HARRY POTTER E O OLHO DA ESCURIDÃO

Nota da Autora (1): Demorou mas chegou, não é?! Aconteceu mais uma porção de coisas... É, problemas e mais problemas. Como já disse antes, a faculdade quase me matou, mas tudo bem... Agora acabou! Estou oficialmente de férias! Lindo, não acham?! Estou eufórica! ;) Também deveria ter postado esse capítulo antes, ele já tem cerca de 3 semanas, mas estava esperando a betagem da Karen, mas ela não devolveu ainda. Para evitar problemas, estou postando, mas quando o capítulo voltar betado, eu colocarei-o novamente aqui, ok?

Nota da Autora (2): Agradecimentos e desculpas pelo atraso para a Anaisa (Não vai me matar, jura?!), a Dani (Telida, mais ameaças?! Poxa... Tudo por uma boa causa, lembra?!), Evenstar (Porque eu fiz isso com ele ainda é um mistééério...), Framboesa (Já até trocamos e-mails divertidíssimos hein! E olha.. carinha do gato de botas do Shrek eu não resisto! Olha lá hein!), ang (Sim, lobos morrem com balas de prata sim... Mas o Avada é o feitiço mais horrível que existe, não é?), Kirina-Li (Vi sim, até cheguei a te mandar um e-mail, você chegou a ver?), Pekena Black Malfoy (Matar o Snape?! Coitado! Hahahaha! Mas vamos ver, não é mesmo?!), Bibynha (Nossaaaaa!! Minina, ficou morrendo de vergonha agora! Poxa, adorei saber que você gosta desta fic! Obrigada mesmo! E espero que continue lendo, ok?!). Beijos a todos!!!!!!!!!!!!

NO CAPÍTULO ANTERIOR: Brigas entre sonserinos e grifinórios - não exatamente um contra o outro -, visões estranhas do passado de Ártemis Figg e Severo Snape, Hermione a beira de uma expulsão e um ataque surpresa ao Ministério da Magia. Remo J. Lupin está morto.


CAPÍTULO TRINTA E TRÊS - IMORTALIDADE

Sirius deixava que um pequeno e suave temor passasse por sua espinha. Todos os pêlos de seu corpo se erguiam e aquela sensação o deixava extremamente agitado e exausto. Um divagar estremecido acompanhado de imagens de um corredor escuro, uma cela, fogo por toda a parte, gritos. De que adiantava permanecer naquele pesadelo se sabia perfeitamente como sair dele? Era apenas abrir seus olhos, certo? Por que seu coração estava disparado e deixando-o ofegante, mesmo que incrivelmente relaxado em seu leito de descanso?

Assim que as pedras azuladas se destacaram no âmbito escuro, a leve brisa daquela noite de primavera entrando por uma fresta na janela, Sirius notou que não era o único instável naquele dormitório. Arabella estava deitada ao seu lado, a barriga de quase completos cinco meses despontando no lençol ligeiramente. Sua cabeça movia-se com delicadeza de um lado ao outro, a expressão de profundo incômodo. Suas sobrancelhas estavam arqueadas em tom de dor, e o noivo começou a sacudi-la para despertá-la.

Os olhos escuros de Arabella abriram num espasmo veloz, o qual surpreendeu Sirius. Ela estava séria como de costume, o semblante calmo e os lábios bem avermelhados. Mesmo na penumbra, embora, o bruxo podia ver que havia algo de errado. Seu peito subia e descia ritmicamente, mas ainda com certo peso. Sirius ficou amolado e aproximou-se da noiva. A brisa agitou seu cabelo escuro com gentileza, enquanto arqueava seu corpo sobre o dela, apoiando seu cotovelo esquerdo na cama.

- Você está bem? – perguntou, a mão guiando até sua barriga instantaneamente.

A primeira reação de sua noiva foi morder o lábio inferior com tamanha força que por muito pouco ele não rompera. Ou ao menos isso era o que parecera a ele. Porém, assim que seus olhos escuros fecharam-se nos dele, Sirius teve de segurar o ímpeto de perguntar o que estava acontecendo uma segunda vez.

- Eu não sei... – murmurou a mulher em resposta, deixando os lábios abertos e soltando um gemido. – Pode ser coisa minha, mas eu sinto que tem alguma coisa acontecendo...

Naquele instante, Sirius percebeu que, de fato, Arabella havia rompido seu lábio inferior no canto esquerdo, onde mordera anteriormente. No luar, o sangue começou a escorrer em quantidade ínfima, mas aparente a ele. Na pouca luz, ele parecia preto. Erguendo a mão direta para limpar o ferimento, Arabella abriu os lábios novamente, torcendo a barriga em sua direção com cuidado.

- Já falou com o Remo sobre o casamento e o bebê? – indagou repentinamente.

A mão de Sirius ficou paralisada, sem reação.

- Por que você resolveu perguntar isso agora? – franzindo a testa.

Suas pálpebras fecharam e abriram novamente, sem ganhar a devida explicação. Era como se ela mesma não soubesse de onde aquela pergunta havia surgido. E aquela postura havia deixado-o estranho? Sirius voltou a dirigir seus dedos até a boca da noiva e iniciou uma delicada limpeza do sangue.

- Ainda não tive uma oportunidade, Bella – respondeu em um ruído. – Mas não creio que ele irá recusar nosso pedido.

Uma das mãos da bruxa guiaram até sua saliência no tórax e passeou carinhosamente.

- Talvez seja apenas impressão minha, mas... – sussurrou Arabella, olhando para longe dos olhos do homem. – Achei que ele andava aluado demais – voltou o olhar para Sirius, já notando a quase risada que ameaçava escapar do noivo. – Além do normal, Sirius. – completou, irritada.

- Isso foi extremamente irônico – riu o bruxo, piscando com o olho esquerdo. – Mas acho que toda essa situação com a Heather de volta deixou-o meio fora dos trilhos. Nunca acreditei que ele a esquecera completamente. E, agora, tê-la de volta nessas circunstâncias, não me parece justo.

Um suspiro soltou-se da grávida. Uns fios do comprido cabelo de Sirius se agitaram. Era estranho como Lupin sempre agira sobre seus sentimentos em relação a Heather. E ele sabia que provavelmente tudo que o melhor amigo sentira pela sua atual noiva estaria se acabando. Ou era o que ele esperava.

- O destino nunca fora justo com ele... E de certa forma, com nenhum dos dois – completou Arabella, uma intensa dor em suas palavras. – Mas sinto que podíamos fazer mais por ele. Remo já fizera tantas coisas por nós durante todos esses anos, não seria verdadeiro e justo esquecê-lo num momento como este – quando Sirius pensou em responder algo, Arabella prosseguiu. – Por favor, Sirius, fale amanhã de manhã com ele. Nós não sabemos por mais quanto tempo ele permanecerá em Hogwarts. E já estamos perto de nosso casamento e do nascimento do nosso filho.

O sorriso mais besta que já fora visto no rosto de Sirius aparecera mais uma vez, para deleite de sua noiva.

- Ou filha... – cochichou, o riso infantil atingindo toda sua face. – Mas por que essa necessidade de rapidez tão grande? Nosso velho lobo não vai fugir de nós, sabia?

Por um breve momento, talvez um piscar de olhos, Arabella sentiu que algo estava faltando. Uma sensação de perda preencheu seu coração e, vindo de seu mais íntimo, ela começou a chorar. Sirius permitiu que seu sorriso desaparecesse e tomou uma expressão de extrema preocupação. Arabella encolheu-se na cama, o corpo ao lado do noivo, como uma criança indefesa. Sirius ficara completamente sem reação, não entendendo o porquê daquela postura tão drástica e repentina de Arabella.

E naquele exato tempo, Hauspie Bellacroix passava pelos portões de Hogwarts, acompanhada de um ferido Silver Zylkins, com o corpo inerte e sem vida de Remo Lupin nos braços.

Correndo com o todo o peso junto ao corpo, Hauspie olhava para os lados na procura de encontrar alguma sala ou lugar em que pudesse entrar em comunicação com Dumbledore. Imaginou o porquê de Figg e Snape não aparecerem no Ministério para ajudá-los. Engolindo em seco e tentando manter a respiração ritmada, Bellacroix pensou no que uma notícia como aquela poderia causar na Ordem da Fênix e em Dumbledore. Remo Lupin era um dos mais importantes membros daquela armada, sem mencionar a forte ligação com Harry Potter e o ex-fugitivo Sirius Black.

Tornando-se para Silver, que mancava da perna esquerda e apertava fortemente um ferimento mais sério no tórax, pediu que fosse a sala do diretor de Hogwarts antes que fosse muito tarde. Imediatamente, a auror francesa adentrou num cômodo escuro e iluminado fracamente pelo luar das janelas. Zylkins desapareceu de sua visão e ela conseguiu manejar o descanso do corpo de Lupin no chão. Suspirando profundamente, cansada por ter percorrido todo aquele caminho, fechou os olhos.

A primeira cena que viera em sua mente não poderia ser outra: a quantidade de corpos sem vida, queimados, incendiados, no Ministério. Ainda poderia sentir o cheiro de podridão no ar, de tão forte. Nunca imaginou que a vingança pessoal de Voldemort iria retornar contra inocentes, a maioria deles sem acreditar ainda de que estava de volta e com força total. Mordendo o lábio inferior, murmurou algo em francês e voltou a olhar para o companheiro caído no piso. Inerte. Sem vida.

