HARRY POTTER E O OLHO DA ESCURIDÃO
Nota da Autora (1): É engraçado olhar esse capítulo pronto, já que foi planejado há tanto tempo... Mas, agora que está pronto e se assemelhou bastante ao que desejei desde o início, é triste. Este capítulo, como já disse em outros sites e no meu, é um divisor de águas: ou você tem fé e espera ver o que faço, ou se é apaixonado pelo que eu destruo aqui, desiste de ler... Só que, assim como em outras atitudes estranhas minhas, eu repito a mesma frase: tudo tem um motivo! Então, antes de tirarem suas conclusões, tive motivo para fazer isso também...
Nota da Autora (2): Além de ser muito especial para mim, esse capítulo é também dedicado à pessoa mais apaixonada pelo "shipper" que aparece aqui. A Anjinha é uma defensora ferrenha da "raça pura"... hahahahahaha! E aqui, temos um SS especialmente para ela (e ela sabe o que é o SS, assim como a Alix -- SS - pela pureza da raça P)... Anjinha, esse capítulo vai pra você, por todos esses anos de ajuda e de apoio incondicional a tudo que eu faço, inclusive minhas decisões malucas ― mas que você adora ― dessa série viu! Obrigada pelas risadas e pelas mensagens durante a semana, por todas as nossas diversões de final de semana e por ser outra adoradora desse casal, no mínimo, sonserino, não é! Finalmente alguém que me entende nisso! Hahahahahaa! Você sempre será a pessoa mais sonserina e de espírito esverdeado que já conheci! Ti amo Anjinha!
Nota da Autora (3): Agradecimentos:
Kirina-Li Nem me fale da falta de atualizações, viu minina! Corta meu coração, porque eu queria que fosse muito mais rápida, só que a faculdade não permite, é realmente difícil ― ainda dou um jeito nisso! ;) Bom, você sabe, confusão pra cima do Harry é comigo mesmo né! Ele merece, afinal de contas, o Voldemort não está sempre no pé, vai! Hahahaha! Hey! D/G? Hum.. não falo muita coisa sobre D/G, é um terreno estranho para mim, adoro, mas na fanfic ele é delicado! Hihihihihihi! E olha, agora essa última atualização demorou dois meses hein! Mais rápido! Beijinhus!
Den Chan: Anjinha, nem vou falar mais nada, já tem dedicatória pra você aqui em cima né! Tbm mamuti mto viu!
Adriana Black: Olha, você tem razão, a Gina não percebeu nada mesmo... O irmão morto né, fica difícil perceber qualquer outra coisa à sua volta... Mas tipo... Isso ainda vai dar pano pra manga, porque a Ametista não é de deixar essas coisas por menos! Hehehehehe! Sério que a Ártemis é sua personagem preferida! Minina! Te amo! Hahahaha! É sério, finalmente alguém que gosta dela! A maioria do pessoal odeiaaaaaa a coitada! Hahahahaha! Mas a Arty logo logo vai mostrar porque veio, acredite! ;) Beijinhus!
Anaisa: Puxa, outra surpresa também! Gosta de Draco e Ametista, as discussões infinitas deles! Ainda vai ter muito viu, aliás, nesse capítulo tem uma bem legal, espero que você goste! Sabe como é, ambos sonserinos, tem que sair as melhores discussões de toda a fanfic né... E olha, o que eu me concentro pra fazê-las... Hahahahaha! Beijinhus minina!
Karen13: Kakaaaaa! Miguxaaaa! Eu aqui conversando com você no MSN enquanto atualizo o arquivo... O capítulo você já leu né... Muito medo, muito choro... Pois é, a Angie fez o que deveria ter sido feito...Bom, não preciso dizer que o seu e-mail do capítulo 34 e do 35 foram, como sempre, HILÁRIOS, não é? Aliás, o "Somebody Saaaaaaaaave Me" acho que nunca vou esquecer, minha mãe pensou que estava tendo umtreco aqui em cima, tamanha minha gargalhada! Só você causando né Kakaa.. hehehehe! E você e o soco né! Amou de paixão! Hahahaha! Um pega-pra-capa com os dois é muito divertido mesmo, você tem razão! Hahahahahha! Mamuti mto viu miguxa! Obrigada por tudo também, amei tuas palavras depois da última cena! Ti amooo! Beijinhus!
No Capítulo Anterior: Hermione descobre que suas visões eram resultado de um dom adormecido em seu corpo trouxa - a garota é herdeira de Helga Hufflepuff, e a nova perseguida na lista de Voldemort, ainda que ele não tenha conhecimento disto. Já Ametista encontrou mais uma semelhança entre Voldemort e ela: ambos são escolhidos de Dragon e possuem o índice máximo de transformação. E ainda há Draco Malfoy, possuidor do mesmo poder que ela.
CAPÍTULO TRINTA E CINCO – O BEIJO QUE ENCERRA
"Como pude deixar isso passar? Era tão óbvio, lógico! Ela tinha que ter o índice máximo... Voldemort não dá ponto sem nó, sempre foi assim e sempre será! Maldita hora em que deixei isso passar por mim!". Sirius ouvia os estudantes deixarem a sala na torre escura, a chama azulada ao meio da sala ainda acesa e agitada, seus pensamentos não o deixando em paz. Ver a expressão da filha ao ganhar mais um elemento que a ligava com o Lorde das Trevas foi doloroso. Desejava que não tivesse sido tão cego, tão ingênuo. Ametista carregava no sangue não apenas a herança genética de Voldemort, como também outras características inseridas no exato momento do feitiço.
A mente começou a doer, ferido pela imprevista decepção de ela ser mais uma escolhida de Dragon. E ainda havia Lupin para perturbá-lo. "Por que você não aceitou a graça de Heather? Teimoso idiota! Sempre querendo se virar sozinho! Para quê isso! Remo, você devia ter aceitado! Agora você está em um coma, e ninguém pode te ajudar! E a Heather? Ela sumiu! Está em um coma tão profundo quanto o seu! Custava uma vez deixar alguém te ajudar!", lutava contra a ira e um súbito desânimo intenso. "Você quer que eu lute sozinho conta Voldemort? Já perdi Tiago, não poderei perder você também".
Focado em seus pergaminhos e desejando correr o mais rápido possível a Dumbledore para comunicá-lo da novidade, ouviu uma voz às suas costas despertá-lo de seus devaneios. O tom usado não parecia contente.
― Nós podemos conversar...?
Sirius tornou-se para o aluno e cruzou os braços. Pensou que com o tumulto da aula, ele esquecesse a cólera enrustida notada assim que colocou os pés dentro da sala. Harry tinha os olhos verdes concentrados no padrinho, os braços cruzados e a face nada satisfeita. Possivelmente, saber que Ametista possuía o mesmo dom que Draco Malfoy não o animara, mas também saber que ele andava conspirando contra seu namoro não ajudava em nada.
― Claro Harry ― respondeu, ajeitando alguns papéis sobre sua mesa. ― Sobre o quê deseja falar?
A expressão de Harry não mudou, ainda implacável e séria demais. Sirius procurou buscar dentro de si a maior paciência que já possuiu. Afinal, além de cuidar de suas atuais discussões com Arabella e vigiar o que a filha tem feito com o namorado, acabara de receber a notícia da morte de seu melhor amigo.
― Acho que você sabe, Sirius ― e, por um momento, Sirius achou que conversava com Tiago, tal idêntico tom de Harry. ― Por que você disse que confiava em mim e, de repente, começa a ameaçar o que tenho com a Ametista?
Agitando a cabeça lentamente, tentando não expressar cansaço e ainda procurando a paciência dentro de si, Sirius respondeu, pegando fôlego:
― Harry, por favor, tente entender ― e postou as mãos no rosto, milhares de pensamentos passando pela cabeça. ― Nós estamos em tempos de guerra. Voldemort aproveitará todas as chances que dermos a ele, e caso você e Ametista não levarem as coisas como devem ser levadas, ficará bastante fácil para ele dominá-los...
― Isso não tem nada a ver com Voldemort! ― interrompeu Harry, inesperadamente, em alto volume. ― Você e Dumbledore são tão protetores com ela que deu nisso! Vocês não admitem que ela não seja mais uma garotinha! A sua garotinha!
Sirius não encontrou palavras para definir o tamanho do sentimento que invadiu suas entranhas ao ouvir o afilhado. Como podia dizer aquilo! Tantos morreram no passado por terem subestimado o poder que Voldemort possuía, as manobras feitas tão ardilosamente por ele, sempre na esperança e ambição de envolver a todos, não somente os cegos e os ingênuos, em sua teia de medo e violência. Não era mais uma questão de pensar individualmente, todos deveriam ter o campo de visão coletivo, imaginar nas milhares de vidas que poderiam ser perdidas, fossem na batalha ou no assistir dela. Os inocentes não eram mais inocentes, os defensores não eram mais defensores... Todos seriam somente um, na luta contra uma idéia preconceituosa e drástica de um ser poderoso demais para ser vencido por um único indivíduo.
E agora, o próprio afilhado, o maior envolvido nessa guerra, fala como se tivesse vivido o tempo todo em outro planeta e chegasse naquele instante. Sem dúvida, ou Harry realmente andava esgotado com tudo aquilo, ou alguém teria roubado seu corpo. Não havia nada de coerente em suas palavras, quanto mais na idéia de que Sirius ou Dumbledore fizeram aquelas ameaças a Ametista por puro ciúme.
― Harry, será que você tem ficado tão maluco com toda essa batalha que perdeu o controle de seus pensamentos? ― para sua surpresa, o monitor tomou uma posição pretensiosa. ― Acho que sim... Nada disso é brincadeira, nada mais se resume a mim ou a você ou a qualquer outro ser humano nesse mundo! Tudo, absolutamente tudo, que realizamos dia após dia é vigiado! Tudo tem de ser previsto, esperado! Os Comensais não dormem em serviço! Muito menos o chefe deles!
Harry descruzou os braços e encarou Sirius mais de perto.
― O chefe deles não vai se meter entre Ametista e eu...
― Talvez não diretamente, mas eles destroem a vida ao seu redor! ― aborreceu-se ainda mais Sirius, não compreendendo o afilhado. ― Fizeram isso comigo! Será que é tão difícil de entender! ― Harry olhou para longe. ― Eu sei que você ama Ametista, e tenho a certeza que ela te ama também, só que eu amei Hariel da mesma maneira, e nem por isso pouparam a mim ou a ela! Voldemort fez de tudo, até matar meu irmão, e isso matou meus pais... Depois, envenenou-me contra minha própria mulher e fez com que a nossa filha fosse somente dela, e não minha!
Notando como usou palavras e expressões indevidas, Harry procurou reparar o erro, mas Sirius pareceu abruptamente enlouquecido, exausto até o último fio de cabelo.
― Sirius, escute, eu entendo que...
― Não, não Harry! Você me escute! ― e então, levantou o dedo até o rosto do afilhado e prosseguiu. ― Primeiro, eles me tiraram o irmão, depois a esposa e, ainda por cima, criaram em minha cabeça que o cara mais leal que eu já conheci na vida poderia ter traído a mim e a seu pai! ― Harry não soube dizer o porquê, mas Sirius pareceu muito machucado em falar de Lupin e Pettigrew, depois de tanto tempo. ― Enquanto aquele filho da puta do Pettigrew se unia ao Voldemort, eu acreditava que Remo tinha revelado o paradeiro de Tiago! Eu estava tão cego, tão estúpido, tão cheio de raiva e ódio por terem me iludido, por terem me afastado da minha mulher e da minha filha...! ― Sirius fungou, mas Harry não viu nenhuma lágrima, apenas o rosto embevecido em fúria. ― E então arrancaram teu pai e tua mãe, e eu escolhi seguir o ódio e me enfiar em Azkaban, ao contrário de cuidar de você, como faria um padrinho correto!
