O Escorpião Escarlate

Capítulo Anterior – No capítulo anterior Kamus e Shaka vão até a prisão de Clairvaux e fazem algumas perguntas a Milo. O ladrão só concorda em colaborar se estiver fora da cadeia. Arriscadamente, o grego ainda prevê a data de aparecimento do próximo escorpião para no máximo duas semanas. A princípio o francês não acredita, mas um novo crime acontece e deixa o Aquariano praticamente sem saída.

- ...outro escorpião foi encontrado.

- Quando ?

- Quase agora.

- Quando foi o crime ?

- Provavelmente em uma festa à fantasia no final de semana na casa de um grande empresário. A empregada entrou hoje no escritório para limpar e descobriu o que um escaravelho egípcio estimado em 20 mil euros foi roubado. Um pequeno escorpião vermelho foi encontrado no lugar da peça. Sob o mesmo tinha um bilhete escrito "Escorpião Escarlate".

Kamus suspirou profundamente. A sorte tinha sorrido para Milo

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O Escorpião Escarlate – Capítulo II – Kamus versus Milo

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Prisão de Clairvaux. Terça-feira. Um dia depois do segundo crime. 5:45 da manhã.

O grego acordou com a sirene tocando e fez mais uma marca na parede. Aquele era o décimo quinto dia desde a visita de Kamus. No dia anterior o prazo que dera para o aparecimento do próximo escorpião tinha se esgotado. Seu plano havia falhado.

Enquanto seguia para o refeitório refletia o quanto tinha sido estúpido.

"Eu não devia ter falado que em duas semanas apareceria outro escorpião. Não devia ter dado prazo algum." – pensou – "Droga Milo, você é um BURRO ! Ele sacou na hora que você estava mentindo. Se ele achasse que você sabia alguma coisa teria te obrigado a falar, não teria ido embora"

- Droga. – praguejou baixinho - Me comportei como um perfeito idiota.

Pegou seu pão e copo de leite e sentou-se desolado. Agora teria que achar outro jeito para sair daquele pulgueiro.

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IPF (Inteligência Policial Francesa). Mesmo dia. Começo da tarde.

Desde que descobriram o segundo escorpião no dia anterior o francês estava submerso nas investigações. Kamus havia trabalhado em casa durante a noite e chegou cedo na IPF. Precisava validar suas anotações e pensar com tranqüilidade sobre o caso. Desabilitou seu telefone e pediu à sua equipe que não o incomodasse por nada.

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Logo no começo da tarde a paz do Aquariano foi perturbada por uma batida na porta. Levantou os olhos do computador praguejando mentalmente contra a criatura que tinha tirado sua concentração.

- Entre. – resmungou entre os dentes.

Era o tibetano.

- O que foi ? – perguntou com cara de poucos amigos.

- O Shaka pediu para avisar que ele já marcou a entrevista com a família que teve o escaravelho roubado. Eles vão fazer o reconhecimento dos suspeitos amanhã no final da manhã. Estou saindo para almoçar. O que quer que eu te traga ?

- Paz e sossego. – respondeu.

- Ok. Sanduíche natural de peito de peru e um suco de laranja. Pedido anotado. – disse sorrindo.

- Nem tente...

- Você acha mesmo que eu vou te deixar ficar mais um dia sem almoçar ? Pode esquecer. – piscou para seu líder e saiu.

Mu era incrivelmente tranqüilo, simpático e paciente; Kamus possuía características mais racionais, frias e reservadas; porém, apesar da diferença de temperamento, os dois tinham uma boa afinidade e o francês gostava muito do Ariano.

Kamus deu um leve sorriso ao se lembrar do dia em que o tibetano entrou na IPF. Mu errou a porta e foi parar na sala do Aquariano. Naquela época Aioria e Shaka já trabalhavam com o francês. Quando o Ariano percebeu o erro, ficou MUITO sem-graça e pediu mil desculpas. Na mesma hora o loiro, que não tirava os olhos do novato, replicou com simpatia "Quem sabe não é um sinal do destino e você ainda vai trabalhar aqui ?"

Fosse mesmo o destino ou tão somente a torcida do Virginiano para ter aquela beldade perto de si, o fato é que aconteceu. Mu veio mesmo para a equipe do francês. Pena que o momento de transição pelo qual o tibetano teve que passar, após sair de sua ex-equipe, tenha sido cercado por tanto preconceito e incompreensão.

Se naquela época Kamus não tivesse acreditado no Ariano convidando-o para trabalhar consigo, Mu certamente teria abandonado a Inteligência Policial...

-oooo-

Era o começo do ano anterior.

O francês tinha sido destacado para trabalhar com Shura e Saga, outros dois líderes da IPF, em um caso secreto. Escolhidos a dedo, os três foram incumbidos de desmascarar os policiais corruptos da corporação. Algumas informações restritas à IPF tinham vazado e um grupo de traficantes tinha se safado de uma batida policial.

Obviamente era uma investigação muito delicada, pois envolvia os próprios colegas de trabalho e por este motivo, não podiam revelar nada deste caso a ninguém, nem aos próprios membros de suas respectivas equipes.

Depois de muito trabalho, levantamentos, investigações e análises, acabaram descobrindo dois policiais corruptos: Zeros e Radamanthys. Coincidentemente os dois trabalhavam na mesma equipe. Zeros era especialista em segurança e Radamanthys era o líder.

Houve um processo muito bem articulado para conseguir desmascará-los. Depois de todas as informações coletadas os três investigadores montaram um dossiê completo com documentos, fotos e gravações. Não havia dúvida sobre a culpabilidade dos dois. Zeros e Radamanthys foram autuados, presos e ficaram aguardando julgamento.

Se por um lado os policiais corruptos foram descobertos, por outro lado o resultado da investigação gerou um desconforto generalizado. Os policiais da IPF ficaram revoltados em saber que seus ex-colegas de trabalho aceitavam suborno e começaram a falar contra a equipe de Radamanthys, dizendo que ela poderia estar completamente contaminada.

Na época a referida equipe era formada por quatro pessoas: Radamanthys, Zeros, Pandora e Mu. Por causa da constante pressão dos colegas de trabalho, a policial Pandora não agüentou e abandonou a IPF porém, o Ariano não queria fazer o mesmo. O tibetano sempre quis pertencer à Inteligência Policial Francesa e não ia desistir assim tão fácil.

Saindo da equipe desfeita, Mu começou a trabalhar na parte central do terceiro andar, onde ficavam todos os policiais que não tinham equipe fixa.

Jamais foi levantada qualquer dúvida sobre a honestidade do Ariano, mas pelas faltas do seu ex-líder, o tibetano passou a ser perseguido. Todos os dias ouvia alguma gracinha dos companheiros de trabalho e não era raro encontrar bilhetes maldosos em sua mesa com a mensagem "FORA TRAIDOR" ou coisa do gênero.

