Possibilidades

Uma Chance Para Recomeçar

Após a discussão que tivera tanto com Lithos quanto com Marin, Aioria deixou a discoteca para caminhar pelo centro de Atenas e pela primeira vez em anos se sentia confuso, sem saber o que fazer.

Marin tem toda razão. Meu ciúme idiota acabou magoando uma das pessoas que eu mais amo.

A discussão de horas atrás ainda ressoava em seus ouvidos.

"Esse ciúme está passando dos limites de irmão para virar outra coisa"

Não, não era isso... Mas, se não era o que é que tinha acontecido horas antes?

"VOCÊ NÃO É MEU IRMÃO"

Olhou para a direção do santuário, talvez fosse melhor voltar e conversar. Não podia deixar as coisas daquela maneira, ou tudo se quebraria e sem deixar chance para concertos. E isso ele nunca permitiria.

0o0

A casa de Leão já estava imersa no silêncio. Lithos não ouvira ruído algum que indicasse que Aioria já tinha voltado.

Quando chegou, tudo que fez foi ter uma conversa rápida com Garan, que foi mais choro do que uma conversa propriamente dita, só conseguiu deixá-lo preocupado, até desistir de dizer qualquer coisa e se trancar no quarto.

Não queria nada.

E ninguém a entenderia afinal... Não passava de uma jovem tola e... Apaixonada. Assim, de um jeito inevitável, por anos a fio. E por mais que tentasse enxergar outros rostos, sentir os sorrisos em sua direção; era só o rosto dele que procurava, era só o seu sorriso que queria sentir e era só seus olhos que os seus buscavam encontrar.

Ele, ele, sempre ele. Podia ter sido apenas uma paixão adolescente boba, mas não foi. Podia ser apenas mais um sentimento pequeno, mas não era. E por mais que dessem voltas, os caminhos de sua vida sempre a traziam de volta para ele.

Ela amava Aioria. Fugir disso era idiotice. E ela não era uma idiota mesmo? Só para variar.

Pensou em Tohma, gostava dele, gostava de verdade, mesmo com tão pouco tempo de convivência. O sorriso sereno, que a acalmava, os olhos azuis tão moleques, mas que guardavam algo muito mais profundo; algo que ela nunca alcançaria, não importasse quanto tempo se passasse.

E ela acabaria magoando-o, pois em seu coração tudo o que tinha para lhe oferecer era sua amizade.

Ouviu passos.

0o0

Droga, talvez estivesse sendo precipitado de novo, talvez fosse fazer ainda mais besteira. Só que tinha que conversar com Lithos.

Ela era sua família. Era mais que família...

Parou na porta do quarto e encostou as mãos na porta, ainda longe da maçaneta.

Lithos, do outro lado, fez o mesmo. Sabia que era ele. Ela sempre sabia.

O silêncio que perdurou doía. Ambos pensavam em suas próprias palavras e em seus atos daquela noite, a mágoa era presente... Embora o medo de que ela permanecesse ali para sempre fosse ainda maior. Não era melhor encarar tudo como um grande mal entendido?

Não. Não era. Algo entre eles mudara, não dava mais para simplesmente dizer Bom Dia ou Oi, como se aquela noite não tivesse acontecido.

"Eu estraguei tudo..." o pensamento veio instantâneo, para ambos.

Lithos se afastou da porta, recostando-se de costas a ela e voltando a chorar. Tinha dito a Tohma que ia ficar bem... Mas não ia. Deixou as lágrimas escorrerem e os soluços escaparam, sem que tivesse controle sobre eles.

Aioria levou a mão para a maçaneta, ia entrar, tinha que entrar, ainda mais depois de ouvir que Lithos chorava... Ele sempre tinha que estragar tudo com seu maldito jeito impulsivo?

Quando ia girar a maçaneta sentiu um olhar sobre si.

Garan.

O seu fiel amigo...

E ele só fez um gesto para que o acompanhasse, largou a porta, tentou esquecer a tristeza que vinha de dentro dela e o seguiu.

