Capítulo 5 – Palavra de Dumbledore

Todos se voltaram para o irmão de Albus Dumbledore. Que Aberforth não era muito certo, não era mistério, mas às vezes ele ainda conseguia surpreender.

Kingsley Shacklebolt urgiu-o:

– Sim, e afinal, ela era bruxa mesmo?

– Isso mesmo. Devo esclarecer que eu só conheço a história porque meu irmão exagerou no hidromel, numa determinada noite no Hog's Head, onde eu era barman. Mas a história é triste e começa na família de Severus, muitos anos antes de ele nascer. Os avós de Severus, de uma tradicional família bruxa, tiveram duas filhas, Moreen e Eileen. Aterrorizada por seu pai, Moreen nunca apresentou qualquer habilidade mágica. Quando sua irmã mais nova Eileen demonstrou ter poderes, o pai abandonou Moreen num orfanato Muggle, dizendo que lá era o lugar de um Squib.

Ao ver o olhar de confusão em Helena, Kingsley esclareceu:

– Squib é o nome que se dá a alguém que nasceu numa família bruxa, mas não tem poderes.

– Que horror!... Ele abandonou a filha? E a mãe, também concordou com isso?

– Não – disse Aberforth tristemente –, ela amava muito Moreen, mas seu marido era um homem terrível, que disse que a garota tinha morrido. Conhecendo o marido, a mãe não se conformou e acabou encontrando a menina, anos mais tarde. Com a ajuda de amigos, eles conseguiram fazer com que um casal acolhesse Moreen. Pouco tempo depois, a mãe morreu e Moreen perdeu todo o contato com sua família biológica. Ela viveu sua vida, casou e teve filhos. Ela descobriu que na verdade tinha poderes, mas não os usou porque não sabia como, sem ter ninguém que a ensinasse. Então, muito tempo mais tarde, ela recebeu uma carta de Albus, dizendo que seu sobrinho (filho de sua irmã Eileen) estava em Hogwarts e precisava de sua ajuda. Portanto, ele iria visitá-la no Natal, se ela quisesse recebê-lo. Foi assim que Severus reencontrou sua tia.

– Severus? – Helena estava fascinada pela história, e não era a única. – Ele precisava de ajuda?

– Albus sabia que Severus estava sendo pressionado por seu avô a se juntar a Voldemort. O avô era um tirano e martirizou Severus durante toda a sua vida, por causa do casamento de sua mãe com Tobias Snape. Sabe, Tobias era Muggle e o casamento enfureceu o pai de Eileen, sequioso por vê-la se casar com outro bruxo, de preferência um puro-sangue. Severus nasceu em seguida, mas perdeu o pai muito cedo. Tobias morreu em circunstâncias consideradas suspeitas e a educação do pequeno Severus foi assumida pelo rigoroso avô. Sulpicius era o nome dele. Eileen não queria ou não tinha meios de se opor ao pai e o filho foi educado para ser um bruxo das trevas. Aos 11 anos, Severus entrou em Hogwarts, e finalmente foi exposto a outras mentalidades, outras pessoas. Seu avô tentava, mesmo de longe, monitorar as amizades de Severus dentro da escola, pelo que Albus me contou.

Remus Lupin assentiu:

– É verdade. Ele só tinha amigos de famílias puro-sangue; muitos viraram Comensais da Morte. Era alguém muito estranho. Geralmente isolado, mas andava com aqueles Slytherin. Assim que chegou a Hogwarts, logo fez amizade com Lucius Malfoy, apesar da diferença de idade entre os dois, e tinham vários amigos em comum. A gente sabia que ele ia virar um deles.

– Então, você o conheceu na escola? – perguntou Helena.

– Sim – respondeu Lupin, e Kingsley notou que ele mediu as palavras. – Fomos... er... contemporâneos.

– Foi mais ou menos nessa época que o avô de Severus começou a pressioná-lo para se juntar a Lord Voldemort – continuou Aberforth. – Albus achou que o rapaz poderia se beneficiar se soubesse mais sobre seu avô, e promoveu o reencontro de Severus e Moreen durante um feriado de Natal, sem que o patriarca soubesse. O encontro foi mais do que bem-sucedido: Severus foi aceito por Moreen como o sobrinho pródigo. Ela realmente gostava muito dele e o apoiava como podia. Para não enfurecer o avô, Severus nunca revelou essa parte da família. Mas mesmo depois que ele morreu, ele decidiu manter sua tia Moreen longe do mundo bruxo. Afinal, ele logo passou a espionar Lord Voldemort para a Ordem da Fênix e quis proteger a família. O problema é que Albus não me contou sobre a outra família de Severus.

Lupin disse:

– Provavelmente, uma sábia decisão acertada entre ambos. Helena e as crianças só estariam em perigo se sua existência fosse revelada. Calculo que Severus não tenha apreciado a interferência de Albus em procurá-la. Não foi uma visita inesperada?