Por causa do preconceito, o belo policial de cabelos lavanda se abateu. Estava perdendo a motivação e a vontade de ir trabalhar. Shaka, muito atento, foi falar com seu chefe. Kamus podia não ser uma pessoa muito calorosa, mas prezava pela justiça.

O Aquariano confiava em Mu. Tinha conduzido a investigação e sabia da boa índole do Ariano. Causando polêmica na IPF, chamou-o para trabalhar em sua equipe.

No primeiro dia ninguém se manifestou. No segundo dia o francês viu Mu jogando fora um bilhete que tinham deixado em seu armário. Sem que o tibetano visse, Kamus pegou o papel do lixo e leu. Imediatamente foi até a sala de Dohko, o Superintendente do andar. Saindo de lá sentou em seu computador e escreveu um e-mail o qual direcionou a todos os líderes e ao coordenador geral dos membros sem equipe, obviamente copiando Dohko. Dizia que estava calçado pela Superintendência e que NÃO toleraria ataques a qualquer integrante de sua equipe; dizia ainda que "esqueceria" os bilhetes anônimos anteriores, mas que o próximo ato de discriminação, de qualquer espécie que fosse, traria graves conseqüências a seu executor.

Myu, um dos policiais que não tinha equipe fixa, não acreditou no aviso. No dia seguinte foi só Mu pisar no elevador para Myu sair imediatamente e dizer que preferia subir de escada, onde o ar era mais puro. O Ariano não contou o ocorrido a Kamus, mas nem precisava. O Aquariano tinha suas fontes. No mesmo dia o nome de Myu estava na mesa do Superintendente. O francês não foi piedoso. Exigiu punição máxima. Deveria servir de exemplo. Dohko concordou com Kamus. A IPF não deveria combater a IPF. Myu foi desligado no final da tarde e depois deste acontecimento não houve mais discriminação contra o tibetano.

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O julgamento dos policiais indiciados teve início. Saga estava em uma outra investigação e não pode acompanhar os amigos. Apenas Shura e Kamus compareceram ao tribunal. Pelos crimes cometidos os corruptos foram condenados a sete anos de reclusão cada. Logo depois de receber sua pena, Radamanthys passou bem perto dos investigadores e os ameaçou.

- Assim que eu sair da cadeia, terei vocês na mira do meu revólver.

- Você deveria ficar calado. Ameaça a um policial acrescenta mais tempo de prisão. – Kamus replicou friamente.

O ex-líder olhou com raiva para o Aquariano.

- Eu sempre te odiei, Kamus. Vou adorar apertar o gatilho. – e fuzilou o francês com o olhar.

- O que você acha ? – Shura perguntou depois que o criminoso foi levado embora.

- No dia em que ele me apontar uma arma, estarei esperando por ele. – respondeu mais friamente ainda.

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O Aquariano fechou os olhos por um momento e suspirou ao voltar para a realidade. Ao se recordar desta história a saudade invadiu o seu peito e o fez se sentir triste.

Parecia incrível, mas por suas atitudes frias e por seus comentários marcados pela indiferença, todos pensavam que Kamus não tinha sentimentos. Isso não era verdade. Claro que tinha sentimentos. Todo mundo tem sentimentos. Apenas, diferente da maioria, tinha aprendido a lidar com os seus. Pena que de um modo bem dolorido...

-oooo-

Seu início de infância foi maravilhoso. Seus pais o amavam muito e ele também os amava. Sendo filho único, apesar de um pouquinho mimado devido à excelente situação financeira da família, era tratado como um príncipe.

Sim. Kamus era uma criança feliz. Muito feliz. Até que uma tragédia aconteceu.

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Como de costume, o francesinho saiu da sala de aula e sentou-se no jardim da escola esperando que os pais viessem buscá-lo. O menino ficou jogando no celular até que a bateria acabou. Olhou no relógio. Os pais já estavam bem atrasados.

Os minutos continuaram se passando, mas eles não chegavam. Achou melhor esperar. Tinha oito anos e já era quase um mocinho, não ficava bem choramingar. Sorriu. Gostava quando a mãe dizia que com oito anos ele já era quase um mocinho.

Os minutos passados se transformaram em uma eternidade e nada deles aparecerem. Foi até a diretoria e pediu para uma professora ligar para os pais. Como não teve resposta no celular, ela tentou a casa de Kamus. Nada. A escola também possuía os telefones comerciais de seus pais, mas ninguém atendeu. Havia ainda o telefone de um tio, apenas para recado. Tentaram. Um homem atendeu e se identificou como o tio do pequeno. Disse que havia acontecido um grave acidente e se prontificou a buscar o garoto.

Assim que seus tios chegaram, foi logo perguntando pelos pais.

- Houve uma explosão no carro. Seus pais estão mortos. – explicou friamente.

"Mortos ?" pensou desesperado. O choro veio fácil. Era impossível se conter.

- Não precisa chorar, menino. Você não vai ficar sozinho. Provavelmente vai morar conosco. – sua tia disse-lhe em perceptível tom de desaprovação.

O pequeno passou a derramar mais lágrimas e agora não parava de soluçar.

Realmente Kamus não tinha outros parentes e numa fatalidade destas teria que morar com os tios, mas isso era coisa que se falasse para alguém que acabou de perder os pais ? Não chorava porque ia ficar sozinho. Chorava porque não teria mais os pais junto de si.

- Pare com este escândalo, moleque ! Saiba que não gosto de crianças mimadas ou barulhentas. Venha. Entre logo no carro. – o tio repreendeu-o.

Casados há doze anos, seus tios não tinham filhos. O problema não estava em crianças mimadas ou barulhentas. O problema estava nas próprias crianças. Eles as detestavam.

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Os restos de pais foram cremados. Tudo para evitar o enterro de caixões praticamente vazios. Seus pais, dois juizes muito conceituados, foram vítimas de terrorismo por parte da família de um criminoso, insatisfeita com a pena aplicada. Uma bomba foi colocada no carro e quando o veículo ultrapassou uma certa velocidade, ela foi ativada.

As risadas que antes enchiam a casa da família Cartelié agora tinham se transformado em silêncio. Seus tios não eram pessoas muito compreensivas, tão pouco amorosas e em grande parte das vezes, ríspidas. Com este novo cenário, o infante acabou se tornando uma criança retraída.

Os dias se passavam. O menino não chegava a ser mau-tratado, mas por causa da frieza e da distância dos tios, o pequeno percebeu que precisava aprender a lidar rápido com as frustrações. Pena que ainda não tivesse aprendido quando seu aniversário chegou. Os tios não se lembraram da data e como era tinha mudado de escola naquele ano, os novos amiguinhos também não o cumprimentaram. Foi dormir chorando.