Pensou em como poderia ajudar de outra maneira. Sua força e habilidade não eram mais eficientes o bastante. Não eficientes para salvar Lupin de uma Maldição Imperdoável, e a pior de todas. Segurando quase um soluço na garganta, dividida entre a decepção consigo mesma e o ódio contra Voldemort e seus seguidores, ouviu passos ligeiros e pesados contra o piso de cimento e ergueu-se. Zylkins estava acompanhado de Dumbledore. Suas vestes azuladas e levemente amarrotadas acompanhavam seu andar nervoso. No instante em que seus olhos encontraram Lupin, o diretor parou bruscamente. O velho bruxo ficou paralisado ao ter completa visão do corpo morto de Remo Lupin ali. Caso estivesse mais claro, Hauspie poderia dizer que havia lágrimas em seus olhos escondidos detrás das lentes de meia-lua.

O diretor abaixou-se com certa dificuldade e passou lentamente os dedos da mão direita sobre o rosto pálido e sujo de Remo. O seu velho estudante especial, o lobisomem controlado pelos melhores amigos, alguém que dividia o tempo entre o Salão Comunal da Grifinória e o Salgueiro Lutador, o melhor professor de Defesa Contra a Arte das Trevas, um amigo... Escorria de sua boca um fio de sangue. Zylkins colocou-se ao lado de Bellacroix e passou o braço esquerdo pela suas costas, querendo confortá-la de alguma maneira. Sentia-se da mesma forma, culpado. A Ordem havia sido montada há pouco mais de um ano, mas pareciam conhecer um ao outro há décadas. Silver ouvira as repreensões duras de Hauspie consigo mesma desde o Ministério até Hogwarts. Ela não se perdoava, e o sentimento não deixava de ser o mesmo no seu caso.

Assistiram Dumbledore retirar seu chapéu cônico da cabeça e deixá-lo de lado no piso, esquecido. Em seguida, flutuar as mãos sobre o corpo de Lupin, sussurrando algumas palavras incompreensíveis, e permitir que a emoção extravasasse do seu corpo em forma de feitiços coloridos. Hauspie imaginou que ele estivera tentando reviver Lupin. Mas sabia, dentro de si, que seria impossível. Trêmulas, as mãos vagavam no espaço, jorrando uma pequena fonte de esperança. Dumbledore parecia fraco, cansado. Era inevitável.

Após alguns minutos assim, no silêncio da noite e no escuro do âmbito, Dumbledore desistiu, rendeu-se. Retirando as mãos sobre o cadáver de Lupin, soltou um suspiro derrotado e permitiu-se limpar algumas lágrimas de seus olhos. Silver já tinha sentado e apoiado-se na parede, respirando com dificuldade por causa do ferimento no tórax. Hauspie continuava ali, em pé, paralisada, com inúmeros pensamentos correndo a sua mente. Seus olhos tremiam ao menor sinal de movimento, coisa que era capaz somente de Dumbledore. O velho acabou por levantar-se do chão e voltar o olhar para os membros de sua Ordem. O olhar sempre tão cheio de vida estava opaco, perdido.

- Acho melhor avisarmos toda a Ordem para a primeira baixa – disse ele, silenciosamente, sem focar direto os olhos azuis da auror. – Se estiver sentindo-se bem, Hauspie, quero que faça isso por mim.

Bellacroix não soube dizer o porquê, mas simplesmente sentiu que Dumbledore necessitava de uma reunião dos membros para noticiar a morte de Lupin mais do que qualquer coisa no momento. Era como se ainda tivesse assuntos mais importantes a serem resolvidos. Respirou e concordou bravamente.

- Sim, senhor, não falharei. – respondeu, mais como uma promessa.

Sem mais palavras, a auror deixou Dumbledore e Zylkins, e chegou logo ao jardim do castelo. Suas pernas a guiaram, mas algo a deixara impassível. De certa forma, uma das sensações mais odiadas era a impotência. Ela estava impotente diante da Nova Era do Terror.

Retirando as duas varinhas de seu casaco, como uma reação automática, avistou ao longe uma sombra no meio das árvores da Floresta Proibida. Sabia muito bem quem era. Cerrando os olhos com raiva, iniciou passo atrás de passo, veloz, a sua caminhada para alcançar aquela criatura afugentada.

Estando bem perto do ponto de ataque, Hauspie agitou as varinhas com força e os rastros azulados de luz transformaram-nas em espadas. Num impulso, retirou seus pés do gramado e cruzou-as diretamente na jugular do oponente. A sombra deu um passo relutante e quase assustado para trás, e apareceu contra a luz de suas espadas. A sempre tão pálida expressão de Severo Snape mostrou-se inabalável.

- Cuidado com essas espadas, Bellacroix. Você pode matar um inocente deste jeito...

Enfrentando a voz seca e ríspida de Snape, Hauspie gritou contra ele, nada muito certo, empurrando-se contra o professor. Snape deu um passo para trás, usando de mesma distância que ela havia impulsionado a si própria. Sua face tornou-se rígida.

- Um inocente? – a voz de Hauspie veio tão carregada de seu sotaque francês que espantou Snape, erguendo suas sobrancelhas repentinamente. – Eu não mato inocentes, Snape! Voldemort mata! – gritou em resposta, tudo saindo de sua garganta como um rangido de leão. – Onde você estava?! ONDE?!

Hauspie mais uma vez empurrou-se para cima de Snape com suas espadas travadas em seu pescoço. O professor de Poções deu outro passo, tentando afastar-se ainda mais, achando toda aquela atitude perigosa demais.

- Bellacroix... Cui-da-do! – disse ele pausado, olhando quase temeroso para as espadas em seu pescoço.

E assim ficaram durante alguns segundos, no limite da razão, Snape tentando entender uma reação tão não-Hauspie Bellacroix, e a auror francesa procurando respostas naquela situação incontrolável.

Aos poucos, a força de Hauspie em suas espadas diminuiu, e Severo foi capaz de soltar o ar de seus pulmões. Enquanto a auror abaixava suas armas e as agitava mais uma vez, com a finalidade de transformá-las em simples varinhas, Snape ajeitou suas vestes negras e observou os cortes na pele clara da mulher. Algo acontecera no Ministério certamente.

Bellacroix notou que Snape a observava atentamente e, então, deu alguns passos para trás e reservou-se na parcial escuridão das folhas da Floresta Proibida. O mestre entendeu a relutância da auror e esperou que ela pudesse dizer qual era o problema. Suas duas pedras azuladas brilhavam contra a obscuridade e Snape podia jurar que ela estava à beira de um novo ataque de nervos – ou de choro. Assim que imaginara nada além do que um daqueles típicos ataques de mulheres guerreiras após lutas mais severas, ouviu-a dizer:

- Lupin foi assassinado.

Um sorriso quase malicioso e divertido apareceu nos lábios do ex-Comensal da Morte.

- Sempre costumei brincar com o perigo, com a morte, Bellacroix. Não faça o mesmo. – disse ele, como quase num conselho, o sorriso ainda ali, provocante.

As folhas movimentaram-se no instante que Hauspie voltou a aparecer na luz e dizer mais uma vez:

- Isto não é uma brincadeira, seu idiota – e sua voz veio derrotada. – Remo Lupin foi assassinado há uma hora, no Ministério da Magia, por uma Maldição Imperdoável. Tente transmitir esta informação ao máximo de aliados.

E sem ao menos esperar uma resposta, Hauspie Bellacroix sumiu nas sombras, deixando um Severo Snape completamente sem palavras para trás e bem longe de si.


No topo da Torre Leste, Heather Potter tinha os olhos fechados e a concentração focada naquele ritual. Hades, Ares e Cronos estavam sentados como ela, fazendo um círculo, todos em silêncio. A tentativa de entrar em contato com alguma vertente do lado negro de Voldemort estava deixando-a exausta. Estava nessa rotina há semanas e tiveram quase nenhum progresso. De certa forma, não conseguia ver a hora de se livrar daquela missão. Apesar de estar impedida de tocar e demonstrar afeição pelo seu sobrinho, Heather era capaz de estar com ele, ao seu redor. Entretanto, desta vez, trancafiada no alto daquela torre com seus três companheiros de vida, Heather não tinha contato com ninguém e nada.

Voldemort estava cada vez mais forte e mais ciente de que eles não poderiam se envolver na batalha. Heather sabia que todo o esforço dos Deuses seria inútil no culminar da Guerra, no estágio em que somente Voldemort ou os Aliados de Dumbledore venceriam. E pensar que, dos males o menor, pois ao menos seu sobrinho era seu parente, sua força, sua vontade de destruir Voldemort, de descobrir seus segredos ao lado de Ares, Cronos e Hades. Faria de tudo.

Soltando a respiração após alguns minutos de meditação, sentiu uma suave corrente de ar atingi-la do lado esquerdo da cabeça, agitando os fios do cabelo castanho. Abrindo os olhos com impaciência, encontrou os globos esbranquiçados de Hades fitando-a. E de uma distância que definitivamente não era segura. Aquela sensação de fogo consumindo sua alma atingiu-a com baixa intensidade, mas ainda assim, não gostara.

"O que foi desta vez?", sua mente indagou, direcionando rapidamente o pensamento para o Cavaleiro.

Os orbes brancos de Hades aumentaram de tamanho e Heather sentiu uma nova onda de fogo espalhar-se pelo seu corpo. Imaginou a sua morte ligeiramente, sendo carregada nos braços de Hades para o Portal do Inferno.