― Eu nunca achei...
Sirius deu um grande passo à frente e encarou o afilhado, erguendo os braços e apertando os mesmos de Harry, com força bastante para machucá-lo. A expressão de terror e desespero era tão clara que chegou a assustar o monitor. Harry vira Sirius daquela maneira em raras situações, como correr enlouquecido atrás de Pettigrew na Casa dos Gritos. E ele tinha aquele mesmo e único olhar novamente.
― Harry, eles te cercam... Eles acham tua fraqueza e te pegam bem ali! ― e retirou uma das mãos dos braços do monitor, apontando fortemente para o coração de Harry. ― Te perseguem pela vida toda! Eles têm feito isso comigo desde então! Minha família, meus amigos, minha mulher, minha filha, meu afilhado... Agora até meu melhor amigo, o único que sobrara do meu passado! Guardo Arabella, Ametista e você a sete chaves porque não possuo mais forças para lutar contra mais uma morte, Harry! Não tenho mais...
E, apoiando-se nos braços do afilhado, Sirius gritou. Bem alto. E começou a tremer. Apresentando espasmos fortes, Harry segurou o homem em seus braços. Como podia ter tido uma postura tão absurda e indigna? Sirius não era o culpado por tudo que dava errado em sua vida nas últimas semanas! Harry estava recordando lentamente tudo que ele falara. Palavra por palavra...
― Seu melhor amigo? ― repetiu, baixinho, para si mesmo. ― Sirius... ― chamou, puxando o rosto do padrinho, tão desgastado, até a altura do seu. ― O-o que acon-aconteceu co-com o Lupin?
O homem cansado continuou a soluçar e a tremer, enquanto cruzou o olhar desesperado com o perdido de Harry. O jovem tinha a expectativa amarga neles, como se estivesse acostumado com as piores notícias, mas nunca conformado. Nunca.
Assim, Sirius distanciou-se de Harry e apoiou o quadril na própria mesa, meio sentado meio em pé, e fungou uma vez mais.
― O incêndio no Ministério, na quinta à noite... ― Harry começou a arregalar os olhos. ― Alguns membros da Ordem foram chamados para ajudar na busca de sobreviventes e para tentar encontrar os Comensais responsáveis pelo crime ― Sirius parou por um momento, como se estivesse ainda processando a informação que Dumbledore dera a ele há três dias. ― Remo foi junto com Bellacroix e Zylkins... E alguém o matou com um Avada Kedavra.
A visão de Harry ficou escurecida repentinamente, e ele caiu sentado contra uma das mesas dos alunos, apoiando a cabeça e esfregando os olhos. Sua pressão caiu e sentiu uma súbita falta de ar. Colocando a cabeça para trás e respirando lentamente, inúmeros pensamentos começaram a inundar sua mente, inúmeras imagens.
O terceiro ano. Lupin apareceu como professor de Defesa Contra a Arte das Trevas. Ajudou-o durante o ano todo, especialmente com o feitiço Patrono, para a defesa dos dementadores. Descobriu que ele fora amigo de seu pai, e que era lobisomem. O quinto ano, em que voltou a ser professor, auxiliando os treinos de Ametista, e dando apoio para que Sirius assumisse a filha. O sexto ano, em que o ajudou novamente, na Ordem da Fênix, mas mais importante, realizou o Pacto de Sangue junto de Snape e Sirius.
Mas, nada disso parecia encaixar-se com o fato de que Lupin estava morto. Um novo número para a estatística maldita de Voldemort, mais uma vida perdida pelo caminho do mal. Colocando as mãos sobre o rosto, tentando procurar alguma razão, algum vestígio de esperança, olhou para cima e viu Sirius com a face abaixada, o cabelo cobrindo seus olhos.
― Mas... Mas... Como...? Como que aconteceu? Como que isso não saiu na imprensa? Como que ninguém está sabendo!
Sirius, com muita dificuldade, ainda tentando conter toda a emoção, explicou com detalhes a conversa que tivera com Dumbledore, inclusive justificando o sumiço de Heather e toda a sua manobra para tentar salvar Lupin. Sirius não soube dizer se o plano de Helderane livrar Heather de seu domínio tinha dado certo, mas sabia que a tia de Harry ainda estava em coma profundo. E ainda pediu sigilo para Ametista, sabendo da tamanha ligação entre ambos ― Lupin e ela.
― Por isso que te peço paciência e que entenda a minha posição, Harry ― concluiu, a voz fraca. ― Seja razoável... Já te tiraram os pais de maneira covarde, depois o padrinho por doze anos, a tia por quase uma eternidade... Não permita que, além de todos eles, te tirem Ametista ou que acabem com a sua própria existência. Por favor...
O céu ganhava um tom azulado, alaranjado, avermelhado... Admirável, sem dúvida. Da pequenina janela do salão comunal da Sonserina, a brusca necessidade de fugir parecia incontrolável. Desejava correr para fora dali, embarcar naquele horizonte suave e tão puro... Tão distante da realidade daquela Torre escura, esverdeada, perdida em sua própria opulência e magnitude. E seus olhos escuros miravam a lareira, tentando não sucumbir à tentação de deixar tudo para trás e esquecer.
A estátua de Salazar Slytherin, imponente e reclusa em seu canto, começou a incomodá-la. A lareira crepitava o fogo esverdeado, e assim ela retirou o olhar dali e deixou escorregar a visão melancolicamente até encarar a figura majestosa de um dos quatro grandes de Hogwarts. Ametista não entendeu a própria paranóia, ainda que a direção dos olhos fortes e sérios de Slytherin estivesse nos seus... Exatamente nos seus... E foi como um estalo em sua cabeça, a imagem daquela noite chuvosa de Halloween, em que encontrou pela primeira vez Lorde Voldemort. Os espelhos, o corpo ambulante e nojento, a fenda fedorenta e os olhos tão vermelhos. Imaginar que Voldemort fora descendente de Slytherin provocava tamanha repulsa pela figura que a fitava que Ametista sentiu tamanho enjôo, perdendo a paciência.
― O quê! ― gritou repentinamente para a estátua, esquecendo-se de que aquela era apenas uma retratação em pedra, não um ser humano. ― Não gostou!
Enquanto a voz estridente da jovem ecoava pelo salão comunal, alunos tornaram-se para Ametista, sem entender com quem a sonserina falava ou mesmo sobre o que ela dizia. Muitos riram, outros sussurraram qualquer expressão zombeteira. Ao tempo em que a jovem continuava fitando a estátua do fundador da Casa, enrolava os dedos uma vez novamente, como quando assistiu Harry abraçar Gina no dia da morte de Percy.
Tinha algo de tão errado com Harry, e ela não conseguia apontar o dedo sobre o quê poderia ser. As palavras de seu pai e de seu avô ainda repercutiam e confundiam suas idéias. A noite em que Harry passara em seu dormitório não saía de sua cabeça. Dormir abraçado a ele, sentir as palpitações de seu coração, a respiração chocar contra seu cabelo e provocar uma sensação tão tortuosa... A falta que sua voz lhe fazia, os braços que a circundavam e envolviam na mais graciosa postura de proteção... Assistir os dias passarem sem que pudesse beijá-lo ou tocá-lo, sem saber o dia seguinte...
No entanto, a imagem dele, olhando Gina com tanto carinho e possessão não deixava seus pensamentos. Durante todo o fim de semana, isolou-se para colocar as informações no lugar. Era difícil analisar o porquê da atitude do grifinório. O estado de Gina, certamente, não deveria ser questionado, e Ametista sabia que sequer a garota havia percebido o inesperado ímpeto de Harry. Mas ainda assim, o desejo esteve ali, presente logo ao seu lado, sem respeitar-lhe e sem dar-lhe compaixão.
Então, nada poderia ser feito a não ser resistir aos pensamentos indignos, deixar que as situações revelassem a verdade, decidir qual o melhor e se realmente valia a pena lutar contra as forças maiores existentes em sua vida. Não seria um estranhamento novo dele que a faria desistir, deixá-lo solto e longe de sua pele e de seu coração. Harry estava mergulhado em suas entranhas e Ametista não cansava de se afogar nele e em todo o ser que ele representava.
Puxando a saia para baixo e cobrindo levemente a coxa, colocou as mãos sobre o colo e as observou com calma. Os dedos estavam brancos, as unhas quase avermelhadas e as palmas suadas. Sem entender o nervosismo, voltou a cruzar com a estátua, assistindo divertida sua vida se desmantelando. A lembrança de minutos atrás deixou um rastro de pânico nela que não sentia há muito. As semelhanças, as malditas semelhanças.
― Você deve estar adorando tudo isso, não é? Todos os seus desejos se tornando reais, tudo que disse acontecendo ― prosseguiu ela em tom bem mais baixo que anteriormente, o olhar duro sobre a estátua. ― Não haverá mais semelhanças, seu porco asqueroso...
Ter o índice máximo de transformação significava pânico a Ametista. Verdadeiro e profundo pânico. As proximidades com aquele que jamais desejou ser seu pai eram cada vez mais explícitas, e não permitiam que esquecesse nem por um momento de onde viera. Minha maldita origem. Hariel Dumbledore fora uma grande espiã do Ministério da Magia, mas ainda assim seu pai dissera que nada garantia a genética do talento. A união de alguém possuidor do talento a alguém que superara o índice seguramente não impressionara, de certa forma. Mas, qualquer nova semelhança à Voldemort costumava incomodar Ametista mais do que os olhares de Harry a Gina ou as infernais importunações de Draco Malfoy. Nada apagaria o tom doído que Sirius dirigiu a ela no momento em que percebera a repentina transformação entre Malfoy e ela.
Aparentemente, Voldemort produziu mais do que um simples feto dentro de Hariel Dumbledore. Possivelmente, o Lorde das Trevas deixou à única filha mais do que o sangue, mais do que o temor. Uma verdadeira descendente, uma rara escolha. Mordendo o lábio, a jovem procurou esquecer a gritaria dos sonserinos ― muitos ainda caçoando de suas atitudes sem sentido ―, tão agitados naquele início de noite. Precisava, mais do que nunca, pensar em como poderia eliminar os problemas de sua cabeça e de sua vida.
Puxando um pergaminho e uma pena, além do tinteiro, de dentro de sua bolsa, a garota apoiou acima de seus joelhos a folha e iniciou:
Problemas a serem resolvidos até o fim do semestre:
1. Detenção com a Figg na terça à noite
2. Descobrir o quê ela tanto quer com as poções de Severo
3. Quebrar o nariz do Malfoy
4. Afastar este idiota e cretino da minha vida
5. Esclarecer ao Harry o porquê da minha implicância
6. Confiar mais no Harry e demonstrar isso pra ele
8. Pesquisar mais sobre Voldemort
9. Procurar outras semelhanças entre nós dois e eliminá-las uma por vez...
― Estão dizendo que andou falando com a estátua, esquizofrênica...
Largando a pena no mesmo momento e soltando a respiração pesadamente, Ametista ergueu o olhar e deu de cara com o rosto sem emoção de Draco. Não mais vestindo os trajes da Sonserina, usando calça social preta e pulôver azulado, os olhos cinzentos de Malfoy captaram as letras de Ametista no pergaminho e riu.
― Não sabia que era adepta a estas listas de garotinhas idiotas como as lufa-lufas ― falava, erguendo uma das sobrancelhas. ― Está tentando formar uma com o quê quer de um namoradinho? Se bem que, por que fazê-lo se o Potter é perfeitinho? Sempre me esqueço disso...
Colocando o melhor de seus irônicos sorrisos no rosto, Ametista dobrou o pergaminho entre os dedos e voltou o material na bolsa, enquanto respondia:
― Sua vida social está tão mau assim que precisa correr atrás de mim para tentar me irritar? ― questionou, o semblante calmo. ― É realmente uma pena, Malfoy.