– É, isso mesmo – lembrou Helena. – O professor apareceu de repente, e tomamos chá. Servi meus biscoitinhos de gengibre, e ele os elogiou muito. Terminei lhe fazendo um pratinho para levar. Eu o adorei de graça; era uma pessoa cativante. Ainda estou muito triste que tenha morrido. Quando Severus soube que ele tinha vindo, ficou muito nervoso. Na hora, eu pensei que ele temesse estar com o emprego ameaçado, mas agora vejo que os motivos eram bem diferentes.

– E isso faz muito tempo?

– Sim, faz algum tempo, sim. – Ela franziu o cenho tentando se lembrar com precisão, e Kingsley notou que as ruguinhas na testa a faziam bem adorável. – Ainda não tínhamos filhos, mas não tenho certeza se eu já estava grávida de Lily ou não. Lily é minha filha mais velha.

Houve um choque coletivo. Harry Potter se ergueu, furioso:

– Aquele canalha!... Como ele ousou!

– Harry – admoestou Lupin. – Harry, por favor.

– O que está acontecendo? – indagou Helena, intrigada. – Foi alguma coisa que eu disse?

– Lily era o nome da mãe de Harry, que Voldemort assassinou – esclareceu Kingsley.

– E quem os entregou para Voldemort foi justamente Snape! – O rapaz parecia furioso. – É culpa dele que os dois estão mortos!

– Harry! – Lupin ergueu a voz. – Dumbledore disse que ele se arrependeu muito quando viu que Voldemort se voltou para perseguir seus pais. Ele tinha muito carinho por sua mãe.

– Carinho? Ele a xingou de Mudblood! – acusou Harry, olhando para Lupin. – Você estava lá! Você viu!

Helena olhou para Kingsley, perdida. Por sua vez, ele mesmo também não entendia totalmente o que se passava, mas explicou:

– Mudblood é uma palavra muito feia, aplicada a pessoas mágicas que vieram de famílias não-mágicas. Um palavrão dos mais ofensivos. É como me chamarem de "macaco" porque sou negro.

– Eu não entendo... – Helena confessou, ainda perdida. – Severus sugeriu o nome de Lily, dizendo que era uma homenagem a uma pessoa muito querida para ele. Eu pensei que fosse uma avó, uma tia, alguém assim. Está querendo me dizer que o nome de minha filha veio de uma namoradinha de colégio!

Kingsley olhou Helena com outros olhos: até o momento ela parecia tão dócil, tão doce e vulnerável. Mas agora ela parecia furiosa e enciumada. Se Severus estivesse ali naquele momento, ele estaria bem enrascado.

Ainda mais que Harry continuava soltando fogo pelas ventas, todo vermelho e com os olhos verdes faiscando de ódio:

– Namoradinha? Ele se engraçou para cima da minha mãe, o calhorda!

Lupin interveio imediatamente, vendo que a situação começava a ficar fora de controle:

– Não! Não, não, definitivamente não! Calma, os dois! Deixem-me esclarecer uma coisa: nunca houve nada entre Severus e Lily. Mas Lily era uma pessoa muito especial. Ela era capaz de ver o lado bom em qualquer pessoa. Ajudou-me muito e posso apostar que tenha feito a mesma coisa por Severus. O problema era que Severus e James tinham muita antipatia entre eles. Os dois se odiavam demais. Mas não houve nada entre Lily e Severus, eu posso jurar.

– Dumbledore disse que Snape se arrependeu muito de ter revelado a profecia a Voldemort – admitiu Harry com alguma relutância. – E que por isso ele se voltou contra Voldemort. Mas eu sempre tive dificuldade em acreditar nisso.

– Bom – disse Lupin –, obviamente Severus nutria alguma afeição por Lily. Afinal, ele era muito hostilizado na escola, e Lily o tratava com respeito e civilidade. Sinceramente, eu não me lembro de que ele tenha tido qualquer namorada em Hogwarts, mas certamente Lily não era namorada dele. Sua mãe amava seu pai, Harry.

O rapaz olhou para Lupin e assentiu. Ninguém naquela sala quis dizer em voz alta a observação de que Helena era fisicamente parecida com Lily, com seus cabelos avermelhados, olhos verdes e corpo mignon. Muito menos na frente de Harry.

Kingsley observava Helena com atenção. A revelação sobre Lily a tinha abalado, ele podia ver. Incrível como a moça era transparente. Talvez tivesse sido esta honestidade e franqueza que atraíram Snape. De qualquer forma, ele podia sentir que agora ela estava mais angustiada e aquilo o incomodava. Ele não gostava de ver Helena angustiada.

Mesmo que eles só tivessem se conhecido há menos de 24 horas, ele sabia que a angústia de Helena o incomodava diretamente. Ele não quis pensar naquilo.

– De qualquer forma – Aberforth cortou a tensão no ar –, de nada adianta pensar nisso agora. Acredito ser hora de tomarmos decisões práticas.

– Boa providência. – Kingsley se virou para o dono da casa – Harry, pretendo ir pegar os filhos de Helena agora, mas gostaria de saber se devo trazê-los para cá ou se falo com Molly para acolhê-los. Não tome isso como uma pressão; eu só quero saber o que devo fazer.