"Pensei que ganharia minha vida após nossa missão cumprida com Dumbledore, Helderane. Minha senhora decidira oferecer uma maravilha antes do tempo?", respondeu com uma nova pergunta o Cavaleiro-Deus, olhando-a com maior vontade.

"Não entendo do que fala, Senhor Hades. Receberá a oferenda após o cumprimento da missão". Heather tornou-se novamente para o círculo de energia, procurando manter a concentração. Hades podia realmente enlouquecer durante algumas semanas. Talvez estivesse sedento por novos corpos, novas almas, novas maravilhas e oferendas. Pensar que um homem como aquele, um guardião das mortes, pudesse ser considerado um Deus era demais para ela. Sabia que Hades era mais do que um Deus, ele possuía uma sede por sangue jamais conhecida em toda sua existência.

E nesse momento, vindo de um mundo distante do seu, de um ponto afastado de sua mente e do seu controle, Heather segurou a sua respiração e notou como seus batimentos cardíacos aumentaram. Repentinamente. Surpreendentemente.

No exato instante, a corrente de energia se quebrou. Ares olhou de esguelha para Hades e Helderane, e Cronos diminuiu a incidência de luz no âmbito. Hades permaneceu encarando Heather, que se perdeu naquele sentimento de sufocação e perda. Seus olhos castanhos deixaram de focar, anteriormente, os esbranquiçados do Cavaleiro, agora no círculo de poder, e perderam-se no espaço.

De alguma forma, depois de perder-se em pensamentos, em imagens incoerentes e indefinidas, Heather somente voltou a si quando o sangue que circulava em seu corpo tomou forma de fogo, incandescente, espalhando uma sensação de dor e incompreensão imensas. Os olhos demoraram a focar tudo que a circundava, mas ao passar dos minutos, a necessidade de voltar à própria existência pareciam dominá-la, e assim notou que o motivo para aquela reação corporal era nada menos que os dedos de Hades trilhando apertões em seus braços.

- Minha Senhora! Minha Senhora! Desperte, minha Senhora!

Ao passo que o redor entrou em foco total, Heather soltou o ar que residia em seus pulmões e puxou os braços do alcance de Hades. O mínimo contato com o Cavaleiro era prejudicial para sua lucidez. Cronos e Ares acompanhavam o movimento impaciente de Hades. O líder dos Cavaleiros de Merlin tocou o rosto da Deusa com delicadeza e sussurrou:

- Vá antes que a alma se despeça de sua existência.

Heather entendera o quê Ares quisera dizer. Havia algo se perdendo dela, algo distante, mais muito importante, necessário para sua vida, sua existência. Antes que deixasse a Torre dos Cavaleiros, Heather tornou-se para Hades e pareceu distinguir da expressão séria e compenetrada do Cavaleiro o quê realmente pensara. Alguém estava morrendo.

E então recordou da última vez em que seu protetor dos Cavaleiros de Merlin, o deus do Inferno, e seu mais querido humano encontraram-se. Heather havia se distanciado de Remo após os acontecimentos desde a noite fatídica de janeiro – o primeiro quase contato corporal com seu amor. Mas, como não podia resistir, fora procurá-lo...

"Naquela noite fria de outono, Remo J. Lupin olhava o céu límpido e cheio de estrelas pela janela de seu dormitório temporário em Hogwarts. Para sua felicidade, a lua cheia ainda estava longe, e ainda não oferecia perigo a ninguém. Piscando seus olhos – castanhos naquele momento – recordou a última discussão com a Cavaleiro de Merlin, a deusa Helderane. Parecia que sua vida não teria fim, e que nunca conseguiria resolver seus problemas pessoais paralelamente aos profissionais.

Repentinamente, alguém bateu na porta. Bufando entediado, supôs logo que fosse Snape enchendo sua cabeça com mais estratégias, ou ainda aquele estranho Hades, que vivia importunando-o.

Ao abrir a passagem, franziu a testa ao reparar nos grandes olhos castanhos que o fitavam.

- Perdeu-se do caminho, Senhora Helderane? – desde as últimas discussões, Lupin optara por chamá-la pelo nome dado à Deusa.

O semblante da mulher pareceu não se abater em absoluto com a rispidez de Lupin. Ao contrário, ela deu um passo a frente e entrou no quarto, batendo seu ombro esquerdo contra o direito do homem, para poder invadir. Lupin bufou mais uma vez e soltou a porta, que bateu fazendo estrondo. Fechando os olhos e preparando os ouvidos para mais uma nova discussão, tornou-se para ela. Heather não estava encarando-o, tampouco prestando a mínima atenção nele. Sua visão estava nos detalhes daquele mísero dormitório, nada comparado às instalações dela. As cortinas amareladas, como se estivessem mofadas, o sofá rasgado e a cama constituída de uma armação de ferro e um colchão que mais parecia uma folha de madeira. Porém, ela sabia bem que nada daquilo era importante para Lupin.

Finalmente, a deusa paralisou sua visão sobre o homem, dono provisório daquele quarto. Lupin tinha os braços cruzados na altura do peito, com a face aborrecida.

- Vamos parar com isso – a voz dela projetou-se no costumeiro tom suave. – Essa farsa levará a nada.

A voz de Lupin estava bastante rouca quando ele respondeu.

- A escolha foi sua, Senhora Helderane, não minha, nem de Sirius ou de Bella.

- Pare de me chamar de Helderane! – gritou a mulher em protesto.

Somente naquele momento, Lupin pôde perceber toda a realidade. Era verdade. Aquela era só uma farsa. Heather Potter carregava um sangue nobre, capacidades inimagináveis, assim como seus poderes, e muito mais que apenas uma beleza interessante. Entretanto, um dia, ela fora uma humana como todos os outros. Não uma deusa.

- Certo – concordou Lupin, num tom cansado, mas como se não desse a mínima para o aborrecimento de Heather. – Que você veio fazer aqui?

A mulher não respondeu. Lupin passou apenas a contemplá-la. O cabelo mantinha-se liso e escorrido até a altura de seus ombros, num corte reto, a pele ainda era um misto de palidez e muita vivacidade, os olhos tão marcantes e que transmitiam tanta compaixão e bondade, os lábios carnudos e vermelhos que pareciam tão belos de longe e tão hipnotizadores de muito perto. A vestimenta de Cavaleiro de Merlin, prateada e branca, bela e majestosa, apenas era uma personagem. A verdade sobre a Senhora Helderane estava por baixo de toda aquela lenda e poder.

- Eu queria conversar com alguém que me conhecesse de verdade – respondeu lentamente a mulher. – Você me conhece muito bem, Remo.

Lupin chegou a engolir em seco ao ouvi-la chamá-lo pelo primeiro nome.

- Eu te conheci, Heather.

Os olhos estreitaram-se sobre Lupin e ele chegou a engolir em seco. Heather. Heather Potter. A irmã mais nova de Tiago, a caçula e a escolhida para carregar um fardo maior que ela. Ainda aos olhos de Remo, Heather parecia apenas uma menininha do terceiro ano em que ele deu um beijo. Seus quinze anos lhe reservaram o poder de encantá-la e fazê-la se apaixonar por ele. Mas aquele namorico não durara muito, afinal, Remo sempre fora apaixonado por outra pessoa, e não pela Srta. Potter.

Os anos foram realmente generosos com Heather. Sua idade se assemelhava com a de Lupin, algo como trinta e sete, trinta e nove anos. Entretanto, a aparência era de uma mulher no auge de seus vinte e cinco, trinta anos. Talvez esta fosse uma das qualidades de um Cavaleiro de Merlin. E a imagem quase infantil e pura ainda era incrivelmente distinguida pelo homem ao concentrar-se nela.

- Você não tem idéia do quanto me conhece, Remo – disse Heather num quase sussurro. – Não tem idéia do quanto é difícil estar na minha pele, viver a minha vida, ser quem eu sou.

Remo relembrou das mesmas palavras ditas por ela há alguns meses atrás, na noite de janeiro, em que quase pôde tocá-la mais uma vez. "Ser quem eu sou. Viver como eu vivo. Observar o quê eu observo. Todos os dias. É horrível É uma prisão. Eu vi tantas coisas nesses vinte e dois anos que você não iria acreditar, se eu arriscasse-me a falar...". Era tudo novamente. E não havia forma de não impressioná-lo, de não deixá-lo saudosista, de não o afetar. Preferiu não responder. Heather suspirou e fugiu os olhos da direção dos dele, colocando-os sobre a janela que dava para os jardins. Remo sempre imaginou o tamanho da pressão sobre Heather. Não deveria ser nada fácil ser um deus, descobrir que pode ser imortal como ela era, saber que verá todos aqueles que ama morrerem em seu caminho.

- Eu vi todo o seu esforço, como o de Sirius e o de Arabella para ajudarem Tiago, para destruírem e se vingarem de Voldemort – continuou ela, ainda olhando o exterior. – Hades insiste em contar sobre como levou os corpos de Tiago, Lílian e Hariel...

A boca estava entreaberta quando Heather disse aquilo. Remo notou que logo em seguida, os lábios vacilaram. Era necessário, até mesmo para uma deusa, possuir muita força para falar sobre a morte de um ente querido, quanto mais do próprio irmão.

- E Harry – Heather parou por um instante. – Harry está um menino tão lindo – Remo deu um passo à frente, na direção dela. – Pena que eu não pude vê-lo crescer. Agora, encontro-o até apaixonado pela filha de Sirius e Hariel. Quem diria?