― Na verdade, os imbecis não têm senso de humor com minhas piadinhas sobre o forno que virou o Ministério da Magia! E isso sim é digno de pena. ― respondeu, os olhos cerrando ligeiramente.
Torcendo a cabeça e tomando um sorriso ainda maior, Ametista completou:
― E, por acaso, você imagina que eu tenha esse senso de humor? ― o riso de Malfoy denunciou divertimento para ela. ― Oh, fico agradecida, não imaginava que desejava conversar comigo sobre o grande assassino e torturador que seu pai tem demonstrado ser a vida toda... É de fato admirável como o todo-poderoso Lúcio Malfoy parece ser como vinho, quando mais velho, melhor, não é mesmo?
― Há! Só eu percebi um sarcasmo dolorido aqui! ― e riu charmoso. ― Tem aprendido bastante comigo, Dumbledore, posso dizer que fica cada vez melhor! Gosto de pessoas à minha altura, não que você esteja perto disso, logicamente... ― e piscou.
Ametista riu alto propositalmente, fazendo com que os estudantes dirigissem olhares a ela novamente.
― Uau! Obrigada pelas aulas, professor! É que, tratando-se de vagabundos idiotas como você, tenho sempre que estar, de alguma maneira, à altura...
― Mais uma vez, lindíssimo... Mas, vamos concordar que, de vagabundos idiotas já estamos fartos, não é mesmo? Temos o Black para isso...
― E de assassinos frios e chantagistas sujos já basta o seu pai e toda sua família. Mamãe também aprecia?
Malfoy não pareceu ter gostado da piada ― envolver sua mãe nunca foi um bom movimento ―, assistindo Ametista ainda juntar as coisas em sua bolsa, querendo visivelmente deixá-lo logo para trás. Quando a jovem procurou colocar um último relatório entre seus papéis, a mão branca de Draco bateu fortemente contra o pergaminho e a impediu de prosseguir.
― Você adora falar de meu pai, do quanto ele faz, manda e executa ― disse ele, o tom baixo, o rosto aproximando lentamente do ouvido dela. ― Quase como uma diversão particular a você... Mas eu vejo de outra maneira, sabe? Para mim, você possui uma inveja obsessiva, pois eu nasci de meu pai e de minha mãe, e eles me desejaram e me tratam como filho, não como você, que além de ser uma aberração, é bastarda.
O olhar de Ametista subiu para encontrar o de Malfoy, furiosa e embevecida em nervosismo. Seus olhos chocaram-se, assim como por poucos centímetros, seus narizes. Fios do cabelo loiro de Draco caíam entre seus rostos, e naquele momento, o que os dividia eram esses mesmos fios. Suas respirações se fundiam em uma, repleta de ódio e fúria. Ametista molhou os lábios, tentando conter uma possível reação física perigosa demais para a figura bela de Malfoy.
― O que você disse? ― perguntou Ametista, a voz quase inexistente, de tão chocada.
― Quer que eu desenhe também, Dumbledore? ― ambos não retiravam os olhos, enfrentando o adversário com vontade. ― Aberração, bastarda e medrosa, é verdade, esqueci de mencionar...
― Medrosa? Quem foge do soco de uma garotinha de treze anos e fica correndo pro papai resolver seus probleminhas na escolinha, que eu saiba, é você, seu imundo...
― Bastante espirituosa, Dumbledore, mas você é um poço de temor. E, perdoe-me, mas é ridículo vê-la desse jeito. ― retomou, o rosto aproximando levemente.
Ametista subiu a altura do rosto, impulsionando o pescoço para trás, e encontrando diretamente os olhos de Malfoy, não mais de um nível abaixo. Os fios alourados dele tocaram sua testa com persistência.
― Poço de temor? Você ficou maluco e ainda mais problemático...
Draco abaixou vagarosamente o corpo e começou a dizer. Ametista ficou calada, esperando qual seria a próxima abobrinha a sair de sua boca.
― Você não era ninguém, protegida pelas grades da vida e do velho e caduco Dumbledore até chegar a Hogwarts, não querendo amigos ou uma boa imagem... ― os olhos de Ametista demonstraram surpresa. ― Sim, eu lembro bem do nosso início nada adorável, sua grifinória idiota. E então descobriu que era filha de Voldemort e correu para esquecer, para desligar-se desse vínculo que você foi feita, que você nasceu para existir... E sua vida tem sido uma eterna fuga, cada vez mais patética, para esquecer e desligar-se do que é verdade... Eu te vejo correndo de quem você é, tendo os amigos errados e agarrando-se pelos cantos à última pessoa que deveria... Você tem tanto medo de se ver parecida àquele que é seu pai de verdade, seu sangue, toda sua biologia, que acaba fazendo o pior papel da única descendente dos maiores bruxos do mundo... Não me canso de rir da sua cara, dia após dia, vendo essa garota cega que você tem mostrado ser... E hoje foi o ápice disto... Saber que você tinha o índice máximo... E pior! Ter o mesmo talento que EU! Sou possivelmente a pessoa que você mais abomina nesta escola e ainda assim, o destino te coloca à prova e brinca contigo... Você é medrosa... Um medo quase doentio de saber quem é, de assumir sua verdadeira face... E isso, Dumbledore, é deprimente.
Os olhos tremendo sem motivo, a boca seca e as palavras perdidas em brisa de primavera. Ametista não soube o quê dizer, não processou uma resposta, não teve forças para alcançar o rosto de Malfoy e socá-lo até provavelmente a morte. Foi como se todas as suas células parassem de trabalhar, os seus tecidos tornassem-se rígidos e um pânico ainda maior tomasse conta de seus nervos. Nada veio à sua cabeça. Absolutamente nada.
Draco, por sua vez, não abriu um sorriso satisfatório, como seria esperado, e sim aumentou a seriedade em seus olhos e sua expressão manteve-se a mesma, ainda que assistisse Ametista paralisada.
― É quase eufórico vê-la tão chocada e enojada consigo mesma ao perceber que, no final de tudo, você não é tão diferente de mim ou de meu pai. Há em seu coração o pulsar de um bruxo que mata quem for e quando quiser, que não possui piedade ou bondade ― sem reagir, Ametista somente pôde perceber o rosto de Draco aproximando-se do seu até que os lábios dele quase se encostaram nos seus. ― Você é tão sonserina, tão maligna e tão genial quanto eu... O quanto isso te assusta?
Oh, Minha nossa! Saia! Saia de perto de mim!
Sem que pudesse mover o corpo, Ametista iniciou uma avalanche de pensamentos, clamando por qualquer tipo de proteção contra Draco. Saber que ele estava tão perto, tentando envolvê-la com palavras sujas e manipuladoras, encher sua mente de idéias mentirosas, era parecer que morreria.
O corpo de Malfoy afundou no sofá, ajoelhado à sua frente, pronto para dar o bote. Foi tão assustador que Ametista encolheu-se ligeiramente.
Saia, pelo amor de Merlin! Desencoste! Pare de me olhar assim!
― Não adianta lutar contra isso ― sussurrou Malfoy, e surpreendentemente, pareceu que ele estivera suando com tudo aquilo. ― É a natureza. O quanto te aterroriza saber que as semelhanças comigo não são tão impossíveis assim?
Ainda paralisada, sentiu sua respiração ficar mais e mais difícil, como se todo o salão tivesse ficado pequeno demais para ambos, e houvesse somente aquele sofá e a estátua de Salazar. Na tentativa de enfiar mais o corpo contra o braço do assento, Ametista desviou por um segundo do olhar de Malfoy e notou o que ocorria a sua volta.
Vários estudantes estavam particularmente interessados naquela cena ― afinal, quem visse de longe certamente assumiria que Malfoy e ela estivessem prestes a se agarrar, no mínimo. Sua bolsa estava pronta a cair no piso, enquanto o tinteiro inundava parte dela. Sua saia subira alguns estratégicos centímetros e oferecia uma visão privilegiada a Draco caso ele olhasse para baixo.
E assim, Ametista soltou a respiração e voltou a olhar para Malfoy. No mesmo momento, o corpo passou a reagir, e então notou que seus dedos estavam brancos ― tamanha força exercida para segurar-se no sofá ―, suas pernas encolhidas ficaram dormentes e passaram a formigar por falta de circulação, e mais do que isso, deixou de contrair os lábios e notou que, durante todo aquele tempo, mordia o lábio inferior com temor o bastante para arrebentá-lo. O sangue atingiu sua boca e a língua adquiriu o gosto característico da substância.
Draco, percebendo também toda a situação, desviou o olhar para a boca de Ametista e empurrou-se para trás, sem mudar a expressão, mas entendendo todo o clima de terror que se criou ao redor deles. Ainda com o rosto presunçoso e frio, concentrou seu olhar no lábio ferido de Ametista e disse, enquanto puxava o pulôver para baixo:
― Nunca esqueça, Dumbledore, que somos exatamente os mesmos, iguais, como gêmeos idênticos – e passando a língua nos lábios uma última vez, completou. ― Esse sangue... ― e notou o tom vermelho do sangue "real" dela. ― Meu sangue, nosso sangue.
Enquanto a figura alourada distanciava-se para o dormitório masculino, Ametista permaneceu sentada naquele mesmo sofá, as palavras assustadoras de Malfoy ecoando num tortuoso vai-e-vem. Como se estivesse em transe, juntou todas as suas coisas e saiu em disparada, para longe, qualquer fosse o lugar, seguindo o plano que torturou sua mente desde o início daquela manhã.
Enquanto caminhava pelo corredor, a fraca luz do pôr-do-sol invadia as colunas e provocava zonas de claridade e sombra. Os jovens, especialmente as crianças do primeiro ano, corriam e se agitavam naquele final de segunda-feira. Hermione sabia que estava levemente atrasada, mas prosseguia sem pressa, admirando aquela bonita tarde de primavera. Do dormitório que ficara confinada na sexta, passou para o próprio dormitório, deixando-o apenas nas refeições. Tanta coisa passava pela sua mente, era difícil controlar. Sabia que possuía uma intensa missão agora, e necessitava manter esta missão em total segredo. A todo custo.
Aproximando-se da sala de Dumbledore, ditou a senha e respirou fundo, antes de adentrar. Mordendo o lábio inferior, tentando conter a ansiedade, tinha o conhecimento de que seria apresentada aos Cavaleiros. A herdeira de Helga Hufflepuff... Ainda era tudo tão surreal, tão imaginativo...
― Diga-nos onde ela está, Dumbledore!
Hermione paralisou na escadaria do gárgula, escondendo-se levemente na penumbra, tentando ouvir melhor. A voz tinha um tom de ordem, de exigência. O que poderia estar acontecendo?
― Não posso, já lhe disse, Senhor Hades ― respondeu a voz serena do diretor. ― Isto não está mais em minhas mãos.
― Talvez o domínio de Helderane não esteja mesmo, mas sei que tem a mulher humana, eu sei que tem! ― protestou de maneira tempestuosa. ― Onde está a mulher?
A monitora da Grifinória deslocou a cabeça levemente, na esperança de observar o que acontecia. Dumbledore estava em pé, atrás de sua mesa, com as mãos postadas sobre ela. À sua frente estavam Ares, Cronos e Hades, este último inclinado sobre a mesa, numa linguagem corporal bastante ameaçadora.
― Quantas vezes preciso repetir a você, Hades? Helderane foi embora! Ela deve estar procurando uma outra alma para apossar-se...
Hades tornou-se rapidamente para Ares, seu longo cabelo negro como a noite girando conforme seu corpo, os globos oculares esbranquiçados, dizendo:
― Minha senhora está brincando conosco, Ares, eu sei que está! ― e dizendo isto, bateu o punho direito sobre a mesa de Dumbledore, provocando uma rachadura. ― Colocarei um ponto final neste joguinho, e somente a humana pode ajudar-me.
