Capítulo 21 – Visita a um velho amigo

– Mamãe, por que a Tia Emma não vem conosco?

– Porque ela precisou procurar um telefone. Sabe, bruxos não acreditam em telefones, aparentemente. Engraçado, né, filha?

– Por que o Tio King foi com ela?

– Porque ele sabe onde tem um telefone. E o nome dele é Sr. Shacklebolt.

– Todos prontos? – indagou Severus, ajeitando London no colo. – A Profª McGonagall vai nos receber pessoalmente.

– Lily, dê a mão para mamãe. Nós vamos viajar de lareira de novo.

– Oba!

– Enrole o cachecol, porque lá é frio. Muito bem, todos prontos.

Sem muita dificuldade, a família Snape se transportou para a lareira, e Severus teve um ligeiro impacto ao se ver dentro do escritório que um dia tinha sido de Dumbledore. Tantas reuniões, tantos chás ali...

– Severus, querido. – Helena o encarou, intrigada. – Tudo bem?

– Sim, eu... só fiquei um pouco... tonto, acho.

Harry Potter emergiu da lareira com um swoosh suave e sorriu:

– Todos inteiros?

A porta se abriu, e McGonagall entrou, o chapéu pontudo balançando e as vestes de tartan escocês farfalhando alegremente:

– Oh, vocês vieram. Que maravilha.

– Profª McGonagall...

– Por favor, Severus. Fomos colegas durante 15 anos. Por favor, chame-me de Minerva. – Ela sorriu. – Olá, Helena. Prazer em vê-la novamente. Vou pedir a Dobby que traga chá. – Ela se abaixou para sorrir para Lily e mexer no seu narizinho. – Com biscoitinhos também, que tal?

Lily sorriu, mas ainda estava agarradinha a Helena. London, por sua vez, estava no colo do pai, olhinhos brilhando ao ver a miríade de objetos fascinantes no gabinete da Diretora de Hogwarts.

Minerva ergueu a cabeça e chamou:

– Albus! Albus! Alguém está aqui para vê-lo.

Helena virou-se para ver um grande quadro na parede, mostrando um bruxo velho e familiar observando o céu num astrolábio. O bruxo do quadro se virou para todos, e ela reconheceu o homem que a visitara há alguns anos, o Prof. Dumbledore.

– Severus, minha criança. – Ele sorriu. – Phineas conseguiu falar com você, afinal. Que bom que você veio. E Helena, encantadora como sempre.

Ela sorriu:

– É bom vê-lo, diretor.

– Você é muito bondosa. Sabe, eu nunca me esqueci daqueles seus biscoitinhos de gengibre. Ah, realmente inesquecíveis... E esses pequeninos?

Helena apresentou:

– Estes são meus filhos, Lily e London. Crianças, digam oi ao Prof. Dumbledore.

Eles ecoaram "Olá, Prof. Bumbledor", ou coisa parecida, e o retrato sorriu:

– Ah, o que é isso? Podem me chamar de vovô Albus. Eu ouvi falar que vocês conheceram uma Vovó num retrato, é verdade?

– A Vovó Wal – respondeu Lily. – Você conhece a Vovó Wal, Vovô Albus?

– Sim, eu conheço.

– Ela estava triste, mas agora não está mais. Só que ela teve que ir embora.

– Talvez um dia ela volte, e aí você vai poder falar com ela de novo. – sorriu Dumbledore.

– Você parece com o tio Abefó!

– Aberforth é meu irmão. Vejo que ele tem tratado bem de vocês.

– Aham.

– Espero que Minerva tenha se lembrado de deixar dropes de limão na mesinha perto da cristaleira. Podem se servir, crianças. Vão.

– Eba!

– Não tão depressa – lembrou Helena. – Como é que se diz?

– Obrigado, Vovô Albus!

Os dois foram procurar os dropes de limão, e Dumbledore se dirigiu a um de seus pupilos favoritos com uma expressão de profunda afeição:

– Olá, Harry. É bom vê-lo.

– É bom vê-lo também, senhor.

– Veio com Severus? É bom ver os dois juntos.

– Sim, senhor. – Harry não evitou um risinho safadinho. – Estávamos discutindo isso mesmo ontem à noite. Severus e a família estão em minha casa.

– Foi o que Minerva me dizia. Soube que você foi considerado inocente, Severus. Meus parabéns. Saiu com um pena alternativa. Aqueles tradicionalistas do Wizengamot não costumam dar sentenças deste tipo.

– Foi o que ouvi.

– Ao menos você está fora de Azkaban, meu rapaz.

– Em breve, Diretor, estarei fora da jurisdição de Scrimgeour. – O retrato girou a cabeça, intrigado, e Severus esclareceu: – Pretendo me mudar da Inglaterra. Assim, poderei ter meus poderes de volta.

– Talvez seja uma boa idéia, Severus. Refazer a sua vida. Ouvi dizer que você teve dificuldades no Beco Diagonal.