Harry olhava para Helena quando respondeu:

– Eu falei que eles poderiam vir para cá e mantenho o que disse.

– Eu agradeço, Harry – Helena disse sinceramente.

– Estou fazendo isso por você e pelas crianças – ele esclareceu de maneira determinada. – Espero que isto fique bem claro. Além do mais, não há necessidade de incomodar a Sra. Weasley.

– Não seria incômodo; Molly adora crianças. Ela adorou que Fleur e Bill já começaram a ter uma pequena prole de Weasley meio-Veelas. Mas no nosso presente caso, o sigilo é aconselhável. Se os Weasley souberem do segredo, será mais gente a saber, o que significa mais chance de vazar para as pessoas erradas.

– É imprescindível para meu plano que Helena e as crianças sejam um segredo muito bem guardado – insistiu Aberforth Dumbledore, os olhos brilhando.

– O senhor tem um plano? – A esposa de Severus Snape tinha a expectativa estampada no rosto.

– Sim, eu tenho – ele sorriu e pegou a mão dela. – Vou cuidar para que possa ver o seu marido o quanto antes. Mas precisamos arrumar alguém que tome conta das crianças. Talvez precisemos incomodar Molly, afinal de contas.

– Não se preocupe com as crianças. Eu tenho uma pessoa para fazer isso. Duas, aliás. Elas estão com as crianças agora mesmo.

Kingsley indagou:

– Posso perguntar de quem se trata? Que pessoas são essas?

– Uma delas é Emma, a filha de tia Moreen e prima de Severus. E a outra é Sr. Stimpy, um amigo da família de Severus que mora conosco há alguns anos. Ele é meio estranho e tem uma severa deficiência física. Mas ele é ótimo na casa e adora as crianças.

Aberforth se virou para Shacklebolt:

– Investigue.

"Ele nem precisaria ter dito", pensou Kingsley, mas ele limitou-se a assentir. Tonks indagou a Lupin, mas na verdade todos ouviram:

– Não seria interessante chamar Hermione para ficar com Helena? Ela conhece bastante sobre Muggles e poderia ajudar.

– Sabemos que a Srta. Granger iria manter segredo, mas precisamos realmente manter essa informação com o mínimo de pessoas que pudermos. Além disso, tenho outros planos para a Srta. Granger – insistiu Aberforth. – Agora, se vocês me derem licença, há um número de coisas que preciso providenciar para conseguir fazer a Srta. Sharp entrar em Azkaban.

Aquela foi a deixa para Kingsley apressar Helena a que eles também se movimentassem. E ela se levantou, dizendo:

– Talvez o senhor tenha razão. São pelo menos cinco horas de estrada até a cidade mais próxima de nossa casa. Isso se o trânsito na M1 estiver desimpedido. Talvez seja melhor ir de trem, mas vou ter que enfrentar as baldeações.

– Não precisa se preocupar com o trânsito – garantiu Kingsley. – O melhor é aparatarmos até lá e voltarmos do mesmo jeito.

– Aparar... o quê?

Harry incentivou:

– Aparatando. Oh, é ótimo. Você vai adorar. Sem contar que é muito prático. Você está aqui, mas aparece em sua casa.

– Jura? E como pode ser isso?

– Se você ficar a meu lado – indicou Kingsley – e pegar meu braço, aí aparataremos juntos.

– Isso é assim mesmo? – Ela hesitou. – E é perigoso?

– Não – garantiu Harry. – Eu já aparatei com outra pessoa. Mas não espere uma sensação boa da primeira vez. É meio... desconfortável.

Helena chegou perto de Kingsley e perguntou:

– Assim está bom, Sr. Shacklebolt?

O auror sentiu a pressão da mão dela sobre seu braço. Trêmula, mas firme. De repente, ele sentiu uma gama de sensações, sensações que preferiu ignorar.

– Acho que está ótimo. Pode me chamar de Kingsley, ou apenas King, se preferir.

– Se me chamar de Helena. – Ela sorriu. Ele preferiu não se deter naquele sorriso, pensando apenas que gostaria de vê-lo mais vezes.

– Pense firmemente em sua casa, o mais nítido na sua mente que puder – instruiu. – Pronta?

Ela assentiu e Lupin tentou tranqüilizá-la:

– Vamos deixar um quarto para as crianças pronto para quando chegarem. Alguma decoração especial?

– Lily gosta de Barbie, mas London é muito pequeno para ter preferências. Mas não precisa se incomodar, Sr. Lupin.

– Não é incômodo nenhum – disse Tonks, olhando fixamente para Lupin. – Eu adoro crianças. Mal posso esperar para ter meus próprios filhos.

Lupin mudou de olhar, mas não disse coisa alguma. Kingsley sentiu que o casal já discutira aquilo antes e virou-se para Helena:

– Então, quando eu contar três. Um... dois...

E ele aparatou antes de dizer três para que Helena não ficasse muito tensa.