― Senhor Hades, a senhorita Potter está em estado de transe a quatro dias, em coma profundo, não há manobra alguma que a faça despertar ― assegurou Alvo. ― Posso lhe garantir isso.
O Deus controlador do Inferno voltou-se para Dumbledore, a mão esquerda segurando a borda da mesa do diretor. Hermione observou as juntas dos dedos ficando brancas.
― Alvo, não esqueça que ainda não recebi minha oferenda, portanto... ― Hermione notou os outros dois Cavaleiros olharem fixamente para Hades, ao passo que o último subiu no tablado onde se localizava a mesa de Dumbledore. ― Não tente me persuadir, pois não conseguirá. A humana está detendo a minha oferenda...
Dumbledore ergueu o queixo e pareceu maior que Hades por um momento.
― Remo Lupin não é sua oferenda, Senhor Hades ― e fixou o olhar no do Deus. ― Aquela é uma fatalidade que ainda poderá ser evitada. A oferenda acompanhará o Senhor ao final de suas atividades em Hogwarts. Este foi o nosso combinado, e espero que cumpra sua palavra.
"Remo Lupin não é sua oferenda? O que ele quis dizer com isso?", pensou Hermione, tentando observar melhor o que acontecia. Dumbledore e Hades trocavam frases em um tom baixo demais para que ela pudesse escutar, então inclinou mais o corpo...
― Quem é você, garota?
Hermione imediatamente olhou para cima, não entendendo como aquele homem aproximou-se tão perto dela, tão repentinamente, e ela não tenha percebido. O Cavaleiro encarava-a de muito perto, os olhos vermelhos concentrados em sua figura, que ficou subitamente pequena e temerosa. Cronos tinha a feição dura e os cabelos caíam entre a jovem e ele, brancos como a neve.
― E-eu... ― e as palavras perderam-se na garganta de Hermione, tensa até o dedão do pé, paralisada. ― E-eu...
― Cronos, esta é Hermione Granger ― de tão envolvida pelo temor daquele Cavaleiro, Hermione não ouviu direito o tom alarmante de Dumbledore. ― Pode deixá-la. Esta é a garota que vocês vêm tentando despertar.
Erguendo o rosto na luz, Cronos deu passagem a Hermione, que caminhou lentamente até o centro da sala. Tremendo, profundamente desconfortável, parou diante da mesa de Dumbledore. "Droga, ele sabe que estive ouvindo!", repreendeu-se em pensamento.
― Esta é a herdeira de Hufflepuff? ― questionou Hades, em tom de descrença. ― Uma filha de trouxas...?
― E a nossa melhor aluna ― completou Dumbledore, descendo do tablado e ignorando a tensão de poucos momentos atrás. ― Hermione é nosso maior segredo, quero que entendam... Voldemort não imagina que Helga tenha deixado uma filha de trouxas como descendente...
― Quem na sua família é bruxo, senhorita? ― perguntou Ares, ainda sem jeito pelos modos de Hades para com Dumbledore e a jovem.
Hermione, ainda trêmula, tentou buscar na memória, mas sempre soube que não havia bruxos próximos a seus pais ou tios.
― Não sei dizer... Nunca soube de nenhum bruxo na minha família até receber a carta de Hogwarts... ― esclareceu, as bochechas ficando quentes.
Os Cavaleiros fizeram mais algumas questões a ela, e Dumbledore assegurou que a garota era mesmo a herdeira. Porém, os Deuses queriam uma prova. Assim, Dumbledore permitiu que eles testassem-na. Hermione não gostou da idéia, ficou imediatamente tensa, olhando para o diretor como se pedisse ajuda. Dumbledore passou um sorriso com os lábios fechados, e a monitora tentou manter-se calma. Após alguns minutos, Hades aproximou-se e pediu que a jovem o tocasse. Ainda duvidosa, Hermione o tocou levemente, a mão direita dele. E a visão foi aterrorizante.
Ametista não sabia dizer ao certo como foram suas últimas 24 horas. Tocando a comida em seu prato, o garfo fazendo um barulho insistente, seus pensamentos estavam tão afastados da mesa da Sonserina que o jantar não tinha a menor graça. A segunda-feira tinha sido surpreendente, no mínimo, especialmente pelo teor da última discussão com Malfoy. A terça passou como um grande borrão, as aulas sem nenhum conteúdo que chamasse sua atenção para qualquer coisa além seus atuais problemas.
Colocando o cotovelo esquerdo sobre a mesa, o garfo em sua mão direita ainda brincando com a comida, suspirou e dirigiu seu olhar para o lado direito. Draco estava em uma empolgada conversa com o time de quadribol da Casa, como se nada tivesse acontecido. Seria somente ela a se sentir mal, realmente mal, ao redor dele? O estômago embrulhava, a respiração ficava difícil de ser controlada... "Meu sangue, nosso sangue", repetia em sua cabeça, sem parar, como um tique-taque de relógio. Malfoy conseguira deixá-la muito mais perturbada do que imaginara.
Não sabia dizer ao certo, mas desde que trocaram olhares tão intensos na sala comunal da Sonserina, Ametista tinha certeza de que algo estava prestes a acontecer. Malfoy devia estar planejando alguma coisa. Nunca defendera a família daquela maneira, nunca se incomodara tanto com a atitude dela para com Voldemort, ou ainda, nunca notara tal tom obstinado dele antes. Era uma sensação estranha que continuava a incomodá-la, mas sabia que Malfoy estava prestes a dar o bote. Um bote daqueles.
Perdida em pensamentos, o momento em que Draco desviou o olhar do time de quadribol e fitou seus olhos azuis fugiu rápido demais e não percebeu. Quando se deu conta, ele já tinha desviado o olhar novamente. Não tinham mais dirigido à palavra ao outro desde a discussão na Sonserina, e ela sabia o porquê. Ele estava com medo. Malfoy entendera que Ametista tinha captado alguma coisa de muito errada. E, como a relação deles nunca fora das melhores, era melhor que ficasse bem longe da astuta jovem.
"E saber que terei de roubar poções de Severo para a Figg com ele logo mais... Eu tenho que descobrir o que há de errado com o idiota", pensou consigo, deixando a visão de Malfoy de lado e dirigindo o olhar para a mesa da Grifinória.
Rony e Gina tinham voltado poucas horas atrás para Hogwarts. Rony era o mais abatido. Hermione tinha os braços ao redor do namorado, carinhosamente, enquanto os quatro conversavam baixinho. Gina tinha olheiras fundas e parecia sorrir para Harry com fraqueza. Imaginou como deveria estar sendo difícil, ainda mais sem poder enterrar o irmão de uma vez por todas. Perder pessoas que se ama... Harry inclinou-se e sorriu plenamente para Gina. A jovem retribuiu e ajeitou o cabelo comprido. O monitor retirou uma mecha de sua bochecha e Gina corou, a expressão exausta. Harry tomou a mão direita de Gina e sorriu uma outra vez. Ametista pensou que ia enlouquecer. O olhar de Harry deixou o de Gina e procurou o dela na mesa da Sonserina.
Assim que encontrou seus olhos, Ametista sentiu que ia afogar-se, sua respiração paralisada na garganta, uma saudade forte batendo em seu coração. Encarando-a seriamente, Harry puxou a mão de Gina e beijou-a levemente, colocando-a de volta na mesa, os olhos fixamente nos de Ametista. Não suportando aquela cena ridícula, ergueu-se da mesa, deixando a comida intocável, e saiu em passos rápidos do Salão Principal.
Próxima de alcançar a escada que a levaria para a Torre da Sonserina, sentiu uma mão agarrar seu braço e puxá-la para trás, na sombra das escadas. A pessoa empurrou-a contra a parede escura e a observou debater-se.
― Por que você está fazendo isso! Me solte! ― gritou, puxando seu braço e tentando se desvencilhar, mas a pessoa era bem mais forte que ela.
― Por que eu estou fazendo isso! Você quer me fazer o favor de explicar o que 'tá acontecendo! ― respondeu, a voz de Harry alta e nervosa.
Parando de se debater, Ametista encostou finalmente na parede e soltou a respiração, encarando Harry finalmente. Os olhos dele brilharam na penumbra.
― Quem estava fazendo ceninha patética, beijando mãozinha de outra garota não era eu! Então, acho que quem tem o que explicar aqui é você! ― retrucou a jovem, apoiando as mãos contra a parede.
Harry ergueu as sobrancelhas, atônito.
― Você some da minha vida por quatro dias, não quer saber de falar comigo, não me deixa saber o que 'tá acontecendo e me evita o máximo possível! Eu tenho corrido atrás de você desde quinta! De que adiantou você me deixar ficar com você na Sonserina se, no dia seguinte, você passou a me evitar como se eu tivesse o demônio no corpo! ― argumentou, o volume da voz alto.
― Eu te disse que precisava pensar, Harry...!
― Pensar em quê! Pensar em quê para você ficar longe de mim! O que você tem pensado que eu não posso saber!
― Você é mais esperto que isso, Harry, pelo amor de Merlin! ― replicou Ametista, a face ficando vermelha. ― É óbvio que tenho pensado em nós! ― Harry franziu ainda mais a testa, cerrando os olhos, não entendendo. ― Será que você não percebeu que, recentemente, o destino anda conspirando contra a gente! E eu quero descobrir o porquê! Preciso entender por que as pessoas estão com essa mania estúpida de querer nos ver separados...!
― Eu conversei com o Sirius ontem, Ametista, e ele me explicou... ― tentou interromper Harry, desacreditado, mas a jovem não permitiu.
― Eu sei o porquê deles falarem aquilo para mim, Harry! Não preciso de você para me dizer! Eles têm medo do que possa acontecer conosco, nós damos chance a Voldemort se bobearmos, e eu entendo isso! ― esclareceu a sonserina, os fios do cabelo ondulado caindo sobre seus olhos. ― O que eu não entendo é por que agora! E por que todos estão se metendo numa coisa nossa! Por que eu tenho que agüentar o Malfoy o tempo todo metendo o nariz onde não deve, me dizendo quem e o que eu devo ser...!
― Malfoy! O que o Malfoy tem a ver com tudo isto! ― surpreendeu-se Harry, um click em sua cabeça.
― Se você não sabe, não serei eu a te dizer! ― e ela abriu os braços e bateu-se contra o quadril. ― Diga-me, então, o que a dona Gina Weasley tem a ver!
Harry balançou a cabeça, erguendo as mãos como se pedisse que Ametista fosse com mais calma.
― Gina! Meu Deus, Ametista, pare com essa loucura! Desde quando Draco Malfoy e Gina Weasley têm a ver conosco!
― Sinceramente, Harry? ― questionou ela, os olhos arregalados em lógica. ― Eles têm tudo a ver! Aquela fuinha repugnante que pertence a minha Casa diz coisas que, se você analisar direito, têm um fundo de verdade tão assustador que eu penso duas vezes antes de me aproximar de outras pessoas!
― Você pensa duas vezes antes de se aproximar de mim por causa do Malfoy!
― Não! Aqui é que está a situação! Você era a única pessoa que eu não tinha medo nenhum! Nenhum!
― Então por que...?
― Por que eu estou agora! – completou Ametista, falando tudo muito rápido e parando por um momento para pegar fôlego. ― Eu não sei! Por que você não tenta me explicar por que teve um súbito interesse na Gina!
Harry abriu a boca e fechou por várias vezes, sem sair som algum. Ametista cruzou os braços.
