuou. Recuou e foi para o lado.
Recuou, lance arregalava os olhos. Não derrubou um pino sequer, apesar de ter sido um lançamento perfeito.
Recuou.
Lance não acreditava na peça que seus olhos estavam lhe pregando, mas sem sombra de dúvida ele podia imaginar o sorriso que acabara de surgir na face de Thabita.
E ele era... lindo.
- Pensei que iríamos ajuda-lo – Pietro olha de forma curiosa para Lucas.
- Mudei de idéia. E ele ainda me devia um bolo...
xxxxx
"Trim! Trim!"
- Fraternidade de Bayville, bom dia!
- Nossa, Lance! Que milagre é esse para atenderem o telefone tão cedo e logo de cara?
- Lance? Quem está falando?
- Hm? Lance? O que houve? Sua voz está estranha...
- Meu nome é Lucas, o Lance ainda está dormindo, aproveitando que hoje não haver aula.
- Lucas???? – era visível a surpresa na voz do outro lado da linha – Lucas?!?!?
- Bingo, é esse mesmo o meu nome! Em que posso lhe ser útil?
- Lucas, sou eu!!! Kitty!
- Oh, não reconheci a sua voz, Kitty. Não está tão cedo assim, vou chamar o Lance, um minuto por favor.
- Espera, me diz uma – ela ouve o barulho o telefone sendo colocado no ombro, e ouve um grito em seguida.
Um grito bem alto.
- Ele já vem, com licença – e coloca o telefone sob a mesa, sem dar a jovem a chance de perguntar outras coisas. Um som de alguém pisando em degraus é ouvido, e alguns instantes depois ela ouve uma voz arrastada no telefone.
- Alô? Kitty!!!
- Lance, bom dia!!!
- Bom dia, como tem passado?
- Ih, tá o maior rolo aqui, precisava ter visto! O Scott e os outros garotos ainda estão irados com o Lucas, a propósito, o que ele faz ai tão cedo? – Foi naquele exato momento em que o cérebro de Lance, o qual não estava funcionando a 100% de sua capacidade, se deu conta da situação.
O que Lucas fazia ali, tão cedo? – ele observa o amigo bem atentamente, e percebe que ele estava espremendo algumas laranjas, enquanto que, com a outra mão, vez outra mexia no fogão, como se estivesse preparando alguma coisa.
E realmente estava. A cada segundo que se passava, seu cérebro parecia ficar mais atento, até que ele realmente se dá conta da situação.
- cozinhando... – Lance falava em um tom de que nem ele mesmo acreditava naquilo.
Um cheiro agradável atingia suas narinas, tirando-a da cama mais cedo do que o normal.
Ela não perde tempo e, usando um roupão, desce correndo. Era um sonho, disso tinha certeza, mas não ia deixar o Fred encostar no seu sonho e devora-lo!!!
- Como prefere seus ovos? – ela ouve a voz de seu "servo", como música para seus ouvidos.
- Mexidos! – ela puxa uma cadeira e se senta à mesa. O bolo cheirava incrivelmente bem, e a taça de suco parecia deliciosa. Havia alguns pães e margarina e, poucos segundos depois, ele colocou uma jarra com leite na mesa.
Como queijo para um rato, não demorou muito para os demais moradores do alojamento aparecerem. Todd pulou encima sofá, mas quando estava prestes a esticar sua língua, ele vê Lucas na pia de costas para ele, e muda de idéia, puxando uma cadeira. Fred parecia uma criança que acabou de ganhar doce, mas quando ele já estava quase metendo a mão no bolo, viu uma das esferas de Thabita, a qual sorria terrivelmente para ele.
- Se manda, Fred! É o meu sonho, e nenhum de vocês vai estragá-lo!
- Lance, que barulheira é essa? – Perguntava Kitty, cada vez mais curiosa.
- Luc acabou de fritas ovos para aquela doida... pra falar a verdade, ele acabou de preparar o café da manhã aqui e agora ela está brigando com Fred por causa disso, enquanto Todd está esperando uma chance para comer tudo...
- Desde quando ele cozinha para vocês?!?!?
- Deixa eu ver... Thabita foi filar a janta dele outro dia... ontem almocei com ele... acho que é a terceira vez e – ele pega um copo de suco de laranja que Lucas lhe entrega – obrigado.
- Obrigado pelo que?
- Nada não, é só uma coisa que – a ficha cai e ele se dá conta do que acabou de receber, enquanto que, do canto do olho, Lance observa quando Thabita ameaça Fred com suas esferas, mas ele não parecia ligar muito – espera, acho melhor desligar, eu - e, para confirmar suas suspeitas, ela atira uma esfera contra seu "amigo". Infelizmente para Thabita, ele se abaixa no último instante, o que faz a esfera seguir uma trajetória reta... em sua direção. Lance arregala os olhos ao ver aquela pequena esfera luminosa vindo de encontro a sua face, e uma vez que ela fora criada originalmente para atingir alguém com as proporções de Fred, com certeza ele... ele...
