Capítulo 17 – A idéia
O almoço terminou sendo num MacDonald's Muggle, e quem tentou animar os ânimos foi justamente Shacklebolt, trazendo McLanches Felizes. London ainda estava um pouco assustado e Lily, irritada:
– Por que aquele homem foi mau com o papai? Tio Harry ficou muito bravo!
Harry ia dar alguma desculpa, mas Severus explicou:
– Aquele homem não gosta de papai porque ele lutou contra o bruxo mau. Harry também lutou contra o bruxo mau, mas de uma maneira diferente. Papai fez uma coisa má, Lily, e foi castigado – da mesma forma que acontece quando você é castigada por fazer algo ruim. Mas algumas pessoas, como aquele homem, acham que papai deve receber mais castigos.
– Ele foi muito mau!
– Foi, sim. Mas é que ele está muito bravo.
– Depois ele vai pedir desculpas, papai? A mamãe me faz pedir desculpas se eu sou má.
– Pode ser que sim, Lily. Isso seria bom. – Ele se virou para sua filha. – E você, mocinha, foi muito corajosa enfrentando aquele homem.
– Ele era feio! E mau!
– Só que você ainda é muito pequena para enfrentar um homem, mesmo que ele seja mau e feio. Se você queria proteger alguém, proteja sempre seu irmão, que é menor que você. Também proteja sua mãe e sua tia Emma. Você é a mais velha depois do papai e uma bruxa muito poderosa. Conto com você para proteger a família, está bem?
Os olhinhos brilharam de orgulho ao ouvir o papai falando essas coisas. Helena pegou em sua mão, e Severus sorriu para ela. Depois ele se virou para Harry:
– Potter... você não precisava ter feito o que fez.
– Como não? Tá, eu sei. Você não gosta de toda aquela coisa chata de Menino-Que-Sobreviveu e Herói do Mundo Bruxo, mas hoje bem que veio a calhar, não foi?
– Eu... gostaria de lhe agradecer.
– Esqueça isso. Só fiz o que devia. Depois, eu perdi a cabeça, como você sempre disse que eu faço. Não pude me controlar. Homenzinho horrível, aquele.
Severus deu de ombros:
– Ele costumava separar revistas técnicas de Poções para mim.
– Sério? – indagou Shacklebolt, chegando com mais uma rodada de Big Macs para os adultos. – É, Prescott sempre foi um homem de acompanhar a multidão. Não tem opiniões fortes. Típico apoiador de Fudge quando era ministro. Severus, eu lamento o que aconteceu.
– Você não teve qualquer culpa, Shacklebolt. Mas foi bom ter acontecido. Apenas consolida uma decisão que eu já havia tomado e hoje eu soube ser viável.
– Decisão?
– Pretendo deixar a Inglaterra o mais breve possível.
Houve um minuto de silêncio até que a notícia fosse absorvida. Helena o encarou e viu a determinação nos olhos negros. Ela sabia que o marido estava falando sério. Ele se virou para ela:
– Desculpe não tê-la consultado antes, Helena, mas não vejo saída. Sem poderes, eu... me sinto literalmente emasculado. Menos que um homem. Sou um inútil no mundo Muggle, não tenho qualificações, certificados ou qualquer coisa que me garanta um emprego capaz de sustentar você e as crianças. Não quero arriscar usar minha mágica e ir parar em Azkaban, longe de vocês de novo. Aberforth me disse que a sentença só é válida na jurisdição do Ministério da Magia, portanto, se eu me mudar para outro lugar, um outro país, posso continuar sendo um bruxo. Eu devo isso às crianças. Como bruxo, eu posso garantir uma vida melhor para nós. Mas, para ser bruxo, devo deixar este lugar. Com o que aconteceu hoje, eu pude ver que não quero ver meus filhos passando por isso, sujeitos a essas cenas por minha causa. Sou um homem marcado aqui. As pessoas também vão fazer meus filhos pagarem pelo que fiz. Em outro lugar, um lugar longe, talvez eles não precisem assistir a esse tipo de incidente.
Shacklebolt pensou em protestar, mas ele sabia que no fundo Severus estava coberto de razão. Harry parecia pensar nas mesmas linhas, porque ele disse:
– Lamento, Severus. Você já sabe para onde pretende ir?
Severus olhou por cima dos ombros. Era uma lanchonete Muggle, com adolescentes, famílias Muggle, gente fazendo um lanche em plena Londres atarefada. Ainda assim, ele abaixou a voz:
– Na verdade, eu tenho uma idéia de onde Draco Malfoy está. Pensei em escrever a ele. Afinal, somos dois exilados.