― Percebe? Será que agora você se dá conta como as coisas estão fora do lugar conosco atualmente? ― e foi como se Harry visse tudo muito nebuloso ainda. ― O que eu sei é que preciso pensar... Não estou pedindo um tempo ou qualquer coisa parecida... Mas eu preciso colocar tudo no meu controle, preciso entender, preciso fugir dessa perseguição maldita do Voldemort, e acho que será difícil para você entender, como tem sido agora, nesse momento...
― Você está tentando me dizer que eu não tenho nada a ver com tudo isso? ― Harry chegou ao ápice da confusão.
― Você tem tudo a ver com tudo isso, Harry! Onde você esteve nos últimos dois minutos! ― Ametista puxou o rosto de Harry na direção do dela. ― Eu preciso que você entenda! Enquanto eu procuro assimilar o que está acontecendo comigo e conosco e a todos a nossa volta, eu preciso que você vá resolver seus problemas também! Não vou admitir que você esteja comigo enquanto pensa em fazer sei-lá-o-que com a Weasley!
― Eu não estou pensando! Não quero nada com a Gina! ― protestou Harry, desvencilhando das mãos de Ametista. ― O problema aqui é você e esses assuntos mal resolvidos com teu pai, teu avó, Voldemort e essa atração repentina pelo Malfoy...!
― ATRAÇÃO PELO MALFOY! ― exaltou-se Ametista, sabendo que ele era a pessoa mais nojenta que já passara pela sua vida. ― COMO VOCÊ PODE DIZER ISSO! EU ODEIO ELE!
― VOCÊ TAMBÉM ACHAVA QUE ME ODIAVA, NÃO É MESMO! ― gritou Harry em resposta. ― Quer saber! FAÇA O QUE QUISER, EU TÔ ME LIXANDO!
E Harry saiu batendo os pés, deixando Ametista perplexa para trás. A jovem ficou por alguns minutos, paralisada contra aquela parede, sem entender o que acabara de acontecer. Harry tinha entendido que tudo aquilo era por causa de Malfoy! Ele tinha mesmo achado aquilo!
Colocando o rosto em suas mãos, respirando fundo, imaginou o que aquela discussão tinha significado. Já tivera discussões anteriores com Harry, mas nunca imaginou que ele duvidasse de sua fidelidade por ele. Como ele achou isso! Enquanto apoiava a cabeça para trás e temia um surto de choro, tentou controlar a expiração e inspiração. Os minutos passavam-se, e ela ainda não conseguia assimilar o que acontecera. Como ele achou isso!
Atrás de uma das escadarias estava alguém, deliciando-se com a cena. Tudo está saindo como o esperado.
A porta da sala de Ártemis estava fechada. Ametista tentou a maçaneta mais uma vez, inutilmente. Suspirando, exausta, a cabeça a milhões de quilômetros dali, ouviu um hem, hem logo atrás, ao passo que encostou a cabeça na porta trancada. Virando as costas, encontrou a figura de Malfoy apoiada na parede adiante, ao lado de uma estátua de um cavaleiro medieval.
― Já tentei, acredite. Acho que a megera não vai cumprir o acordo. ― disse ele, a voz seca, enquanto analisava as unhas das mãos.
Ametista sequer deu o trabalho de responder. Deu de ombros e se sentou no chão do corredor, as pernas esticadas e cruzadas uma sobre a outra. O olhar distante pedia ― clamava ― por uma luz. Alguém deveria dar-lhe um sinal de que as perguntas de sua mente seriam respondidas logo. Sentada naquele piso gelado, ainda tentava entender como Harry tinha absorvido a conversa de maneira totalmente contrária a que ela quis dizer. Agradeceu por Malfoy manter a boca fechada naqueles minutos em que esperavam Ártemis. A última coisa que necessitava eram mais palavras confusas daquele traste. Como Harry pôde acreditar que ele sentira algo por Draco? "Você também achava que me odiava, não é mesmo!", gritou a voz do namorado em suas entranhas. "Droga Harry! Eu queria te odiar, é diferente! Eu queria, porque já sabia que te desejava! Mais que droga!", repetia a si mesma, querendo se convencer de que toda aquela discussão tinha sido um lapso de memória seu.
Divagando em seus próprios pensamentos, não notou quando uma coruja veio em sua direção, num vôo rasante, largando um pedaço de pergaminho em seu colo, juntamente de uma pequena sacola, ligeiramente pesada. Somente no momento em que o objeto tomou contato com sua pele é que Ametista o percebeu. Olhando para Draco de baixo, notou que o bruxo parecia tão distante quanto ela. Então, abriu o pergaminho, sozinha.
Srs. Malfoy e Dumbledore,
Dentro da sacola há dois frascos com poções de invisibilidade. Quero que tomem e esperem o efeito de dez minutos. Vocês poderão continuar vendo um ao outro, enquanto, de fora, ninguém poderá vê-los. Mas não dêem chance ao destino! Tomem cuidado! Então, dirijam-se à sala de Poções e roubem do armário especial de Snape as poções Avaritia, Ira, Luxuries, Pigritia, Invidia, Ingluvies e Superbia. Depois, deixem as poções na boca da estátua do cavaleiro à frente da minha sala. Quero as poções até às nove horas.
Ártemis Figg
Lendo o papel e notando o prazo da professora, Ametista ergueu-se do chão. "Isso será rápido, bem rápido", disse para si, enquanto caminhava até Malfoy.
― Temos até às nove para trazer as sete poções. ― avisou, oferecendo o pergaminho a Malfoy.
O sonserino leu com rapidez o bilhete e Ametista notou como franziu a testa ao ler as poções, uma por uma.
― O que ela quer com poções como esta? ― questionou, ainda encarando o papel em suas mãos.
― Não tenho idéia, só sei que quero terminar logo isso, Malfoy, por favor ― ela deu-lhe um dos frascos de dentro da sacola. ― Temos dez minutos para esperar o efeito, então tomamos logo e vamos para as masmorras. Chegaremos lá na hora. ― Ametista logo abriu o frasco e observou por um momento.
Draco nada respondeu, apenas fez o mesmo que ela, observando o líquido. Era de uma coloração rósea, quase avermelhada. Ametista nunca tinha ouvido falar de poções de invisibilidade, e imaginou que, caso Ártemis possuísse esta, por que não poderia possuir as outras?
Sem pensar muito, colocou o frasco nos lábios e inclinou-o para fazer com que o líquido descesse sua garganta. O gosto assemelhava-se com morangos e mel, bastante agradável. Uma ligeira queimação dentro de seu peito, e então mais nada. Passando a língua nos lábios, viu Malfoy fazer o mesmo.
― Ao menos não tinha o gosto daquela Poção Polissuco... Horrível... ― murmurou o jovem, sacudindo a cabeça como que para assimilar melhor o sabor. ― Vamos?
Ambos iniciaram a caminhada, um ao lado do outro, em busca das masmorras. Os corredores estavam vazios e escuros, os estudantes já deixando rapidamente para correram às suas Torres. Ninguém gostaria de topar com Filch durante a noite. A sala de Snape sempre estivera ocupada por ele, mas se Ártemis mandou-os ir naquela noite, então ele deveria estar fora. A menos que...
― Você não acha estranho demais tudo isso? ― questionou baixinho para Malfoy, ambos andando em passos rápidos e cautelosos.
― Sem dúvida, mas a Figg nunca bateu muito bem, vamos combinar... ― respondeu, o tom de desdém na voz. ― E mesmo que isso seja uma armadilha, nós temos o bilhete para comprovar ― e ele retirou o bilhete do bolso, apontando para a assinatura de Ártemis. ― Isso diz tudo.
Ametista olhou duvidosa para Draco, pensando com calma. Ártemis não era do tipo de deixar-se pegar. Nunca ela daria uma bola fora, nunca permitira que alguém soubesse de suas atividades, no mínimo estranhas, dentro e fora dos limites de Hogwarts.
Após mais alguns minutos, Ametista começou a sentir um pouco de calor. Não sabia se eram os passos muito rápidos, ou a noite, que realmente estava amena, um tempo agradável. A primavera começara há poucos dias, e era uma das estações favoritas da maioria dos alunos. Agitando levemente o casaco da Sonserina, Ametista notou que Draco também estava suando. Então, a poção deveria estar fazendo efeito.
Quando chegaram ao corredor da sala de Snape, Draco checou em seu relógio. Ainda não tinha feito os dez minutos. Dois minutos restantes, e poderiam fazer logo o que Figg pedira. Ametista aproximou-se ligeiramente da sala, sem muita paciência para esperar. A luz estava acesa. Voltou para Draco.
― Severo ainda está lá dentro! Como que a Figg coloca a gente numa roubada dessas! Se ele perceber nós dois por aqui, esquece, quanto mais na sala dele! ― mostrou-se indignada a jovem, ajeitando o casaco, o calor aumentando.
― Mas foi exatamente por isso que ela nos deu uma poção de invisibilidade, Dumbledore... ― respondeu Malfoy, não ligando para a tensão da morena.
― A louca mesmo disse nesse pergaminho que deveríamos tomar cuidado...! ― e Ametista calou-se rapidamente, pensando em alguma coisa. Malfoy sequer notou o silêncio de Dumbledore. ― Você acha mesmo que aquela era uma poção de invisibilidade? ― questionou, subitamente.
Draco paralisou e lançou um olhar instigante a Ametista.
― Agora você pensa nisso, inteligência! ― ralhou o loiro, aborrecido. ― Por favor, Dumbledore, fique com a boca fechada...
― Nós temos de testar, Malfoy! Eu não vou entrar lá sem saber que estou mesmo invisível! ― protestou a sonserina, cruzando os braços.
Malfoy bufou, sem a mínima paciência para a paranóia da jovem.
― Ok, esquizofrênica, vamos acabar com isso logo ― submeteu-se Draco, exausto. ― Mas você tem que me prometer que ficará de bico calado depois...
― Que seja, imbecil! Como que você vai testar a poção!
Draco explicou a Ametista que, sendo monitor da Sonserina, poderia transitar por aqueles corredores àquela hora. Portanto, iria passar lentamente pela sala de Snape e dizer algo, certamente o professor não se incomodaria. Assim, tomou a dianteira, sabendo que os dois minutos restantes já haviam passado, e caminhou em direção à sala de Snape.
Primeiramente, Malfoy passou em passo normal. Nada. Depois, Malfoy passou bem mais devagar. Ainda nada. E, finalmente, o monitor paralisou a frente da sala, e encostou-se ao batente. Snape sequer moveu-se. Draco olhou para Ametista, a jovem dando o braço a torcer. Quando ela começou a caminhar na direção de Malfoy, prontos para invadir a sala de Poções, Snape ergueu-se da mesa e dirigiu-se a porta. Malfoy arregalou os olhos e chamou Ametista.
A jovem apertou o passo, sabendo que Snape trancaria a porta. Assim que o mestre aproximou-se da passagem, Draco puxou Ametista e ambos jogaram-se para dentro da sala, tomando o cuidado de não encostar-se ao mestre ou ainda provocar qualquer tipo de ruído. Postando-se ao lado de um sofá, ambos deram as mãos e ficaram silenciosos, segurando suas respirações. Já dentro do escritório, iluminado por algumas velas flutuantes e a lareira, Malfoy e Ametista viram Snape passar um fecho na porta, despreocupado, e retirar-se, atravessando uma ligeira passagem na parede ao lado da lareira. Aquele deveria ser o dormitório do mestre.
Soltando as respirações, Ametista notou certo desconforto entre eles, as mãos unidas em maneira protecionista. Rapidamente, largou as mãos geladas de Draco e caminhou pela sala calmamente. O sonserino pigarreou, disfarçando o mal estar entre ambos. Ao canto esquerdo e escuro da sala mal iluminada, situaram o armário particular de poções de Snape.
― Merlin, esta foi por pouco... ― sibilou Malfoy, o coração disparado, sem saber ao certo o motivo. ― Se eu não tivesse percebido o que ele faria...