0o0

Garan já o esperava nas escadarias da Casa de Leão, olhava as estrelas, era uma noite bonita afinal, embora parecesse cheia de névoa. Seus olhos não pareciam repreensivos, mas Garan deixava transparecer algo quando se preparava para uma bronca?

- Bom, por que não senta? – ele disse sereno.

- Estou querendo voltar lá para dentro. – disse, a raiva marcando as palavras, Garan nem ligou e se sentou nas escadarias. Não viu outra alternativa, fez o mesmo.

- Agora pode me contar o que aconteceu?

- Brigamos.

- Vocês sempre tiveram uma e outra briga, mas nunca vi a Lithos triste daquele jeito, nem você se controlando para não escancarar a porta e começar a falar como um louco. – Aioria o olhou assustado. – O que houve?

- Ciúmes... – disse baixinho.

- Como?

- Tá bom Garan... Sabe qual merda eu fiz dessa vez? ARRANQUEI A LITHOS DA BOATE! ISSO MESMO E AINDA QUASE ESBOFETEI A CARA MALDITA DO IRMÃO DA MARIN QUE SE ATREVEU A BEIJÁ-LA. – gritou, em alto e bom som, levantando-se.

- Ah... Foi isso? Esse foi um de seus maiores ataques de ciúme sabia? – Aioria olhava para Garan indignado com tanta calma. – Tem razão Lithos estar tão chateada.

- Eu ainda não terminei, sabe o que ela me disse? Heim, você sabe o que ela teve coragem de gritar pra mim? Que eu não sou irmão dela... – a última frase saiu baixinha. – Que eu não sou irmão dela.

- Ela não disse nenhuma mentira, vocês não são irmãos.

Silêncio. Aioria voltou a se sentar, dessa vez aparentemente mais calmo.

- É não somos irmãos.

- Sempre se consideraram assim Aioria, mas sempre foram grandes amigos. Você a ajudou em um momento difícil, mas ela também sempre esteve ao seu lado, em todos os momentos difíceis que você passou.

- Eu sei...

- Só que não parece se lembrar. – disse, desta vez seu tom de voz saiu severo.

- Eu devo desculpas a ela não é?

- Muito mais que desculpas Aioria, ela merece uma explicação.

- Garan, eu não agüentei ver aquele garoto... junto dela. Não pude me conter, todos começaram a falar dos dois e o idiota se aproveitou dela.

- Será que se aproveitou mesmo? – Aioria olhou displicente para o céu. – Lithos cresceu, agora você percebeu não é? É uma mulher Aioria, uma jovem mulher. Não pode esperar que ela continue a garotinha que um dia você mandou para estudar longe do Santuário, não pode esperar que ela continue a menina que não ficava longe de você.

- Não podia ser assim...

- Assim como? Você já traçou o seu futuro, ela precisa traçar o dela. Afinal, não estará aqui para sempre.

- Eu não vou deixá-la, sabe disso.

- Eu sei disso Aioria, mas ela não vai aceitar, e disso você já devia ter tomado consciência. O Santuário agora está em paz, não veremos mais guerras, cada um traçou um caminho, já tivemos casamentos, reencontros... Você mesmo irá se casar! – disse. – Lithos não vai querer atrapalhar você e Marin, creio que ela se sente uma peça que não se encaixa. Então ela própria quer traçar seus rumos, não pode mais ficar presa a você.

- Ela não está presa a mim...

- Está sim, somos tudo o que ela tem. Somos sua única família.

- Então por que os caminhos têm que se separar?

- Quer que ela passe a vida a seu lado, vendo você construir uma vida com Marin, ter filhos, enquanto ela continua a seu lado, sem poder fazer o mesmo?

- Não é isso...

- É sim, foi isso que sua crise de ciúmes mostrou. Você a quer sempre a seu lado, não quer que ela fique com mais ninguém, mas você não tem a mesma disposição pra ela. Quer que ela pra você, só que você, Aioria, não faz o mesmo por ela.

- Garan...