- Ametista é uma boa garota. – respondeu Lupin.

Heather virou-se para ele. Seus olhos estavam ligeiramente marejados.

- Sim, ela é – concordou, porém suas sobrancelhas arqueadas não condiziam com sua afirmação. – Mas há algo de muito errado, Remo. Acho que você e Sirius devem ficar de olhos bem abertos – Remo franziu a testa. – A garota não nasceu por acaso e todos nós sabemos disso. Harry deve ficar preparado para o pior.

Lupin ia perguntar sobre o quê Heather estava falando, mas alguém bateu na porta novamente. Dando as costas e abrindo-a, chocou-se com o homem de cabelo escuro e de orbes profundamente brancas. Ao trocar um único e ligeiro olhar, sentiu toda a extensão de seu corpo ferver.

- Senhor Hades – cumprimentou Remo num tom incomodado. – Em que posso ajudá-lo?

Os olhos quase brancos do Cavaleiro de Merlin concentraram-se sobre Lupin.

- A Senhora Helderane encontra-se aqui – aquilo não era uma pergunta, era uma afirmação. – Posso falar com minha Senhora?

"Minha Senhora" – estranhou Lupin. Virando para trás, encarou Heather. A mulher estava séria e encantadora novamente, deixando o seu lado humano de lado mais uma vez. De dentro do dormitório, perguntou a Hades o quê ele queria com ela. Hades pediu que ela saísse por um instante.

No corredor, com a porta entreaberta, Heather emparelhou-se a Hades com a expressão aborrecida.

- Minha Senhora sabe que não deveria estar aqui – disse o Cavaleiro num tom austero. – Ares está furioso com sua falta de comprometimento, Helderane! Você deve agir como uma deusa, não se esqueça disso!

Heather apertou os olhos, irritadíssima.

- Você sabe muito bem que não posso deixar de ser uma humana entre eles, Hades! – ralhou a mulher no tom de comando usado sobre os outros Cavaleiros.

A deusa arriscou rodar os pés para voltar ao quarto, porém Hades alcançou seu braço direito. Um choque de terror espalhou-se pelas suas entranhas e teve de se desvencilhar veloz e quase ríspida do toque dele. Com leveza e fixando seus olhos tão claros sobre Heather, Hades disse:

- Não aja como uma humana – recomendou num tom quase ciumento. – A Senhora ainda pertence a nós, não deixe que sua parte sentimental acabe com sua racional.

Lupin estava ouvindo tudo muito atentamente do lado de dentro do dormitório, com os olhos arregalados. Heather pareceu estava calada até um certo tempo, para depois responder:

- Eu agirei como acho melhor, Hades. Nem você, nem Ares e nem Cronos mandam em mim – aborreceu-se e respondeu com a postura de uma verdadeira deusa. – E pare de me chamar de "minha Senhora" porque eu não sou sua.".

Por mais difícil que fosse relembrar a última noite de conversas com Lupin, a qual acabara em discussão igualmente, Heather soube desde aquele instante quem seria o alvo de Hades naquela empreitada. Contudo, caso algo acontecesse com Remo John Lupin, todos veriam o lado negro e obscuro da Cavaleiro de Merlin mais forte e terrível. Isto todos poderiam escrever.


Deixando a Torre da Lufa-Lufa, Harry olhou para o corredor extenso na escuridão daquela noite, preocupado. Que raio de dia fora aquele? A Poção Polissuco, a reação estranhíssima de Malfoy em seu corpo, a conversa sutil com Ametista, o "ataque" de Hermione na aula de Aprendizes e o aviso de McGonagall: o Ministério estava sendo alvo de uma nova investida de Voldemort. Algo estava muito errado. Caminhando até uma das janelas do corredor, Harry olhou ao horizonte da noite e notou que o céu tinha perdido o brilho.

Guiando-se para a sala comunal da Grifinória, Harry iniciou algo que evitara pensar durante a ronda na Lufa-Lufa: o estado de seu namoro. Algo que começara sem muita esperança tornou-se uma tormenta sem controle que apenas o levava aonde ela quisesse. O jovem sentia-se fora do controle da relação há muito tempo, mas sabia que Ametista também não o possuía. Tão diferentes e ao mesmo tempo tão completos. Harry não imaginava, porém, que a convivência passasse, agora, a incomodar todo seu o redor. De alguma maneira, não considerava que seu namoro pudesse influenciar no curso das atitudes de Hogwarts. Uma sonserina, um grifinória. Apaixonados. Isso só poderia ser loucura.

Diante da questão séria dela, o quê dizer? Será que valia a pena?

"É claro que vale a pena! Vale a minha vida!", respondeu mentalmente, logo que cruzou a linha divisória entre a Torre da Grifinória e da Sonserina. Paralisando, olhando para ambos os lados, imaginou em continuar até a sala comunal da sua casa, mas algo o chamava para a Sonserina. Atraindo o olhar para as masmorras, Harry ignorou sua razão e resolveu descer até chegar na Torre dos inimigos.

O salão comunal das serpentes estava envolvido numa atmosfera tão impessoal e fria que Harry, inconscientemente, abraçou os próprios braços na intenção de esquentar-se. Encontrou a escada circular e iniciou a subida. O dormitório feminino estava escuro, silencioso. Nunca pensou que chegar até a Torre da Sonserina fosse tão fácil sem sua capa de Invisibilidade. Era claro que a sensação de estar sendo observado o perseguia, mas ainda assim, conseguira parar os movimentos e respirar o ar gélido da Torre.

Ainda sabendo qual era a cama da neta de Ametista, Harry puxou timidamente a cortina e encontrou-a deitada em posição fetal, os olhos fechados e a respiração quase lenta o bastante para estar num sono profundo. A janela atrás de sua cama estava aberta, mas o céu realmente não oferecia luminosidade que pudesse incomodar. Harry achou estranho o visual escuro e soturno do horizonte uma segunda vez.

Dando uma última olhada no quarto, desconfiado que houvesse algum olhar curioso das outras camas, Harry adentrou e fechou o dossel o suficiente para cobrir sua figura em pé. Dirigindo seus olhos verdes para a garota encolhida, o grifinório notou que Ametista agitava as sobrancelhas, como se estivesse profunda num pesadelo.

Repentinamente, os lábios de Ametista abriram-se e ela murmurou:

- Não vá... Não me deixe aqui... Não...

Retirando o casaco da Grifinória, Harry ajoelhou-se na cama e retirou os sapatos dos pés, deixando-os cair ao lado do leito. Inclinando-se levemente, estendeu a mão direita sobre o rosto da namorada, enquanto apoiava o corpo com a esquerda. Tocando a pele clara da jovem, Harry sentiu um arrepio e percebeu que ela também se arrepiou, ainda que estivesse adormecida. Um leve sorriso despertou em seus lábios e ele encostou-os no ouvido esquerdo da garota, sussurrando:

- Amor...

O corpo de Ametista contorceu-se ligeiramente e ela encolheu-se mais, um sorriso leve aparecendo em seus lábios e sua testa aliviando a agitação passada. Harry engoliu com calma e procurou colocá-la de lado e se deitar junto dela. Seus braços envolveram-na em um abraço confortável, enquanto unia seus corpos com sutileza. Ametista moveu-se quando Harry tentava fechar os olhos. A jovem tornou-se para ele e encaixou seu rosto exatamente na altura do de Harry, seus narizes tocando-se com pureza e suas respirações como se fossem uma só.

Harry segurou os braços que envolviam o corpo de Ametista e assistiu os olhos escuros da garota que lhe era tão linda abrirem-se para ele. Lenta e gradual, a boca de Ametista passeou com sedução pela bochecha fria do namorado, com perigo. Demorando-se no canto esquerdo da boca dele, Ametista aprofundou o olhar sobre os verdes de Harry e suspirou. O monitor da Grifinória então esqueceu da conversa entre eles naquela noite e assumiu que era melhor não pensar. Antes que algo acontecesse, o que importava acima de tudo era estar com ela.

O contato da boca quente de Ametista com a sua foi quase chocante. Um calafrio atingiu seu corpo e fechou os olhos, como se pudesse evitar aquela sensação estranha. E o mais assustador foi o que se seguiu. Ametista mordeu seu lábio inferior, puxando-o para cima dela, enquanto a cicatriz no centro de sua testa iniciou uma queimação que há muito não tinha. Sua cicatriz costumava doer, mas somente quando Ametista e ele se tocavam antes de namorarem, na época em que ainda oprimiam seus sentimentos. Será que aquele era algum sinal?

Mas antes que pudesse refletir, seu corpo já estava encaixado no da namorada, deitados naquela cama, na noite fria e sem horizonte. Seus lábios trocavam carícias muito mais que gentis, quase fogoso. As mãos dela passeavam pelo seu cabelo escuro e desgrenhado, ambos beijando-se com sofreguidão. As suas próprias mãos separaram-se e passaram a cobrir os espaços nus do corpo vestido num pijama da garota. Sentia que aquela seria mais uma noite em que não diriam nada, em que apenas dariam vazão aos seus sentimentos e suas vontades malucas que um tinha pelo outro. Era claro para quem quisesse ver, mas ainda parecia difícil aceitar que alguém o amava com a intensidade que ele mesmo amava. Harry segurou o ímpeto de subir suas mãos para o tórax e peito da namorada. Não sabia se ela ainda estava pensando na conversa deles horas antes.