― Oh, por favor, Malfoy! Menos! ― sussurrou Ametista de volta, o coração disparado da mesma maneira. ― Agora só precisamos encontrar as poções...
Ametista abriu com cautela o pequenino armário, de pouco mais de um metro de altura e largura. Inúmeras poções estavam enfileiradas, todas com rótulos informando a natureza de todas elas. Os olhos de Ametista começaram a correr rapidamente pelos frascos, querendo dar um ponto final em toda a conspiração de Ártemis.
Draco parou ao seu lado, puxando o pergaminho do bolso, dizendo:
― A primeira da lista é a Avaritia.
A jovem iniciou a procura, sabendo que as poções não estavam organizadas por ordem alfabética, pensando como que Snape não perceberia o roubo no dia seguinte. "Merlin, isso não é nada certo, me ajude".
― Para quê serve isso? ― questionou o garota, em tom baixo, enquanto parecia encontrar o frasquinho delicado de coloração alaranjada.
― Possivelmente para despertar a avareza em alguém ― quando Ametista encarou Draco, perguntando-se como ele sabia daquilo, o jovem logo respondeu. ― Mal em latim, Dumbledore? Avaritia quer dizer cobiça, avareza.
Ametista guardou para si o comentário seguinte. Tinha um pouco de temor em pensar o que Ártemis faria com aquele tipo de poção. Afinal, de tudo um pouco se esperava daquela mulher tão misteriosa. Somente a idéia do acordo feito entre ela e Malfoy já provocara uma intensa dúvida e suspeita, quanto mais com poções como aquelas.
E assim seguiram as poções. Ira, de coloração avermelhada; Luxuries, azulada; Pigritia, amarelada; Invidia, negra...
― A próxima? ― perguntou Ametista, tornando-se levemente para trás, esperando a resposta de Malfoy.
O jovem sonserino estava suando bastante, ela reparou. Logicamente, aquela sala não colaborava em nada. As velas flutuavam logo acima de suas cabeças, assim como a lareira crepitando sem parar, quente e bem acesa. As gostas de suor escorriam pelo rosto do loiro, fazendo com que mechas de sua franja grudassem na lateral de sua face. O pescoço estava vermelho, e seus olhos não encontravam os de Ametista, concentrados no pergaminho de Ártemis.
― Ingluvies. A gula. ― respondeu, respirando fundo logo em seguida.
Ametista achou rapidamente o frasco, a cabeça ainda no estado de Draco. E então, tornou-se para ele e chamou sua atenção. Draco ergueu os olhos e encontrou os de Ametista, o suor escorrendo pelo seu nariz também.
― Malfoy, você está bem? ― questionou a jovem, impressionada.
― Estou, estou... ― retrucou velozmente.
― Acho melhor você tirar seu casaco, parece que está suando bastante. ― e ela pegou na barra do casaco do sonserino, puxando-o para cima.
Draco levantou os braços, enquanto Ametista puxava o casaco. No instante em que ele passou pelo rosto molhado de Malfoy, Ametista notou que toda a camisa branca da Sonserina estava grudada no corpo do rapaz. Quase assustada com tanto suor, dirigiu o olhar para cima e encontrou o jovem paralisado, suando, e encarando-a sem hesitar. Uma súbita corrente de calor passou pelo seu corpo, assim que achou os olhos cinzentos e sem emoção do companheiro de Casa.
E foi como uma rajada, pois Ametista não soube de onde veio, mas repentinamente, ela estava suando tanto quanto Draco. Sentiu sua roupa colada no corpo, a saia flutuando sobre sua pele, colando em suas pernas úmidas. Era como se todos os poros de seu corpo estivessem abertos e resolvessem liberar as toxinas de toda sua existência. A camisa branca também estava colada sobre seu tórax e costas, e ela teve de tirar o casaco da mesma maneira, sentindo-se abruptamente em um forno. Retirando o casaco pela cabeça, passou-o sobre o rosto e notou como o tecido ficou úmido somente de secar seu rosto.
Também esperou que estivesse exalando algum cheiro estranho, característico do suor. Porém, tanto ela quanto Draco exalavam um perfume bastante aprazível, uma mistura de morangos e mel, exatamente como a poção de invisibilidade que tomaram há pouco. A jovem abanou-se por um momento, e Malfoy continuou encarando-a quase que hipnotizado. Ela paralisou, notando mais uma vez como o pescoço do sonserino estava avermelhado, ainda que o rosto estivesse muito levemente rosado, para o pálido Malfoy.
― Ah... Hum... Ah... ― ela pensou em algo para dizer, tentando desvencilhar-se de uma situação tão estranha e desconfortável quanto aquela, sentindo as gotas de suor escorrer pelas suas costas e irem direto de encontro com a barra da saia. ― Qua-qual a última? ― indagou, finalmente, ainda que gaguejando.
Ouvi-la falar com ele foi como se o tirassem de um transe profundo, concentrado em absolutamente nada além da imagem de Ametista suando tanto quanto ele naquele pequeno escritório. O jovem soltou a respiração e puxou o bilhete, úmido então, dentro seus dedos, e observou a poção restante.
― Superbia... O orgulho.
A jovem voltou-se para a estante, procurando com os dedos o último frasco, pensando no que poderia estar provocando aquela transpiração em ambos. O que será que Ártemis colocara naquela maldita poção? O frasquinho de coloração esverdeada estava na última prateleira do armário, no canto. Ametista ficou na ponta dos pés para alcançar o frasco. Enquanto tocava o frasco, tentou raciocinar. Ártemis estava pedindo poções correspondentes aos poderes dos sete pecados capitais. Avareza, Ira, Luxúria, Preguiça, Inveja, Gula e Orgulho. Que diabos ela poderia querer fazer com tudo aquilo?
Com o último frasco nas mãos, Draco abriu o próprio casaco, ainda tomado pelo seu suor perfumado, e colocou todas as poções juntas, fazendo uma trouxinha. Fechando a porta do armário com cuidado, Ametista tornou-se para ele e ambos checaram tudo antes de deixarem o escritório de Snape em total silêncio.
A volta para a sala de Ártemis foi ainda mais estranha. Draco e Ametista enfiados em seus próprios pensamentos, contrariando o costumeiro jogo de discussões entre eles. Os corredores estavam escuros, mas ainda era possível observar o caminho, algumas frestas permitiam que o luar iluminasse partes do piso. Ametista ainda sentia o suor escorrer pelas suas costas, assim como as pernas úmidas, roçando uma na outra durante o andar. Draco também procurava entender o que poderia estar acontecendo, o corpo mergulhado em transpiração que cheirava a morangos e mel.
Assim que chegaram à sala, notaram que esta também estava trancada. Ártemis ainda não havia voltado. Bufando, querendo fugir dali, sem saber o motivo, Ametista olhou para Draco, enquanto emparelhava-se à estátua do cavaleiro. Deveriam colocar os frascos das poções dentro da boca do cavaleiro. O sonserino estava tentando abrir a trouxa de seu casaco com todo cuidado, para que nada acontecesse com as poções.
Ametista estendeu a mão e pediu os frascos para Malfoy. Subindo sobre os pés da estátua, a jovem ficou pendurada à altura dos olhos da estátua, abrindo a máscara que protegia a boca do cavaleiro. Pôde ver que havia um compartimento almofadado ali, próprio para esconder objetos frágeis. Draco parou ao seu lado, carregando o primeiro frasco entre os dedos. O rosto dele estava na penumbra, apenas a luz da lua iluminando fracamente o corredor.
Logo após depositar todas as poções de maneira correta dentro da boca do cavaleiro, Ametista notou que suas mãos estavam extremamente suadas e não conseguiam mais segurá-la sobre a estatua, dando apoio. Então, desceu do pé alto do cavaleiro e ajeitou a roupa. Assim que passou os dedos pela sua fronte, as mãos encheram-se ainda mais de suor, sem explicação alguma. Ela continuava a suar, e Draco também. Erguendo os olhos para encontrar o rosto do jovem, podia perceber o pescoço do sonserino ainda bem vermelho.
E então, aproximou-se do companheiro de sua Casa e guiou suas mãos para a gravata verde e prata da Sonserina. Malfoy paralisou todos os músculos de seu corpo, e Ametista não deixou de sentir certo estranhamento. Harry costumava ficar daquele jeito, quando ela o tocava. Era quase como um ritual para impedir que perdesse o controle. E lá estava a fuinha repugnante se segurando, por algum motivo ainda duvidoso a ela. Com seus pequeninos dedos, Ametista dedilhou até a ponta da gravata do sonserino e começou a retirá-la, aliviando a pressão no pescoço de Draco. Malfoy era mais alto que ela, portanto teve de se aproximar um pouco mais para fazer o trabalho direito.
Sua fronte estava a centímetros da de Draco quando conseguiu chegar à posição ideal para retirar a gravata do rapaz. Tocando levemente a pele exposta do pescoço dele, Ametista arrepiou-se de maneira surpreendente. Não entendeu o porquê do calafrio tão intenso, mas notou os pêlos do rosto dele levantarem. Ele também sentira o mesmo arrepio. O perfume de morangos e mel estava começando a irritá-la e a entorpecê-la, o trabalho de tirar a gravata da Sonserina cada vez mais difícil. Sua visão estava levemente turva, como se tudo estivesse pegando fogo naquele corredor frio e iluminado pela lua.
― Você parecia enforcado... ― ela murmurou, enquanto terminava de retirar o nó da gravata, ensopada em suor.
O hálito de Malfoy atingiu o topo de sua cabeça, agitando alguns fios de cabelo e refrescando levemente a testa suada. Ametista ergueu o olhar, ainda com a gravata entre os dedos, os braços erguidos no esforço de retirar a peça. Não soube de onde veio, mas um intenso tremer de suas pernas quase a derrubou. A boca dele estava semi-aberta, esperando que algumas palavras saíssem dali e deixassem que o silêncio não existisse mais.
A jovem apenas sentiu os dedos de Malfoy tocarem sua barriga envolvida pela camisa branca colada pelo suor. Não entendeu o porquê de ele estar tocando-a, especialmente onde o suor estava tão forte. Imaginou que os dedos dele ficassem tão molhados quanto os dela, tocando ainda sua gravata ao redor do pescoço, mas já solta. Os dedos transformaram-se em mãos e logo, Draco Malfoy estava tocando suas costas e envolvendo-a, puxando-a para mais perto de seu corpo. Uma nova corrente quente atingiu seu corpo, e era como se tudo continuasse a pegar fogo, agora de dentro para fora. A necessidade de sentir os dedos dele percorrerem sua pele foi forte, e Ametista sabia que aquele não era Harry. Como um desejo descomunal, irracional.
Soltando a gravata de seus dedos, deixando-a escorrer pelo corpo de Draco, Ametista tocou os ombros de Draco com sutileza. Estava lutando contra aquilo que Harry a acusara. Mas, sabia com plena certeza. Aquela não era ela. Alguma outra coisa estava provocando as sensações... Aquelas sensações... Ametista cravou as unhas nos ombros de Draco, sem entender o porquê, sentindo uma série de ondas quentes percorrerem sua espinha enquanto Draco tocava pouco a pouco a pele molhada protegida pela camisa. As mãos dele correram das costas para as laterais de seu tronco, abaixando levemente até encontrar a barra da saia. Ametista desceu as mãos dos ombros, passeando lentamente pelo tórax do jovem, o hálito dele ainda no topo de sua cabeça, os olhos dela cravados em seus lábios.