Os dois só se deram conta do aniversário do sobrinho três meses depois. Presentearam-no com uma bola e lhe deram parabéns, mas pelo pouco interesse demonstrado em saberem seu verdadeiro dia de aniversário, Kamus ficou entristecido e chorou copiosamente.

- Moleque mal-agradecido. Não deveríamos ter comprado nada. – a tia replicou.

- O QUE É ISSO ? – o tio perguntou aborrecido - Temos um BEBÊ em casa ? Se vai ficar chorando que nem uma criancinha vou te obrigar a usar fraldas e chupeta para ir à escola. Você já tem nove anos. É PRATICAMENTE um homem. Não me aborreça com este chororô. Vá lavar o rosto.

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Amor era uma palavra que não existia naquela casa, então era melhor esquecê-lo. Ódio era um sentimento que também não deveria cultivar. Apesar da distância e da frieza com que era tratado, eram os tios que o alimentavam, educavam e vestiam. Preferiu optar pela indiferença. Se não se importasse com isso, estas coisas não o machucariam.

Foi assim que a criança reservada cresceu e se transformou em um jovem introspectivo. Foi assim que aprendeu a lidar com os sentimentos e ignorá-los. Foi assim que seu coração se endureceu e se transformou em uma pedra de gelo.

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- Autocontrole – o francês falou baixinho para si próprio e respirou fundo.

Por causa do tratamento recebido na casa dos tios Kamus tinha muito autocontrole. Praticamente nada o abalava. Nada até que Ele entrou em sua vida. O Aquariano até saiu vez ou outra com alguma garota, mas foi sempre por prazer. Nunca sentiu nada por elas a não ser tesão. Mas não com Ele. Com Shura era diferente.

O Capricorniano era um tanto sério no trabalho, mas doce e cativante entre quatro paredes. Inteligente, bonito, educado e sexy, era impossível não se apaixonar pelo espanhol. Shura parecia A PERFEIÇÃO em pessoa, e o melhor: gostava do Aquariano.

O único problema é que o francês já estava TÃO acostumado a reprimir as emoções, que não conseguiu demonstrar o que realmente sentia pelo namorado. Depois de quase oito meses de um relacionamento morno, o Capricorniano se esvaiu por suas mãos e o abandonou, mudando-se para Londres e indo morar com o novo namorado, Aioros.

O Aquariano respirou fundo.

Há dezessete dias, um dia antes dele e Shaka irem até a Clairvaux, seu ex- tinha ligado. Ele e Aioros viriam para o aniversário de Aioria e o espanhol queria saber como o francês estava. Apesar de não serem mais namorados, ainda eram colegas de profissão e tinham amigos em comum. Não dava simplesmente para deixarem de se falar o resto da vida.

Os assuntos até que foram bem amenos. Falaram sobre o aniversário de Aioria, os novos trabalhos do Aquariano, as conquistas profissionais de Shura, o clima, campos de golfe, peças de teatro... Tudo ia muito bem até que o Capricorniano desligou. Kamus teve uma forte crise logo em seguida. Ainda gostava do ex- e chorou bastante. Teve uma péssima noite de sono e no outro dia amanheceu irritado. Para piorar esse era JUSTAMENTE o dia em que em falaria com o grego na Clairvaux.

Obviamente depois desta ligação a visita no presídio tinha sido catastrófica. O francês que sempre era comedido em seu comportamento, brigou com Shaka no carro, teve um rompante de fúria, deixou o criminoso conduzir o interrogatório e não saiu da prisão com nada além do que já sabia.

Kamus respirou fundo novamente.

Isso não podia voltar a acontecer. Um aspirante a Superintendente não podia se deixar levar por emoções baratas. Deveria agir como uma pessoa digna de ocupar o cargo, se portar como uma pessoa competente, sensata e austera; e não como uma bicha louca que fica atormentada só porque o ex- ligou.

- Droga. – praguejou.

Voltou os olhos para o computador e retomou suas anotações com o intuito de esquecer tudo aquilo. O espanhol já estava tomando tempo demais dos seus pensamentos.

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Cerca de quinze minutos depois, o Ariano voltou com o seu lanche. Enquanto comia olhou para seus apontamentos e ficou aborrecido. Pela forma amadora com que conduziu o interrogatório provavelmente teria que ceder.

- É. Agora eu sei para que os sentimentos servem: para me afastar da cadeira de Superintendente.

Pensando no erro que cometeu na entrevista com Milo, o francês sabia quão nocivas as emoções podiam ser. Mas sua mente ainda teimava em pensar no Capricorniano.

- Por favor, Kamus, - pediu a si próprio - PARE com essa história de achar que ainda gosta dele. Ele já te abandonou, já disse que não te ama e está muito feliz com o Aioros. Esqueça toda essa baboseira de sentimento. Isso não é para você. Você ainda quer ser Superintendente, não quer ? Ou prefere se entregar às emoções e ser visto como um investigadorzinho medíocre o resto da vida ?

Era ÓBVIO que isso não era verdade. O francês era um EXCELENTE investigador e jamais seria considerado medíocre, mas se tinha o desejo se tornar Superintendente, precisava ser duro consigo mesmo.

Respirou fundo. TINHA que se controlar. Sabia que tudo aquilo que estava sentindo era ruim, pois o desviava de seu verdadeiro propósito. Respirou fundo novamente e endureceu o coração. TINHA que parar de frescura e suportar a dor em seu peito.

- Afinal, sou O Homem de Gelo, não sou ?

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Depois de mais meia hora, Kamus já estava com a resposta de suas análises. O cenário era claro.

O Aquariano pegou o telefone e ligou para Dohko. Recebeu a permissão necessária via e-mail, repassou para o presídio e em seguida ligou para Loraine, diretor da Clairvaux. Saiu de sua sala, reuniu toda a equipe e expôs a exigência do ladrão. Disse tudo o que precisavam fazer para sua provável vinda. Enviou um e-mail para Fleur, secretária da IPF, para que ela organizasse a estadia do criminoso; anexou ainda os dias que ele ficaria sob custódia e sua ficha criminal.

Tomava todas as precauções necessárias para o que parecia ser inevitável: teria que tirar Milo da cadeia.

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Prisão de Clairvaux. Manhã de Quarta-feira. Dois dias depois do segundo crime.

Naquele dia completavam-se dezesseis dias da visita dos investigadores, mas o grego não estava mais lembrando disso. Tinha outras coisas para se preocupar. O detento responsável pela selagem dos móveis estava com o serviço atrasado e pegara duas portas de armário que estavam sob a responsabilidade do ladrão.

Milo ficou irritado. Tinha dito ao outro preso que as portas estavam praticamente prontas, pois faltava apenas lixar a parte de cima e a de baixo, mas ainda não estavam acabadas.