Em meio a um beijo dado em seu pescoço, Harry sentiu novamente a cicatriz ferver. Impedindo que uma reação verbal saísse de sua garganta, não querendo alarmar a namorada, ainda mais na sua condição, Harry retirou sem pensar duas vezes sua camisa branca e jogou-a contra o chão, juntando-a com seus sapatos. Quando as mãos quentes de Ametista foram de encontro com o fecho de sua calça, ela retirou a boca da sua e colocou-a contra seu ouvido direito.

- Não quero pensar em ficar longe de você... Não posso pensar... – disse baixinho, lançando choques de prazer ao namorado.

Sim, como ele pensara, ela também estava divagando sobre a conversa de mais cedo. Harry distanciou-se dela por um momento para cruzar seu olhar com o dela e então a beijou mais uma vez, não querendo deixar transparente que também estava preocupado. Ametista enlaçou-o com pressa, enquanto ainda desfazia o cinto de sua calça. Harry percebia que ela estava ainda com a cabeça longe, bem longe. Postando suas mãos dos lados de sua cintura, deslizou-as para cima, querendo retirar a parte de cima de seu pijama. Ametista permitiu, erguendo as costas, esticando-se com a rapidez e deixando escapar um suspiro.

O jovem admirou o torso da garota por um momento, querendo desviar as palavras dela de sua cabeça, as palavras pronunciadas mais cedo naquela noite. Ninguém poderia sequer supor em tirá-la de seu alcance. Era inaceitável. Harry nunca poderia permitir isso, de jeito algum. As mãos dela ergueram-se e postaram dos lados de seu rosto, puxando-o para seu toque. Ametista tocou seus lábios nos de Harry com delicadeza e sorriu contra sua boca, com um estilo doloroso, tão característico. O fogo parecia consumi-los dentro do dossel uma vez mais. O que poderia eles fazer se alguém parecia deixá-los mais do que descontrolados juntos?

- Isto está me partindo, Harry... Quebrando meu coração...

Ametista abriu levemente suas pernas e aninhou Harry em seu corpo, aproximando cada centímetro de pele do jovem. Por mais que seu corpo respondesse com desejo e excitação ao contato com Ametista, Harry sequer estava levando o fato em si. Ouvi-la dizer que estava partindo-a, estava quebrando-a... Era demais para agüentar. Ambos já haviam passado por tantos momentos críticos. Seu namoro nunca fora o mais pacífico e calmo. A dificuldade em assumirem seus sentimentos, a aceitação de toda Hogwarts, o ingresso de Ametista na Sonserina e até mesmo quando Cho tentou fazer parte da história dos dois. As circunstâncias em que Ametista "morrera" e como retomaram o namoro. Não. Era imperdoável o que estavam tentando fazer ambos passarem.

Quando Ametista esticou o pescoço e colocou a cabeça no espaço entre o ombro e a cabeça de Harry para beijá-lo, o monitor sentiu que algo úmido estava tocando-o, e não eram somente os lábios dela. Harry tocou a face da jovem, trazendo-a para sua visão. Suas bochechas estavam molhadas.

- Eu não consigo tirar da cabeça, Harry... Querem te tirar de mim... – sussurrou ela novamente, no momento em que seus rostos se encararam assim que ela voltou a cabeça no travesseiro. – Como eles podem querer fazer isso?

- Shh... – sibilou o jovem, colocando um dedo nos lábios dela, impedindo-a de continuar.

Harry puxou o lençol de cima do corpo da jovem e procurou assim tocá-la livremente, sem proteções. Todos os pêlos de Ametista se levantaram ao sentirem os dedos habilidosos do apanhador tocá-la com delicadeza, mas ainda assim determinação como se desejasse ganhar uma final mundial de quadribol e o pomo de ouro estivesse ali, era só esticar-se.

Eu te amo, ele sussurrou enquanto acariciava suas coxas e subia as mãos, cauteloso, mas desejando tocá-la no mais íntimo, como na noite do aniversário dela. Harry queria fazê-la esquecer o mais rápido possível do futuro e de tudo que os cercava. Mas então, quando estava dançando seus dedos sobre pouco abaixo do umbigo da jovem, ouviu-a mais uma vez:

- Eles querem te tirar de mim... Como eles podem querer isso? Você é tudo para mim...

- Sinceramente, Ametista? – instigou Harry, erguendo-se sobre ela, colocando as pernas ao lado do quadril da jovem e olhando-a fixamente. – Quero mandar tudo se danar! O importante aqui é que não deixaremos ninguém nos afastar...

- Eles são mais fortes que nós dois... – interrompeu a jovem, aumentando a voz.

- Eles são mesmo? – questionou Harry, levantando as sobrancelhas, não gostando da reação da namorada.

O olhar de Ametista foi para longe do dele, querendo não demonstrar sua insegurança.

- Ametista, por favor, olhe para mim – pediu Harry, puxando o rosto da jovem para o seu, comprimindo seu tórax nu e abaixando-se até encontrar a face dela bem de perto. – Você me ama?

Diante da questão de Harry, Ametista arregalou os olhos.

- Você teve alguma dúvida durante esse tempo todo, Harry?

Harry soltou a respiração e pensou em como toda aquela situação estava interferindo demais na relação deles. Mas por quê? Porque vocês dois estão permitindo que interfira, disse a mente dele.

- Dorme comigo hoje. – pediu Ametista repentinamente.

Os verdes olhos de Harry tomaram um brilho diferente, não o costumeiro matreiro ou malicioso. Era um olhar de insegurança e carência. E era o mesmo sentido que expressavam os da garota debaixo dele. Ambos ficaram sensíveis demais com toda a pressão daqueles que deveriam apoiá-los mais do que tudo.

Ametista nada quis dizer após a rápida conversa. Sentindo que os dedos de Harry não desejavam mais seu quadril, e voltaram ao foco passado, ela segurou a respiração, fechou os olhos, procurou suprimir um gemido e decidiu. Era melhor que eles não deixassem que a atmosfera entre eles naquela noite, tão convidativa, amorosa e erótica se dissipasse. Ametista não quis revelar seus pensamentos. Aqueles que se misturavam com a sensação calorosa e maliciosa que Harry estava provocando naquele exato segundo. Ao notar que seus músculos iniciavam uma contração, que logo seria seguida por um relaxamento, o ápice do toque mágico e delicioso do namorado, Ametista segurou um novo gemido, e este não seria apenas de satisfação. Era um medo que criara raízes nela a partir daquela noite. A jovem não quis revelar.

Revelar que sabia, de alguma maneira nebulosa, que aquela seria a última noite em que passariam juntos.


As sombras corriam contra a claridade parcial que o luar oferecia. Uma era alta e de forma cônica no topo, um vasto borrão a seguindo. A segunda mancava e era mais baixa, porém esguia. A última não corria, mas de passos acelerados ela parecia preocupada, imponente. A escuridão dos corredores de Hogwarts tentava devorá-las em seu poder e abrangência. Ela era maior que todas as sombras acordadas daquela noite. Contudo, havia um único elemento, também em movimento, que não exercia um bom papel de presa para o limiar de terror da escuridão. E este não possuía qualquer sombra.

Dumbledore, Zylkins e Snape perseguiam algo luminoso e tremendamente rápido. Algo em seu ápice de ódio. Algo no limite de sua existência.

- Helderane! Helderane! – clamava o diretor de Hogwarts, ofegante, à Deusa. – Por favor, Helderane! Precisa ouvir-nos!

Em vão. Helderane ignorou completamente o pedido de Dumbledore, acelerando o passo em direção à Torre Leste. Snape tentou emparelhar-se com o velho diretor e seu chapéu cônico para tentar uma abordagem mais energética com Helderane, mas a mão esquerda de Dumbledore estendeu-se à frente de seu corpo, impedindo-o de tomar qualquer atitude.

Snape engoliu em seco e olhou para trás. Os olhos de Silver Zylkins estavam cansados e visivelmente assustados com a postura da Cavaleira de Merlin. Havia de ter algo para pará-la. Caso algo acontecesse com Helderane ou qualquer um dos Cavaleiros de Merlin, toda a ajuda que poderiam fornecer estaria acabada. E Dumbledore não tivera todo o trabalho para convocá-los para dar em nada.

Mas ainda assim, aquela atitude da Deusa não levaria ninguém a um resultado. Nada traria Remo Lupin de volta a vida. Nem mesmo ela, uma Deusa com poderes lendários.

E então, ao terminar seu pensamento, Dumbledore e seus seguidores assistiram Helderane tornar-se para os três, interrompendo seu caminho raivoso, e apontar um de seus dedos entre os olhos de Severo Snape.

- Você é um perdedor amargurado, Snape. É isso que você é! – disse ela, num tom de voz nunca antes visto por eles. Era como se pudesse carregar todas as suas forças negativas em apenas palavras. – Você é digno de pena!

Snape sentiu-se levemente cambaleante ao ouvir as acusações. Os olhos castanhos de Helderane estavam postados sobre ele e pareciam ver além de seu rosto macilento e suas vestes escuras. Helderane podia ver sua alma, sua áurea, ele tinha certeza. E não somente isso. Helderane estava lendo seus pensamentos, sem a menor dúvida.

- Surpreso, idiota? – perguntou ela, arqueando as sobrancelhas, num ímpeto, abaixando o dedo do rosto dele. – Sim, eu ouvi o que disse. E sabe o que é mais surpreendente? Sim, eu posso. Sim, eu irei.