Os dedos de Draco deslizaram até a frente da camisa dela e puxaram-na para cima, desejando soltá-la da barra da saia. Ametista voltou a subir suas mãos, as unhas raspando no tecido molhado da camisa, encontrando a pele úmida do pescoço dele, notando como estava quente. Logo que sua camisa se perdeu da saia, as mãos de Draco subiram vagarosamente até encontrar a pele embevecida em suor. A barriga de Ametista tremeu completamente, como num espasmo, assim que as palmas tocaram-na. Os dedões de Draco estavam contorcidos sobre sua pele, e subiam na esperança de encontrar seu umbigo. Ametista soltou um gemido baixo, inesperado, e Draco perdeu o controle. Segurando com força o tórax da jovem, empurrou-a para si e abaixou sua cabeça, encontrando diretamente os lábios entreabertos dela, tão convidativos e necessitados.
As bocas acharam-se uma na outra, e uma onda de dependência formou-se entre eles, forte e irresistível. Ametista sentiu os lábios de Draco encostarem-se aos seus, atendendo seu pedido desesperado, mas notou o instante em que os dentes dele captaram seu lábio inferior do lado esquerdo com sutileza. Os dentes tomaram o lábio e morderam com rapidez, como um vampiro, procurando por sangue, experimentando os melhores pontos dos mais suculentos pescoços expostos. Não foi um movimento carinhoso, foi um ímpeto de desejo incontrolável. Ametista soube que Draco não a beijara simplesmente para sanar o que ocorria desde a sala de Snape, e sim porque não agüentava mais. O intuito era muito maior. Era poder tocá-la, poder vencer barreiras entre eles que sempre existiram... Os segundos em que os dentes dele seguravam seu lábio inferior com força, mas ainda gentileza e moleza, a suavidade do movimento corporal de um gato, a sensualidade implícita, parecia nunca mais acabar.
Então Draco largou seu lábio e passou a beijá-la com todas suas forças, puxando o corpo da jovem para cima, e unindo suas cinturas por alguns instantes, até que Ametista escorregasse novamente, o suor intenso. As línguas uniram-se rápidas, em movimentos ritmados e perfeitos, os hálitos quentes e o gosto do mel presente ali. A jovem cravou agora as unhas nos fios úmidos do couro cabelo de Draco e puxou-o para baixo, enquanto impulsionava o quadril na direção do dele, desejando o contato maior, sem pudor. Sem entender o que a levava àquilo, apenas mergulhava na sensação de ser correspondida da exata maneira. Draco dedilhava sua cintura, apertava, como se quisesse deixar marcas em sua pele daquela experiência surreal. A pele dela era tão macia, tão suave, tão quente e fria ao mesmo tempo, suada e entorpecida... E a respiração seca e impossível, disparada e abrupta, como se ela quisesse tirar o ar de seus próprios pulmões.
Deixou sua boca e percorreu o rosto, até encontrar o lóbulo de sua orelha e capturar-lhe com avidez, o nariz dela apontado para o céu, soltando sopros em seu pescoço, certamente marcado pelas unhas dela, incontroláveis. Correu os lábios pelo pescoço dela e voltou a concentrar-se no lóbulo da orelha, envolvendo-o entre os dentes e os lábios, beijando e puxando, descendo até o pescoço e o colo, fechado pela gravata, e percorrendo até chegar à outra orelha, repetindo o processo. Ametista gemeu outra vez e ronronou como uma gata, deliciando-se com as sensações que ele provocava.
Os lábios encontraram-se mais uma vez, os quadris chocando-se um contra o outro com a leveza que um lençol encontra o colchão, quase imperceptível. A língua dele roçou na dela, depois nos lábios, puxando um deles entre os dentes e voltando para dentro, dançando entre si, causando calafrios, arrepios, o subir e descer de correntes quentes e frias, o incêndio ainda tão forte que parecia impossível de ser apagado. E de alguma maneira, ela precisava de mais... E ele precisava de mais... E se beijavam sem pensar no amanhã, sem se importar se as roupas caíssem no chão e eles dessem cabo ao desejo ali mesmo... E o incêndio aumentava, assim como o desejo, o beijo, o envolvimento, as mãos se procurando, os suspiros, os gemidos, os gritos abafados... Não havia mais nada, era tudo um grande borrão de intensidade... E ela nunca pensou em se sentir daquela maneira, não com tanto fogo e tanto desejo, a ponto de esquecer que estava beijando Draco Malfoy, à frente da sala de Ártemis, depois do horário de todos estarem deitados... Ela queria estar deitada no quarto dele, com ele, sentindo-o tocá-la e beijá-la sem fim...
― QUE DIABOS ESTÁ ACONTECENDO AQUI!
Os lábios de Draco ignoraram o chamado histérico, enquanto aproveitavam-se do pescoço dela, tão delicioso e suculento, e então a orelha novamente, e quando procurou a boca tão maravilhosa, não a encontrou. Ametista estava paralisada. Tornando-se para trás, tentando enxergar aonde o olhar dela encontrava o de outra pessoa, Draco Malfoy viu Harry Potter.
Harry não soube como suas pernas ainda tinham força para levá-lo tão rapidamente de volta à Torre da Grifinória. Faltavam apenas alguns corredores, e elas iam velozes... Tão velozes que quase não agüentava. Pareciam que a qualquer momento, cederiam à exaustão. Não corria, somente deixava que suas pernas o levassem longe, distante até a eternidade daquela cena. Os braços acompanhavam o movimento das pernas, a veste da Casa ficando contorcida no corpo, enquanto o suor começava a descer pela sua testa até os lados do rosto. Estava tudo rápido demais, e ele precisava que fosse ainda mais veloz. Tudo, absolutamente tudo, para tirar aquela cena de sua cabeça.
A visão dos dois... Os braços de Ametista rodeando o pescoço de Malfoy, suas mãos entranhadas no cabelo loiro do sonserino. As mãos sujas dele tocando a pele do tórax dela, por baixo de sua blusa branca. As pernas de ambos procurando refúgio, entrelaçando uma a outra. Uma busca insaciável, interminável. Achou que seus olhos estavam queimando na hora que os bateu naquela cena. Ouviu-a soltar um suspiro, agarrar o corpo do sonserino com maior necessidade. Harry soube que aquilo não era uma miragem, uma enganação. Ametista realmente estava beijando Draco Malfoy. Suas suspeitas não eram, então, tão infundadas e absurdas quanto ela havia deixado claro apenas pela reação. A discussão de mais cedo, de pouco menos de duas horas, e isso...
"Como fui tão idiota! Ela estava mesmo enrolada com o vagabundo! Durante todo esse tempo, por isso estava tão estranha! Quer ver que aquela noite que passamos na Sonserina só serviu para mostrar o quanto ela escolhera errado, ou o quanto eu fui um completo imbecil...", pensou consigo, as pernas dando sensação de que voava. Harry estava totalmente sem rumo consciente, era como se seus membros inferiores tivessem criado vida própria, involuntários às suas vontades, levando-o para longe.
Logo depois que gritou, completamente atônito com aquela demonstração de puro desejo, Draco e Ametista deixaram de se beijar, e ambos encontraram-no ali, paralisado, descrente. Malfoy parecia quase que hipnotizado, sem parecer ter idéia da gravidade em ser pego. Ametista, por outro lado, parecia bastante confiante, pois assim que o percebeu ali, soltou-se dos braços de Malfoy e prosseguiu encarando Harry com inteira surpresa. "Era como se ela não tivesse consciência do que fizera, como se não tivesse sido ela", recordou, os passos cada vez mais velozes e mais próximos da Torre.
"Estou quase lá, estou quase lá", desejou, notando as familiaridades do lugar, dos corredores escuros naquele horário. Faltava muito pouco mesmo, dois corredores, duas curvas e então...
― Harry?
Como se tivesse tomado um choque, ou ido de encontro direto a um muro, Harry congelou onde estava, pouco antes da penúltima curva até a Torre, ouvindo a voz chamar por seu nome. Parado ali, tornou-se lentamente para trás e sentiu as pernas realmente doloridas e cansadas por toda a quase correria. A imagem de uma confusa Gina Weasley se formou em seus olhos, sabendo somente naquele instante que estavam inundados por lágrimas. A ruiva, vestida ainda nos trajes da Grifinória assim como ele, aproximou-se com cautela, estendendo seus braços.
― Você está bem? ― indagou ela, a voz em tom baixo. ― Passou que nem um furacão por mim, parece transtornado ― disse Gina, colocando uma das mechas de seu cabelo atrás da orelha direita. ― Aconteceu alguma coisa?
Harry ficou parado, assistindo Gina aproximar-se, sem ter muita noção do que acontecia naquele momento. Era difícil dizer se algo tinha acontecido de fato, as coisas pareciam misturadas em sua cabeça agora, todas constituindo um grande borrão doloroso em sua mente, e uma martelada direto em seu peito. Não soube explicar se estava bem, se algo tinha acontecido, se estava na condição de andar até a Torre e trancar-se para sempre em seu dormitório. Ou ainda correr até a Torre da Sonserina e fazer questão de executar seu primeiro assassinato, com muito prazer, quebrando todos os ossos existentes no corpo de Draco Malfoy.
E aquelas malditas lágrimas ameaçavam cair agora.
― Harry... Você esteve chorando? ― questionou Gina, repentinamente muito perto dele. Os olhos da jovem estavam arregalados, ainda dolorosos pela morte do irmão. ― Fale para mim, o que houve!
"Eu odeio ele", lembrou da voz de Ametista, negando qualquer tipo de atração por Malfoy. Como poderia odiá-lo se estava agarrando-se a ele na frente da sala da Figg! Esteve sendo enganado durante todo aquele tempo, não era possível! Teria percebido! Na discussão, apenas criara um motivo para responder às insinuações ― verdadeiras ― de Ametista, em relação aos últimos ímpetos seus em relação à Gina.
A mesma Gina que estava tocando, naquele exato instante, seu rosto, delicadamente. As mãos dela eram quentes, os dedos longos e finos, totalmente diferentes dos pequeninos e cheios de Ametista. Os olhos castanhos continuavam arregalados sobre ele, as lágrimas agora prestes a deixar o globo ocular e escorrer pela sua pele.
― Harry! Pelo amor de Merlin! Diga alguma coisa, qualquer coisa! ― pediu Gina, um tom quase desesperado, tensa até a última raiz de seu cabelo. ― Por favor, diga! Faça alguma coisa!
"Não vou admitir que você esteja comigo enquanto pensa em fazer sei-lá-o-que com a Weasley!", ela disse a ele, quase duas horas antes daquele momento silencioso, em que as mãos de Gina tocavam seus ombros, tentando sacudi-lo ou provocar qualquer reação, mostrando que ele estava bem.
― Faça qualquer coisa! Me diga que está bem, por favor! ― gritou Gina, em um pedido alucinado. ― O que aconteceu!
Harry fez a única coisa que veio à cabeça. Vingar-se. Vingar-se das acusações, vingar-se das atitudes, vingar-se de ter penetrado em seu peito e dilacerado seu coração ao beijar a última pessoa que deveria beijar. Traí-lo com a pior pessoa existente naquela escola. "Eu preciso que você entenda! Enquanto eu procuro assimilar o que está acontecendo comigo e conosco e a todos a nossa volta, eu preciso que você vá resolver seus problemas também!", ela dissera. Então, por que não dar algo a ela pensar, exatamente como estou pensando agora? Harry abaixou a cabeça até a altura da de Gina e executou o mesmo movimento que vira a pouco, tocando seus lábios nos da jovem Weasley, dando o mínimo pensamento sobre as conseqüências daquele exato ato.
O grifinório não soube dizer o que Ametista sentira assim que encostara os lábios em alguém que não ele, mas sabia que, para ele, havia sido horrível. Não por Gina, ela era uma garota adorável, e o beijo realmente era bom, sem dúvida. Mas, a sensação de beijar alguém que não Ametista parecia consumi-lo por dentro. Finalmente, conseguiu erguer os braços e passá-los ao redor do corpo de Gina, enquanto ainda a beijava com cuidado, os lábios apenas unidos.