– Sim. Não foi nenhuma surpresa, claro. Acho que tive sorte de não ser linchado em praça pública, como nos dias da Inquisição.

– Oh, bem. O tempo realmente pode ser o senhor da razão, Severus. Com tempo, tudo vai adquirir a devida perspectiva. Nesse meio tempo, você tem sua família. E é uma família linda.

– Obrigado.

– Falando nisso, e a família de sua tia, como vai?

– Uma parte está chocada, a outra está a caminho de ficar chocada. – Severus deu de ombros. – Nem todos sabem que são bruxos. Só minha prima.

– O que ela achou?

– Está muito animada. Pretendo ensiná-la a controlar sua magia. Num país estrangeiro, não sei como são as escolas de bruxaria.

– E as crianças? Minerva já deve tê-los incluído para Hogwarts, quando eles completarem a idade requerida.

– Até lá tenho alguns anos pela frente. Muita coisa pode acontecer.

– Nada poderia ser mais verdadeiro. Desejo boa sorte, Severus – disse Dumbledore. – Vou sentir sua falta.

Minerva McGonagall, que voltava com as crianças, repetiu:

– Eu também sentirei saudades, Severus. Mande notícias de vez em quando. Para onde vai?

– A princípio, ainda não sabemos. Estamos vendo as nossas opções. Eu gostaria de pensar que poderia procurar Draco Malfoy, mas não quero deixá-lo em perigo. Rufus Scrimgeour pode inventar de monitorar minhas atividades.

– Sim, sim, ele poderia fazer isso mesmo – concordou Dumbledore. – Boa sorte, Severus. Deixe-me saber como as coisas correm. Harry, meu rapaz, sempre é um prazer vê-lo. Apareça quando quiser.

– O prazer foi todo meu, senhor.

Dumbledore virou-se de costas, voltando para observar seu astrolábio. Minerva voltou-se para Severus:

– Harry me disse que você queria alertar Pomfrey. Algo errado?

– Eu planejava um exame completo das crianças antes de partirmos para nosso novo lar. Verificar se elas precisam de vacinas mágicas e poções de imunização para moléstias mágicas mais comuns de infância. Não sabemos que hospitais mágicos vamos encontrar se resolvermos deixar a Europa.

– Entendo – disse ela. – Bom, é melhor irmos por aqui, todos.

As crianças ficaram fascinadas com o Castelo de Hogwarts. Primeiro, porque lá tudo era bruxo, com outros retratos que se mexiam, tochas nos corredores e coisas fascinantes. Depois, era um castelo de verdade, com masmorras e tudo. Pomfrey examinou as duas crianças, declarou-as saudáveis fisicamente e magicamente até precoces, quando Severus explicou o potencial curador de London e a empatia natural de Lily.

Para alegria da pequena, Hagrid estava em sua casa reconstruída, e ela ficou com a mãe e o irmão brincando com Canino e outros bichinhos, enquanto Harry acompanhava Severus ao túmulo de Dumbledore perto do lago. Depois foi a vez de todos fazerem um lanche nas cozinhas cheias de elfos domésticos. London adorou fazer cócegas na pêra e vê-la transformar-se em maçaneta para abrir a porta magicamente. Se pudesse, ele teria ficado horas fazendo cócegas na pêra.

Foi tanta brincadeira e diversão em Hogwarts que o grupo voltou muito tarde para Grimmauld Place. London estava dormindo no colo de Helena e Lily ainda resistia bravamente, agarrada à perna de Severus. Quando eles chegaram, viram que havia visitantes na casa. Emma estava entretida com Shacklebolt e Hermione, jogando palavras cruzadas, mas não eram os únicos.

– Olá! – saudou Emma. – Puxa, vocês demoraram!

Hermione se ergueu e veio beijar Harry:

– Olá para todos.

– Como foi o passeio? – indagou Tonks, abraçada a Remus no sofá. – Soube que foram a Hogwarts!

Lily correu a abraçá-la:

– Eu vi o Hagrid e o Canino e Tia Minerva! O Vovô Albus me deu dropes de limão!

– Puxa, vocês se divertiram, hein?

– Sim, até demais – disse Helena, pegando a mão de Lily. –Agora, mocinha, está na hora de dormir. Diga boa noite para todos.

– Boa noite! Boa noite, papai!

Severus abaixou-se e beijou a menina:

– Boa noite, filhinha.

Helena beijou Severus antes de levar as duas crianças para cima. Emma observou a cena e aproximou-se, Shacklebolt a seu lado. Severus virou-se para a prima:

– E então? Como foi o seu dia?

– Tudo certo. – Ela sorriu. – O plano está em andamento.

Harry indagou:

– Plano?

– Para a mudança – esclareceu Severus. – Vamos estabelecer uma residência Muggle. Emma estava procurando um lugar adequado com imobiliárias.

Remus indagou:

– Então decidiram mesmo se mudar?

– Sim. É o melhor para todos.

– A esse respeito, Severus – começou Shacklebolt –, acho que chegou a hora de eu ter uma conversa com você a respeito de um gado que estou deixando pronto.