"QUE DROGA" pensou "Eu disse PRATICAMENTE prontas e não PRONTAS ! Que ESTÚPIDO !"

O preso selador era um assassino perigoso, condenado a mais de vinte e cinco anos de prisão. O grego sabia o risco de se envolver em brigas na cadeia. Poderia acabar morto pelo grupo que defendia o outro detento. Não. Queria sair da Clairvaux e por isso não podia morrer. Precisava AO MENOS estar inteiro para encontrar Afrodite. Já bastava não conseguir manter suas características "doces" ali dentro e lançar mão de tanta falsidade e mentira. Não que não tivesse lutado para se manter íntegro, mas com tanto mau exemplo, era praticamente impossível não se contaminar.

O Escorpiniano olhou para o outro preso.

A cadeia tinha uma espécie de regra: estupradores eram mortos, assassinos eram respeitados e ladrões não se metiam a besta. O selador estava na segunda categoria e Milo na terceira. Além de ser um assassino muito perigoso, o outro já havia matado um preso-marceneiro por motivo semelhante. Era melhor não insistir na briga.

- Ora Escorpião, por que você foi me dizer que as portas já estavam prontas ? – perguntou com a arrogância característica de quem sabe que é temido dentro da prisão – Agora, eu só espero que a SUA lixagem não arranhe a MINHA selagem.

Era ÓBVIO que a lixagem danificaria a selagem.

- Não se preocupe. – Milo respondeu – Vou usar a lixa fina.

- Você faria isso por mim, Escorpiãozinho ? – perguntou com voz doce e passou a mão no rosto do grego.

- Claro. – respondeu com um sorrindo falso.

Certamente o grego se atrasaria por usar a lixa fina, mas o jeito era fazer. Afinal, queria voltar a ver seu belo Peixinho, não queria ?

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- Está triste Escorpião ? – outro prisioneiro perguntou assim que o selador saiu da sala – Quase não ouvi sua voz hoje.

- Briguei com meu diretor e ele não quer me deixar voltar para Hollywood. Disse que tenho que treinar mais para o filme. – replicou procurando pela marcenaria a lixa fina.

Os outros sorriram com a brincadeira.

- É verdade. – o ladrão afirmou - Não sei como vocês agüentam. Isso aqui é de matar. Vou pedir para fazer o laboratório do meu próximo filme em uma prisão de segurança mínima. Cansei de fingir que sou um criminoso com onze anos para cumprir.

Todos riram.

- Milo, eu queria ter a metade do bom humor e da esperança que você tem. – Jack, um assassino preso há mais de doze anos, comentou.

- O QUÊ ? Você com esperança e bom humor ? Nem pensar ! – o grego replicou em tom de deboche – E perder o cara MAIS chato e ranzinza da cadeia ?

A risada foi geral. Jack gargalhava.

De repente a porta se abriu e um guarda entrou. Os presos pararam imediatamente de rir.

- Menos riso e mais trabalho. Quem começou a piada desta vez ?

Silêncio na marcenaria.

Já era a segunda vez que isso acontecia naquela semana e ainda era quarta-feira. Milo estava extrapolando com suas brincadeiras. Ali não era lugar para isso. Claro que os outros não o dedurariam, mas isso significava que todos ficariam sem almoço. O Escorpiniano já havia ficado sem almoço na segunda-feira por causa de uma outra piada.

O ladrão sabia que haveria castigo por dispersar os presos do trabalho, então era melhor se entregar antes que tivesse alguma represália por parte dos presidiários.

Lentamente o grego levantou a mão e olhou para baixo.

- De novo, senhor Nekalaous ? – o agente penitenciário perguntou - Parece que ficar sem almoço DUAS VEZES na semana é pouco para você. Que tal uma solitária ?

Ali na Clairvaux, o diretor Jacques Loraine, assim como o diretor anterior, era amante da matemática. Se algum criminoso precisasse ir para a solitária, era utilizado "dois elevado" à vez da infração. Então a primeira vez rendia uma semana; a segunda, duas; a terceira, quatro e assim sucessivamente. Era a terceira vez do Escorpiniano. Seriam quatro semanas.

O ladrão engoliu seco.

- Está surdo grego ? – o guarda perguntou para intimidá-lo.

- O que o senhor decidir, senhor. – respondeu baixando a cabeça.

- Venha comigo AGORA ! – o agente penitenciário ordenou. – E vocês – disse aos outros presos – VOLTEM AO TRABALHO !

- Jack, avise o selador que estarei fora. – pediu baixinho.

Tirou a touca que usava para proteger os cabelos, colocou a camisa e andou de cabeça baixa até o guarda. Sabia que se levantasse o olhar apanharia. Era melhor seguir o protocolo.

O agente colocou uma algema para retirá-lo da sala e da ala da Marcenaria.

O ladrão olhou de rabo de olhou para o guarda. O agente parecia feliz. Na certa o castigo seria terrível.

Pararam em frente a sala de interrogatório e o grego foi empurrado para dentro. Ao se deparar com Kamus, percebeu que a sorte sorrira para si e seu rosto se iluminou. O investigador viera buscá-lo.

O agente cochichou no ouvido de um outro policial que estava junto do Aquariano e saiu.

- Bom dia Milo. Pode se sentar. Creio que ainda se lembra de mim, investigador Kamus. Este é o investigador Aioria. – e apresentou o belo rapaz de cabelos curtos, o qual o guarda falara há pouco.

O Escorpiniano sorriu para o novo investigador enquanto se sentava.

- Acho que não fui muito honesto com você na última vez em que estive aqui, – o francês retomou a conversa – pois eu não lhe disse que NÃO negocio com criminosos.

Milo desmanchou o sorriso e ficou mudo.

- Então, serei objetivo e vou perguntar UMA ÚNICA VEZ antes de pedir ao agente que está lá fora, que entre.

O Aquariano colocou um pequeno escorpião sobre a mesa.

- Onde eu consigo um desses ?

O preso continuava mudo.

- Milo, é uma pergunta bem simples. Você consegue responder. Onde você conseguia estes escorpiões ? – perguntou firmemente.

O Escorpiniano fechou a cara e olhou para o lado. Já que não ia sair da prisão, não facilitaria as coisas.

- Ok. Quer falar pelo modo difícil, não é ? Aioria, – pediu – mande o guarda entrar.

Kamus viu o ladrão ficar um pouco tenso quando o agente entrou na sala.

- Chamou investigador ?

- Sim.

O francês olhou para Milo. O preso parecia um pouco nervoso

– Será que você pode trazer um copo de água ? – pediu ao guarda.

- Claro. – e saiu.