Enquanto procurava desviar seus olhos dos da Deusa, Snape pensou se ela estava com o "posso" e o "irei" a ler seus pensamentos ou a salvar Lupin. Dumbledore juntou o próprio corpo do de Snape e disse:

- Helderane, por favor, eu peço que seja condescendente – os olhos de Helderane lentamente dirigiram-se aos do diretor. – Precisamos de sua tolerância agora, mais do que nunca...

Velozmente, os olhos voltaram para Snape e Zylkins soltou um gemido agudo. Dumbledore olhou para trás e não entendeu, pois o jovem parecia normal, ainda mancando e com o braço ferido.

Porém, voltando a visão para Helderane, percebeu que a luminosidade ao redor do corpo da Deusa aumentou e não teve dúvidas. Helderane – não, Heather Potter – estava invocando o mais profundo do que significa ser um ser lendário, um deus. Os olhos castanhos de Helderane tornaram-se avermelhados, como se estivessem sido banhados em sangue.

- Aposto que deve estar se divertindo com essa cena toda, não tenho razão? – sua voz veio mais rouca e profunda desta vez, lançando um mal-estar maior ainda que o passado em Snape. E aparentemente, em Silver também. – Primeiro, você perseguiu Harry a vida toda para vingar-se de Tiago por ter sido definitivamente não-condescendente – e nesta hora, ela tomou a iniciativa de encarar Dumbledore, esquecendo-se quem ele era, mas depois voltando o olhar para Severo. – Depois, fez de tudo para colocar Sirius de volta a Azkaban... – Snape tentou abrir a boca para relutar, mas Helderane interrompeu. – Sim, eu já disse que sei de tudo. E por último, deve estar se deliciando com Re-re...

Helderane foi incapaz de terminar o nome do falecido porque seus olhos já estavam se enchendo de água, transformando-se em castanhos mais uma vez. Remo estava morto. Hades a avisara. Remo estava morto. E morto antes que ela pudesse... Morto por esta guerra sem fim. Morto debaixo de suas vestes e debaixo de seu poder. Morto envolto em desgraça. Morto longe dela. Morto sem antes olhar em seus olhos uma última vez.

Voldemort matara a pessoa que mais importava em sua vida após seu sobrinho, Harry. Helderane piscou e as lágrimas caíram de seus olhos. Dumbledore tocou o braço de Snape e indicou com a cabeça Silver. O duelista estava petrificado em terror, olhando ainda para a figura da Deusa, ainda que ela estivesse agora definhando. O mestre de Hogwarts saiu do alcance desesperado de Helderane e deu as costas, puxando Zylkins consigo. Quando tocou nas costas do integrante da Ordem da Fênix, sentiu o corpo do duelista completamente gelado, sem forças aparentes para continuar após tal demonstração de poder.

Enquanto Snape retirava Zylkins dali, a fim de encontrar os outros integrantes da Ordem para comunicar sobre a morte de Lupin, Dumbledore estendia seus braços para tomar Helderane em seus braços.

A veste champanhe da Cavaleira de Merlin estava amarrotada, manchada de sangue no centro e barra. Dumbledore confortou o pequenino corpo de Heather em seu tronco, envolvendo-a com seus braços e veste quente, enchendo-se de sangue igualmente. Há poucos instantes, o encontro entre Heather e o corpo inerte de Lupin fora demais para agüentar. O velho sabia da relação diferenciada que existia entre os dois, e sempre olhara com dúvida, já que Lupin sempre fora apaixonado por Arabella e Heather tornara-se um ser inalcançável para qualquer mortal – como o próprio Lupin.

Entretanto, com a presença de Heather, ainda que como Helderane, novamente em Hogwarts, Dumbledore considerou a idéia de retomarem seu relacionamento – não como um romance, mas a relação de confiança. Lupin era alguém extremamente inseguro, insegurança essa adquirida a partir de sua condição lamentável. E, além dos seus melhores amigos, somente Heather Potter, a irmãzinha caçula de Tiago, sabia de seu grande segredo. Somente a ela ele confiara. Dumbledore imaginava e almejava que, com a volta de Heather, Lupin pudesse novamente criar tal vínculo.

- Não é justo... – lamentou Heather, em meio às lágrimas e soluços.

Dumbledore nada pôde responder, apenas ofereceu apoio, passando os dedos gentilmente pelos cabelos castanhos e lisos de Helderane.

Toda a Era do Terror parecia estar voltando com toda a força e vontade de vinte anos atrás. Voldemort não estava preocupado com as vidas inocentes, como sempre. Porém, ainda assim, ainda sabendo da tamanha crueldade enraizada no Lorde das Trevas, Dumbledore nunca imaginou que Lupin teria tão morte, tão rápida, tão triste. Uma morte idêntica à de Tiago e Lílian. Uma Maldição Imperdoável e tudo acabara. Num lampejo de luz.

Envolvendo Heather em seus braços, Dumbledore imaginou no que aconteceria no final. No real final. O diretor acreditava piamente em vitória, na vitória do bem, na vitória daqueles que tentam proteger o mundo de tamanha infestação de horrores. Porém, abraçado àquela mulher, vendo-a chorar descontrolada, assisti-la definhar-se em seus braços... Nada daquilo era justo, dissera Helderane. E ela nunca falara algo tão correto em toda a vida.

- Criança – murmurou Dumbledore no pé do ouvido da mulher. – Criança. Não faça isso com você mesma... Poderia ser qualquer um de nós. Qualquer um...

- Não ele! Não ele! – gritou Heather, afastando-se do peito de Dumbledore. – Por que ele?! Por que não podem me levar no lugar dele?! Remo não merecia! Ele era um homem de honra! HONRA! Coisa que Voldemort nunca terá! NUNCA!

E então, Heather encarou Dumbledore com um desgosto unido a um ódio descomunal. O diretor ergueu suas sobrancelhas, como se soubesse exatamente o que passava pela cabeça da Deusa.

E o silêncio ficou entre eles. Um silêncio perturbador. Heather estava tomando uma postura ereta e séria, ainda que seus olhos transmitissem o tamanho de seu descontrole. Dumbledore deu um passo na intenção de tocá-la de alguma maneira, mas a mulher andou para trás e sustentou o olhar, dizendo:

- Eu preciso fazer isso, Alvo...

- Heather...

- Quem está falando é Helderane, Alvo – corrigiu ela, seriamente. – Ela é a parte que possui o poder. Heather é a parte que tem a emoção.

- Exatamente por isto, Heather – continuou Dumbledore, as mãos estendidas ligeiramente à frente de seu corpo. – Clamo pela emoção. Pelo raciocínio. Você fala sobre deixar tudo para trás. De desafiar. E de desafiar as pessoas erradas.

- Pessoas, para mim, Alvo, são seres humanos. E eles não são e nunca serão seres humanos novamente – respondeu Helderane, a voz banhada em imponência. – Ele sorriu. Agradeceu. Não vou deixar que ele seja a oferenda.

Dumbledore soltou um suspiro. Sabia que argumentar com Heather seria de total ineficiência. Perda de tempo. Antes de iniciar sua fala, o diretor tomou ar e coragem.

- Como você deve saber, permiti em outubro passado um Pacto de Sangue – disse ele, aproximando-se de Helderane. E desta vez, ela não se afastou. – Um Pacto de Sangue, um ato imperdoável, com pena direta em Azkaban. Um Pacto realizado por Snape, Lupin e Black. Um Pacto que permiti, colocando a vida desses três homens em sério perigo – Dumbledore retirou os óculos e olhou profundamente para a Deusa. – O Pacto foi feito para salvar a pessoa mais importante na minha vida, a minha neta. E, depois de tudo, depois de todo o risco e das noites sem dormir – ele parecia incrivelmente triste. – repetiria sem pensar uma segunda chance. Portanto, caso você queira ariscar tudo que possui para salvá-lo, salvar uma pessoa tão importante para você quanto Ametista é para mim... Vá em frente.

Helderane não sorriu, não esboçou qualquer reação facial que pudesse deixar Dumbledore confiante de tudo que dissera. Mas então, sentiu as mãos da Cavaleira de Merlin tocarem as suas, em agradecimento.

- Somente peço que tome cuidado, muito cuidado – finalizou o velho, cansado. – Criança... Cuidado com todos eles, especialmente com Hades.


De fora da Torre Leste era possível sentir uma intensa energia espiritual. Ninguém saberia explicar, mas a força era realmente além do entendimento. Muitos se sentiriam enjoados, outros agraciados. A pouca esperança que ainda existisse até mesmo em um suicida a ponto de dar cabo da vida retornaria com força total, abençoado por tal poder. Este era um efeito de um Cavaleiro de Merlin. Porém, naquele instante nada importava. Não para Heather Potter.

Helderane não precisou estender um dedo para mover a porta da Torre Leste. Ao seu mínimo aproximar, a entrada se escancarou como se tivesse sido golpeada por uma forte rajada de vento. O ciclo anterior, composto pelos quatro Deuses em formação, estava desfeito, mas ainda assim, uma forte corrente de energia os envolvia. Helderane pôde ver Cronos olhando por uma das janelas da Torre, o semblante tranqüilo e uma luminosidade em tom esverdeado o envolvendo com gentileza. Ares, por sua vez, parecia ligeiramente perturbado. Suas mãos postavam-se sobre seu rosto, como se precisasse de um chacoalhar para despertar do transe daquele ritual. Isolado no mais fundo da sala estava Hades.