- Como já te disse, ela não é uma menina, muito menos sua irmã. Essa crise de ciúme demonstrou algo que nem você mesmo enxerga. Preste atenção, não feche os olhos dessa forma Aioria ou pode ser tarde demais. – Garan se levantou, dessa vez o semblante se mostrava muito mais sério e preocupado.

- Espera... – Aioria não queria que a conversa terminasse daquela forma, queria que Garan lhe dissesse o que deixara nas entrelinhas, mas sabia que ele nunca faria isso.

- Precisa ficar sozinho Mestre Aioria. – foi tudo o que ele disse.

Aioria continuou sentado em silêncio. Nada se encaixava em sua mente, mas de certa forma as palavras de Garan pareciam ter sentido.

0o0

Tohma suspirou e mordeu a maça vermelha que estava nas suas mãos. A face bem talhada parecia um belo quadro de Eros. Olhou para o relógio que marcava altas horas da madrugada.

Mas não estava com sono. Chegara em casa e ainda estava pensando nos acontecimentos da noite. O sorriso de Lithos... a dança... o beijo... o ciúmes de Aioria.

Mordeu a maçã com força. Que merda. Ainda estava com raiva do leonino. Infelizmente tinha de admitir um de seus defeitos, ficar remoendo as coisas por muito tempo.

Imaginava se Lithos estava bem. Será que já estava dormindo? Será que encontrou com Aioria? Mas é claro que se viram... Estavam na mesma casa... Será que brigaram?

– Não imaginei que fosse te achar acordado...

Não se deu ao trabalho de virar, para responder a irmã, apenas continuou comendo a fruta vermelha. A viu buscar um copo d'água e sentar-se de frente para ele, na mesa simples da cozinha.

– Ah, Tohma... Eu não sei o que fazer... – ele abaixou a cabeça, mexendo nas madeixas ruivas, num sinal de claro cansaço. – Que noite, por Zeus... Se pudesse apagar isso tudo...

– Brigou com Aioria? – ele finalmente se manifestou.

– Ah, está tão evidente assim?

Tohma não respondeu com outro gesto a não ser um maneio de cabeça.

– Sim, brigamos. Você sabe... não suporto ignorância, mesmo com quem merece... E dessa vez Aioria passou dos limites, com você e com a Lithos.

– Também acho. Mas eu não falo mais nada, Marin. Ele é seu noivo. Se eu disser o que penso dele agora, acho que você me mata...

Ela bebeu um gole da água esquecida sobre a mesa.

– Não... Não mato. Tohma, você é meu irmão. Existe ex-noivo, mas não existe ex-irmão.

Mas também quero te dizer, que Aioria não é assim. Ele é explosivo sim, bastante impulsivo e não pensa duas vezes antes de qualquer coisa. Mas ele é bondoso, e arrancaria um braço para defender quem ama. É a pessoa mais carinhosa do mundo...

– Você diz isso porque o ama. Mas se ele é assim, hoje não foi. Pareceu foi bem arrogante e possessivo.

– Hoje ele passou dos limites mesmo...

Ficaram um tempo em silêncio. Tohma terminando sua maçã e Marin o copo de água. Encaram-se em silêncio por algum tempo até que Toma resolveu abrir a boca.

– Tem alguma coisa te preocupando.

– Não é nada. – ela desviou o olhar.

Sabia o que era. Sabia claramente. Mas como dizer isso? Como entender isso? Não podia ser verdade...

– Não fiz uma pergunta, Marin. Sei que algo te preocupa.

Ela sorriu, não te forma alegre.

– Tenho medo, Toma. Medo que essa obsessão do Aioria em "proteger" a Lithos seja mais que um ciúme de irmão. E você sabe que eles são não são irmãos...

Ele tencionou os músculos brevemente, antes de concordar com a cabeça.

E ambos ficaram em silêncio. Cada um com suas próprias preocupações e também preocupações do outro.

Tohma temia que Lithos não pudesse sequer falar com ele mais, visto o ciúme do irmão. E tinha medo que Aioria machucasse ainda mais Marin, como ele machucou hoje.