O Aquariano percebeu que o detento ficou um pouco mais tranqüilo. O agente trouxe a água, colocou sobre a mesa e se retirou.

- Milo eu sei que você está mentindo. – Kamus continuou - Você não sabe nada sobre os escorpiões que apareceram. Então, já que você não sabe o suficiente, eu não tenho que te tirar daqui. Agora diga o que eu quero saber e vou "esquecer" que você mentiu para mim. – disse friamente.

"Droga. Sabia que ele tinha sacado." o preso refletiu.

- Você sabia que mentir para a policia pode ter um efeito muito negativo enquanto você estiver aqui dentro ? - Aioria perguntou.

O preso olhou para o Leonino. Kamus já sabia que ele não tinha conhecimento algum sobre o aparecimento dos escorpiões. Agora o outro policial dizia que isso poderia ter conseqüências negativas ali dentro. "Ele está dizendo que se eu não morrer espancado por mentir para a polícia, vou mofar na solitária. Tenho que fazer alguma coisa e rápido".

- Vamos fazer um acordo Milo e saiba que estou abrindo uma exceção porque não costumo negociar com bandidos. – deu uma pequena pausa - Eu vou te dar um tempo para pensar enquanto tomo a água. Quando eu acabar, ou você fala onde conseguia os escorpiões, ou chamo o agente para refrescar sua memória.

Kamus tomou a água calmamente. Milo não sabia o que fazer. Se falasse, confirmaria seu blefe e não sairia da prisão, se não falasse, apanharia.

- Seu tempo acabou. – disse colocando o copo sobre a mesa – Pode chamá-lo Aioria.

- Espera. – o Escorpiniano falou para ganhar tempo – Eu... eu não gosto de ser ameaçado.

- Basta começar a falar que as ameaças param.

De repente a mente do ladrão teve um estalo. "Será que..."

- Não estou blefando sobre os meus conhecimentos.

- Ah, não está ? – o francês perguntou irônico.

- Na parte de baixo do escorpião tem uma letra.

Kamus já havia analisado muito bem o escorpião. Apenas balançou a cabeça negativamente.

- Que pena. – disse inexpressivamente - Tente outra Milo, essa mentira não funcionou.

O grego deu um belo sorriso. Precisava demonstrar auto-confiança. Tinha sentido o relevo da outra vez quando o investigador colocou o objeto em sua mão.

- Você está mentindo Kamus. Tem uma letra embaixo do escorpião. – disse triunfante.

Era verdade. Tinha mesmo uma letra.

- E o que significa esta letra ? – o francês perguntou.

- Ora investigador, o "X" marca o lugar do tesouro. Essa letra é a assinatura de quem fez o escorpião.

- E quem fez ?

- Só falo do lado de fora. – disse decidido.

Se Kamus deixasse o ladrão dominar a investigação estaria perdido. Nunca conseguiria saber o que precisava. Se era guerra o que o Escorpiniano queria, o francês era ÓTIMO em guerra psicológica.

- Ok. Pelo modo difícil. Aioria, por favor.

O investigador grego fez um sinal e o guarda entrou.

- Então, o que você estava me dizendo Milo ? – o Aquariano perguntou.

A tensão estava estampada no rosto do Escorpiniano, mas ele permaneceu mudo.

- Sabe, – Kamus se dirigiu ao guarda – estamos com um pequeno problema com a testemunha. Preciso da sua ajuda para que ele continue a falar.

- É mesmo, policial ? - o agente tirou o aparelho de choque da cintura e ligou.

O francês percebeu que Milo engoliu seco e se encolheu na cadeira. De onde o investigador estava era até possível ouvir a respiração entrecortada do preso. Quando o guarda chegou mais perto do ladrão o Aquariano recomeçou a falar, chamando a atenção do agente.

- Acho que ele está falando tanto que ficou com a garganta seca. Você pode trazer uma água para ele ? Assim podemos continuar com o interrogatório.

O guarda cerrou os olhos.

- Claro, investigador. – desligou o aparelho, recolocou na cintura e saiu irritado.

"Quem estes almofadinhas pensam que são ?" o agente refletia "Só porque trabalham em um prédio bonito em Paris acham que eu sou copeira para ficar trazendo água para todo mundo ?"

Os três permaneceram em silêncio até o guarda voltar com a água. Colocou-a sobre a mesa e saiu.

- Beba ! – o francês ordenou ao Escorpiniano.

Milo estava nervoso e bebeu de uma vez só. Tinha dado sorte com a letra embaixo do escorpião. Ainda bem que se lembrara disso, mas o investigador era um homem frio. O terror psicológico que estava lhe impondo estava tirando sua concentração.

"Realmente Kamus não parece o tipo que aceita negociar. Tudo tem que ser do jeito dele. O que devo fazer ?" – o ladrão pensava angustiado.

- Sabe Milo, sou um homem muito ocupado e tenho outras coisas para fazer além de ficar conversando com você. Você tem um cronômetro Aioria ?

- Tenho sim.

- Você tem 60 segundos para começar a falar ou a próxima vez que o guarda entrar não será para trazer água. Já te dei duas chances. Esta é a terceira. Não costumo ser TÃO paciente assim.

- 59 segundos... 50... 40... 30... – Aioria contava aumentando a tensão psicológica – 20... 10... 9... 8... 7... 6... 5... 4... 3... 2... 1. Tempo esgotado.

- É uma pena que você tenha optado por isso, Milo. – o francês disse calmamente – Acho que você já deve ter ouvido falar do caso do presidiário que se suicidou com um grave traumatismo craniano, não ? Era eu quem o interrogava. Ele não queria colaborar com as respostas. Foi uma pena o que aconteceu. (1)

- É verdade. E ele deve ter se jogado COM MUITA FORÇA na parede para quebrar a cabeça daquele jeito. Pobre rapaz. – Aioria comentou com pesar.

O grego ficou com receio. Já tinha ouvido a história. O tal preso não tinha colaborado com alguma investigação e os guardas o espancaram até a morte. Era óbvio: o policial chamaria o agente e pelo jeito não se importava se o guarda fizesse o mesmo.

- Kamus, - o presidiário disse com ar suplicante – você sabe que eu posso te ajudar, eu já te provei isso. Se você chamar o guarda ele não vai sair daqui até ter a minha língua na mão dele. Aí será impossível falar.

O francês não deixaria que o Escorpiniano tomasse conta da situação.

- Tudo bem Milo, - disse com um leve sorriso - se ele arrancar a sua língua, prometo não deixar que ele corte sua mão. Assim você pode desenhar.

- Kamus, por favor. – pediu esticando sua mão e colocando sobre a mão do Aquariano.

O toque inesperado foi como uma descarga elétrica no policial. O investigador puxou a mão na hora.

- Eu NÃO te dei autorização para tocar em mim. – disse friamente.