E ele encarava Helderane diretamente.

Mas, desta vez, fora diferente. Heather – sim, pois era ela quem sentia as fortes ondas quentes e incendiárias de Hades, e não Helderane – não foi afetada de maneira alguma pela repentina troca de olhares, sempre acompanhada daquele fogo intenso. Não, desta vez, ela estava tão repleta de fúria e revolta que nem mesmo um Deus como Hades poderia afetá-la.

Como se não bastasse o olhar, havia o sorriso. O sorriso sarcástico e recheado de malícia.

A porta atrás de Helderane fechou-se em um piscar de olhos e então os outros dois olharam-na diretamente, como Hades. Cronos continuou com a mesma expressão despreocupada, quase sonolenta, enquanto Ares pareceu mais atrapalhado ainda. O deus agitou a cabeleira azulada e prontificou-se a aproximar seu corpo de Helderane. A Deusa deu um passo para trás, sem um segundo pensamento.

- Senhora Helderane? O que há de errado? – indagou o líder da legião, um tom de voz alarmado.

Porém, a Deusa nada respondera. Não havia o que responder. Seus olhos indicavam do que gostaria de falar e com quem gostaria de falar. Hades alargou o sorriso, ainda achando toda a situação divertida demais para conseguir conter a alegria. Ares postou-se ao lado, ainda que relutando, de Helderane, e estendeu um braço para tocar-lhe as costas delicadamente. Helderane não moveu um músculo de seu corpo todo.

- Traga-o... de... volta... – disse de forma pausada para Hades.

Como se ainda fosse possível, o sorriso do Deus alargou-se uma vez mais.

Mas ele nada respondeu. Helderane sentiu uma veia em sua têmpora tremer e palpitar. De forma alguma, permitiria que Hades ou qualquer outro Deus tentasse tripudiar sobre ela. Não sobre ela. Sobre a Senhora Helderane, a única Cavaleira de Merlin, a reencarnação de Iris, a filha do grande mago Merlin.

- Não ouse lançar-me este olhar e este sorriso... – repreendeu a Deusa, aumentando o volume de sua voz.

Mas então, repentinamente, Hades iniciou um andar lento e sofredor até Helderane, dizendo:

- Quem fala em ousadia e não procura olhar-se ao espelho é a minha Senhora – sua voz era estridente de forma sutil, e por mais contraditório que isto fosse, causava uma sensação horripilante a qualquer humano. – Ousadia é pensar em dirigir-se em tal tom a mim após saber tudo que represento – Helderane estufou o peito e Hades colocou-se à frente dela. – Ele não irá voltar.

Ares distanciou-se de Helderane, olhando em dúvida para Hades. Cronos paralisou ao lado do líder e cochichou algo em seu ouvido. Nenhum dos outros Cavaleiros pareceu se mover.

- Faça o que lhe disse, Senhor, ou não gostará de presenciar o que sou capaz de realizar. – repetiu Helderane de forma mais enérgica.

- Isto é uma ameaça, minha Senhora...?

- Não, isto é uma ordem! – afirmou Helderane com veemência, fazendo com que Ares e Cronos aproximassem mais uma vez seus corpos da possível futura discussão.

Hades retirou o sorriso largo do rosto e intensificou o olhar na Deusa. O líder dos Cavaleiros de Merlin, Ares, puxou o braço de Helderane para si, mas não conseguiu tirá-la de seu centro de equilíbrio. Ao invés disso, sentiu um formigamento na mão que a tocara. Seu olhar voltou a fitar o rosto enraivecido de Helderane, e sentiu que havia algo fora de lugar. Nunca antes sentira tal formigamento, tal sensação desconfortável ao tocar alguém, muito menos em um Cavaleiro.

Então, imediatamente, Ares lançou um olhar sério para Cronos e algo humanamente impossível aconteceu.

Estendendo os braços para cima e fechando os olhos avermelhados, Cronos jogou seus cabelos para trás e sua veste esverdeada passou a brilhar de maneira quase viva. A luminosidade vinda do luar, do céu opaco daquela noite, paralisou por um instante, da mesma maneira, e era possível, daquela Torre Leste, tão alta quanto as outras, observar uma coruja completamente estática no ar, sem qualquer indício de movimento ou vida.

Cronos paralisara o tempo.

Nesta facilidade.

E quando os rostos de Ares e Cronos voltaram a atenção para Hades e Helderane, assustaram-se. Havia uma cortina de névoa envolvendo os Deuses, ainda que quase transparente. Mas ambos sabiam o que aquilo significava. Eles não desejavam interrupções. Nem mesmo a de dois Deuses tão poderosos e lendários quanto eles.

- Eu quero Remo de volta, Hades! Eu ordeno que você o ressuscite!

- Esqueça, minha Senhora... – retrucou Hades, os olhos esbranquiçados fixos em completo nos dela. – A alma daquele lobisomem já é minha e não há volta...

Helderane forçou as vistas sobre Hades, provocando sua fúria.

- Não quero saber! EU O QUERO DE VOLTA! AGORA!

- E para quê exatamente? A minha Senhora é uma Deusa, um ser lendário, uma imortal! NUNCA poderia comparar-se aos modos de um simples humano! E pior que isto! Um humano que é metade um animal irracional! Como a minha Senhora pode se rebaixar a este nível...?

- TRAGA-O DE VOLTA PARA MIM, HADES! AGORA! EU ESTOU ORDENANDO E ENTÃO ME OBEDEÇA! – vociferou Helderane em reposta.

Num piscar de olhos, Helderane foi lançada à parede contrária, com força bastante para arrancar alguns cascalhos do bloqueio. Seu corpo bateu contra o concreto do castelo e caiu como um peso morto contra o chão. Ares e Cronos soltaram exclamações imediatas ao ataque de Hades, e ambos tornaram-se contra ele, olhando-o com perplexidade.

- O quê pensa que está fazendo, Hades?! Perdeu completamente a cabeça?! – gritou Ares, ainda chocado por ver tal cena.

Enquanto Hades trocava olhares intensos com o líder, Cronos seguiu até o corpo de Helderane e ajudou-a a levantar-se. Sua testa tinha um pequeno corte e, aparentemente, seu pulso se partira com a queda. Os olhos da Deusa abriram-se com certa relutância e, assim que o fizeram, Cronos teve de se afastar.

Banhados em sangue estavam eles, mas de uma forma que nem mesmo os olhos avermelhados de Cronos eram. Estavam embevecidos em pavor e ódio e todos os outros sentimentos tão repugnantes que uma pessoa adquire num momento de completo transtorno. Ares assistiu os olhos de Helderane encherem-se de sangue, de fúria, e naquele exato momento, esticou o olhar então para Cronos. O segundo Cavaleiro de Merlin entendeu.

Ares passou a caminhar até o corpo levemente cambaleante de Helderane, que se erguia do chão com dificuldade. E ele dizia:

- Minha Senhora Helderane... Por favor... Não pense nisso...

Helderane nada respondia, apenas erguia o corpo do piso frio da Torre Leste, os olhos tão repletos de puro terror que realmente chegava a assustar. Ela parecia estar ignorando. Parecia estar hipnotizada por algo além do que é compreensível. Muito além...

- Eu peço... Imploro, minha Senhora...

E então, tudo aconteceu rápido demais.

Primeiro, foram as explosões de todas as vidraças da sala. Todas as janelas simplesmente estouraram em apenas um segundo, todas ao mesmo instante, como numa dança, como numa explosão fabricada pelos filmes trouxas. No mesmo ritmo, provocando um estouro tão ensurdecedor que caso o tempo não estivesse parado, possivelmente, acordaria toda Hogwarts de uma só vez.

Depois, vieram as rajadas de vento. Novamente, algo impossível para um tempo congelado. Mas lá estavam elas, sacudindo as cortinas que restavam, invadindo a única sala "viva" em toda Hogwarts, na alta e longínqua Torre Leste.

E por último, a visão impressionante. Helderane estava de pé, os cortes em seu rosto tinham sumido, seu corpo estava intacto, como se nada tivesse acontecido segundos antes. Foi possível enxergar através de tamanha ventania e cacos de vidros voando contra todos os lados, lutando para se dissiparem pelo ar e viajarem janelas afora. Helderane ainda possuía os olhos avermelhados e cheios de ira. A Deusa Cavaleira de Merlin tinha, pelo pior jeito, ressuscitado em sua totalidade.

Ares foi o primeiro. Logo em seguida veio Cronos. E, com extrema relutância, Hades também. Todos os Deuses se agacharam diante de Helderane, se ajoelharam para reverenciar a Deusa deles. A reencarnação da filha de Merlin. A imortal.

Helderane deu um ligeiro passo à frente e logo estava diante dos três Deuses ajoelhados. Ela estendeu a mão direita para Ares primeiramente. O líder da legião beijou-a com delicadeza, olhando antes fixamente para o rosto da Cavaleira. Depois veio Cronos, relutante em observá-la e tocá-la, mas ainda assim tão gentil quanto Ares.

Hades, o último a tocar em Helderane, fez questão de erguer-se até a altura da Deusa, que naquele instante parecia-lhe dez vezes maior, e procurou encará-la com sinceridade. A Deusa colocou um belo sorriso no rosto.

- Você me acordou, Hades... Um bom trabalho... – elogiou a Deusa, olhando da mesma maneira para o Deus que comandava o inferno.