Severus franziu o cenho, depois olhou para Emma, que estava enrubescida. Então ele ergueu uma sobrancelha:

– Está falando de lobola?

Shacklebolt sorriu:

– É a tradição de minha tribo.

– Pela tradição, você deveria falar com Oskar, que é o irmão mais velho.

– Você serve. E está bem mais perto.

Harry, Tonks e Remus pareciam perdidos no diálogo, mas Hermione estava com os olhinhos brilhando e dirigiu-se a Shacklebolt:

– Nossa, lobola! Eu já li sobre isso!

– Você conhece isso, Hermione? – perguntou Harry.

– Por que isso não me espanta? – brincou Remus.

Mas ela mudou o tom, ainda dirigindo-se a Shacklebolt:

– Isso não é meio bárbaro?

– É tradicional. – Shacklebolt deu de ombros. – Eu não me sentiria bem se não seguisse a tradição de minha tribo.

Tonks indagou:

– Mas o que é isso?

– Lobola – explicou Hermione – é o preço da noiva, a ser pago pelo candidato a noivo, em algumas tribos africanas. É um dote no sentido inverso. Manda a tradição que a lobola seja paga em gado, mas hoje em dia a tradição do gado tem sido substituída por outros bens, como imóveis, eletrodomésticos ou até mesmo dinheiro vivo. A negociação é livre.

Todos olharam para Emma, que enrubesceu ainda mais. Severus indagou:

– Presumo, então, que estejamos abrindo negociações?

– Precisamente.

– Então, vamos fazer isso da maneira tradicional. Ou seja, sem a participação da noiva ou de qualquer outro interessado. – Os outros iam protestar, mas Severus continuou. – Para garantir a imparcialidade das negociações, permitirei a presença de nosso anfitrião, Harry Potter. Ele vai assegurar que não houve má-fé no negócio.

– Negócio? – Hermione estava indignada. – Isso é bárbaro. Estão tratando uma mulher adulta como se fosse uma... coisa!

– Há quem diga que isso é romântico, Srta. Granger – argumentou Severus. – Por favor, vamos passar à sala de reuniões, se todos estiverem de acordo.

Harry estava curioso para saber como era uma negociação de lobola e foi o primeiro a entrar na sala, seguido por Shacklebolt e Severus, que fechou a porta, para frustração de Remus, Tonks, Hermione e Emma.

Eles se sentaram à mesa da família Black, Harry à cabeceira, enquanto Harry e Shacklebolt se sentavam frente a frente. O Auror começou:

– Eu esperava ter mais tempo para a corte, mas, como vocês pretendem se mudar em breve, tive que apressar os procedimentos.

– Entendo – disse Severus. – Antes de iniciarmos as negociações em si, Shacklebolt, gostaria de lhe dizer que sou muito grato pelo que fez por minha família. Não sei se você sabe exatamente por que deixei seu nome com minha mulher como último recurso.

– Bem, nós já falamos sobre isso. Fiquei honrado.

– Sei que vou me repetir, mas quero deixar isso bem claro. Albus depositava imensa confiança em você, Shacklebolt. Mais do que isso, você é um bom homem. É honesto, íntegro, sensato. Circula bem no mundo Muggle, melhor até do que eu. Além do mais, tem uma posição privilegiada tanto dentro do Ministério da Magia quanto dentro do governo Muggle. Eu sabia que trataria Helena com distinção e cortesia. Você faria a coisa certa, eu tinha certeza.

Shacklebolt parecia até um tanto constrangido ao responder:

– Eu não tinha idéia de que você tinha tanta consideração por mim, Severus.

– Quando vi você interagindo com minha família, eu vi que meu julgamento não tinha sido errado, nem minha confiança tinha sido depositada erroneamente. Você continua um homem íntegro, como Dumbledore acreditava que era.

Harry estava abismado. Jamais tinha ouvido Severus Snape soltar esse tipo de elogio a quem quer que fosse. Shacklebolt provavelmente pensava a mesma coisa, pois disse:

– São palavras muito honrosas para mim, Severus. Jamais pensei em ouvi-lo dizê-las.

Severus assentiu, sem sorrir:

– Eu tampouco, Shacklebolt. Porque você me surpreendeu, sabia?

– Mesmo?

Os olhos de Severus adquiriram um brilho frio e assassino, um brilho só encontrado nos olhos de um verdadeiro Comensal da Morte. A voz dele também diminuiu um pouco de volume, para alcançar um tom decididamente homicida:

– Porque eu jamais pude imaginar que você se aproveitasse da situação para fazer avanços inapropriados contra Helena. – Ele se inclinou para frente e, num rasgo de ira controlada, os lábios erguidos para mostrar os dentes, como uma fera prestes a desferir um ataque, completou: – E nós vamos lidar com isso agora, Shacklebolt. Você deu em cima de minha mulher e está incorrendo num erro crasso se pensa por um minuto que eu pretendo ignorar isso só porque agora você diz que quer se casar com Emma. Fui bem claro?