Em sua carreira como investigador, Kamus tinha encontrado vários destes tipos. Assassinos, ladrões, estupradores, traficantes, fraudadores, a nata do crime. Costumavam se colocar como seres dignos de pena em uma conversa com o francês. Suas expressões sofredoras, seus olhares de súplica, suas falas carregadas de emoção ao implorar "por favor". Alguns até lançavam mão, como o grego estava fazendo agora, do artifício do toque. Grudavam-se às mãos do investigador como um filho que procura as mãos de um pai em busca de proteção. O policial já estava vacinado contra estes tipos que se faziam de coitadinhos e não sentia um pingo de pena deles, ao contrário, só os desprezava.

O Escorpiniano estava temeroso. Sabia que contra os agentes penitenciários da Clairvaux não adiantava valentia. Sabia do que eles eram capazes...

-oooo-

Quando Milo entrou no presídio o regime de silêncio absoluto não era mais vigente, mas não se permitia conversação durante o trabalho. O diretor achava que isso distraía os presos e eles não rendiam o que precisavam.

Na primeira semana de cadeia pegaram o ladrão cantando alto enquanto trabalhava. Os demais presos acompanhavam a música e dançavam, atrasando o serviço. O Escorpiniano bem que tentou se justificar, mas não teve discussão. Uma semana de solitária.

Dez dias depois de sair da solitária, estava novamente cantando. Com a ferramenta ligada, não foi capaz de ouvir o guarda supervisor chegando. A regra era clara. A perturbação da paz era punida com a reclusão absoluta.

Era ÓBVIO que Milo não estava perturbando a paz. Não estava cantando alto e o barulho da serra era INFINITAMENTE maior que o som da sua voz, mas os guardas já estavam de olho nele por causa da reclamação da primeira vez em que foi enviado à solitária.

O agente penitenciário mandou ele calar a boca e parar de cantar. O grande erro do Escorpiniano foi argumentar.

- Por favor, senhor guarda. - pediu – Se até os mendigos de rua cantam, qual o proble...

Antes de terminar a frase um violento golpe de cassetete dado em seu joelho o fez perder o equilíbrio e cair no chão. Em seguida ouviu um apito e imediatamente seu corpo foi estremecido por dolorosos choques. Logo outros dois agentes chegaram, atendendo ao chamado do apito, e ajudaram a ensinar um pouco de disciplina ao preso.

Sua boca sangrava e sua carne ainda tremia quando foi trancafiado por duas semanas na solitária. Felizmente quando saiu de lá o diretor era outro e as regras já estavam bem mais flexíveis. Agora quando as conversações eram exageradas eram punidas com a privação do domingo ou do almoço.

-oooo-

– Chega de história. – o Aquariano disse aborrecido - Vai falar por bem ou por mal.

Os pensamentos do Escorpiniano corriam à velocidade da luz. Seu tempo estava se esgotando. Em instantes o guarda entraria na sala. Precisava arrumar um jeito de vencer aquele combate psicológico.

"Mas como ?"

De repente teve um lampejo. Conseguiu pensar em um modo de vencer o policial. Era uma forma completamente suicida. Se desse errado, perderia a vida e nunca mais veria o Afrodite, mas se desse certo, sairia da prisão muito em breve. Fingiu estar aborrecido. Teria que ser convincente.

- Quer saber ? – disse raivosamente – Antes eu ATÉ ia cooperar, mas agora CHEGA. NÃO gosto de ameaças. Quer mandar ele entrar ? MANDE. Não falo mais PXXXX NENHUMA. Prefiro MORRER. – deu uma pequena pausa - E VÁ PARA A PXXX QXX PXXXX, VOCÊ e esse seu capacho. – apontou para Aioria.

O Leonino arregalou os olhos e ia falar, mas Kamus fez um sinal com a mão para ele esperar. Conhecia bem a psicologia criminosa.

- Acabou o showzinho ? – o Aquariano perguntou-lhe.

- VAI SE FXXXX.

O policial grego se levantou, mas um gesto do francês o deteve antes que chegasse no preso.

- Não se preocupe com o cãozinho valente, Aioria. Está latindo alto para fazer medo, mas não ataca. Ele sabe que não tem conhecimento suficiente para que eu queira tirá-lo daqui. Quer morrer ? Ótimo. Que morra. – replicou com sua característica frieza.

"PXXX QXX PXXXX ! QUE MXXXX ! Esse puto do Kamus saca tudo ?" pensou irritado "Droga. Como ele sabia que esse lance da morte era um blefe ? Droga duas vezes. Eu pensei que ele também estava mentindo e que não era tão durão assim. Vai. Pensa Milo, pensa. Ele vai chamar o guarda. Ai, ai, o que eu faço ?" perguntou-se sem ação.

- Aioria, peça para o agente entrar.

O guarda entrou na sala A tensão do preso aumentou. Milo não sabia o que fazer.

- Quer que eu pegue outra água, investigador ? – o agente perguntou um pouco aborrecido.

- Não. Quero apenas que se certifique que a algema do preso está bem fechada.

O guarda aproximou-se do presidiário e pegando a corrente que unia as algemas deu um forte puxão para cima. Milo soltou um pequeno gemido causado pela violência da ação.

O ladrão tinha ouvido falar que antes de espancarem um detento ali na sala de testemunho, os agentes penitenciários o algemavam. Isso evitava que o preso se defendesse.

- Está bem presa. – afirmou ao francês e virou-se novamente para o preso. Os olhos do guarda brilhavam.

O Escorpiniano engoliu seco. Pelo olhar do agente sabia que se não falasse, apanharia e ainda que falasse, apanharia. Estava perdido. Não sabia mais o que fazer. Olhou suplicante para Kamus, mas este não poderia estar mais impassível. Sua frieza era impressionante.

O guarda tirou o aparelho de choque da cintura. O Aquariano, sentado calmamente, observava o comportamento do ladrão.

"Acho melhor eu começar a falar" o presidiário pensou. "Qual era mesmo o nome do cara que fazia os escorpiões ? Ele trabalha na feira de artesanato que tem perto da torre Eiffel ou era perto do Arco do Triunfo ? QUE MXXXX ! Por que a gente SEMPRE esquece as coisas importantes quando mais precisamos delas ?"

A tensão crescia no interior do preso. O agente deu um passo em direção ao Escorpiniano. Milo engoliu seco. Sua mente estava em branco. Não conseguia mais se lembrar de nada. Era como se tudo o que soubesse tivesse se apagado.

"Droga, Milo" – o Aquariano refletia – "Por que você não fala ? É tão cabeça dura assim que prefere se deixar morrer a abrir a boca ?" pensou em desaprovação "Mas que INFERNO, Shura, por que você não sai da minha cabeça ?" recriminou o ex- por não conseguir tirá-lo da mente.