Os orbes esbranquiçados de Hades demoraram-se em detalhar o rosto singelo e delicado de Helderane – ou de Heather. Como seria possível algo tão frágil possuir tanto poder?

- Era isto que desejava? – indagou Helderane, a voz muito mais que um simples canto de uma ninfa. Era mágico. – Desejava despertar Iris dentro deste corpo humano?

Um silêncio permaneceu em ambos, um silêncio compreensivo e profundamente esclarecedor.

Veio em seguida a reposta direta de Helderane, sem permitir mais palavras de Hades:

- Pois então, meu querido Senhor, seu desejo será não apenas realizado, mas também destruído em pouco segundos...

Ares e Cronos ergueram-se do chão, temerosos em relação ao que dissera.

- Minha Senhora, o quê...

Helderane levantou o dedo indicador da mão esquerda, calando imediatamente os Deuses, lançando um olhar mais apurado sobre Hades. O Deus do Inferno olhou desconfiado para Helderane e soube. Soube naquele instante. Tudo estaria acabado.

- O seu desejo era acordar-me e tentar-me. A tentação de colocar-me ao seu lado, ao lado do Deus que comanda o Portal das Sete Estrelas e, assim, destruir tudo que não o satisfaz. Destruir os comandantes reais, os seres lendários, tudo que poderia ser mais poderoso que você – a voz, apesar de tão bela, vinha decidida. – Está tudo acabado, Hades. Este corpo nada mais me é útil. Este corpo não me quer mais. Eu irei libertá-la.

Antes que Hades pudesse responder, Ares aproximou-se, a cabeça levemente abaixada para que seu olhar não encontrasse o da Deusa, dizendo em tom perturbado:

- Mas a minha Senhora não pode desistir, não pode nos deixar! Há ainda um século para ser cumprido neste corpo humano!

- Não me importo, Senhor Ares – retrucou lentamente, o olhar voltando para Hades. – A garota foi agraciada pelo poder de transformar-se em uma Deusa milagrosa e lendária. Entretanto, de que adiantará tê-la em mim se seu coração, a única parcela que restara de sua vida humana, não estar concentrada em mim? Preciso de uma nova vida, esta não me interessa mais – e fechando seus olhos, ela completou. – E irei realizar um último desejo dela.

E Hades pareceu novamente sério e furioso.

- Você não irá ressuscitá-lo, não é mesmo?

Helderane estendeu o braço e tocou a pele do rosto de Hades. O Deus contorceu levemente a face, tentando retirar a cabeça das mãos da Cavaleira. Estava formigando. Estava queimando. Estava ferindo.

- Querido Senhor, sabes que não posso ressuscitá-lo – disse ela, ainda tocando com determinação o rosto do Deus. – Não poderia fazê-lo, já que o responsável pelas vidas retiradas da Terra é o Senhor, e não eu. Mas permitirei que ela tente, que ela gaste sua energia... Não, que ela gaste minha energia restante em seu corpo para tentar fazê-lo.

Assim que retirara a mão do rosto de Hades, Helderane deu um passo para trás e Ares e Cronos puderam observar a vermelhidão logo abaixo do olho esquerdo de Hades, onde a Deusa o tocara. Os três Deuses trocaram olhares e voltaram-se para Helderane. Ela abriu os braços e disse:

- Não sejam tolos, meus Senhores.

De um lugar desconhecido, Helderane foi atacada e seus pés rasparam contra o assoalho, seu corpo imóvel. Era uma força invisível, incontrolável por ela. Novamente, outra corrente de energia transparente a atingiu do lado esquerdo do corpo, seu braço indo levemente para trás, de encontro às costas. Ela abriu um sorriso.

- Já disse para não serem tolos...

- Nossa Senhora não pode escapar – falou Ares, a voz imponente. – Ainda resta um século. O nosso século.

- Isto mesmo. Nossa Senhora não poderá escapar sem antes acabar conosco. – continuou Cronos, no mesmo tom de Ares.

Helderane esperou que Hades também dissesse algo, mas o que veio em seguida penetrou em sua mente. Não faça isso. Seu olhar intensificou-se em Hades, o Deus olhando-a pelos seus globos esbranquiçados, irradiando poder. Não faça isso. A Deusa tentou captar de onde a voz vinha, pois sabia que não era de nenhum dos três Cavaleiros de Merlin.

Cavaleiros que, agora, tentavam de todas as maneiras tirá-la de seu ponto de equilíbrio na forma de rajadas de poder. Rajadas invisíveis. Eles não a queriam mais os enfrentando. Eles desejavam que Helderane voltasse ao corpo da mulher Potter. Não faça isso. "Diabos, de onde vem esta voz?", pensou a Deusa, perturbada, concentrando-se em evitar os ataques dos Deuses.

A rajada de vento que antes desaparecera voltara com força máxima. Seus fios castanhos agitavam-se sobre seus olhos, suas vestes claras lutavam para permanecer envolvendo sua figura feminina, o corpo humano tentando protegê-la dos ataques. Não faça isso. Os três Cavaleiros eram poderosos demais, mas ainda, caso Helderane unisse toda sua força para apenas um propósito, poderia facilmente destruí-los. Ou ao menos, colocá-los fora de jogada, deixá-los para trás, distanciar-los de seu caminho. Era apenas reunir forças. Não faça isso. Reunir suas forças e todos iriam deixá-la em paz. E então a Deusa poderia procurar outra vida capaz de recebê-la.

E ela pôde ver finalmente. Enquanto reunia suas forças, todos seu poder adormecido, Helderane viu. Atrás do corpo de Hades estava uma figura masculina. E a figura chamava-se Remo Lupin.

O espírito não mexeu os lábios e a voz adentrou em sua mente uma vez mais. Não faça isso.

E Helderane entendeu, finalmente o que ele estava tentando dizer com aquelas três palavras. Lupin estava desejando, estava pedindo, clamando, para que Helderane não permitisse. Não permitisse que Heather Potter abandonasse-a.

A Deusa sabia que, enquanto seu corpo estava lutando contra os três Cavaleiros, tentando fugir de seus ataques, tentando persuadi-los a fazê-los entender de que estava indo embora, estava deixando-os e iria a busca de uma nova vida que pudesse oferecê-la confiança e conforto, o corpo de Heather Potter tinha sido libertado. E ela estava naquele momento, lutando contra a morte de Remo Lupin. Heather estava na saleta perto do Salão Principal, com o corpo de Lupin em seus braços, ensangüentado, deixando para trás sua vida para dar-lhe a seu amado. Heather estava oferecendo-lhe sua imortalidade.

E ali estava Lupin, clamando para a Deusa que não permitisse esta ação. Lupin não desejava que Heather deixasse tudo para trás apenas para salvá-lo. A imortalidade de Heather não era necessária. Ele não queria mais provocar problemas, não queria que aquela mulher, ainda que parecesse a garotinha que se apaixonara quando muito jovem, largasse seus sonhos, largasse seu destino, para salvá-lo de algo inevitável. Seu espírito estava vagando ainda, esperando que Hades o levasse para onde deveria ir, e havia voltado, havia estado ali, clamando por piedade. Piedade para impedir que Heather cometesse um erro.

Helderane respirou fundo e observou o semblante cansado de Lupin. O homem estava com os olhos duros, os olhos de um perdedor. Helderane não poderia aceitar um pedido daquele. Sua parte humana chamada Heather Potter era incrivelmente devota àquele homem, àquele homem que acabara de se despedir. E neste instante, Helderane sabia que nada poderia fazer. Heather possuía uma força de vontade maior que seu poder de impedi-la. A imortalidade pertencente à garota desde seu nascimento estava sendo doada livremente para Lupin. Cabia aos Deuses e ao próprio Lupin aceitar. Heather estava abdicando de sua vida como Deusa, estava deixando tudo para trás, tudo para tornar-se uma simples humana novamente. Aceite, disse Helderane para Lupin, igualmente sem mover os lábios.

Lupin não demonstrou nenhuma objeção ou mesmo alguma reação às palavras de Helderane. Era como se a idéia dele já tivesse sido tomada bem antes que Heather aparecesse diante de seu corpo e reunisse tudo que ainda restara de puro em seu corpo. Reunindo ela estava, reunindo para salvá-lo. Aceite.

E então, a imagem turva do espírito de Remo Lupin desapareceu. Helderane soltou a respiração. E ao mesmo tempo, uma explosão na sala da Torre Leste aconteceu, unida a um grito de desespero. Os três Cavaleiros de Merlin, Ares, Cronos e Hades, caíram contra o piso, desacordados. A figura da Deusa Helderane foi desaparecendo aos poucos, a expressão cansada e quase aliviada. E um choro descontrolado provocou que o tempo movesse novamente e que Hogwarts despertasse com uma nova e sofredora exclamação de profunda dor.


NO PRÓXIMO CAPÍTULO:
Está em todas as notícias do mundo mágico o ataque ao Ministério da Magia. Mas Hogwarts não possui tempo para discutir questões políticas. Um de seus maiores aliados está morto, Helderane resolveu tirar umas férias e Ártemis Figg decide levar em frente sua intenção de expulsar Hermione. Porém, o que poderá acontecer para impedi-la? E finalmente Sirius descobre suas jóias no sexto ano da Sonserina. Veja o impacto da morte de Percy e Lupin em "HUFFLEPUFF RESURGE NA TROUXA E OS ESCOLHIDOS DE DRAGON"