Inundado em seus devaneios, ainda que soubesse exatamente o que fazia, Harry não percebeu na hora o corpo de Gina contorcer-se em confusão debaixo de seus braços. Os lábios dela estavam duros contra os seus, chocada demais para qualquer reação. Os braços dela esmagados entre eles, as mãos dela paralisadas sobre sua face, os dedos ficando mais quentes do que antes. Não é certo envolvê-la em seus problemas, Harry, ela já tem demais. Harry desejou calar sua mente, tentando tirar alguma sensação boa e gratificante, afinal, gostaria de saber o prazer de Ametista em traí-lo. Deveria ter algum!
Aos poucos, notou o corpo de Gina amolecendo em seus braços, e os lábios dela ficarem mais leves, mais suaves, como um verdadeiro beijo deveria ser. Um calor invadiu seu peito, mas não de uma maneira boa. As lágrimas que relutavam em cair de seus olhos deixaram o posto e derramaram-se pela sua face, atingindo lentamente os dedos de Gina, acariciando o rosto dele com carinho. Harry apertou o corpo dela contra o dele, enquanto sentia a urgência de chorar o mais forte que conseguia, deixar aquela dor extravasar. As bocas abriam com demora, desejando um contato maior, Gina passando ainda os dedos pelo rosto choroso de Harry, o peito do jovem doendo ainda mais, aquilo tudo o quebrando por dentro. Deveria ter algum sentimento bom beijar outra pessoa a não ser Ametista. Deveria...
― Você não queria!
Antes que as línguas pudessem tocar-se, Harry quebrou o beijo, afastando o corpo de Gina do seu com suavidade, e despertando de sua loucura momentânea. A figura de Ametista Dumbledore estava ofegante, mas paralisada, assistindo a cena exatamente como ele fizera anteriormente. O rosto de Ametista estava vermelho, a roupa toda amassada e fora de esquadro, a respiração agitada pela corrida até a Torre da Grifinória. Seu semblante parecia chocado e magoado, não revoltoso como o de Harry.
Gina ficou perplexa com aquela cena, dando-se conta somente naquele momento que havia beijado Harry Potter. E pior, o mesmo Harry que namorava Ametista, que sabia de suas aventuras junto de Draco Malfoy. Então, não desejando envolver-se naquilo, os dedos ainda molhados pelas lágrimas que escorriam pelo rosto de Harry, e os lábios amolecidos pelo contato tão surpreendente com sua paixão infantil, Gina deu as costas e correu. A última coisa que precisava era envolver-se no namoro de Harry e Ametista, ou qualquer outra dor de cabeça. E também, dentro de si, tinha a certeza de que nada iria acrescentar àquilo. O problema parecia anterior ao beijo deles.
― Você negou... Como pôde mentir para mim? Eu não acredito... ― disse Ametista, a voz embargada, enquanto ouvia os passos de Gina dirigirem-se para longe.
Harry pareceu sair de seu transe, uma esperada fúria unindo-se às imagens em sua mente, o coração quebrado.
― Eu neguei? Eu! E o que me diz de você! ― e ele apontou o dedo na direção do rosto de Ametista, a voz como a dela.
― Eu não queria beijá-lo! ― ela respondeu, a voz estridente. ― Eu vim correndo para cá porque sabia que você pensaria o que eu pensaria! Mas não era eu! Agora... Isso aqui...
O tom enojado de Ametista, misturado ao tom choroso de sua voz, o rosto molhado pelas lágrimas assim como o dele, provocaram o aumento de sua fúria.
― VOCÊ NÃO QUIS BEIJÁ-LO! VOCÊ ESTAVA SE AGARRANDO COM AQUELE VAGABUNDO! NO MEIO DO CORREDOR! ― protestou, a voz realmente alta, totalmente exaltado.
― FOI ALGUMA COISA QUE A FIGG ME DEU! FOI ISSO QUE EU VIM TE EXPLICAR, FOI PRA ISSO QUE EU CORRI DAQUELA TORRE PRA CÁ! A FIGG ME DEU ALGUMA COISA, PARECIA QUE EU TINHA QUE BEIJAR O...
― EU NÃO QUERO OUVIR, SUA MENTIROSA! VOCÊ MENTIU PRA MIM! VOCÊ SE AGARROU COM AQUELE FILHO DA PUTA! COM O MALFOY, AMETISTA! COM A PIOR ESPÉCIE DE GENTE QUE EXISTE EM HOGWARTS!
― SE EU BEIJEI O MALFOY NÃO FOI DE CASO PENSADO, COMO VOCÊ AGORA, SÓ PRA TER SUA VINGANÇA INFANTIL CONTRA MIM! NÃO ACREDITO QUE VOCÊ BEIJOU A WEASLEY, HARRY!
― VINGANÇA! VINGANÇA! PARA QUÊ VINGANÇA! VOCÊ MESMA DISSE ANTES, EU QUERIA TER BEIJADO ELA ANTES, LEMBRA! HÁ DUAS HORAS VOCÊ ME ACUSOU DISSO! ENTÃO, AQUI ESTÁ, AMETISTA, PROVEI QUE VOCÊ ESTAVA CERTA!
O rosto de Ametista desesperou-se, as lágrimas caindo em maior quantidade de seus olhos, as frases saindo com dificuldade misturada aos soluços de sua garganta. A jovem respirou fundo, a gravata de sua veste se desmontando, unindo-se ao amassado de sua camisa.
― Não faça isso, Harry, não faça... ― pediu Ametista, a voz abaixando, contra o rosto embevecido em fúria e as palavras exaltadas do jovem. ― Você tem que acreditar em mim... Eu... Não era eu, você tem que acreditar... É da minha fidelidade, Harry, eu sei que você só fez isso pra se vingar...
― QUE SE DANE A SUA FIDELIDADE, AMETISTA, VOCÊ JÁ DEU A PROVA DE QUE NÃO HÁ FIDELIDADE, VOCÊ ACABOU DE DAR! ― Harry tomou a respiração, soltando um soluço em meio ao choro. ― SABE O QUE EU ACHO? QUE, DURANTE TODO ESSE TEMPO, VOCÊ DESEJOU ESTAR COM AQUELE FILHO DE COMENSAL SUJO! E QUE, DIZENDO QUE FOI ALGUMA COISA QUE A FIGG PROVOCOU VAI DAR A CHANCE DE EU TE PERDOAR, MAS EU TE DIGO QUE ISSO NÃO VAI ACONTECER!
― Como você não pode acreditar em mim! ― questionou Ametista, o choro crescendo, o desespero tomando conta. ― Foi tudo um engano...!
― O ÚNICO ENGANO AQUI FOI EU TER ACREDITADO DURANTE TODO ESSE TEMPO EM VOCÊ! ― retrucou Harry, pronto para machucá-la o tanto que podia. ― SE TIVESSE TIDO A OPORTUNIDADE, VOCÊ TERIA ARRANCADO AS ROUPAS DELE LÁ MESMO, TER FEITO AQUILO QUE VOCÊ PARECIA DESEJAR FAZER COMIGO NO MEIO DO CORREDOR, PRA QUALQUER UM VER! VOCÊS ESTAVAM TÃO... TÃO ENLOUQUECIDOS UM PELO OUTRO QUE NEM PERCEBERAM EU CHEGAR! ASSUMA QUE VOCÊ PODERIA TER TRANSADO COM ELE LÁ MESMO, COMIGO ASSISTINDO! VAI, DIGA LOGO!
Harry estava inteiramente transtornado, alguém parecendo ter possuído seu corpo, os olhos vermelhos pelo choro, a voz estridente como a de um adolescente que mudava a voz, descontrolado. Ametista não podia acreditar em tudo aquilo. Primeiro, todo o processo de ter pegado as poções na sala de Snape até o encontro de Harry naquele corredor parecia uma mancha em sua mente. Tudo parecia ter sido realizado por outra pessoa, alguém corajoso o bastante de se deixar levar por uma força muito mais forte que ela. Os lábios ainda estavam doloridos, tamanha a força que levara em seus beijos com Malfoy. Mas, o enjôo e o nojo persistiam ali, atormentando-a. Não havia sido ela, definitivamente, mas como colocar aquilo na cabeça de Harry?
Mas, pior ainda, foi encontrá-lo fazendo a exata mesma coisa, só que tendo a total consciência de seus atos. Assistir beijá-lo Gina provocou um mal ainda maior do que ter a sensação de completar uma maratona insaciável de desejo e beijos com a pessoa mais asquerosa que conhecera. Harry beijara Gina para vingar-se, ela sabia. Tinha que ser...
― FOI ALGUMA COISA QUE A FIGG DEU PRA MIM, MALDIÇÃO HARRY, VOCÊ TEM QUE ACREDITAR!
― QUER UMA NOVIDADE PRA VOCÊ, AMETISTA? ― e Harry deu três passos até ela, ficando bastante próximo do rosto da jovem. ― EU NÃO ACREDITO EM NADA DO QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO, E SINCERAMENTE, NÃO PRETENDO ENGOLIR NUNCA! NUNCA!
― COMO QUE VOCÊ NÃO PODE ACREDITAR NA MINHA FIDELIDADE POR VOCÊ! COMO VOCÊ PODE ESQUECER! EU TE AMO, HARRY, VOCÊ SABE DISSO...!
― NÃO DIGA QUE ME AMA! ― e o monitor colocou as mãos nas orelhas, tentando proteger-se, numa atitude infantil. ― NÃO USE DISSO PRA ME VENCER, AMETISTA, É SUJO DEMAIS! NÃO DIGA QUE AMA! NUNCA MAIS! EM TODA A SUA VIDA, NÃO QUERO OUVIR ISSO DE SUA BOCA!
Ametista ficou boquiaberta, alguns instantes paralisada, sem saber o que dizer. Harry estava colocando à prova tudo que passaram juntos naqueles meses? Não podia ser... Simplesmente não podia ser...
― Que-quer di-dizer que você... Vo-você nu-nunca confiou no-no que eu se-senti p-por vo-você! ― e agora, a voz dela veio cheia de mágoa e incerteza, o choro firme.
Harry, que já tinha tirado as mãos do ouvido, olhou seriamente para Ametista, os olhos vermelhos e as lágrimas caindo e inundando seu rosto e pescoço. O silêncio pairou sobre eles, cruel e perverso. E então, ele se aproximou dela e ficou com o rosto bem próximo. Sua voz veio baixa e fria.
― Não acredito em você e nunca mais confiarei no quê diz.
Alguns instantes passaram até que as frases puderam ser assimiladas na cabeça de ambos. Instantes que pareceram uma eternidade, fria e sem sentido, sem emoção e verdades. Ametista, então, segurou sua respiração, o coração disparado, as lágrimas derramando sem parar em seu rosto. Não estava acreditando em tudo aquilo, não podia estar acontecendo... Mas, saber que era a mais pura realidade a ajudou no momento em que disse a última frase daquela noite, e a mais dolorosa de sua vida. Após ter ouvido a que mais a marcaria, diria a que se tornaria um divisor de águas em sua existência.
― Se você não acredita na minha palavra e não confia em mais nada que eu digo, acredite apenas nessas últimas que ouvirá da minha boca por um bom tempo, Harry ― e ela tomou a respiração, segurando-se para não vacilar. ― Estou saindo da sua vida, e quero que saia da minha. Para sempre. Está tudo acabado. Esqueça que eu existi um dia na sua vida, porque tenha certeza que vou esquecer você na minha.
E deu as costas, dando passos curtos e lentos de volta à sua Torre, deixando um perplexo e chocado Harry para trás. E provavelmente, para sempre.
Nota da Autora (3): Agora já foi...