- Lance? Lance? Você ficou mudo, o que foi?
- Nada – ele suava frio – apenas Thabita se irritou com Fred e abriu fogo contra ele, e uma bomba do tamanho de uma bola de tênis acabou vindo na direção do meu rosto.
- O que aconteceu? Como você está?!?!?
- Inteiro – um silêncio enorme tomava conta do local.
- Não te atingiu? Está ferido? Machucado?
- Não... - na verdade a esfera ainda existe e estava à um centímetro da sua face, na mão de Lucas. - Se me dá licença, eu vou desligar – e nem esperando a resposta, ele coloca o telefone no gancho e se afasta lentamente dali, imaginando a fria da qual suas calças escaparam.
E, a despeito do que havia dito, todos ali pararam o que estavam fazendo, em especial, Thabita. Sua esfera era mais do que suficiente para atordoar Fred e causar graves problemas a pessoas mais "normais". Todo mundo observa a esfera pulsar fortemente, como se quisesse atingir um tamanho acima do normal e, em seguida, diminuir até se estingüir por completo.
O jovem mutante observa sua mão e, constatando que não havia nenhum ferimento, retorna o que estava fazendo, levando a jarra de suco para a mesma, junto com algumas frutas. Obviamente, na altura do campeonato todos os demais estavam em profundo silêncio, deixando de lado o motivo de sua briga, seja lá qual fosse.
- Mas que silêncio é esse, pessoal? – ele deixava as coisas na mesa e ia até a pia, sorrindo afavelmente – O que foi? Viram um bicho de sete cabeças?
- Eu não estou sonhando! – Thabitá se beliscava – você está aqui mesmo!
- Ei McCoy – Todd falava sem comer nada – que que cê tá fazendo aqui?
- Preparando o café da manhã, essas porcarias que vocês andam comendo ainda vão deixar vocês doentes.
- A gente não tem muito dinheiro para ter um café desses todos os dias – Fred falava com a boca cheia.
- Só por que vocês não querem. É obrigação do Diretor da BayVille providenciar o sustento de alunos com dificuldades orçamentárias. E esse alojamento está horrível, a propósito.
- É isso que dá ter um lugar cheio de homens – Thabita devorava uma maçã – eles não sabem cuidar daqui!
- Pode ser, mas a verba para a manutenção tem que vir da escola, afinal, é um prédio dela – ele observava os olhares confusos deles – estão de brincadeira, não estão? Não sabiam mesmo disso?
- Escuta, você não quer ir bater um papo com o diretor Kelly? – Pietro, sentado no sofá, bebia o suco.
- Sabe que você tem razão? – Fred termina de beber o suco que lhe fora oferecido – Por que a gente não pensou nisso antes?
- Tinha mesmo que ser um McCoy! – Thabitá se ergue e o segura pelo braço – Vem cá, Lucas! – e empurra Todd, "abrindo" um lugar para Lucas se sentar - Come com a gente hoje, anda!
- Olha...
- Sem reclamação! – ela fechava a face – É meu servo e vai fazer o que eu mandar, ouviu!!!
- Que história é essa de servo? – Lance puxa um banco.
- Algum dia eu te explico – Lucas olha torto para Lance – eu...
- Escuta, a gente não sabia disso! – Fred se manifesta – bem que as coisas eram melhores quando a diretora Raven estava aqui!
- É mesmo! – Pietro se ergue – Como é que a gente não pensou nisso antes??
- Tá bom, até parece que o diretor gosta muito da gente! – Todd dava uma risada sarcástica – Se depender dele, a gente morre é de fome, isso sim!
- O que acha, McCoy? – Thabita espera ele terminar de sorver o copo de leite – Pode nos ajudar?
- Não tem nada que uma boa conversa não resolva – ele termina de limpar sua boca – e além do mais, Não pretendo viver em um lugar caindo aos pedaços.
- Vai morar conosco? – havia bastante empolgação na voz de Lance – Tá falando sério?
- Viva!!! – Thabita tinha um sorrido de um lado ao outro – nunca mais vou ter que comer aquela droga de comida que vocês pedem! Lucas, você vai cozinhar para a gente todos os dias!
- Que remédio eu tenho? – ele pega um pedaço de bolo e começa a mastigá-lo – Fraternidade de BayVille, não é? Gostei do nome.
- Mutantes, Lucas – Lance se ergue, parando em frente a ele, estende-lhe a mão – seja bem vindo a Irmandade dos Mutantes.
- Irmandade dos Mutantes? – ele se ergue e aperta a mão do amigo – Gostei do nome. Tem algum significado em especial?
- Você é esperto, pode deduzir sozinho – Pietro se ergue e se aproxima da mesa – mas se quiser, podemos te ensinar o que significa. Interessado?
- Quem sabe? – ele aperta a mãO de Pietro – Tudo na vida é uma eterna experiência de aprendizado... e isso pode realmente vir a ser interessante...
Continua...