O agente ligou o aparelho. O ladrão cerrou os dentes. Tentou pensar em Afrodite. Queria desviar sua atenção da dor que sabia que sentiria.

O francês já tinha presenciado um guarda espancando um preso. Sabia como era difícil fazê-lo parar de bater depois que começava. Apesar de não gostar de bandidos, achava que essa era uma violência desnecessária.

- Ótimo que ele está bem preso. – Kamus disse ao guarda, fazendo-o parar a centímetros do presidiário - Agora quero que entregue isso ao Diretor. – disse retirando um envelope do bolso do paletó e colocando sobre a mesa. – Ele está aguardando para assinar.

- Mas se eu sair quem vai fazer a segurança de vocês ? – o agente perguntou.

- Se importaria em deixar o aparelho de choque ?

- Aqui está. – disse entregando-o na mão do francês e saindo em seguida.

Kamus se levantou, caminhou pela sala e passou por trás do grego, ainda com o aparelho de choque ligado na mão. Milo estremeceu de leve. O corpo do ladrão ainda se recordava da dor que era sentida com a descarga elétrica. Se o investigador queria machucá-lo, essa era a hora. Engoliu seco e ficou esperando.

O Aquariano entregou o aparelho ao Leonino e posicionou-se atrás do criminoso. Kamus tinha tentado arrancar mais informações do grego, mas ele estava irredutível. Era óbvio que não ia falar. Não ali dentro. O garoto era muito cabeça dura e jogava pesado, mas de qualquer forma, não era mais necessário continuar com a tortura psicológica.

- Ok Milo. Você me convenceu. Vou te tirar daqui.

Os belos olhos azuis se voltaram com surpresa para o investigador.

- Terá o que pediu, mas com algumas restrições. – disse voltando a andar pela sala.

O Escorpiniano ficou atento ao francês, mas por dentro soltava fogos de artifício. Tinha arriscado o pescoço, mas tinha valido a pena. Ia sair da prisão.

- Você ficará fora cinco dias...

- Mas eu pedi dez. – explicou.

- Se está achando ruim, posso te deixar aqui. – disse friamente.

Milo se calou e ficou sério, mas por dentro, gargalhava de satisfação.

- Você não estará a passeio, mas à disposição da polícia. Se eu perceber que você não quer colaborar, você volta para o presídio e vai direto para a solitária, entendeu ?

O grego assentiu positivamente. Estava com vontade de gritar loucamente de felicidade. Desta vez Kamus tinha caído no seu jogo.

- Você não poderá ira a nenhum lugar que queira, a não ser que EU autorize, você andará cem por cento do tempo algemado, a não ser que EU determine o contrário. Será acompanhado o tempo todo por um policial e não poderá falar com ninguém, a não ser que EU autorize. Só dará informações a mim e à minha equipe. Só responderá ao questionamento de outro policial se EU autorizar. Lembrando que se TENTAR me enganar, vai desejar nunca ter nascido. Alguma pergunta ?

- Apenas uma. – disse com um sorriso levemente debochado nos lábios – Estou autorizado a respirar ?

Aioria deu uma pequena risada com a piada, mas logo voltou a ficar sério.

- Sem gracinhas. – o francês replicou.

"Pelos céus." Kamus pensou "Já vi que esse garoto vai me dar MUITO trabalho."

-o-

O agente voltou com o ofício de guarda provisória assinado pelo Diretor. Passaram pelo setor de averiguação e o grego foi solto para trocar de roupa. Tirou o uniforme e colocou a roupa que estava quando foi preso. Kamus não pôde deixar de notar como o grego ficou ainda mais atraente sem as roupas folgadas de presidiário.

Aioria colocou algemas nos tornozelos do preso e recolocou a algema no braço do Escorpiniano com cuidado. A força empregada pelo guarda para verificar se o ladrão estava bem preso tinha machucado seu pulso.

Os três saíram do prédio e entraram no carro.

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Fazia quase vinte minutos que estavam na estrada quando Milo quebrou o silêncio.

- Kamus, será que eu posso visitar o túmulo da minha mãe ?

O francês já havia planejado o dia em que levaria o ladrão até o cemitério, mas não ia facilitar as coisas. Se o preso descobrisse que na verdade ficaria bem mais que cinco dias fora e que além de visitar o túmulo de sua mãe ainda teria algumas outras mordomias, poderia tentar conduzir sua estadia fora da prisão. O garoto tinha personalidade. O Aquariano não podia perder o controle.

- Na hora em que EU decidir, você vai.

Depois da resposta o detento voltou a ficar calado.

-o-

Durante o caminho o francês olhou três vezes para o Escorpiniano, pelo retrovisor, e se aborreceu ao perceber que Milo parecia estar esperando que ele olhasse. Ficou ainda mais aborrecido na última vez, depois de receber um belo sorriso do ladrão.

"Se eu não gostasse tanto de você, Afrodite..." o grego pensou ainda sorrindo "Larga de ser tonto, Milo. Só a sua cabeça para achar que o Kamus ficou olhando para você depois que você se trocou. Não está vendo que ele não é viado ? Pára de ficar pensando bobagens." se recriminou "Mas então por que ele fica olhando para mim ?" perguntou-se em seguida "Ora Milo, é para ter certeza que você não vai aprontar."

O ladrão sorriu largamente.

"Sinto muito policial, mas se você acha que eu não vou aprontar, você está MUITO enganado."

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Próximo Capítulo – Na IPF Milo toma conhecimento dos dois crimes e começa a ajudar nas investigações.Um erro da secretária coloca o francês em uma situação bem delicada em relação ao Escorpiniano. Kamus tenta descobrir mais sobre a misteriosa companhia do grego quando ele foi preso.

ATENÇÃO: O próximo capítulo contém material erótico - verifique a indicação de permissão de idade do site antes de prosseguir..

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Nota da autora – Explicações

( 1 ) História contada no capítulo I – Conhecendo o Escorpião

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Nota da autora - Agradecimentos

Gostaria de agradecer a todos que estão acompanhando a história, principalmente as que mandaram e-mails

Ana Paula - Está adorando a fic e estava curiosa para saber quem era o dono do coração do francês. Achou o Kamus muito esquentado com os criminosos. Bela Patty - Aninha, infelizmente vc não teve sorte nas suas suposições, não era nem o Saga nem o Hyoguinha. Explicado o "pavio curto" do francês ? Ora, com um espanhol gato desses como ex-, quem não fica histérico ? rsrs. Mil obrigadas pelos incentivos .

Anjo setsuna - Ficou com ciúmes do Dido & Milo. Apostou no Saga para ser o amor do Kamus. Bela Patty - Se vc já estava com ciúme do Milucho, quero só ver agora do Kâ com o Shurinha rsrs. Ah ! Tem razão. O Saga é PERFEITO !