Harry assentiu:
– Pode ser uma boa idéia. Talvez realmente seja bom para vocês dois.
Emma derramou uma lágrima:
– Oh, Severus. Você é toda família que tenho aqui… Como vou fazer sem você?
– Na verdade, se você quisesse vir conosco, seria bem-vinda. E mais: eu prometo treiná-la para aprender a usar sua magia.
– Treinar?
– Bom, você precisa aprender a usar essa sua varinha novinha. – Ela arregalou os olhos. – As crianças iam adorar ter você por perto, e Helena também. Mas claro que você tem sua própria vida, eu entendo se você não quiser ir.
Emma tinha os olhos azuis muito arregalados, e ela encarava Severus.
– Fala sério? Severus, é sua vida e sua família.
– Emma, você mesma disse: você é toda minha família aqui. Oh, tem Oskar e Lukas, mas eles estão na Suécia; fizeram sua vida por lá. De qualquer forma, você não precisa decidir agora, nesse instante.
Shacklebolt incentivou:
– Severus teve uma excelente idéia. Por que não pensa nisso? E, se me permite, Severus, você também pode amadurecer esta idéia. Examine todos os ângulos, converse com Helena; talvez ela queira dar algumas sugestões também.
Severus encarou sua mulher, que no momento ajudava London a se servir das batatinhas fritas. Helena devolveu o olhar e disse:
– Prefiro discutir o assunto mais tarde. Vou pensar um pouco.
O olhar de Helena não revelou muita coisa, mas Severus sabia que sua mulher tinha algo em mente. Não chegou a haver qualquer tipo de desconforto na mesa, porque Harry em seguida concordou:
– Isso parece ser bem sensato. Bom, se estão todos de acordo, podemos ir agora.
– Sim, acho prudente – garantiu Helena, de olho em London, que tentava pegar as batatinhas de Lily. – Alguém precisa tirar uma sonequinha ou vai ficar bem mal-humorado.
Harry não pôde evitar:
– Pena que essa sonequinha não funcionava em Severus Snape no meu tempo de Hogwarts.
Os adultos riram da piada, que fez bem após tanta tensão. Após lançar um olhar patenteado para Harry (que riu ainda mais), Severus anunciou:
– Encontro vocês mais tarde. Vou tentar enviar uma mensagem a Draco.
Harry ofereceu:
– Se quiser usar Hedwig...
– Agradeço a oferta, mas acho que sua coruja é muito identificável. Vou até o correio.
Emma indagou:
– Você chega a tempo de jantar? Sim, porque depois desse lanchinho de almoço, o jantar vai ter que ser substancioso.
– Claro que sim. – Ele beijou a cabeça de Lily. – Só vou cuidar de umas outras coisinhas.
Helena o encarou, uma expressão preocupada:
– Tome cuidado, querido.
Severus despediu-se polidamente e saiu pela cidade de Londres, pensativo. Ele sentiu algo em Helena, algo que não precisava usar Legilimência para perceber. Ela estava chateada com alguma coisa. Talvez ela não quisesse sair do Reino Unido, e não queria criar uma cena na frente dos demais.
Mas aquela decisão era a melhor, na opinião de Severus. Ele estava pensando mais na sua família do que em si mesmo quando a tomou. Na sua cabeça, se eles ficassem ali, o que acontecera com ele na Floreios e Borrões poderia acontecer algum dia com Lily ou London. Severus jamais se perdoaria se os seus atos respingassem em seus filhos.
Por isso, a sua decisão. Num outro lugar, ele poderia até tentar mudar de nome ou coisa parecida. Seria mais fácil distanciar-se num outro país.
Ele começou a fazer planos, a traçar estratégias. Numa livraria Muggle, ele comprou um mapa da Europa. Apesar de já ter idéia de para onde pretendia se mudar, ele brincou com outras possibilidades. Sentou-se num café tipo francês, pediu um capuccino e abriu o mapa, deixando a cabeça vaguear.
Mas a quem ele estava tentando enganar? Jamais ele poderia decidir onde viveria sem falar com Helena. Estivera tanto tempo longe da família que estava destreinado sobre a convivência com outras pessoas e decisões colegiadas. Tinha que se acostumar a consultar sua mulher para esse tipo de decisão.
Ele não contava, porém, com a reação de Helena.