Marin pensava em Aioria, no quanto Lithos e Tohma estavam sofrendo. Maiss tinha uma dúvida em forma de ferida lhe assombrando cada pensamento: o que foi aquele ciúme? E se fosse amor?

0o0

Aioria não foi para casa naquela madrugada, ao invés disso, desceu as escadarias. Andou por um bom tempo lá embaixo, pensando sobre tudo que havia ocorrido.

Lá, abaixo dos alojamentos dos cavaleiros de prata, e um pouco antes dos alojamentos dos soldados, havia uma pequena mata. Ainda estava escuro, mas ele conhecia bem o local para saber que na mata havia uma cruz de madeira. Aioria fitou por um tempo, a madeira já velha unida com uma corda, molhada de orvalho. Depois sentou-se ao seu lado.

Aquele era o túmulo de Aioros, mas o cavaleiro não estava ali. Aioros estava vivo, protegendo a casa de Sagitário.

Mas por tantos anos Aioria sentara-se ali que hoje em dia, via o lugar como um refúgio, um porto-seguro.

"Zeus... o que eu faço?"

Como saber se nem tinha idéia do que estava sentindo?

Imagens das horas anteriores se misturavam a um passado recente, quando Lithos ainda era uma menina e o seguia para todos os lados. Quando acordava e a percebia a seu lado, onde ficara para cuidar dele e guardar seu sono.

Lembrava-se das brincadeiras, das brigas, dos momentos difíceis. Lembrou do dia em que a encontrou, naquela vila em ruínas chorando pela alma de seu pai.

E seus sorrisos misturavam-se com a própria dor que se instalara de repente no coração. Turbilhão de sentimentos que ele não podia controlar.

E na solidão da pequena mata, o cavaleiro chorou.

Sem testemunhas, a não ser uma cruz que marcava o tempo. Tempo que não voltava mais...

O que ele podia fazer?

0o0

Durante dois dias, não se teve notícias de Aioria. Até que naquela manhã, quando o leonino subia as escadas enquanto Camus descia.

O francês maneou a cabeça com educação, mas Aioria não acenou. Notara em sua aparência um pouco de desleixo. A barba por fazer, os cabelos bagunçados e as roupas um tanto quanto amassadas. Onde será que ele teria ido. Mas não se atreveu a perguntar. Não era problema dele.

– Aioros está em sua casa. – simplesmente avisou antes de virar as costas, sem resposta do outro.

Aioria concordou e continuou subindo as escadas. Queria ver Lithos. Só isso. Andou pelos corredores, até encontrar o quarto dela.

Antes de abrir a porta, no entanto, respirou fundo. Nunca foi de parar antes de fazer alguma coisa. Mas o que estava acontecendo? Não, não podia fugir. Tinha que conversar com ela. Tinha que esclarecer tudo, tinha que se desculpar pelo gesto impenssado.

Não podia recuar. Abriu com cuidado a porta.

– Lithos, eu...

Mas a menina não se encontrava ali. No seu lugar, um rapaz de um pouco mais que dezoito anos também. Cabelos e olhos de um castanho infantil e ao mesmo tempo experiente.

– Sabia que te encontraria aqui. – Aioros sorriu. – Aonde você foi? Nos preocupou...

Mas Aioria não respondeu. Ignorando a pergunta, disse apreensivo, como se sua vida dependesse da resposta:

– Cadê a Lithos?

Oros respirou fundo. Sabia que ele lhe perguntaria isso. Sabia o que tinha que dizer.

– Oria, a Lithos... se foi.

Continua...

N.As: Lithos: Demorou, mas nós conseguimos. Ai está mais uma atualização de Possibilidades. Sei que nada justifica tamanha demora, só que os compromissos do dia-a-dia nos sufocaram tanto, que acabamos nos enrolando na teia do tempo.

O importante é que cada linha acima foi escrita com carinho e respeito a todos vocês que acompanham, pois de nada adiantaria atualizar rápido com uma história incoerente não é?

Espero que gostem desse capítulo.

Abraços

Lithos de Lion