Arashi Kaminari - Gostou do Milo & Dido, gostou das informações da prisão e da jogada de sorte do Escorpião. Só achou estranho o Milucho não mudar ali dentro. Bela Patty - Foi difícil ver o Milucho com outro que não o francês, mas pelo Dido vale a pena . Mil obrigadas pela dica. Tive que reescrever os três próximos caps, mas valeu a pena. Realmente o gatinho de Escorpião mudou e ainda vai dar MUITO trabalho para um certo investigador rsrs.

Athenas de Aries - Achou que a história está tomando um rumo legal e comentou que muitas vezes os personagens até tomam rumo próprio. Bela Patty - Tem toda a razão. O pior ainda é quando eles tomam rumo próprio em UA (para que eu fui inventar de escrever UA ?). Praticamente refiz todo este capítulo 3 vezes !

Caliope Amphora - Adorou o cap. Achou o Kamus muito sexy fazendo papel de investigador durão e o Escorpiãozinho muito esperto. Está curiosa sobre os crimes. Bela Patty - Obrigada pelo incentivo. Bem, aqui está mais um pouquinho de investigador durão para vc (pena que não deu muito certo com o Milucho rsrs). Shurinha. Foi ele quem "roubou" o coração do Aquariano. Aguarde... logo tem pistas dos crimes.

Cardosinha - Adorou a fic e já tem um palpite para o novo Escorpião Escarlate e está aguardando o lemon (?) . Também jogou uma praga em cima dos guardas que "tentarem" tocar no Milucho. Bela Patty - Vou mandar seu currículo para o Kamus. Mal começou a fic e vc já tem um suspeito ? rsrs. Menina, acho que a sua praga vai para mim. Tive que reescrever este cap 3 vezes ! EU MESMA já estava quase enforcando o Escorpiãozinho, mas agora passou . Lemon ? O.O. Ok, você me convenceu (rsrs) terá um leve (mais ou menos) entre Kamus e Shura no próximo cap. (PS: Obrigada pela foto do Hyoguinha. É linda !)

Dana Norram - Comentou que a Santuário Times já fazendo escola e gostou bastante da temática da fic. Bela Patty - Essa Calíope é um perigo ! rsrs. Realmente a ST foi o tempero que faltava.

Gisele - Disse que o Milucho não é nada bobo e ainda sortudo. Só espera que ele não se decepcione com o Dido. Está ansiosa por Mi & Ka juntinhos. Bela Patty - Essa relação do Escorpiãozinho com o Peixinho ainda vai dar muita dor de cabeça. Quanto ao ladrão e o policial... tá longeeeeeeee... Ah ! Viu só ? O Kamus não é perfeito. Ele também erra ! \o/ rsrs.

Ilia - Adorou jeitinho do Milucho. Torce para o Kamye não ficar muito tempo nessa implicância com o greguinho. Também está curiosa para saber por onde anda o Dido. E já tem uma suposição de quem seja o novo Escorpião Escarlate. Bela Patty - Ai, ai, o Milucho ! Humm... estou vendo certo francesinho meio mal-humorado ficando um tanto confuso aí pela frente. Pois é... Shurinha é o dono do coração do Aquariano ! Bem, Dido em breve. E não se preocupe, TODOS são culpados até que provem o contrário. rsrs.

Kitsune Youko - Achou o Milo bem abusadinho. Mas gostou do Dido & Milucho. Ficou curiosa para saber se terá algo entre Mi & Kâ. Bela Patty - O Milucho está IMPOSSÍVEL. Está dando trabalho ATÉ para mim. Fiquei quase doida de procurar perfis criminosos na internet rsrs. Sim, acredite, esta é uma fic Mi & Ka (apesar de muitos fatos aí pela frente mostrarem o contrário rsrs)

Litha-chan - Adorou Milo & Dido (que calor !) Também ficou aliviada pelo gatinho de Escorpião não ter perdido os cachos. Bela Patty - Calor é a história que vem por aí sobre o início do namoro entre o Kâ & Shura (uau ! rsrs). Milucho & Peixinho... não é fofo ? Sobre os cachos do Milucho, sou má, mas JAMAIS tocaria nos cachinhos do grego. NUNCA !

Nana Pizani - Ficou com pena do Milucho, mas sabe que ele é esperto o suficiente para dobrar o Kamus e ganhar os 10 dias de sol. Já tem alguns suspeitos. Bela Patty - Realmente o Milo foi bem esperto. Ele quase perdeu, mas no fim, acabou ganhando do francês. Bem, acho que agora vc vai ficar com pena do Kamye. Tadinho T.T. Segure os seus suspeitos. Em breve tem pistas.

Neme - Adorou a fic e achou que muito emocionante. Dido & Milo. Clima entre Milo & Kâ. Também gostou do Milucho não perder os cachos. Kamus neurótico e participando de batalhas psicológicas ? Que novidade ! rsrs Bela Patty - Pois é. Não tive coragem de tocar nos lindos cachinhos do fofo e se as mulheres podem... Bem, só sei que o Milucho vai deixar o francês ainda mais neurótico. Vc sabe como ele é terrível, não ? rsrs. E EM HOMENAGEM À VOCÊ: Shurinha como amor do francesinho ! Na verdade isso é uma espécie de compensação até que saia aquela fic em que o Mi & Shurinha serão amigos (tá demorando...)

Shakinha - Está adorando a fic. Achou muito interessante a história do Milo e está morta de curiosidade para o próximo cap. Bela Patty - Aqui está. Milo 1 x 0 Kamus. rsrs. Tadinho do francês, ele pode ser Gelo, mas este ladrão é FOGO !

Srta Nina - Milucho sofrendo tanto, Kamus mau (que medo!) Adorou ! Está brava com o Dido por não visitar o Mizinho. Bela Patty - Ok, ok, aqui está. Um pouco de sofrimento para o francês também, ok ? rsrs. Tadinho. E o Kamus TAMBÉM erra ! \o/ rsrs. (e enquanto isso, Milucho aproveita a situação rsrs). Bem, em breve sai o motivo do Dido não visitar o namorado na prisão... (acho que vc vai ficar mais brava ainda)

Sinistra Negra - Está esperando para ver quem é o novo Escorpião Escarlate. Já tem alguns suspeitos, mas não revelou. Bela Patty - Em breve começam as pistas (para falar a verdade é um emaranhado de fatos tão grande que até eu estou me perdendo do meio deles rsrs)

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Nota da autora – contato

Como sempre podem me contatar, brigar, criticar, reclamar, dar dicas ou só escrever para bater papo no erika(ponto)patty(arroba)gmail(ponto)com ou via review neste site.

Bela Patty .

- Outubro / 2005 -